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Cliente de banco não pode ser obrigado a usar serviço

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7 de abril de 2007, 0h00

Cliente de banco não pode ser obrigado a usar o serviço de transferência bancária em vez de emissão de cheque. O entendimento é da 42ª Vara Cível de São Paulo, que proibiu o banco Itaú de cobrar tarifa de R$ 16 para clientes de emitem cheques com valor maior do que R$ 5 mil. Cabe recurso.

A Ação Civil Pública foi ajuizada pela Associação Nacional de Defesa da Cidadania e do Consumidor (Anadec) contra o banco. De acordo com a inicial, a instituição financeira cobra a tarifa dos consumidores que optam por passar cheque em vez de usar o serviço de transferência bancária.

O argumento da Anadec foi de que não existe qualquer lei brasileira que imponha aos consumidores a obrigação de usar exclusivamente um serviço. “Seria uma ingerência na vida pessoal, no patrimônio dos cidadãos, nas manifestações de vontades e na essência de diversos negócios jurídicos, como compras com cheque pré-datado, que é uma prática nacional profundamente enraizada”, alegou.

A associação sustentou, ainda, que não existe lei que “ampare a cobrança de taxas ou tarifas, dos correntistas que optem pela emissão de cheques em valor igual ou superior a R$ 5 mil”. Com a atitude, o banco “está incidindo em ofensa ao Código de Defesa do Consumidor, que por sua vez traz regra cristalina sobre a devolução de valores cobrados indevidamente”.

O artigo do CDC citado pela Anadec é do de número 42. De acordo com a regra, “o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”.

A primeira instância paulista acolheu os argumentos. “A questão do lucro bancário no país passa inexoravelmente pela tolerância e até leniência do Banco Central, admitindo práticas e políticas públicas indefensáveis, dentre as quais situamos, sem sombra de dúvida, a explosão em progressão geométrica das tarifas exigidas pelas instituições financeiras.”

“De fato, quando se instituiu o sistema de pagamento por via eletrônica, calcado na segurança, na realidade, na rapidez e na própria eficiência do sistema, não ficou preso em camisa de força o consumidor, haja vista mera faculdade e não obrigação para as operações a ele inerentes”, reconheceu a primeira instância.

A Anadec também move ação contra outros bancos no mesmo sentido.

Leia a decisão

Processo nº 583.00.2007.126911-3 – 42a. Vara Cível de São Paulo

Despacho Proferido em 16-03-2007

VISTOS: Ação civil pública interposta pela Anadec em desfavor do Banco Itaú S/A, de natureza declaratória, com carga condenatória, de repetição do indébito e pedido de tutela liminar, sustentando a ilegalidade da cobrança de tarifa para a hipótese de cheques emitidos superiores ao valor de R$ 5.000,00, cuja TED seria mera facultatividade do cliente e não obrigatoriedade, priorizando assim normatizar o assunto e evitar doravante referido procedimento, acostando procuração e documentos (fls. 13/26).

Aprecio, em cognição sumária, a ordem liminar reclamada: Bem assentada a questão, extrai-se a presença de legitimidade, interesse e a possibilidade jurídica do pedido, cuja entidade promovente se afigura regularmente inscrita, atendendo aos reclamos da lei específica, postulando em nome de interesses coletivos e com repercussão difusa.

A questão do lucro bancário no País passa inexoravelmente pela tolerância e até leniência do Banco Central, admitindo práticas e políticas públicas indefensáveis, dentre as quais situamos, sem sombra de dúvida, a explosão em progressão geométrica das tarifas exigidas pelas instituições financeiras.

De fato, quando se instituiu o sistema de pagamento por via eletrônica, calcado na segurança, na realidade, na rapidez e na própria eficiência do sistema, não ficou preso em camisa de força o consumidor, haja vista mera faculdade e não obrigação para as operações a ele inerentes.

Conseqüentemente, a doutrina francesa de Rives Lange entende que na operação bancária deve subsistir a maior transparência possível, cujos encargos refletem a segurança do consumidor e a perspectiva de incidência de remuneração pré-fixada. Neste universo, cada consumidor participa, em maior ou menor extensão, pagando às instituições financeiras valor fixo, mensalmente descontado, não sendo coerente, mas incongruente, a tarifação por atividade desempenhada. De um lado, a dormência inaceitável do Estado, tributando o cidadão, cada dia mais, em torno de 40% do PIB, d’outro, os bancos, encontrando tarifas e mais serviços imputando o ônus aos clientes consumidores, veja-se o mesmo lado da moeda, poderes político e econômico asfixiando o crescimento e o desenvolvimento do país, cujas gerações futuras suportarão os pesados encargos desta miopia institucional.

Com efeito, no caso em tela, ora examinado, comprova a entidade demandante que a instituição financeira, Banco Itaú S/A, a seu bel talante cobra tarifas para as hipóteses de cheques enquadrados nas circunstâncias da transferência eletrônica de dinheiro, a conhecida TED. Bem por tudo isto, na vertente dimensão, apresenta extrato, o qual evidencia, sem maiores comentários, diretamente, ter a instituição financeira imposto tarifa no valor de R$ 16,00 a sua cliente (fls. 25), fato este, por si só, estranho à previsão e à normalidade operacional do serviço bancário.

Afinal de contas, as instituições financeiras não podem estabelecer limites para efeito de compensação bancária, se fossem plausíveis as incidências, tanto em cheques de pequeno valor, mas também naqueles acima do limite, enquadrando-se na transferência eletrônica, situariam fato geradores proporcionando cobranças, o que não se admite, pelo menos dentro da lógica e racionalidade do serviço prestado.

Dito isto, pinçada a hipótese determinada, descortinado o horizonte revelado, reputo presentes os fundamentos autorizadores da medida, e concedo a tutela liminar pleiteada, a fim de que a instituição financeira Banco Itaú S/A, após a sua intimação, não cobre qualquer tarifa em relação aos cheques emitidos de valores R$ 5.000,00, ou superiores, sob pena de multa diária fixada, para cada caso específico, de R$ 100.000,00, sem prejuízo de proceder à restituição de todas as glosas feitas, corrigidamente.

Oficie-se ao Banco Central do Brasil, com cópia da inicial e desta decisão para que, no prazo de 10 dias, informe ao Juízo a disciplina que administra a cobrança das tarifas e o leque de discricionariedade das instituições para as respectivas fixações, salientando o critério e as circunstâncias em relação aos bancos públicos e privados, sob pena de desobediência e crime contra a administração da Justiça, tendo como destinatário, seu presidente Henrique Meirelles. Dê-se ciência ao Ministério Público do Consumidor. Cite-se e intime-se, por mandado a requerida, para os termos desta ação, inclusive para cumprimento, de imediato da tutela liminar, cuja defesa será apresentada em 15 dias, sob pena de revelia.

Cumpra-se, com observação.

Intimem-se.

NOTA DO CARTÓRIO: Providencie a autora o recolhimento da diligência do Oficial de Justiça referente ao mandado de citação e intimação expedido. NOTA DO CARTÓRIO: Providencie a autora a retirada e encaminhamento do ofício ao Banco Central do Brasil, no prazo legal. – ORDINÁRIO

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