Não à poluição visual

São Paulo se libertará da apropriação indevida de espaço público

Autor

13 de outubro de 2006, 16h20

*Artigo publicado em O Estado de S. Paulo, na edição de 13/10/2006.

A sociedade paulistana está de parabéns pela aprovação da lei Cidade Limpa. Vamos enfrentar para valer o problema da poluição visual e acabar com o caos provocado pelo excesso de publicidade externa. É tempo de valorizar a arquitetura e a paisagem urbana da cidade.

Ressalto o espírito público da Câmara Municipal, que se revelou absolutamente sintonizada com o interesse público e com a opinião da imensa maioria da população. A votação quase unânime (45 votos a 1) mostrou um apoio ao projeto independentemente das divisões político-partidárias e mesmo da disputa eleitoral que ocorria enquanto o projeto tramitava. Os vereadores de São Paulo, em grande maioria, tiveram o desprendimento de votar a favor de São Paulo, apesar das pressões sofridas.

Agora, é hora de trabalhar. Temos um imenso desafio pela frente. Precisamos implementar a nova legislação e fazer cumpri-la. Em linhas gerais, o Cidade Limpa proíbe qualquer tipo de publicidade exterior e estabelece regras para anúncios indicativos, aquelas placas que identificam os pontos comerciais.

Assim, ficam proibidos outdoors, anúncios luminosos, back-lights, publicidades nas paredes laterais dos edifícios, totens e estruturas infláveis. Também vai acabar a propaganda em ônibus, táxis, trailers e carretas. São Paulo vai-se libertar de uma das formas mais claras de apropriação indevida do espaço público, a poluição visual que tomou conta do horizonte da cidade nas décadas mais recentes, a ponto de muitos paulistanos nem mesmo lembrarem que a cidade não era assim até pouco tempo atrás.

O prazo para a remoção dos anúncios é 31 de dezembro. Fica a advertência: não haverá recuo, as regras não serão atenuadas porque temos consciência de que a lei altera aspectos formais, mas principalmente impacta a cultura da cidade; qualquer abrandamento seria visto como autorização para que tudo ou quase tudo siga como está. Por isso, seremos implacáveis para cumprir e assegurar o cumprimento da nova legislação.

A Secretaria Municipal de Coordenação das Subprefeituras está incumbida de organizar as equipes que vão acompanhar a implantação da lei, atender os que têm dúvidas, esclarecendo-as, e combater o desrespeito. Antes mesmo do final do ano, parte da paisagem já vai dar sinais de limpeza. Anúncios colocados em áreas públicas serão retirados tão logo quanto possível, como forma de exemplo. As subprefeituras vão aumentar a ação contra as placas que estão claramente ilegais perante a legislação anterior. E as empresas responsáveis deverão iniciar os trabalhos de retirada de suas placas, adaptando-se às novas regras. Com tudo isso, antes mesmo de entrar em vigor a nova lei já fará sentir seus efeitos benéficos.

Nas semanas desde que anunciamos o projeto Cidade Limpa, muito se falou da falta de fiscalização para combater a publicidade que desobedecia à legislação anterior. A principal causa desse problema é que a lei continha defeitos genéticos que tornavam impossível o seu uso para reduzir a poluição visual. Um exemplo disso é que dois outdoors idênticos, lado a lado, podiam ser um legal e outro ilegal, dependendo da data de sua instalação. A lei tinha outros pontos confusos e dubiedades que causavam dúvidas até entre especialistas.

Com a nova lei aprovada pela Câmara e já sancionada pelo Executivo, a cidade entra num novo tempo. Em vez de comemorar, sinto que devemos arregaçar as mangas. Temos dois grandes desafios pela frente. Em primeiro lugar, fazer cumprir a lei, com o apoio vigilante de toda a população. Em seguida, quando a publicidade externa estiver eliminada, saltará aos olhos o excesso de fios e postes nas ruas e avenidas da cidade.

Essa poluição visual deverá ser nosso próximo alvo. Para enfrentar o problema o então prefeito José Serra promulgou lei oriunda da Câmara Municipal que estipula a obrigatoriedade de concessionárias, empresas estatais e prestadoras de serviços tornarem subterrâneos todo o cabeamento da rede elétrica, de televisões a cabo, os fios telefônicos e outras linhas transmissoras. No lugar dos postes, a cidade ganhará árvores.

Não vou provocar ilusões. Levar fios e cabos de um centro urbano com as dimensões de São Paulo para o subsolo requer tempo e, acima de tudo, muito investimento. Infelizmente, trata-se de mais um descaso do passado que nossa geração está condenada a corrigir, como ocorreu também com a poluição dos três rios em cujo encontro os jesuítas decidiram fundar o colégio que deu origem a São Paulo.

Mas a impotência não é uma característica de São Paulo: ao contrário, aqui tudo foi construído pela força e pela coragem de seus habitantes. Cabe a nós, então, enfrentar o problema, vencê-lo com o planejamento e com a persistência, já que não é possível fazê-lo de um só golpe.

Minha proposta é que as administrações municipais de São Paulo passem a incluir o enterramento de fios como parte integrante das ações de manutenção da cidade, abraçando todas as oportunidades que houver para avançar, como obras em ruas, reurbanização de áreas, reformas de calçadas, intervenções em ruas comerciais, etc. Um exemplo a ser seguido é o das Ruas Amauri, no Itaim Bibi, e Oscar Freire, nos Jardins, onde a comunidade, com apoio da Prefeitura, incluiu o enterramento dos fios ao realizar obras de embelezamento das ruas. A partir de agora, precisamos incluir o enterramento em todas as intervenções importantes que o Estado ou a comunidade realizarem em áreas da cidade.

Assim, com trabalho persistente e contínuo, começaremos a fazer com que, no futuro, possamos olhar para trás e ver que aos poucos a cidade deu uma resposta efetiva ao clamor dos moradores de São Paulo, que exigem do poder público medidas concretas e um combate sem tréguas a todas as formas de poluição. Nossa palavra de ordem é uma só: persistência.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!