Briga de todos

Acordo internacional é uma grande arma na luta contra crime

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22 de setembro de 2006, 17h00

O combate à lavagem de dinheiro e ao crime organizado avançou no Brasil, mas ainda faltam acordos de cooperação internacional, uma das principais armas de luta. A falta de conhecimento de como proceder às operações também é um obstáculo ao combate ao crime.

As observações são do procurador da República no Paraná Vladimir Aras. Ele foi um dos palestrantes desta sexta-feira (22/9) do seminário “Lavagem de Dinheiro e Cooperação Jurídica Internacional”, promovido pelo CJF — Conselho da Justiça Federal. Mestre em crimes de informática, o procurador lembrou da importância dos acordos internacionais na apuração de alguns casos, como o do Banestado, em que ele atuou.

O escândalo foi resultado de uma das maiores operações contra lavagem de dinheiro no país e envolveu um volumoso desvio de dinheiro para o exterior, entre outras operações fraudulentas, que deram cabo de mais de US$ 75 bilhões retirados do país por meio de contas CC5, destinadas a moradores fora do Brasil. O caso Banestado nasceu de uma representação do Banco Central ao Ministério Público, em 1997. “O Banestado foi o maior laranjal até hoje plantado em Foz do Iguaçu”, lembra o procurador Aras. Durante as investigações, foi quebrado o sigilo de 160 contas e instaurados centenas de inquéritos policiais

Cooperação internacional

Os acordos internacionais ratificados pelo Brasil, a partir da Emenda Constitucional 45, têm força de lei ordinária e podem inclusive ajudar a Justiça brasileira a driblar as lacunas da legislação. Na Convenção das Nações Unidas sobre o Tráfico de Entorpecentes, por exemplo, o artigo 5 faculta a possibilidade de confisco de produtos do tráfico, bem como o de bens que correspondam ao valor desses produtos. Essa segunda hipótese não está prevista em nossa legislação, mas pode ser utilizada com a aplicação da convenção.

Para Vladimir Aras, a lavagem de dinheiro e o crime organizado são problemas mundiais e a solução global é a cooperação internacional. De acordo com ele, é preciso ampliar as unidades nacionais especializadas no assunto como as varas especializadas em lavagem de dinheiro instaladas no sul do país. O procurador propõe que o Ministério Público, a Polícia Federal e os demais órgãos que atuam no combate desse delito também criem unidades especializadas.

Ele insiste na importância da criação de forças-tarefa transnacionais e investigações conjuntas por autoridades dos países envolvidos. De acordo com o procurador, novos instrumentos como a Convenção de Budapeste, que trata de crimes eletrônicos, também devem ser abraçados pelo Brasil.

Quebra de sigilo

A quebra de sigilo internacional foi o tema da palestra do promotor de Justiça do estado de São Paulo Silvio Marques, outro convidado para participar do seminário do CJF. Ele explicou os esquemas detectados no Brasil de lavagem de dinheiro proveniente da administração pública. Segundo o promotor, a lavagem é feita por meio de superfaturamento de preços, empresas fantasmas ou laranjas. Pode também ser feita pelo chamado smurfing, que é a divisão do valor em quantias não sujeitas à fiscalização. Outras formas detectadas são a compra de dólar, ouro ou valores mobiliários e a aquisição de jóias e obras de arte em nome de terceiros.

No exterior, entre os mecanismos mais comuns, estão a utilização de empresas offshore e movimentação de contas em bancos sediados em paraísos fiscais, além de compra de títulos da dívida pública. O promotor lembrou da hipótese clássica de desvio de dinheiro público por meio de obras, serviços ou compras.

Silvio Marques enumerou e classificou as formas em que se dão os pedidos de quebra de sigilo internacional. São elas: por ordem judicial, ordem do poder legislativo (CPIs) e por ordem administrativa. Entre os órgãos autorizados a pedir a quebra de sigilo estão o Coaf — Conselho de Controle de Atividades Financeiras, a CVM — Comissão de Valores Mobiliários, a Receita Federal e o Cade — Conselho Administrativo de Defesa Econômica.

Existem quatro instrumentos de quebra de sigilo no exterior. Um dos mais antigos é a carta rogatória, expedida por um juiz civil ou criminal e aplicada por meio do Ministério da Justiça. Há ainda os pedidos de cooperação internacional criminal, o MLAT — Tratado Legal de Assistência Mútua, que pode ser expedido por um juiz, membro do MP ou delegado. O Brasil tem muitos MLAT. O principal é com os Estados Unidos. A quebra também pode ser feito por meio de um pedido de cooperação internacional civil. Este, no entanto, só pode ser aceito se houver, sobre o mesmo fato discutido no pedido, uma investigação criminal.

“Não adianta só prender as pessoas envolvidas no desvio do dinheiro. É preciso resgatar o que foi desviado”, observou o promotor. Ele lembrou de como é difícil e demorada a quebra de sigilo em paraísos fiscais, que isentam total ou parcialmente em até 20% o pagamento de impostos. “Nesses países, é difícil a quebra de sigilo. Ela deve ser feita, na maioria dos casos, por carta rogatória, onde fica necessária a dupla criminação, ou seja, o crime cometido no Brasil precisa ter correspondência no exterior. Também deve haver indícios do crime nos dois países.”

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