Aniversário de 40 anos

O risco da precipitação é substituir o CTN por algo pior

Autores

  • Roberto Carlos dos Santos

    é técnico da Receita Federal.

  • Leandro Tripodi

    é doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) mestrando em Administração Pública e especialista em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) professor de Direito Tributário do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e analista tributário da Receita Federal do Brasil.

31 de outubro de 2006, 19h54

O Código Tributário Nacional (CTN) completa 40 anos. Editado sob a égide de um regime de exceção, traz, em vários de seus dispositivos, marcantes traços daquele período. Embora elaborado por especialistas consagrados — fato que proporcionou uma elevada qualidade técnico-legislativa, para os fins a que se propunha o texto — seu conteúdo, frente à exigência de um Estado moderno, eficiente, justo e democrático, tornou-se de tal forma ultrapassado que a beleza da forma não contrabalança o peso de sua obsolescência.

Mas há de se ter cautela. O risco de se precipitar na substituição de uma lei que está em vigor há relativamente bastante tempo é o de trocá-la por algo pior. Quando o ranço ideológico rouba a cena e toma o lugar do espírito público e da precisão técnica, há grandes chances de que o que poderia ser um grande avanço tornar-se um triste retrocesso. Os poderes constituídos ainda não produziram um texto que pudesse substituir à altura o atual CTN, de tal modo a atender as exigências dos tempos atuais — possibilitando um nível de arrecadação razoável, logo não excessivo, para custear os serviços públicos, além de alargamento da base contribuinte, eliminação dos problemas que levam à informalidade e promoção da consciência geral de cooperação entre a sociedade e o Estado.

Há de se mudar certas idéias, que se tornaram paradigmáticas. O próprio conceito de tributo consagrado no CTN tem-no como uma prestação compulsória, pura e simplesmente, sem dispor sobre sua destinação ou sobre qualquer contraprestação do Estado para com o cidadão. Ainda mais principesca é a regra de que qualquer situação, desde que definida em lei, e atendidos certos requisitos, pode gerar a obrigação de pagar imposto, mesmo quando o ente federativo não demonstre sua viabilidade ou racionalidade econômica nem ofereça ao contribuinte a justa retribuição.

A instituição de um tributo deve ser orientada por uma motivação bem conhecida do público e a ela inexoravelmente atrelada. Devemos pensar o país como um grande condomínio, onde todos têm a obrigação fundamental de colaborar com o custeio e manutenção do patrimônio comum e dos serviços de interesse da coletividade, de acordo com sua capacidade econômica. Por outro lado, os recursos devem ser administrados e empregados de acordo com sua razão de estar nos cofres públicos, de maneira republicana e por meio de instrumentos democráticos.

Embora o conceito de sujeição tributária esteja sedimentado, é preciso também sobre ele tecer uma reflexão filosófica. Atualmente, na nomenclatura legal, o sujeito ativo da relação tributária é o ente público — e o sujeito passivo é o contribuinte. Ora, sendo (ou devendo ser) esta uma relação bilateral, é preciso que sejam explicitadas, também, as obrigações, na prática, dos entes tributantes, que se referem a uma justa contraprestação, na forma de bens e serviços públicos, pelo pagamento dos tributos que exigem em virtude de lei aprovada por meio de processos constitucionais.

Em síntese, o sistema tributário, como um todo, e em particular, o CTN deve voltar seu foco não somente no tributo, mas, também, e, sobretudo, nos direitos do contribuinte e na harmonia e equilíbrio da relação entre este e os diversos órgãos em que se subdivide o Estado brasileiro. Nem mesmo com um sentido estritamente técnico pode-se admitir tal precedência do Estado sobre o cidadão-contribuinte, como hoje vigora, num tempo em que, cada vez mais, a economia brasileira é afetada pela maneira como são aplicados os recursos que o fisco retira da sociedade.

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