Preço do adjetivo

ACM é condenado por chamar Nicéa Camargo de louca

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22 de setembro de 2006, 18h37

Saiu caro para o senador Antônio Carlos Magalhães uma entrevista concedida em 2000 para a jornalista Mônica Bergamo, do jornal Folha de S. Paulo. ACM foi condenado a pagar 200 salários mínimos de indenização por danos morais para Nicéa Camargo, ex-mulher de Celso Pitta, por chamá-la de louca e de prostituta. A decisão é do juiz Gilberto Ferreira da Cruz, da 1ª Vara Cível de São Paulo. Cabe recurso.

De acordo com o processo, o senador ficou irritado com uma entrevista concedida por Nicéa Camargo à TV Globo. Na ocasião, a ex-mulher de Pitta disse que ACM era autor de diversos crimes.

ACM não gostou das declarações e respondeu na mesma proporção, na Folha. Na entrevista a Mônica Bergamo, disse que não iria processar “uma prostituta”, e tachou Nicéa de louca. Alegou também que não poderia ser condenado porque só respondeu às acusações, prerrogativa prevista na Lei de Imprensa.

Em depoimento ao juiz, a jornalista alegou que entrevistou o senador por ter ficado “surpresa com a reportagem [de Nicea na Globo] porque até então nunca tinha visto a Rede Globo fazer reportagem tão contundente envolvendo o senador”.

Para o juiz, “muito embora a Constituição Federal e a lei de imprensa garantam resposta a um acusado ou imputado, essa resposta, como exercício de direito ou de defesa, deve ser regular e respeitar os limites e as proporções do eventual agravo”.

“No caso analisado, as injúrias de prostituta e louca, além de referências a residência da autora e familiares, transbordaram em muito a qualquer regularidade ou proporção. Tratam-se de injúrias que atingem a honra subjetiva da vítima, vale dizer, o amor próprio, a auto estima e o bom conceito que todos nós temos a cerca de nossas qualidades e atributos pessoais”, afirmou o juiz Gilberto Ferreira da Cruz.

O juiz considerou que “o réu, provocado pela repórter a uma entrevista por telefone, não se limitou a eventualmente contrariar aquilo que estava sendo veiculado pela Rede Globo, partindo, assim, para dilacerantes ofensas pessoais que, com certeza, estavam dissociadas de acusações de cunho funcional do réu, as quais eram objetos de investigação em CPI à época”.

[Texto retificado em 26/9/2006]

Leia a decisão

Processo 583.00.2001.090690-1

TERMO DE AUDIÊNCIA AÇÃO: Indenização (Ordinária) Aos 8 de agosto de 2006, às 14:04 horas, nesta cidade e 1º Ofício Cível Central, na sala de audiência do Juízo de direito da 1ª Vara Cível Central de São Paulo, sob presidência do MM.(a) , Dr.(a) GILBERTO FERREIRA DA CRUZ, comigo Escrevente abaixo assinado, foi aberta a audiência de conciliação, instrução e julgamento, nos autos da ação e entre as partes supra referidas. Apregoadas as partes, compareceu a autora Sra. NICÉA TEIXEIRA DE CAMARGO – RG 38.674.067-7, acompanhada de seu defensor o Dr. FELICIO ROSA VALARELLI JÚNIOR – OAB/SP. 235.379, ausente porém o réu Sr. ANTONIO CARLOS PEIXOTO DE MAGALHÃES, mas presentes seus defensores os Drs. PAULO GUILHERME DE MENDONÇA LOPES – OAB/SP. 98.709 e PATRÍCIA DE CASTRO RIOS – OAB/SP. 156.383. Abertos os trabalhos proposta a tentativa de conciliação, a mesma restou infrutífera. Em termo apartado o MM. Juiz colheu o depoimento da testemunha MONICA BERGAMO.

O MM. Juiz foi declarado encerrada a instrução, e determinado que se passe aos debates. Dada a palavra ao Advogado da Requerente, foi dito que: MM. Juiz.: reitero os temos da inicial, inclusive reforçando a parte do animo subjetivo do réu e inadmissível entendimento de que teria sido simplesmente para informar ou com a intenção senão ofensiva e que diante das gravidades das declarações a autora se sentiu extremamente ofendida por isso requer sejam arbitrados os danos morais, levando-se em conta o nível econômico do réu e a gravidade da ofensa.

Considerando inclusive as afirmações feitas em ardência pela testemunha que confirmou as declarações ofensivas proferidas pelo réu. Dada a palavra ao advogado do requerido, disse que: MM. Juiz: Neste momento o réu reitera os termos de sua contestação,querendo chamara atenção deste Juízo aos seguintes pontos: consoante se pode ver da reportagem do Jornal Folha de São Paulo de 06.04.2000 a autora imputou ao réu a prática de graves delitos fato esse que foi confirmado pelo depoimento da única testemunha arrolada onde ficou assentado que o contexto “expressava acusações contra o requerido, que o envolveu, com a menção também ao Senador Gilberto Miranda. Ficou surpresa com a reportagem porque até então nunca tinha visto a Rede Globo fazer reportagem tão contundente envolvendo o requerido.

O assunto era constrangedor para o Senador Antonio Carlos.” Assim se o réu realmente proferiu as palavras que lhe são imputadas contra a autora nada mais fez em legitima defesa de sua honra e dignidade o que foi feito incontinente a agressão. O réu nada mais fez do que reagir as violentas agressões que lhe eram feitas. Nesse sentido pode-se sem a menor sombra de dúvidas dizer que inexiste qualquer ilicitude conduta do réu.

Uma porque reagiu de forma proporcional aos insultos que lhe eram deferidos. Duas porque em assim sendo a origem do dano imputado tem-se origem na própria conduta da autora e por último porque inexistiu dessa feita qualquer ânimus de ofender a autora, mas apenas de se defender.

A seguir pelo MM. Juiz foi proferida a seguinte sentença:

Vistos.

Nicea Teixeira de Camargo promove ação ordinária de indenização por danos morais sustentando, em síntese, ter sido atingida em sua honra e imagem por palavras de baixo calão proferidas pelo réu Antonio Carlos Peixoto de Magalhães em entrevista que este concedeu a repórter e colunista da Folha de São Paulo, Monica Bergamo. Nessa matéria jornalística, o réu teria imputado à autora os adjetivos “prostituta e louca”, acrescentando que ele “não iria processar uma protistuta” além de assacar outros impropérios em meio ao teor do colóquio mantido por telefone. Pede a autora a condenação do réu ao pagamento de indenização por dano moral a ser arbitrado pelo Juízo (fls. 2/28).

Em resposta, o réu contestou a ação argüindo preliminares de ilegitimidade de parte e de decadência. No mérito, sustenta que o fato decorreu de exercício de resposta imediata, em legitima defesa de assaques ilícitos antes proferidos pela autora. Também alega ter agido desprovido de dolo de ofender e sim motivado pelo elemento subjetivo de defender a sua honra. Pede a improcedência da ação e a condenação da autora nas verbas da sucumbência. O feito seguiu o seu trâmite e tentada a conciliação em audiência preliminar, restando infrutífera.

Em saneador, o Juízo afastou as preliminares argüidas, fixou os pontos controvertidos da lide e determinou a expedição para a colheita do depoimento pessoal do réu, o que veio a ocorrer por meio de carta precatória. Nesta audiência, infrutífera a conciliação, foi ouvida a testemunha Monica Bergamo. Em alegações orais, as partes basicamente reproduziram os pedidos deduzidos na inicial e contestação, acrescentando análise da prova hoje produzida.

É o relatório.

Fundamento e Decido.

A ação procede. Decorre da simples e objetiva leitura da entrevista concedida pelo réu e publicada no Jornal Folha de São Paulo o excesso em, eventualmente, dar resposta a alguma ofensa recebida. O réu, provocado pela repórter a uma entrevista por telefone não se limitou a eventualmente contrariar aquilo que estava sendo veiculado pela Rede Globo, partindo, assim, para dilacerantes ofensas pessoais que, com certeza, estavam dissociadas de acusações de cunho funcional do réu, as quais eram objetos de investigação em CPI à época.

Muito embora a Constituição Federal a e lei de imprensa garantam resposta a um acusado ou imputado, essa resposta, como exercício de direito ou de defesa, deve ser regular e respeitar os limites e as proporções do eventual agravo. No caso analisado, as injúrias de prostituta e louca, além de referências a residência da autora e familiares, transbordaram em muito a qualquer regularidade ou proporção. Tratam-se de injúrias que atingem a honra subjetiva da vítima, vale dizer, o amor próprio, a auto estima e o bom conceito que todos nós temos a cerca de nossas qualidades e atributos pessoais.

Na ceara civil, ao contrário da penal, não é necessário comprovar-se dolo, pois o dever de indenizar nasce da culpa, mesmo que levíssima. Noutra ótica, também não é necessária a prova do dano ou da dor experimentada pela autora, pois “in re ipsa” ou no vernáculo, o dano decorre diretamente do fato e independe de demonstração. A repórter Monica Bergamo confirmou o inteiro teor da reportagem publicada e, por conseguinte, das injúrias nela contidas. A responsabilização do réu, nessa quadra, é medida que se impõe, para proporcionar a autora a compensação pelos danos sofridos e, ao mesmo tempo, dissuadi-lo de novos atentados que venham a atingir a honra subjetiva de terceiros. Em remate, qualquer exercício de direito, retorsão ou defesa deve ser moderada, sob pena de caracterizar ato ilícito pelo excesso.

O valor da indenização leva em consideração as circunstancias do evento, a gravidade das injúrias imputadas, o veículo de informação de notória e larga penetração social, assim como as condições pessoais, sociais e funcionais dos envolvidos. É de bom alvitrio que a indenização não pode ser elevada ao ponto de gerar enriquecimento ilícito, porém não pode ser irrisória e ineficaz para os fins a que se destina. A indenização deve obedecer aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, dentro das circunstancias do caso concreto.

Posto isto e pelo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a ação para o fim de condenar ANTONIO CARLOS PEIXOTO DE MAGALHÃES ao pagamento a autora de indenização por danos morais no importe de 200 salários mínimos em vigor a época do efetivo pagamento, com incidência de juros desde a data da publicação ofensiva por se tratar de indenização decorrente de ato ilícito.

O réu também deverá pagar as custas processuais comprovadas e honorários advocatícios que fixo em 15% sobre o valor total da condenação. Publicada em audiência, saem as partes intimadas. Registre-se e intime-se. Nada mais. Lido e achado conforme, vai devidamente assinado.

Eu,____________________, (SONIA REGINA N.DE OLIVEIRA), Escrevente-Chefe, digitei. O MM.(a) Juiz(a): GILBERTO FERREIRA DA CRUZ

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