Venda de votos

STF diz que candidato pode ser cassado por venda de voto

Autor

26 de outubro de 2006, 18h23

É constitucional cassar o registro ou diploma de candidato eleito condenado por compra de voto. A decisão é do Plenário do Supremo Tribunal Federal em julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade apresentada pelo PSB contra o artigo artigo 41-A da Lei Eleitoral (Lei 9.504/97).

O partido alegava que o artigo 41-A da Lei Eleitoral, que prevê “cassação do registro ou do diploma” como pena para o candidato que captar voto ilegalmente, teria criado uma nova hipótese de inelegibilidade.

Em setembro do ano passado, o ministro Gilmar Mendes, relator da ADI, determinou que a ação fosse julgada diretamente no mérito pelo Plenário. Nesta quinta-feira (26/10), o relator apresentou seu voto, pela rejeição da Ação Direta de Inconstitucionalidade.

Gilmar Mendes afirmou que o Tribunal Superior Eleitoral consolidou uma orientação no sentido de que “sanções de cassação de registro ou do diploma, previstas por diversos dispositivos da Lei das Eleições, não constituem em novas hipóteses de inelegibilidades”.

“A sanção de cassação de registro ou do diploma, cominada pelo artigo 41-A da Lei 9.504, não se confunde, a meu ver, com a declaração de inelegibilidade diante da ocorrência de algumas hipóteses definidas no artigo 14 da Constituição e na Lei Complementar 64/90”, destacou.

O relator ainda afirmou que a captação ilícita de votos distingue-se das situações de inelegibilidade. A última impõe uma sanção decorrente de práticas eleitorais de corrupção, enquanto a primeira “impõe um impedimento, um obstáculo que não se caracteriza como sanção, embora dela possa resultar”.

“Não se pode concluir que a disposição esculpida no artigo se apresenta como obstáculo à cidadania passiva, isto é, como espécie de inelegibilidade, porque o que fez o legislador foi impor uma forma de sanção ao candidato que vicia a vontade do eleitor”, considerou Gilmar Mendes.

A decisão foi unânime.

ADI 3.592

Visite o blog Consultor Jurídico nas Eleições 2006.

Veja a íntegra do voto

26/10/2006

TRIBUNAL PLENO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.592-4 DISTRITO FEDERAL

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES

REQUERENTE(S): PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO – PSB

ADVOGADO(A/S): LEONARDO PINHEIRO LOPES

REQUERIDO(A/S): PRESIDENTE DA REPÚBLICA

ADVOGADO(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

REQUERIDO(A/S): CONGRESSO NACIONAL

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO GILMAR MENDES (Relator): Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida liminar, proposta pelo Partido Socialista Brasileiro – PSB, em face da expressão “cassação do registro ou do diploma”, constante do art. 41-A da Lei n° 9.504, de 30 de setembro de 1997, o qual possui o seguinte teor:

“Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990.”

O requerente alega, em síntese, que o referido dispositivo teria criado nova hipótese de inelegibilidade, sem observância da reserva constitucional de lei complementar para tratar do assunto, prevista no art. 14, § 9o, da Constituição.

Sustenta, ainda, que o dispositivo impugnado também teria afrontado os §§ 10 e 11 do art. 14 da Constituição, na medida em que estabeleceu hipótese de perda de mandato eletivo em decorrência de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude, sem observar, no entanto, o procedimento previsto para a ação de impugnação de mandato eletivo.

Distribuídos a mim os autos, apliquei à ação o rito do art. 12 da Lei n° 9.868/99.

O Presidente da República prestou informações às fls. 89-180, concluindo pela constitucionalidade do dispositivo impugnado. Baseando-se na doutrina e na jurisprudência eleitoral, afirma que:

“ab initio, é necessário aduzir que o art. 41-A é fruto de um projeto de iniciativa popular, liderado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, Central Única dos Trabalhadores – CUT, Associação dos Juízes para a Democracia e inúmeros outros movimentos sociais. A intenção precípua desejada pela norma guerreada é a de que o processo eleitoral transcorra da forma mais correta possível, ou seja, que os candidatos captem o voto dos eleitores por meio das propagandas eleitorais, dos debates, da divulgação das propostas, etc.; e não por meio de subterfúgios que quebrem a lisura da disputa e que tornem a vontade dos eleitores viciada. (…) Nesse sentido, cumpre destacar, ainda, que a cassação prevista no dispositivo questionado não configura hipótese de inelegibilidade. Pois, conforme acima afirmado, não é verdadeiro aduzir que quaisquer circunstâncias que impliquem na impossibilidade de ser votado configura imperiosamente hipótese de inelegibilidade. (…) De fato, o art. 41-A comina pena de cassação de mandato e estabelece sanção de natureza pecuniária, que, em ambas as hipóteses, não configuram inelegibilidade, uma vez que o apenado continua na plenitude do gozo de seus direitos políticos e, por conseqüência, pode disputar quaisquer outras eleições subseqüentes.”


O Congresso Nacional prestou informações às fls. 183-192, nas quais sustenta que “a norma do art. 41-A não criou situação nova de inelegibilidade. A menção feita ao art. 22 da Lei Complementar n° 64/90 diz respeito unicamente à esfera procedimental, e portanto não enseja confusão meritória entre a cassação de registro ou diploma por captação de sufrágio e a investigação judicial eleitoral.”

A Advocacia-Geral da União manifestou-se pela improcedência do pedido formulado (fls. 202-217).

O parecer da Procuradoria-Geral da República é pela constitucionalidade do dispositivo impugnado (fls. 219-226).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO GILMAR MENDES (Relator): A presente ação impugna a expressão “cassação do registro ou do diploma” constante do art. 41-A da Lei das Eleições.

Com o advento da Lei n° 9.840/99, que introduziu o art. 41-A na Lei n° 9.504/97, surgiram na doutrina e na jurisprudência de alguns Tribunais eleitorais teses sobre a inconstitucionalidade desse dispositivo, por se tratar de nova hipótese de inelegibilidade criada por lei ordinária e não por lei complementar, como exige o art. 14, § 9o da Constituição.

Atualmente, todavia, o Tribunal Superior Eleitoral já possui jurisprudência consolidada no sentido de que as sanções de cassação de registro ou de diploma, previstas por diversos dispositivos da Lei das Eleições, não constituem novas hipóteses de inelegibilidade (Ac. no 25.241, de 22.9.2005, rel. Min. Humberto Gomes de Barros; no mesmo sentido o Ac. no 882, de 8.11.2005, rel. Min. Marco Aurélio; Ac. no 25.295, de 20.9.2005, rel. Min. Cesar Asfor Rocha; Ac. no 5.817, de 16.8.2005, rel. Min. Caputo Bastos; Ac. no 25.215, de 4.8.2005, rel. Min. Caputo Bastos; no mesmo sentido o Ac. no 25.289, de 25.10.2005, do mesmo relator; Ac. no 25.227, de 21.6.2005, rel. Min. Gilmar Mendes; Ac. no 4.659, de 19.8.2004, rel. Min. Peçanha Martins; Ac. no 612, de 29.4.2004, rel. Min. Carlos Velloso; Ac. no 21.221, de 12.8.2003, rel. Min. Luiz Carlos Madeira; Ac. no 21.169, de 10.6.2003, rel. Min. Ellen Gracie; Ac. no 21.248, de 3.6.2003, rel. Min. Fernando Neves; Ac. no 19.644, de 3.12.2002, rel. Min. Barros Monteiro).

A sanção de cassação de registro ou do diploma cominada pelo art. 41-A da Lei n° 9.504/97 não se confunde com a declaração de inelegibilidade diante da ocorrência de alguma das hipóteses definidas no art. 14 da Constituição e na Lei Complementar n° 64/90.

Assim, quanto à constitucionalidade do art. 41-A, da Lei n° 9.504/97, em face do § 9o do art. 14 da Constituição, o parecer do Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, bem esclarece a questão, verbis:

“Não procedem as alegações de inconstitucionalidade da expressão ‘e cassação do registro ou do diploma’, contida no artigo 41-A, da Lei nº 9.504/97, com a redação que lhe foi conferida pela Lei nº 9.840/99. Em primeiro, é preciso observar que, ao contrário do sustentado pelo requerente em sua petição inicial, o aludido dispositivo não cria nova hipótese de inelegibilidade, razão pela qual não se observa a sustentada violação ao artigo 14, §9º, da Constituição Federal. Em verdade, o dispositivo sob análise se refere, especificamente, à captação ilícita de sufrágio, impondo como sanções, a pena de multa e a cassação do registro ou do diploma, não se confundindo estas hipóteses com a inelegibilidade. Com efeito, ao discorrer sobre o tema das inelegibilidades, o Ministro Moreira Alves destacou que estas se caracterizam como “impedimentos que, se não afastados por quem preencha os pressupostos de elegibilidade, lhe obstam concorrer a eleições ou, – se supervenientes ao registro ou se de natureza constitucional – servem de fundamento à impugnação de sua diplomação, se eleito”. Verifica-se, portanto, que distintas são as situações de inelegibilidade e de captação ilícita de sufrágio, porquanto esta impõe uma sanção que decorre de prática de corrupção eleitoral, enquanto aquela impõe um impedimento, um obstáculo que não se caracteriza como sanção, embora dela possa resultar. Dessa forma, não se pode concluir que a disposição insculpida no artigo 41-A, da Lei nº 9.504/97 se apresenta como obstáculo à cidadania passiva, isto é, como espécie de inelegibilidade, porquanto, na realidade, o que fez o legislador foi impor uma forma de sanção ao candidato que vicia a vontade do eleitor, através da doação, oferecimento, promessa ou entrega de bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, e a punição é restrita ao pleito em que ocorreu a captação ilícita. Tal diferença resta evidenciada no acórdão n° 16.242, do Tribunal Superior Eleitoral, no qual o Ministro Nelson Jobim, relator, destacou em seu voto:

“(…) Mas lembro que a lei complementar exige, para efeito da prática de abuso de poder econômico, o risco de perturbação da livre manifestação popular. É isso que tem que ser demonstrado. Ou seja, quando a captação de sufrágio foi criada pelo art. 41-A da Lei n° 9.840/99, não se falou de inelegibilidade, e sim em captação do sufrágio com o fim de obter o voto. No caso concreto poder-se-ia pensar em captação de sufrágio, mas captação de sufrágio não leva à inelegibilidade, que exige o risco de perturbação da livre manifestação popular. Esta é a diferença fundamental. Ou seja, se estivéssemos perante a captação de sufrágio, sim, porque estaríamos discutindo o problema com o fim de obter o voto do art. 41-A; todavia, não é a hipótese”

Assim sendo, resta claro que não se pode atribuir à sanção decorrente da captação ilícita de sufrágio a natureza de inelegibilidade, de sorte que não procede o argumento do requerente no sentido da necessidade de previsão em lei complementar.” (fls. 221-222)


No mesmo sentido manifestou-se o Advogado-Geral da União, nos seguintes termos:

“Em que pesem os argumentos colacionados à inicial, percebe-se que o autor parte da equivocada premissa de que o disposto no artigo 41-A da mencionada lei estaria criando uma nova hipótese de inelegibilidade. Todavia, isso não ocorreu, conforme se demonstrará a seguir. A Constituição Federal traça em seu bojo condições de elegibilidade (art. 14, §§ 3º e 8), bem como hipóteses de inelegibilidades (art. 14, §§ 4º a 7º). Por fim, possibilita ao legislador complementar criar novas hipóteses de inelegibilidade, com o fito de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do exercício de função cargo ou emprego na administração pública direta ou indireta (art. 14, § 9º). Dessa forma, para que um cidadão comum possa pretender ocupar algum cargo eletivo deverá possuir condições de elegibilidade (nacionalidade brasileira, pleno exercício dos direitos políticos, alistamento eleitoral, domicílio eleitoral na circunscrição, filiação partidária e idade mínima), bem como não poderá se enquadrar em qualquer das hipóteses de inelegibilidade previstas no art. 14 da Carta Maior e na Lei Complementar nº 64/90. Nesse diapasão, o autor afirma, com acerto, que, afora as hipóteses de inelegibilidades elencadas na Constituição Federal e na legislação complementar, não poderia o legislador ordinário inovar. Cabe asseverar que, no caso dos autos, não houve tal inovação ao introduzir o artigo 41-A no bojo da Lei nº 9.504/97. Em nenhuma passagem da lei em apreço há menção a pena da inelegibilidade como conseqüência jurídica do descumprimento dos preceitos nela contidos. Ao revés disso, as sanções previstas no artigo 41-A são expressas, quais sejam, a pena de multa e a cassação do registro ou do diploma. Não se menciona inelegibilidade, porquanto de inelegibilidade não se trata. Na realidade, as sanções correlatas ao cometimento da captação de sufrágio pelo eventual candidato – pena de multa ou cassação do registro ou do diploma – não impõem, por si mesmas, a sua inelegibilidade. O sentido do preceito sob análise é o de afastar, de imediato, o candidato da disputa eleitoral. Assim, ele não incidirá em qualquer condição de inelegibilidade, mas tão-somente restará proibido de participar de um pleito eleitoral específico.” (fls. 204-205)

Deve ser levado em conta também que, em recente julgamento (ADI 3.305/DF, Rel. Min. Eros Grau, julgado em 13.9.2006), o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 77 da Lei n° 9.504/97, entendendo que tal dispositivo, ao cominar a sanção de cassação de registro da candidatura, não trata de nova hipótese de inelegibilidade. Retiro as referências deste julgado do Informativo STF n° 440, verbis:

“O Tribunal julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido Liberal – PL contra o art. 77 e seu parágrafo único da Lei federal 9.504/97, que, respectivamente, proíbe os candidatos a cargos do Poder Executivo de participar, no trimestre que antecede o pleito, de inaugurações de obras públicas, e comina, ao infrator, a pena de cassação do registro da candidatura. Sustentava-se, na espécie, ofensa ao art. 14, § 9º, da CF, por se ter estabelecido, sem lei complementar, nova hipótese de inelegibilidade, bem como a inobservância do princípio da isonomia, já que a norma alcançaria exclusivamente os candidatos a cargo do Poder Executivo. Entendeu-se que a referida vedação não afronta o disposto no art. 14, § 9º, da CF, porquanto não consubstancia nova condição de elegibilidade, destinando-se apenas a garantir igual tratamento a todos os candidatos e a impedir a existência de abusos. Além disso, concluiu-se pela inocorrência de violação ao princípio da isonomia, por se considerar haver razão adequada para a diferenciação legal, qual seja, a de exercer o Poder Executivo função diversa da do Poder Legislativo, de gerir a Administração Pública e de, conseqüentemente, decidir sobre a realização de obras. Precedente citado: ADI 1062 MC/DF (DJU de 1º.7.94).”

Assim, tendo em vista que a sanção de cassação de registro ou do diploma não implica declaração de inelegibilidade, não vislumbro inconstitucionalidade no art. 41-A da Lei n° 9.504/97 em face do disposto no § 9o do art. 14 da Constituição.

Da mesma forma, não vejo qualquer inconstitucionalidade em relação aos §§ 10 e 11 do art. 14 da Constituição.

É certo que a captação de sufrágio, definida pelo art. 41-A, da Lei n° 9.504/97, deverá ser apurada de acordo com o procedimento da ação de investigação judicial eleitoral, previsto no art. 22 da LC n° 64/90, o qual dispõe, em seus incisos XIV e XV, o seguinte:


“XIV – julgada procedente a representação, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos três anos subseqüentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder de autoridade, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e processo-crime, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar;

XV – se a representação for julgada procedente após a eleição do candidato serão remetidas cópias de todo o processo ao Ministério Público Eleitoral, para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e 11 da Constituição Federal, e art. 262, inciso IV, do Código Eleitoral.”

Tais incisos, no entanto, não se aplicam ao procedimento da representação para apuração da conduta descrita no art. 41-A da Lei n° 9.504/97, como já decidiu o Tribunal Superior Eleitoral (Ac n° 19.587, de 21.3.2002, Rel. Min. Fernando Neves; Ag. n° 3042, de 19.3.2002, Rel. Min. Sepúlveda Pertence).

O procedimento do art. 22, a ser observado na aplicação do art. 41-A, é aquele previsto nos incisos I a XIII. Isso porque, diferentemente da ação de investigação judicial eleitoral, a representação para a apuração da captação de sufrágio não implica a declaração de inelegibilidade, mas apenas a cassação do registro ou do diploma.

Por isso, a decisão fundada no art. 41-A da Lei n° 9.504/97, que cassa o registro ou o diploma do candidato, tem eficácia imediata, não incidindo, na hipótese, o que previsto no art. 15 da LC n° 64/90, que exige o trânsito em julgado da decisão para a declaração de inelegibilidade do candidato. Os recursos interpostos contra tais decisões são regidos pela regra geral do art. 257 do Código Eleitoral, segundo a qual os recursos eleitorais não têm efeito suspensivo. Assim, não há necessidade de que seja interposto recurso contra a diplomação ou ação de impugnação de mandato eletivo para o fim de cassar o diploma.

Estabelece-se, dessa forma, a distinção entre (a) a ação de impugnação de mandato eletivo, instaurada para a apuração de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude, a seguir o rito previsto no art. 14, §§ 10 e 11 da Constituição e no art. 3o da LC n° 64/90; (b) a ação de investigação judicial eleitoral, instaurada para apurar uso indevido, desvio ou abuso de poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, que deve seguir o procedimento do art. 22, incisos I a XV da LC n° 64/90; (c) e a representação para apurar a conduta descrita no art. 41-A da Lei n° 9.504/97, que segue o procedimento dos incisos I a XIII do art. 22 da LC n° 64/90.

Com esses fundamentos, não vislumbro qualquer inconstitucionalidade no art. 41-A da Lei n° 9.504/97 em face do art. 14, §§ 9o, 10 e 11 da Constituição.

O art. 41-A foi introduzido na Lei n° 9.504/97, por meio da Lei n° 9.840/99, com a finalidade de reforçar a proteção à vontade do eleitor, combatendo, com a celeridade necessária, as condutas ofensivas ao direito fundamental ao voto. Ou seja, enquanto a ação de investigação judicial eleitoral visa proteger a lisura do pleito, a representação para apurar a conduta prevista no art. 41-A da Lei n° 9.504/97 tem o objetivo de resguardar um bem jurídico específico: a vontade do eleitor.

Nos termos da Constituição, a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos (art. 14, caput).

Embora não esteja explícito nessa norma constitucional, é evidente que esse voto tem uma outra qualificação: ele há de ser livre. Somente a idéia de liberdade explica a ênfase que se conferiu ao caráter secreto do voto.

O voto direto impõe que o voto dado pelo eleitor seja conferido a determinado candidato ou a determinado partido, sem que haja uma mediação por uma instância intermediária ou por um colégio eleitoral. Não retira o caráter direto da eleição a adoção do modelo proporcional para a eleição para a Câmara de Deputados (CF, art. 45, caput), que faz a eleição de um parlamentar depender dos votos atribuídos a outros ou à própria legenda. É que, nesse caso, decisivo para a atribuição do mandato é o voto atribuído ao candidato ou ao partido e não qualquer decisão a ser tomada por órgão delegado ou intermediário.

O voto secreto é inseparável da idéia do voto livre.

A ninguém é dado o direito de interferir na liberdade de escolha do eleitor. A liberdade do voto envolve não só o próprio processo de votação, mas também as fases que a precedem, inclusive relativas à escolha de candidatos e partidos em número suficiente para oferecer alternativas aos eleitores.


Tendo em vista reforçar essa liberdade, enfatiza-se o caráter secreto do voto. Ninguém poderá saber, contra a vontade do eleitor, em quem ele votou, vota ou pretende votar.

Portanto, é inevitável a associação da liberdade do voto com uma ampla possibilidade de escolha por parte do eleitor. Só haverá liberdade de voto se o eleitor dispuser de conhecimento das alternativas existentes. Daí a inevitável associação entre o direito ativo do eleitor e a chamada igualdade de oportunidades ou de chances (Chancengleichheit) entre os partidos políticos.

A igualdade do voto não admite qualquer tratamento discriminatório, seja quanto aos eleitores, seja quanto à própria eficácia de sua participação eleitoral.

A igualdade de votos abrange não apenas a igualdade de valor numérico (one man one vote) (Zahlwertgleichheit), mas também, fundamentalmente, a igualdade de valor quanto ao resultado (Erfolgswertgleichheit).

A igualdade de valor quanto ao resultado é observada se cada voto é contemplado na distribuição dos mandatos. A igualdade de valor quanto ao resultado associa-se, inevitavelmente, ao sistema eleitoral adotado, se majoritário ou proporcional, à admissão ou não de cláusula de desempenho ou de barreira para as agremiações partidárias, e à solução que se adote para as sobras ou restos, no caso da eleição proporcional.

Ressalte-se que o caráter livre e secreto do voto impõe-se não só em face do Poder Público, mas também das pessoas privadas em geral. Com base no direito alemão, Pieroth e Schlink falam de uma eficácia desse direito não só em relação ao Poder Público, mas também em relação a entes privados (Drittwirkung) (Cf. Pieroth e Schlink, Grundrechte – Staatrecht II, 2005 p. 277).

Assim, a preservação do voto livre e secreto obriga o Estado a tomar inúmeras medidas com o objetivo de oferecer as garantias adequadas ao eleitor, de forma imediata, e ao próprio processo democrático.

Essa é a teleologia da norma do art. 41-A da Lei das Eleições.

O rito sumário previsto nos incisos I a XIII do art. 22 da LC n° 64/90, assim como a possibilidade de execução imediata da decisão que cassa o registro ou o diploma do candidato que pratica captação ilícita de sufrágio, traduzem salutar inovação em nossa legislação, pois permitem a rápida apuração e conseqüente punição daqueles que atentam contra a incolumidade da vontade do eleitor.

Dessa forma, a regra vem integrar o plexo normativo de garantias processuais do direito fundamental ao voto.

Os resultados obtidos pela aplicação do art. 41-A da Lei n° 9.504/97 pela Justiça Eleitoral em todo o país têm demonstrado a importância de mecanismos processuais céleres para a proteção eficaz da liberdade do eleitor, o que só tem contribuído para o aperfeiçoamento da democracia.

Com essas considerações, voto pela improcedência desta ação direta de inconstitucionalidade.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!