Aposentadoria e trabalho

Decisão do Supremo não colide com a jurisprudência do TST

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25 de outubro de 2006, 7h00

Nos últimos dias, houve considerável divulgação por parte dos meios de comunicação da decisão proferida em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.721), em que o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, entendeu pela inconstitucionalidade do parágrafo 2o, do artigo 453, da CLT, o qual foi instituído pela Medida Provisória 1.596/97 e convertida posteriormente na Lei 9.528/97.

Trata-se de uma espécie de benefício previdenciário tipificado como aposentadoria proporcional. O referido parágrafo determina que a concessão de benefício de aposentadoria a empregado que não tiver completado 35 anos de serviço, se homem, ou 30, se mulher, implica em extinção do vínculo empregatício.

Firmou-se entendimento, decorrente da interpretação imediata da decisão, de que o empregador não poderia dispensar seu empregado, em caso de aposentadoria, sem que fossem observados os reflexos oriundos de uma demissão sem justa causa, interferindo, com maior relevância, nos valores a serem pagos a título da multa de 40% sobre o FGTS.

Observemos que quando da vigência da Lei 6.950/81, o desligamento do empregado representava condição para a obtenção da aposentadoria espontânea. Atualmente, porém, sob a vigência da Lei 8.213/91, a jubilação passaria a constituir causa para desfazer o vínculo contratual.

O Tribunal Superior do Trabalho possui entendimento sedimentado pela Orientação Jurisprudencial 177, argumentando que a aposentadoria espontânea extingue o contrato de trabalho, mesmo quando o empregado continua a trabalhar na empresa após a concessão do benefício previdenciário, não sendo devida, portanto, a multa de 40% do FGTS em relação ao período anterior à aposentadoria.

O contraponto que devemos fazer acerca da decisão proferida pela Suprema Corte pauta-se no sentido de que a inconstitucionalidade evidenciada repousa somente na hipótese normativa prevista no parágrafo segundo do artigo 453 da CLT, ao passo que a interpretação consolidada pela corte superior trabalhista e, diga-se, também por grande parte da doutrina especializada, está em consonância com seu próprio caput, o qual reza que no “tempo de serviço do empregado, quando readmitido, serão computados os períodos, ainda que não contínuos, em que tiver trabalhado anteriormente na empresa, salvo se houver sido despedido por falta grave, recebido indenização legal ou se aposentado espontaneamente”.

Não havia posições conflitantes entre o STF e o TST quanto ao mesmo tema, mas sim quanto a dispositivos legais díspares, o que sempre tornou incólume o respeito da corte superior laboral ao posicionamento de nosso tribunal constitucional, conforme se observa, por exemplo, na Reclamação 2.368 onde o TST, ao prestar informações, consignou que as “ADIs em comento limitam-se à aferição da constitucionalidade dos parágrafos acrescentados pelo artigo 453 da CLT pela Lei 9.528/97, e que o artigo 453, caput, da CLT, por si só, afasta expressamente a possibilidade de se computar o período trabalhado pelo empregado anteriormente à sua aposentadoria espontânea para efeito de contagem de tempo de serviço, na medida em que dispõe que a aposentadoria espontânea exclui o direito ao cômputo do período anterior ao jubilamento”.

Ao final do julgamento, o próprio STF ao negar seguimento à Reclamação, convalida tal assertiva, pois o “controle concentrado de normas ataca objetivamente os dispositivos normativos em espécie. No caso, os parágrafos 1º e 2º, do artigo 453, da CLT, foram atacados pelas ações diretas: permanece válido seu caput. Assim, não há desrespeito à decisão vinculante do Supremo Tribunal Federal se o paradigma normativo invalidado é diverso do dispositivo legal aplicado ao caso”.

A redação atual do caput do artigo 453 foi inserida pela Lei 6.204 de 29 de abril de 1975, e esta, até o presente momento, não teve sua recepção questionada perante sistema jurídico vigente, logo, a interpretação do TST referendada pela Orientação Jurisprudencial 177 há de prevalecer, mesmo após o julgamento da ADI 1.721, pois partem as premissas interpretativas e fáticas de dispositivos legais diferentes.

Acreditamos que o assunto merece reflexão, e que a aposentadoria espontânea dos empregados inaugura uma nova relação trabalhista, senão vejamos:

a) Até que ponto o princípio constitucional previdenciário da seletividade e distributividade das prestações (art. 194, III, CF/88) estaria sendo observando quando da manutenção de duas relações jurídicas simultâneas, contrato de trabalho e benefício previdenciário?

b) Como podemos contemplar diuturnamente a aposentadoria com os princípios constantes nos artigos 193 e 170, caput, IV e VIII, da Constituição Federal?

c) A Constituição faz dicotomia entre trabalhadores e aposentados (artigos 8º, VI, 10º, 194, parágrafo único, VII, v.g.), tornando, assim, distintas as relações jurídicas. Tal assertiva não seria apta a ensejar a inauguração de um novo contrato de trabalho quando da jubilação e permanência no mesmo emprego?

d) Da análise do parágrafo 2º do artigo 201 da Constituição Federal o benefício de aposentadoria corresponde à substituição do salário. Caso uma pessoa continue trabalhando pode-se contemplar que o benefício que ela receba eventualmente poderá ser menor que um salário mínimo, eis que a fonte de subsistência do segurado ainda permanece?

A nosso ver, portanto, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.721, o qual julgou pela inconstitucionalidade do parágrafo 2º do artigo 453 da CLT, não enseja, em princípio, colisão com a jurisprudência pacífica do Tribunal Superior do Trabalho contida na Orientação Jurisprudencial 177, eis que esta fundamenta seu entendimento no próprio caput do citado artigo e, não, em seu parágrafo 2º, tornando-a aplicável aos casos concretos mesmo após a manifestação de nossa corte constitucional.

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