O juiz e a acusação

Atuação do Supremo não agrada MP, revela pesquisa

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16 de outubro de 2006, 17h32

Promotores e procuradores de Justiça não gostam da atuação do Supremo Tribunal Federal. Essa é uma das conclusões do Diagnóstico do Ministério Público dos Estados, estudo conduzido pela cientista política Maria Tereza Sadek e entregue nesta segunda-feira (16/10) ao Conselho Nacional do Ministério Público.

Num universo de 3.260 membros do Ministério Público dos estados, mais de 50% afirmaram que estão descontentes com a atuação do STF, que qualificam como regular ou ruim.

A pesquisa é fruto de parceria entre o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais, a Secretaria da Reforma do Judiciário e a Conamp — Associação Nacional dos Membros do Ministério Público. O estudo, de mais de 150 páginas, cruza dados de todos os estados do país, mas não informa os motivos de a atuação do Supremo desagradar grande parte dos membros do MP.

Para a procuradora regional da República Janice Ascari, conselheira do CNMP presente na cerimônia de entrega da pesquisa, um dos motivos do resultado pode vir do fato de que o Supremo não estaria tratando o crime com o rigor que merece ser tratado.

Há cerca de seis meses, em sessão do Supremo, o ministro Gilmar Mendes trouxe a público dados que mostravam que de cada dez denúncias levadas ao STF, oito foram consideradas ineptas nos últimos cinco anos. Esse é um ponto de atrito freqüente entre juízes e o MP, e deve ter pesado na avaliação.

No mês passado, por exemplo, duas denúncias do Ministério Público Federal em casos de repercussão foram rejeitadas pelo Supremo Tribunal Federal por inépcia. Primeiro, a 2ª Turma do STF extinguiu ação penal contra o juiz federal Ali Mazloum, acusado de abuso de poder. “Algumas condutas podem até ser moralmente ou funcionalmente reprováveis, mas assumem o caráter de mera irregularidade administrativa e não se justifica a propositura de ações penais”, explicou o ministro Gilmar Mendes. Mazloum era acusado de ameaçar policiais rodoviários. A denúncia foi baseada apenas em um relatório produzido por um policial.

Depois, o Supremo rejeitou a denúncia contra o deputado federal Otávio Beckert (PL-PR), conhecido como Chico da Princesa. O parlamentar era acusado de corrupção eleitoral, previsto no artigo 299 do Código Eleitoral. Ele foi denunciado com base na acusação de uma das cinco testemunhas ouvidas, que não chegou a esclarecer como o fato ocorreu.

Perfil institucional

Para a comandante da pesquisa, professora Maria Sadek, a descrição demográfica e sociológica dos membros do MP é um dos destaques do trabalho. “Com esses dados, que foram posteriormente cruzados, chegamos a uma variação regional muito forte, o que nos mostra que não se pode pensar no MP de cada região como uma só entidade”, explica.

A professora dá alguns pequenos exemplos do que detectou na pesquisa que demorou quase um ano para ser concluída. No Nordeste, por exemplo, o trabalho detectou um equilíbrio entre homens e mulheres dentro da entidade. No Norte do país foi observada a maior deficiência em relação à infra-estrutura.

O estudo apresenta, ainda, um panorama geral sobre o MP, levando em conta dados sobre orçamento, quadro de servidores, percentual por gênero, além de uma análise comparativa do Ministério Público com o Judiciário e a Defensoria Pública dos estados.

Para a pesquisa foram enviados para os associados da Conamp 11.860 questionários, dos quais foram respondidos 3.260: ou seja, 27%. O produto final da pesquisa foi dividido em dois enfoques. Uma é a análise quantitativa dos dados institucionais do Ministério Público e a outra é a qualitativa.

Segundo o conselheiro do CNMP Ricardo Mandarino, a pesquisa trouxe alguns resultados que, para ele, podem encher a instituição de orgulho: a maioria dos membros do MP é contra o foro privilegiado, contra o nepotismo e contra a ocupação de cargos fora da instituição. Outro item que agradou ao conselheiro é desaprovação baixíssima com relação ao CNMP.

Dos promotores e procuradores ouvidos, 36% avaliam como bom o desempenho do Conselho. “Isso quer dizer que as deliberações do Conselho estão sendo legitimadas pelos próprios ‘controlados’, por força de seus próprios comportamentos éticos”, afirma o conselheiro. A pesquisa apresentada ao CNMP será lançada oficialmente nesta terça-feira (17/10), em cerimônia no Ministério da Justiça.

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