De volta às ruas

Justiça do Paraná liberta Hélio Renato Laniado

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12 de outubro de 2006, 13h03

A Justiça do Paraná determinou a soltura do doleiro Hélio Renato Laniado na terça-feira (10/10). Os detalhes da libertação ainda não foram divulgados. Mas seu advogado, Roberto Podval, disse à revista Consultor Jurídico que “ele foi muito bem tratado”. O advogado afirma que Laniado não aceitou colaborar com o mecanismo da delação premiada. “Foi por isso que dentre os acusados ele foi o que mais tempo ficou preso". Procurado, o advogado não deu pormenores do estágio do processo. Admitiu apenas que a libertação se tornou possível com a volta de Laniado ao Brasil e que se cliente "agora, só pensa em descansar”.

Considerado foragido a partir de abril de 2005, Laniado foi preso no exterior, quatro meses depois, com o apoio de serviços policiais internacionais e monitoramento da Polícia Federal. Foram acionadas as representações da Interpol em Israel, Holanda, Portugal e também na República Tcheca. Laniado foi extraditado para o Brasil em agosto deste ano.

Ataque e defesa

Segundo o Ministério Público Federal, entre 1995 e 2002, Laniado — junto com Eliott Eskinazi, Renato Bento Maudonet Junior e D.L., também denunciados — movimentou dinheiro nas contas Watson, Braza, Best, Wipper, Taos e Durant, nos bancos Banestado de Nova York e Merchants Bank/NY. Em duas dessas contas, foram bloqueados pelos EUA mais de US$ 3,5 milhões. Ele utilizaria empresas em paraísos fiscais no Caribe e no Uruguai para a transação financeira — sistema semelhante ao que o publicitário Duda Mendonça confessou ter recorrido para receber dinheiro do PT.

O caso de Laniado é cercado de controvérsias. Ele alega que jamais operou como "doleiro", mas como consultor de investimentos no exterior, movimentando dinheiro já internacionalizado — ou seja, não operava a remessa de recursos para o exterior. Em seu primeiro depoimento, Hélio Laniado disse não saber se a origem desses recursos, ou de parte deles, fosse do Brasil. Mas repeliu a quantia astronômica deduzida pelos investigadores: mais de 1 bilhão de dólares. Segundo o depoente, os mesmos valores foram somados diversas vezes, fazendo com que a quantia real das transferências fosse multiplicada.

Em maio, a 1ª Turma do STF deferira Habeas Corpus para tornar sem efeito o decreto de prisão preventiva contra Eliott Maurice Eskinazi e D.L., também acusados no caso Banestado — embora, segundo os advogados, nem eles nem Laniado tiveram conta em Curitiba, o que os desvincularia do foro paranaense.

O caso da liminar para Laniado gerou uma sucessão de conflitos de decisões entre juízes paranaenses e ministros do Supremo — com ordens e contra-ordens de soltura. A decisão do ministro Pertence em 19 de dezembro, dava liberdade provisória a Eskinazi e estendia seus efeitos aos co-réus L. e Laniado. Mas não chegou a ser cumprida pela Justiça do Paraná. Ao julgar o mérito da questão, o ministro excluiu Hélio Laniado do benefício. A Turma cassou liminar deferida anteriormente ao empresário — com voto vencido do ministro Marco Aurélio, favorável à extensão do Habeas Corpus.

Delação a la carte

Laniado teria sido localizado com o monitoramento dos telefonemas trocados com sua então namorada, Mariana Weickert. Foi quando se soube que ele estava em Israel. As autoridades daquele país, no entanto, preferiram não prendê-lo para a deportação. Laniado é judeu de origem egípcia. Esperou-se então que ele embarcasse para a Europa. Na escala em Praga, ele foi retirado do avião e iniciado seu longo e penoso suplício. Durante todo esse período, no Brasil, quem se movimentou para tentar libertá-lo foi seu irmão, o publicitário Cláudio Laniado.

A prisão preventiva foi um pedido da força-tarefa CC5 do MPF, na "Operação Zero Absoluto". Temia-se que ele fizesse a chamada delação premiada a la carte. Efeito residual do Caso Banestado e da Operação Farol da Colina, o estado do Paraná tem sido acossado por ofertas de delação premiada, feitas a doleiros, que, em determinadas condições de temperatura e pressão, esforçam-se para oferecer o maior volume de informações, nem sempre confirmadas, para obter benefícios.

A alguns acusados, sobretudo de crimes financeiros, tem sido ofertado o que alguns advogados apelidaram de "delação premiada a la carte". Essa modalidade de delação, em voga não só no Paraná, mas em todo o Brasil, à disposição de advogados, policiais e membros do Ministério Público, consistiria em ofertar ao acusado um cardápio de pessoas a serem denunciadas em troca de redução de pena do acusado.

A lei 8.072 de 1990 é uma das várias leis que prevêem o dispositivo da delação premiada. Em seu artigo 8º, parágrafo único, prevê que “o participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando o seu desmantelamento, terá pena reduzida de um a dois terços”.

A revista Consultor Jurídico entrevistou cinco advogados que têm clientes acusados de crimes contra o sistema financeiro, a quem teria sido ofertada a delação premiada a la carte. Desse rol de profissionais do Direito, apenas um concordou em conceder entrevista formal: o criminalista Elias Mattar, de Curitiba.

“Devo dizer que a democracia está agora sob suspeita, porque todos os princípios que constituem os institutos do Estado democrático estão sendo contestados. A delação premiada tem tomado caminhos de injustiça sonora e gritante”, diz Elias Mattar.

O criminalista concordou em revelar um caso em que viu de perto como se operam as maquinações que conduzem à delação premiada a la carte, desde que o nome de seu cliente fosse mantido em sigilo.

“Meu cliente, inocentado e reconduzido ao cargo que tinha na Receita Federal, era acusado de um caso que envolvia exportação fraudulenta. Na Polícia Federal, na cela, ele era procurado, sobretudo por agentes e delegados, que o pressionavam psicologicamente, perguntando: ‘Diga quem está por trás de tudo, diga!!!!!’ Ele não tinha a quem delatar, mas o pressionaram tanto que escrevi ao ministro da Justiça. Até que um dia meu cliente me disse na cela: ‘Diga para eles pararem de me pressionar porque não tenho a quem delatar, mas se eles continuarem, podem trazer uma lista de nomes que assino embaixo, porque não agüento mais essa tortura na cela da PF’.”

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