Dignidade do tribunal

Punição a juiz tem de ser prevista em lei complementar

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21 de outubro de 2006, 6h01

A previsão de infração disciplinar de juiz só pode ser instituída por lei complementar. Baseado nessa previsão constitucional, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional o Provimento 8, de 2001, do Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região (Sergipe). Foram cinco votos a quatro.

A norma criou uma infração disciplinar que considera ato atentatório à dignidade do tribunal a repetição, palavra por palavra, de decisão anulada ou a manutenção dos mesmos fundamentos quanto ao objeto da nulidade, quando o processo retornar à vara de origem para nova sentença. A ação foi proposta pela Anamatra — Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho.

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade, a associação sustentou que o Poder Judiciário, no exercício da atividade administrativa, não pode criar deveres e prever infrações disciplinares sem amparo na lei. Segundo a Anamatra, a infração disciplinar não está prevista na Lei Orgânica da Magistratura (Lei Complementar 35/79) e a competência para a criação de infração disciplinar para magistrado é exclusiva de lei complementar.

O TRT sergipano alegou que a criação do dispositivo foi feita como reação ao comportamento reiterado de juízes trabalhistas de primeira instância daquela região. Argumentou que, nas decisões, eles repetiam fundamentos já rejeitados pelo tribunal em outras sentenças.

Tal conduta, segundo a defesa do TRT, “retardava os feitos e desatendia o cumprimento da ordem judicial colegiada, causando desprestígio ao Poder Judiciário, grave prejuízo a uma das partes litigantes e o comprometimento do princípio da segurança jurídica”.

Voto da relatora

A ministra Ellen Gracie, relatora, observou que o juiz tem o dever de acatar os fundamentos que anularam a sua sentença. E afirmou que “parece não restar dúvida de que sua prática reiterada traz conseqüências nocivas à segurança jurídica e à pronta entrega da prestação jurisdicional, além de transgredir princípios e normas do ordenamento jurídico do país”.

Para ela, o assunto tem caráter estatutário e, por isso, ligado à conduta, à disciplina e aos demais deveres e vedações inerentes à atividade judicante, matéria prevista na Lei Orgânica da Magistratura. A ministra lembrou que a nova regulamentação desta norma “estará sempre sujeita à reserva de lei complementar, conforme dispõe o artigo 93, caput da Constituição Federal”.

Com isso, a ministra afirmou que ao criar uma infração, por meio de provimento, o TRT afrontou o artigo 93, caput, da Carta Magna. Entretanto, Ellen Gracie salientou que mesmo sem o ato contestado o tribunal tem outras formas de punir o juiz por esse tipo de prática. Isto porque os artigos 35, I, 42, I e II, 43 e 44 do Estatuto da Magistratura dispõem que é dever do magistrado cumprir as disposições legais e que a violação a este dever poderá resultar na aplicação das penas disciplinares de advertência e censura.

Divergência

O ministro Marco Aurélio entendeu que no Provimento 8/01 do TRT de Sergipe não há previsão de pena ao juiz. “Se partiu de uma premissa que, anulada a sentença por vício instrumental, possa aquela que a prolatou repetir o que se contém no ato fulminado. Não há previsão de pena”, concluiu. Para ele, o provimento é uma orientação interna do tribunal e não uma tipificação normativa.

Acompanharam a ministra Ellen Gracie, os ministros Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Carlos Ayres de Britto, Celso de Mello, Sepúlveda Pertence. Ao lado do ministro Marco Aurélio, pela improcedência, votaram os ministros Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Gilmar Mendes e Nelson Jobim (aposentado). A ministra Cármen Lúcia não participou da votação, porque sucedeu o ministro Nelson Jobim, que votou antes de se aposentar.

ADI 2.885

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