Último desafio

Projeto de efetividade da sentença moderniza a Justiça

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14 de abril de 2007, 16h21

Mais um dos 39 projetos da chamada reforma infraconstitucional do Poder Judiciário está prestes a ser aprovado. Trata-se de uma mudança sensata, oportuna e relativamente simples na redação do artigo 520 do Código de Processo Civil, que objetiva reforçar as competências dos juízes de primeira instância, desestimular os advogados a interpor recursos com fins meramente protelatórios nos tribunais superiores e desafogar a Justiça, em cujas cortes hoje tramitam cerca de 60,4 milhões de processos.

O projeto, que já passou pela Câmara, foi aprovado pelo Senado com emendas e teve de ser submetido a uma última apreciação pelos deputados, antes de ser enviado à sanção do presidente da República, determina que os recursos de apelação não poderão interromper o cumprimento de uma sentença judicial prolatada por um juiz de primeira instância, exceto nos casos em que a execução da decisão possa causar danos irreparáveis ou de difícil ressarcimento. Como pela legislação em vigor os recursos de apelação suspendem automaticamente a execução das sentenças, a parte vencedora num litígio judicial, para usar o jargão forense, “ganha mas não leva”. Ou seja, ela é obrigada a esperar o julgamento do recurso pelos tribunais superiores, mesmo que a causa não seja complexa e os desembargadores e ministros não tenham divergências doutrinárias ou legais sobre a matéria.

O problema é que os tribunais superiores atualmente se encontram abarrotados de processos. Por isso, como o julgamento dos recursos de apelação demora muito tempo, a regra hoje imposta pelo artigo 520 do Código de Processo Civil acaba estimulando a prática da chicana pelos advogados da parte derrotada, por meio de recursos protelatórios, o que desmoraliza o Judiciário e dissemina a incerteza jurídica, uma vez que cidadãos e empresas favorecidos por decisões judiciais não podem usufruir seus direitos. “Se a execução imediata da sentença passa a ser regra, o interesse recursal protelatório diminui”, diz a exposição de motivos do projeto.

Apresentado em dezembro de 2004, o projeto faz parte do chamado Pacto de Estado em Favor de um Judiciário mais Rápido e Republicano, que foi firmado pelos presidentes da República, do Senado, da Câmara dos Deputados, do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior do Trabalho logo após a aprovação da Emenda Constitucional nº 45, que criou o controle externo sobre a magistratura e introduziu a súmula vinculante, entre outras importantes inovações institucionais. Como o projeto de reforma constitucional do Judiciário se arrastou durante 13 longos anos no Legislativo, esse pacto foi concebido para propiciar a votação da reforma da legislação num prazo mais curto.

Apesar da resistência da OAB, que se opôs a aspectos da reforma infraconstitucional por temer que ela reduzisse o mercado de trabalho de seus filiados, o pacto foi uma das mais importantes e bem-sucedidas iniciativas políticas da atual década. Em vigor há 30 anos, o Código de Processo Civil foi concebido na época da ditadura militar, quando eram outras as condições sociais e econômicas do País.

Para modernizar a legislação processual, os signatários do pacto se comprometeram a apoiar 39 projetos preparados para redefinir as competências das diferentes instâncias judiciais, permitir o uso de meios eletrônicos na tramitação dos processos, limitar a interposição de agravos, unificar as fases de conhecimento e execução de títulos judiciais, coibir a abertura de ações repetitivas e disciplinar os pedidos de vista. Nos dois últimos anos, quase todos esses projetos foram aprovados. Os projetos ainda pendentes dizem respeito aos processos penal e trabalhista. Com a aprovação dada como certa do projeto que altera os efeitos da apelação contra sentença dos juízes de primeira instância, a fase legislativa da reforma do Judiciário, relativa ao processo civil, estará concluída. Agora o desafio da Justiça é desenvolver programas de gestão administrativa.

O êxito do pacto mostra que, quando os dirigentes dos Três Poderes são capazes de pôr os interesses maiores da Nação à frente de seus interesses corporativos, a modernização das instituições é um desafio que pode ser vencido.

Editorial publicado em O Estado de S. Paulo, neste sábado (14/4), com o título A modernização da Justiça

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