Morte no cárcere

Estado tem de indenizar inocente que ficou 13 anos preso

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19 de outubro de 2006, 21h46

Sem nunca ter sido condenado ou sequer processado, o pernambucano Marcos Mariano da Silva passou 13 anos na cadeia. Quando foi preso, tinha 37 anos, estava casado e tinha 11 filhos. Quando saiu da prisão, aos 50 anos, sua família estava desfeita e, além do sofrimento moral, Marcos Mariano estava tuberculoso e cego.

Nesta quinta-feira (19/10), o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a responsabilidade do estado de Pernambuco pela injustiça contra Marcos Mariano da Silva, hoje com 58 anos, e o condenou a pagar a ele uma indenização de R$ 2 milhões.

Por unanimidade, os ministros da 1ª Turma do STJ reconheceram a extrema crueldade a que o cidadão foi submetido pelas instituições públicas. “É o caso mais grave que já vi”, indignou-se a ministra Denise Arruda. “Mostra simplesmente uma falha generalizada do Poder Executivo, do Ministério Público e do Poder Judiciário.” Para a ministra Marcos perdeu a capacidade de se movimentar, de ser autônomo. “Aqui não se trata de generosidade”, disse. “Aqui se trata de um brasileiro que vai sobreviver não se sabe como.”

Marcos Mariano foi preso em 27 de julho de 1985, sem motivo conhecido e preso ficou até 25 de agosto de 1998. “Ele foi preso sem inquérito, sem condenação alguma, e sem direito a nenhuma espécie de defesa”, sustentou seu advogado, José Afonso Bragança Borges. “Foi simplesmente esquecido no cárcere, onde ficou cego dos dois olhos e submetido aos mais diversos tipos de constrangimento moral”.

Acusado de participar de diversas rebeliões, Marcos Mariano passou mais de seis meses em um presídio de segurança máxima, sem direito a banho de sol. Segundo o advogado, a inocência de Marcos só começou a ser discutida depois que o policial Roberto Galindo assumiu o comando do presídio Aníbal Bruno, em Recife, onde ele estava preso. Galindo promoveu um mutirão judicial para resolver casos pendentes dos presos. “O assessor jurídico ficou espantado”, disse o advogado. “Não havia nada que justificasse a prisão dele”.

Morte no cárcere

“Esse homem morreu e assistiu à sua morte no cárcere”, afirmou o ministro Teori Zavaschi. “O pior é que não teve período de luto.” Enquanto estava preso, Marcos assistiu inerte à degradação de sua mulher e seus 11 filhos, que se espalharam mundo a fora.

“Imaginem os filhos que cresceram injustamente com a imagem de um pai presidiário?”, argumentou. Os ministros consideraram que a situação vivida por Marcos é muito pior do que a de um pai que perde um filho na porta de uma escola. Ou de alguém que é torturado fisicamente. Julgaram a questão “excepcionalíssima”, por ser um dos mais longos sofrimentos que o Estado impôs a um cidadão.

O advogado de Marcos pediu indenização de R$ 6 milhões. A primeira instância fixou o valor da indenização em R$ 356 mil. O Tribunal de Justiça de Pernambuco fixou o valor em R$ 2 milhões, o que foi mantido pelo STJ. Depois que saiu da prisão, passou a receber uma pensão de R$ 1,2 mil, beneficiado por uma lei aprovada pelo Legislativo de Pernambuco em junho deste ano.

História repetida

A história de Marcos Mariano lembra o caso dos irmãos Naves, também vítimas de graves falhas judiciais. Joaquim Naves e Sebastião Naves foram presos em Araguari (MG) e esperaram oito anos na prisão para que a sua inocência fosse provada.

O caso de Marcos Mariano é ainda mais grave. Antes dos 13 anos, ele já havia ficado seis anos na prisão pela mesma acusação. O advogado de Marcos Mariano, José Afonso Bragança Borges, afirmou que, ao todo, foram 19 anos de prisão injusta. E chorou após a conclusão do julgamento pelo STJ.

Resp 802.435

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