Roupa suja

Membros do MP e advogados discutem a relação

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27 de setembro de 2006, 7h00

Tanto os advogados quanto os membros do Ministério Público admitem que o relacionamento entre eles nem sempre é bom. Os advogados reclamam de denúncias mal feitas, de ênfase em fatos não relevantes, da alta exposição na mídia. Os membros do MP reclamam de advogados que tentam atrapalhar as investigações, de profissionais que confundem o trabalho com a sua vida pessoal e do pouco envolvimento da classe com causas públicas. O debate entre as duas categorias ocorreu na reunião mensal dos associados do Cesa — Centro de Estudos das Sociedades de Advogados nesta terça-feira (26/9).

O centro de estudos convidou as procuradoras da República em São Paulo, Janice Ascari e Geisa de Assis Rodrigues; e os promotores de Justiça Arnaldo Hossepian e Marcelo Daneluzzi para discutir o tema A Advocacia e o Ministério Público.

Para a procuradora Geisa Rodrigues existem dois tipos de advogados: o que colabora com a investigação, que produz novas provas e traz a versão do seu cliente para os autos e o que não conversa com o Ministério Público e acaba fazendo com que seu cliente perca a oportunidade de se defender.

Há uma mudança de comportamento dos advogados, principalmente na área criminal, segundo a procuradora Janice Ascari. Ela diz que na fase judicial os advogados e procuradores têm uma relação normal como a parte contrária. Mas na fase pré-judicial, e principalmente na fase de investigação, quando esta é feita pelo MP, alguns advogados passam a atacar os membros do Ministério Público no campo pessoal. “Às vezes há uma certa incompreensão do papel do MP. Se eu digo a um advogado que ele não vai olhar o inquérito, ele não vai olhar e pronto. Porque vai ser prejudicial para a investigação.”

Janice também critica alguns ex-membros dos tribunais, que depois de aposentados voltam para a advocacia e tentam exercer sua influência entre os juízes. “Existe até uma resolução do Tribunal de Justiça, se não me engano de São Paulo, que proibiu que os aposentados freqüentem o lanche, para impedir que ocorra esse tipo de coisa.”

Existe realmente uma minoria de advogados que querem atrapalhar as investigações, principalmente na área que envolve patrimônio público, na opinião do promotor Marcelo Daneluzzi. Para ele, a relação entre advogados e Ministério Público ficou ainda mais tensa depois de 1985. A partir deste ano, o Ministério Público se fortaleceu com a possibilidade de defender o interesse coletivo e o patrimônio público. Daneluzzi também criticou a falta de atuação dos advogados atuais com as causas públicas. “A advocacia sempre foi muito envolvida, lutou contra a ditadura, o presidente da OAB foi quem assinou o impeachment de Collor e não vejo mais essa atuação.”

Para o promotor Arnaldo Hossepian não há como ter uma relação extremamente fraterna, principalmente na área criminal, já que o MP é detentor do direito de processar alguém criminalmente e o advogado tem de defender seu cliente. Mas acrescenta que o advogado está usa os instrumentos da lei e o MP busca convencer o juiz da culpa do acusado.

O outro lado

Os advogados que estavam na reunião também fizeram suas críticas. Um deles disse que está com todos os seus bens bloqueados porque ele foi procurador de uma empresa estrangeira que responde processo na Justiça trabalhista. “Foi um erro do Ministério Público e um abuso da Justiça do Trabalho. Agora como explico essa situação para a minha mulher?”

Outro advogado disse que alguns membros do Ministério Público convocam a imprensa e transformam uma operação de busca e apreensão em um espetáculo, como ocorreu no caso da boutique Daslu. Outro associado reclamou que muitas vezes o Ministério Público quer enquadrar atos ilícitos como uma grande ilegalidade e deixa de dar importância para questões maiores e mais relevantes para o país.

A defesa

A procuradora Janice Ascari diz que não pode responder pela conduta dos colegas, mas que os advogados podem reclamar nas corregedorias estaduais e no Conselho Nacional do Ministério Público. Para a procuradora Geisa Rodrigues, a questão é que o MP ainda está buscando se reestruturar, já que antes de 1985 era uma instituição inerte e amorfa. “Às vezes o MP acha que é a solução para tudo e por isso a instituição se perde. Mas já há uma geração mais madura.”

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