Briga da notícia

Justiça recebe queixa-crime de jornalista contra Veja

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11 de outubro de 2006, 21h02

O juiz da 1ª. Vara Criminal de São Paulo recebeu, nesta quarta-feira (11/10), queixa-crime oferecida pelo jornalista Leonardo Attuch, da revista IstoÉ Dinheiro, contra a revista Veja.

A ação é movida contra Roberto Civita e Mauro Calliari, respectivamente dono e principal executivo da Editora Abril, que publica a revista, bem como contra os jornalistas Eurípedes Alcântara e Mário Sabino, respectivamente diretor de redação e redator-chefe de Veja. Pede que os quatros sejam enquadrados nos crimes de calúnia, injúria e difamação, conforme previsto 20, 21 e 22 da Lei 5.250/67 (Lei de Imprensa).

Atendendo a alegações prévias da defesa da revista, o juiz excluiu da ação tanto Civita como Calliari, por considerá-los partes ilegítimas do processo. A defesa da Veja está aos cuidados dos advogados Alexandre Fidalgo e Lourival J. Santos do escritório Lourival J. Santos Advogados.

Leonardo Attuch, que é representado pelo advogado Luiz Riccetto Netto, do Riccetto Advogados Associados, contesta sucessivas reportagens e notas em em que a revista Veja o citou como alvo de uma operação da Polícia Federal, intitulada Gutemberg. Supostamente preparada para apurar atividades ilícitas de jornalistas, a operação, na verdade, se resumiu a postulados teóricos da Polícia Federal.

O jornalista contesta também a informação repassada por Veja em reportagens de que ele manteria relações profissionais impróprias com o banqueiro Daniel Dantas, do Banco Opportunity.

À época Dantas foi pivô do escândalo em torno da contratação da Kroll Associates, a maior empresa de investigação privada do mundo, para espionar a Telecom Itália, com quem o Opportunity disputava o controle da Brasil Telecom. As investigações da Kroll acabaram esbarrando em figuras do primeiro escalão do governo federal e Dantas foi acusado de estar espionando o governo.

Leia a petição:

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara Criminal

do Fórum Regional XI – Pinheiros – Capital – Estado de São Paulo

Leonardo de Rezende Attuch (822-1) brasileiro, casado, jornalista, portador do R.G. nº xxx emitido pela SSP/DF, cadastrado no Ministério da Fazenda sob C.P.F. nº xxx, residente e domiciliado no município de Cotia, Estado de São Paulo, à Rua xxx, no bairro de xxx, por seu advogado e bastante procurador que esta também subscrevem (doc. 1), vem à presença de Vossa Excelência, a fim de apresentar

queixa crime

em face de Roberto Civita, brasileiro, de estado civil ignorado, jornalista, portador do R.G. nº xxx emitido pela SSP/SP, de Mauro Calliari, brasileiro, de estado civil ignorado, jornalista, de Eurípides Alcântara, brasileiro, de estado civil ignorado, jornalista e de Mário Sabino, brasileiro, de estado civil ignorado, jornalista, todos domiciliados na Capital do Estado de São Paulo, à Avenida das Nações Unidas no 7221, no bairro de Pinheiros, CEP 05425-902 Tel. 55 11 3037-2000, “ex vi” do que dispõe o artigo 5º, incisos V e X da Constituição da República Federativa do Brasil, combinado com os artigos 12, 13, 20, 21, 22, 40 inciso I letra “c” e § 2º, 41 § 1º, 42 e seguintes da Lei Federal nº 5.250/67 (Lei de Imprensa) e com o artigo 41 do Código de Processo Penal, em razão dos motivos fáticos e jurídicos fundamentos, a seguir, articulados.

1. COMPETÊNCIA

Local dos Fatos

O lugar do delito, para a determinação da competência territorial definida pelo artigo 42 da Lei Federal nº 5.250/67, declina o local da administração principal da agência noticiosa, situada na Capital do Estado de São Paulo, à Avenida Nações Unidas nº 7.221, no bairro de Pinheiros, estando o referido local inserido na comarca desse conceituado Fórum Regional.


2. PUBLICAÇÃO

Veiculação dos Fatos

II –

O querelante tivera ciência dos falsos fatos ofensivos em 22 de fevereiro de 2006, data em que foram publicados e veiculados na edição no 1944, ano 39, nº 7 da REVISTA VEJA.

3. PARTES

O Querelante

III –

O querelante, nascido em 12 de maio de 1971, começara a trabalhar aos 14 anos de idade, no Banco do Brasil S/A., como office-boy e, já aos 19 anos, fora transferido para a área internacional da aludida instituição financeira e, pouco tempo depois, fora nomeado ASSESSOR, em cargo comissionado, na divisão de recuperação de créditos internacionais, tornando-se um dos mais precoces assessores desse renomado Banco.

IV

No ano de 1993, o querelante graduara-se em JORNALISMO pela Universidade de Brasília e, logo depois, fora selecionado para o programa de jovens talentos do jornal O Estado de S. Paulo e, após cursá-lo, recebera um convite para trabalhar no Correio Braziliense, principal jornal da Capital Federal, trocando o salário que recebia no Banco do Brasil S/A. por outro que representava um terço do que percebia, em nome da vocação jornalística e de seu sonho profissional.

V –

Seis meses depois, graças ao trabalho no Correio Braziliense, o querelante fora convidado para trabalhar na sucursal da REVISTA VEJA, da Editora Abril, em Brasília, no ano de 1994, transferira-se para São Paulo, ainda na Editora Abril, para atuar como repórter da REVISTA EXAME, onde se tornara profissional de destaque, chegando a vencer o Prêmio Abril de Jornalismo e, no ano de 1995, recebera diretamente de Roberto Civita, aqui querelado e dono da editora, correspondência enviada com cópia para José Roberto Guzzo, à época diretor de redação da Revista Exame, nos seguintes termos, “in verbis”:

Gostei muito do seu paper […] E vou aproveitar alguns pontos num discurso em Londres na próxima semana. Parabéns pela clareza e serenidade do seu resumo. E obrigado pela ajuda! Um grande abraço, Roberto Civita.

VI –

Na REVISTA EXAME, o querelante fora autor de várias matérias de destaque e, no ano de 1997, fora laureado com um dos mais importantes prêmios da imprensa brasileira, o Prêmio Citibank de Excelência em Jornalismo, recebendo como recompensa, uma bolsa para cursar programa de aperfeiçoamento na Universidade de Columbia, em Nova York.

VII –

Logo depois, ainda no início de 1997, aos 25 anos, o querelante fora convidado para editar a seção de economia do JORNAL ESTADO DE MINAS, em Belo Horizonte, tendo se transferido para a Capital mineira, onde fora um dos responsáveis pela modernização desse respeitável jornal.

VIII –

No ano de 1998, além de editar as notícias econômicas do Jornal, o querelante tornara-se editor de uma nova revista, chamada ECONOMIA, sobre negócios em Minas Gerais e, no ano de 1999, com a explosão da rede mundial de computadores, tornara-se também o editor de uma publicação chamada Internet Negócios.


IX –

No ano 2000, o querelante regressara a São Paulo, após receber convite para ser editor de economia da REVISTA ISTOÉ DINHEIRO, torna-se então responsável por várias reportagens de destaque da publicação, sendo finalista dos Prêmios Esso e Embratel de Jornalismo, em algumas ocasiões.

X –

No ano 2004, o querelante passara a acumular a função de editor de economia da IstoÉ Dinheiro com a edição de uma nova revista, a DINHEIRO RURAL, que vem tendo grande repercussão no meio ligado ao agronegócio.

XI

E durante sua carreira, o querelante já publicara três livros.

XII –

É essa a sua CARREIRA, marcada pela vocação, pelo trabalho, pela seriedade, pela dedicação e pelo empenho em informar a verdade.

Os Querelados

XIII –

O querelado Roberto Civita, é responsável pela publicação da REVISTA VEJA no exercício da função de editor.

XIV –

O querelado Mauro Calliari é responsável pela publicação da REVISTA VEJA no exercício da função de diretor-geral.

XV –

O querelado Eurípedes Alcântara é responsável pela publicação da REVISTA VEJA no exercício da função de diretor de redação.

XVI –

O querelado Mário Sabino é responsável pela publicação da REVISTA VEJA no exercício da função de redator-chefe.

4. SINOPSE FÁTICA

Fatos Antecedentes

XVII –

O querelante, enquanto jornalista e editor da revista IstoÉ Dinheiro, fora responsável por uma série de reportagens sobre o notório e ruidoso “CASO BRASIL TELECOM”, que também envolvera as empresas KROLL, Opportunity e Telecom Itália.

VIII –

Ao contrário da maior parte da imprensa, o querelante, seguidor de seus deveres deontológicos e comprometido com a missão de bem informar, fora o único profissional que se preocupara em “ouvir o outro lado”, tendo, para tanto, se valido de fontes qualificadas, ocupantes dos mais elevados cargos nas empresas envolvidas no episódio.

XIX –

Dentre outros, entrevistara (´on the records`), Jules Kroll, o fundador da agência KROLL e dois executivos ligados a PREVI – Fundo de Previdência do Banco do Brasil S/A., que informaram que a Brasil Telecom fora coagida pelo Governo Federal e pela Telecom Itália a superfaturar a compra de uma outra operadora de telefonia em US$ 250.000.000,00 (duzentos e cinqüenta milhões de dólares americanos), reportagem esta que, aliás, fora finalista de um dos mais importantes prêmios de jornalismo do País, além de ter feito publicar, com exclusividade, matéria intitulada “O Diário Secreto da Parmalat”, na qual Stefano Tanzi, filho do fundador da empresa, narrara sua angústia com a crise da multinacional do leite e seus planos para ingressar na telefonia brasileira.


XX –

Algumas de suas matérias jornalísticas apontaram contradições e equívocos na apuração que vinha sendo levada a efeito pelo DEPARTAMENTO DE POLÍCIA FEDERAL sobre o caso[1], fato, aliás, que já havia chamado a atenção do Deputado Federal Paulo Delgado (PT-MG) que, sobre a questão, assim se pronunciara, “in verbis”:

A Polícia Federal não está agindo na defesa do Estado; ela interroga, indicia e atormenta a vida do Opportunity, visivelmente favorecendo um dos lados. (destaques adicionados)

XXI –

Essa prática do bom jornalismo, que não atende interesses outros que não o de bem informar, bastara para que o querelante se visse como alvo de uma dessas arbitrárias “ações secretas” da Polícia Federal (tão em moda nos últimos e sombrios tempos), consubstanciada no “monitoramento” de suas atividades jornalísticas, mais especificamente no que se refere às matérias ligadas à concessão da telefonia no Brasil e sobre atos supostamente irregulares, praticados por integrantes do mais alto escalão do Governo Federal.

XXII –

É o ESTADO POLICIAL tentando controlar e intimidar a imprensa livre.

XXIII –

Essas subterrâneas indagações policiais, teriam levado o significativo e bizarro nome de “Operação Gutemberg” (porque visaria à prisão de jornalistas críticos de ações de membros do Governo), o que, aliás, já mostra, por si só, do que se está a falar … Sinal dos tempos !

XXIV –

Órgãos de imprensa mais dóceis e vinculados ao escalão oficial publicaram muitas notas dando conta da existência dessa tal e esdrúxula operação (que vulneraria a constitucionalmente assegurada liberdade de imprensa), chegando, inclusive a apontar o nome do querelante como um dos investigados-monitorados-devassados pela ação policial secreta, que buscava a chancela formalmente legitimadora do Poder Judiciário Federal em primeiro grau.

XXV –

Como a tais notas soem suceder invasões domésticas ao alvorecer, realizando buscas e apreensões espalhafatosas, com cerimonial degradante de prisões temporárias (tão estrepitosas quão desnecessárias) com algemas etc., tudo autorizado por setores arbitrários e burocráticos da Justiça Federal de primeiro grau, que fizeram o querelante precaver-se procurando conhecer, por seus advogados, o que se tramava à sorrelfa pelos beleguins dessa “Stasi” tapuia como, aliás, é direito seu, assegurado na CHARTA MAGNA e até instrumentalmente tutelado por “habeas data”.

XXVI –

Lograra o querelante localizar perante a 5a Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de São Paulo, representação subscrita pelo Delegado de Polícia Federal Élzio Vicente da Silva, na qual se pleiteava fosse excepcionado seu sigilo telefônico para que fosse possível vigiar o jornalismo que praticava e que desagradava ao Governo .

XXVII –

Lê-se daquela peça o seguinte,[2]in verbis”:

Durante análise dos meios de prova obtidos nesta investigação, identificou-se uma nova vertente da atuação da criminalidade organizada contempo-rânea: a utilização dos meios de comunicação em proveito da quadrilha. Percebe-se o interesse, por parte das organizações criminosas detentoras de poder econômico, de ter a mídia ao seu lado. Notícias veiculadas pelos meios de comunicação são formadoras da opinião pública, não sendo por outro motivo que a mídia, hoje, é tida como o “quarto poder”. A organização criminosa tratada no IPL no 12-004/04-PCD no 2004.61.81001452, com o objetivo de informar e contra-informar, lançou mão de contatos que possuía com profissionais dos meios de comunicação, usando a difusão de notícias no interesse – e em proveito – de seus integrantes. Da mesma forma que se dá a ingerência no poder do Estado, também a ORCRIM agia em sua relação com os meios de comunicação, mais especificamente a imprensa. De um lado, a imprensa é utilizada para divulgar matérias contendo dados investigados pela ORCRIM, realizando o que se acordou chamar de “lavar a fonte”, ou seja, os “investigadores” repassam os dados ao profissional da imprensa, que utiliza o material para elaborar uma matéria. Em seguida, essa matéria jornalística é usada como um fato pelos próprios fornecedores dos dados, os quais não precisam divulgar as fontes. A outra forma de atuação se dá com a publicação tendenciosa de matérias sobre pessoas, instituições ou fatos que tenham algum interesse para a organização criminosa. Os integrantes da ORCRIM passam, então, a deter o poder da informação e logicamente da desinformação assumida sempre trabalhando a favor dos interesses da quadrilha. Durante diálogo entre TIAGO VERDIAL[3] e ANGELO JANNONE[4], gravado pelo último, VERDIAL atesta estar alimentando suas fontes na imprensa: “VERDIAL – Eu era responsável por toda investigação desde o início quando apareceu pela primeira vez na imprensa. E depois disso … AJ – Você alguma vez contatou com algum jornalista nesse caso ? V – Hum hum. NHI – Certo, mas era amigo de bar ou tinha um bom relacionamento ? V – Um bom relacionamento. Só dando a história para eles”. A Editora três, responsável pela revista ISTOÉ Dinheiro, supostamente vinculada ao grupo DANIEL DANTAS[5], teria sido utilizada para lançar matérias convergentes com o interesse do grupo criminoso. No diálogo travado entre ANNE MARIE e seu filho, TIAGO VERDIAL, uma matéria publicada na revista ISTOÉ Dinheiro teria sido elaborada pela quadrilha: TIAGO – Eu já tinha feito todos os links de TOKIO com CUMBERLAND, só que eu não tava mergulhado exatamente em CUMBERLAND, eu tava cuidando muito dos links, eles já sabem que a CUMBERLAND era acionista oculta do TOKIO… MÃE: ah é ? TIAGO: É, isso saiu na ISTOÉ Dinheiro dessa semana, matéria todinha feita pela gente, não sei o que, e saiu na capa da IstoÉ Dinheiro, não sei se você viu “Diário Secreto de Stefano Otanzi ?” que era filho do (… incompreensível). MÃE: é, em que jornal ? TIAGO: não, saiu na capa da IstoÉ Dinheiro. MÃE: ah, não, não. Como é que é o título ? TIAGO: “O Diário Secreto de Stefano Otanzi”. Sem entrar no mérito da veracidade dos dados ali contidos, nota-se que a citada matéria, mencionada na aparente bravata de TIAGO VERDIAL, converge com os interesses da ORCRIM.


XXVIII –

Entre outras, foram divulgadas pela mesma revista, as seguintes matérias intituladas de:

DIÁRIO SECRETO DA PARMALAT;

SUMIRAM US$ 250 MILHÕES;

O ATAQUE A DANTAS

O GIGANTE NACIONAL

XXIX –

Da mesma maneira, coincidência ou não, logo após a prisão de TIAGO VERDIAL, a revista ISTOÉ Dinheiro, em reportagem noticiada na capa, divulgara outra matéria e uma entrevista realizada com JULES KROLL, criador da agência KROLL, o qual dá sua versão sobre os fatos:

O SR. KROLL DÁ SUA VERSÃO

As intrigantes contradições do caso KROLL

Observa-se que o autor de todas as citadas matérias é LEONARDO ATTUCH, jornalista da revista ISTOÉ Dinheiro, vinculado à Editora Três. Fontes da imprensa vinculam o jornalista LEONARDO ATTUCH a KROLL ASSOCIATES BRASIL (notícia anônima indica que atuaria sob pseudônimo SILVIO BERLUSCONE) e a DANIEL DANTAS, que, através, de suas matérias, “limparia” possível atuação ilícita verificada no relatório Parcial de Inteligência encaminhado a Vossa Excelência. Há, desse modo, indício de que LEONARDO ATTUCH favorecia a quadrilha investigada no procedimento criminal supracitado, elaborando matérias que vão ao encontro dos interesses da ORCRIM.

XXX –

Jornalismo isento, agora, pasme, passara a ser ´nova vertente da atuação da criminalidade organizada contemporânea` ! É o fim do mundo ! Onde estamos ? Seria o Estado democrático de direito mera ficção ? E a constitucional liberdade de imprensa ? Teria sido inserida pelo legislador, no texto Magno, por mera sofisticação retórica ? É inconcebível que o Governo Federal, quando tenha seus interesses contrariados ou questionados, lance mão de expedientes intimidadores e arbitrários, próprios dos regimes de força. Afinal, vivemos, de fato, uma democracia, ou um despotismo disfarçado de república sindicalista democrática ?

XXXI –

Bem cabem aqui as palavras do escritor e jurista francês EDOUARD RENÉE LÉFÉBVRE DE LABOULAYE, para quem, desde que haja juizes capazes de fazer respeitar a Constituição e as leis, o governo pode até ser absoluto, mas ao menos não será um governo déspota[6].

XXXII –

E fora precisamente o que se verificara no caso: o Poder Judiciário INDEFERIRA o pleito de quebra do sigilo telefônico do querelante. Eis o teor desse irrepreensível “decisum”:

“Trata-se de pedido de interceptação telefônica e concessão de senhas de acesso aos dados cadastrais e histórico de chamadas efetuadas e recebidas. O Ministério Público Federal, instado a manifestar-se, opinou pelo deferimento da medida. Decido. As condutas mencionadas pela Autoridade Policial como suficientes para autorizar a interceptação não se revelam típicas. Matérias jornalísticas "investigativas" são realizadas com a utilização das mais diversas fontes de informações. Ainda que tais fontes transmitam dados inverídicos com o intento de "criar" fatos e o jornalista não investigue com cautela tais informações, poder-se-ia cogitar de responsabilização no campo da ética profissional ou mesmo na esfera cível, por meio de pleitos de caráter indenizatório, contudo, não se vislumbra crime. O caráter fragmentário do direito penal deve ser observado, na medida em que apenas condutas que afetem de maneira mais gravosa bens jurídicos protegidos pelo ordenamento devem ser criminalizadas. Revela-se um tanto exagerada a afirmação de que a utilização de reportagens constitui forma de participação na organização criminosa, mormente considerando que os crimes em tese praticados pela quadrilha dizem respeito a obtenção de dados sigilosos em investigações por meio de entidades que não possuem atribuição constitucional para tanto. Ora, em nenhum momento foram levantados indícios de que o alvo da interceptação pleiteada tenha participado, de alguma forma, da obtenção de tais dados, o que afasta sua possível participação em organização formada com a finalidade supra mencionada. Isto posto, indefiro o pedido formulado. Cientifique-se a Autoridade Policial e o Ministério Público Federal. São Paulo, 26 de outubro de 2004 – LUIZ RENATO PACHECO CHAVES DE OLIVEIRA – Juiz Federal Substituto” (destaques adicionados)


XXXIII

Como se vê, o pleito que visava a suprimir garantia fundamental, assegurada ao querelante pela Constituição Federal, fora INDEFERIDO, repita-se ainda uma vez, pelo MM. Juízo da 5a Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de São Paulo, que não vislumbrara tipicidade penal nos fatos, e deixou expressamente consignado que “… revela-se um tanto exagerada a afirmação de que a utilização de reportagens constituiu forma de participação na organização criminosa …”, e mais, que “… em nenhum momento foram levantados indícios de que o alvo da interceptação tenha participado, de alguma forma, da obtenção de tais dados, o que afasta sua possível participação em organização formada com a finalidade supra mencionada …”. Decisão digna dos grandes, e cada vez mais raros, juizes comprometidos com os direitos fundamentais dos cidadãos, assegurados na Ordem Constitucional.

XXXIV –

Os fatos acima relatados, nada obstante tenham se verificado em autos que tramitavam sob o pálio do segredo de justiça, tiveram estreito acompanhamento pelos querelados e pela Revista Veja, tanto assim que há perfeita sintonia cronológica entre o quanto se passava em âmbito policial/judicial e as notas que se faziam publicar na seção Radar do aludido semanário.

XXXV –

De fato, em setembro de 2004, publicara-se nota sob o título “VEM AÍ A OPERAÇÃO GUTENBERG”, em que mencionava que a polícia federal iria investigar profissionais de imprensa envolvidos em “venda ou engavetamento” de reportagens. Relevante sublinhar que esse texto continha a expressão “isto é”, não recomendada nas revistas da Editora Abril, por óbvias razões concorrenciais.

XXXVI –

Curiosamente, dias depois, a polícia federal representava o querelante pela quebra do sigilo telefônico …

XXXVII –

Depois daquela primeira nota, muitos rumores surgiram na imprensa. Alguns colunistas divulgavam a informação de que cem (100) jornalistas, ou mais, estariam sendo investigados pela polícia federal, já que considerados hostis ao Governo (e que vinha de uma tentativa de expulsão, do território nacional, de um jornalista americano …).

XXXVIII –

Em outubro daquele ano, o querelante voltara ao tema: em nova nota, intitulada “Subproduto da Kroll”, afirmara que a tal “OPERAÇÃO GUTENBERG” investigava apenas quatro jornalistas e mencionava que seu foco era o caso Kroll. Nesta, como naquela outra nota, utilizara-se da expressão “isto é” por duas vezes.


XXXIX –

Os boatos na imprensa voltaram-se, então, contra a pessoa do querelante, que recebera chamadas telefônicas de amigos, que diziam ter informações da polícia federal, advertindo que ocorreriam até diligências de busca e apreensão em sua residência. Desnecessário mencionar a angústia e os abalos psicológicos sofridos pelo querelante e por seus familiares. Mesmo porque a última “Operação Gutenberg” de que se tem notícia num Brasil de triste memória fora aquela que tentara ocultar a realidade do assassinato de VLADIMIR HERZOG.

XL –

Em novembro de 2004, a revista Veja retomara o tema através da nota “MURCHOU”. Nela, noticiava-se que a tal operação policial havia “subido no telhado”. Note-se que a decisão judicial que indeferira a quebra do sigilo telefônico do querelante data de 26 de outubro daquele ano …

XLI –

Tudo está a demonstrar que os responsáveis pela publicação da revista Veja sempre tiveram pleno e total conhecimento de tudo quanto se passava nos bastidores cavernosos da repressão ao livre direito de informar, inclusive do despacho denegatório da pretensão policial, eis que as notas, repita-se, guardam PERFEITA SINCRONIA TEMPORAL com a investigação …

Mas não fora só isso !

XLII –

No início do ano de 2005, Márcio Aith, editor-executivo da revista Veja, mencionara expressamente o nome do querelante em reportagem chamada “O Dia da Caça”. Na matéria, citara um e-mail de cuja autoria fora atribuída ao querelante e, no mesmo texto, assegurara que a própria polícia federal teria sua autoria como incerta.

XLIII –

Tudo culminara com a reportagem veiculada na edição no 1905 (ano 38 – no 20), de 18/5/2005, da revista Veja, intitulada “A USINA DE ESPIONAGEM DA KROLL”, em que no subtítulo “Reportagens Sob Suspeita”, fizeram-se as seguintes alusões à pessoa do querelante:

O relatório da Polícia Federal, obtido por VEJA, descreve como a Kroll teria feito uso da imprensa para conseguir a publicação de reportagens de seu interesse e de pelo menos um de seus clientes – a Brasil Telecom, de Daniel Dantas. Por meio de escuta autorizada judicialmente, a PF flagrou o espião português Tiago Verdial, que prestava serviços para a Kroll, vangloriando-se de ter conseguido publicar, na revista Istoé Dinheiro, da Editora Três, uma matéria favorável à empresa de investigação. Em diálogo travado com a mãe, Anne Marie, Verdial diz ter sido “responsável” pela produção de uma matéria de capa na mesma revista sobre a falência da companhia italiana Parmalat. Intitulada “O Diário Secreto da Parmalat”, a reportagem, publicada em maio do ano passado, descreve as ligações da empresa de laticínios com a Telecom Itália, adversária de Dantas no setor de telefonia. “Matéria todinha feita pela gente. Saiu na capa da Istoé Dinheiro”, diz Verdial. O relatório da Polícia Federal lista ainda outras três reportagens publicadas pela Istoé Dinheiro, sempre com um tom favorável a Dantas e à Kroll, de acordo com a PF. Diz um dos trechos do documento: “Da mesma maneira, coincidência ou não, logo após a prisão de Tiago Verdial, IstoÉ Dinheiro em reportagem noticiada na capa, divulgou outra matéria e uma entrevista realizada com Jules Kroll, criador da agência Kroll, o qual dá sua versão sobre os fatos, apontando contradições no então chamado caso Kroll”, descreve o relatório. A Polícia Federal também chama atenção para o fato de que “o autor de todas as citadas matérias, dentre outras com mesmo direcionamento, é Leonardo Attuch, jornalista da IstoÉ Dinheiro”. E completa: “Há indícios de que Leonardo Attuch favorecia a quadrilha investigada no procedimento criminal, elaborando matérias que vão ao encontro dos interesses da organização criminosa”. Attuch afirma que nenhuma de suas reportagens foi contestada por quaisquer das partes envolvidas e que um pedido de quebra de sigilo telefônico, feito pela PF à Justiça, foi negado sob a justificativa de que não existiam indícios de crime contra ele.


XLIV –

Tal matéria, ponto culminante do longo processo de intimidação e constrangimento a que vinha sendo submetido o querelante, segundo as palavras de Eduardo Ribeiro, editor de “Jornalistas & Companhia”[7], representara um “soco certeiro” (sic) na sua imagem. De fato, nela, o nome do querelante vem grafado por cinco vezes, algumas em negrito, e de seu teor o que se dessume é que fora acusado de favorecer, com reportagens, uma quadrilha[8].

XLV

Ponha-se em destaque, por relevante, que depois dessa publicação os jornalistas da revista Veja foram convidados pelo querelante a debater publicamente sobre as acusações que direcionaram contra sua pessoa em importantes fóruns da comunidade jornalística: o website “OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA” e o website “COMUNIQUE-SE”. A despeito do convite aberto, negaram-se aqueles ao democrático e público confronto dialético.

XLVI –

Em razão dessa matéria, o querelante ajuizara o competente pedido de direito de resposta em face dos responsáveis pela publicação da revista Veja e, para sua surpresa, todavia, na sua edição da indigitada revista de 15 de junho de 2005, a seção Radar daquele Semanário, publicara a seguinte nota, “in verbis”:

Debate Público

De “ATT para Mr. DD”: “Está confirmada a entrega da encomenda desse final de semana”. Esta frase faz parte de uma série de e-mails em mãos da Polícia Federal com diálogos muito interessantes. É um prato feito.

XLVII –

Diante do contexto dos fatos acima relatados, e considerando que a nota vinha encimada pelo título “Debate Público” (uma clara referência ao convite ao debate feito pelo querelante a seus colegas de Veja), e tendo em vista que nela se insinua que o e-mail citado teria sido enviado pelo querelante (ATT) a Daniel Dantas (DD) e remete a uma possível “venda de reportagem” (´está confirmada a entrega da encomenda deste fim de semana`), e, considerando, ainda, que o querelante jamais enviara mensagem de qualquer natureza à pessoa de Daniel Dantas, aforara pedido de explicações contra o jornalista responsável pela Seção Radar de Veja, que fora autuada sob no 004.05.017908-3, controle no 1473/05, autuada na 1a Vara Criminal desse Foro Regional de Pinheiros.

XLVIII –

O interpelado, jornalista responsável pela Seção Radar de Veja, negara-se a responder ao quanto lhe fora indagado mas, dada a exigüidade do prazo decadencial para o aforamento de ação penal privada em crimes cometidos através da imprensa, deixara o querelante de ajuizar queixa-crime contra o responsável pela seção “Radar” da Veja porquanto exaurido aquele lapso temporal.

XLIX –

Concomitantemente, então, o querelante vira-se obrigado a escrever artigo sobre os fatos, em sua própria defesa, e para que a verdade fosse restabelecida. Eis o seu teor que, aliás, é auto-explicativo:

Um ataque à liberdade

Polícia Federal do governo Lula abre precedente perigoso: quando um jornalista incomoda, pede-se sua quebra de sigilo.

Leonardo Attuch*

Dias atrás, fui surpreendido ao ser citado, com destaque, na revista Veja. Meu nome apareceu numa reportagem sobre o caso Kroll, aquele da suposta espionagem contratada pela Brasil Telecom contra a Telecom Itália e que teria respingado em membros do governo federal. Num dos trechos, com o subtítulo "reportagens sob suspeita", Veja afirma que a Polícia Federal teria descoberto que a Kroll faria uso da imprensa para publicar reportagens de seu interesse e de um de seus clientes: a Brasil Telecom, sob o controle do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity. Mais ainda: reproduzindo trechos de um relatório da Polícia Federal, que é parte de um processo que corre em segredo de justiça, Veja empresta suas páginas para acusações ainda mais graves. Uma delas: "Há, desse modo, indícios de que Leonardo Attuch favoreceria a quadrilha no procedimento criminal supracitado". A suposta quadrilha, a qual se refere a Polícia Federal, seria formada pelas empresas Opportunity e Kroll. Cabe a mim, portanto, não apenas rebater as acusações, como também trazer à tona fatos novos para a devida compreensão do assunto – e que foram omitidos pela revista Veja. Os ataques oficiais contra minha honra, contra a revista DINHEIRO e contra a Editora Três, agora públicos, já haviam sido feitos pela Polícia Federal, no dia 27 de setembro de 2004, quando foi pedida a quebra do meu sigilo telefônico ao juiz Luiz Renato Pacheco Chaves de Oliveira, da 5a Vara Criminal de São Paulo. Para tanto, a Polícia Federal listou reportagens que, segundo as autoridades policiais, "favoreceriam a quadrilha". Além disso, pediu que a investigação se desse sob SEGREDO DE JUSTIÇA (grifo da própria PF). Eis o argumento dos policiais: "Que a cautela dos autos do procedimento que se inicia fique com esta autoridade policial, a fim de que se mantenha o necessário sigilo da operação, resguardando as provas produzidas e protegendo os policiais federais envolvidos nas operações de Inteligência." Após receber tal pedido, eis o que responde o juiz Luiz Renato Pacheco: "Está-se diante de possível mitigação de direitos fundamentais; e, assim sendo, para que fosse possível invadir esta seara, seria necessário existir sólidos indícios de práticas criminosas, o que não restou patente no caso em tela". Portanto, a decisão foi clara. O juiz entendeu que não existem indícios de crimes. Ainda assim, atropelando a Justiça, a Polícia Federal listou as mesmas acusações contra mim, contra a revista DINHEIRO e contra a Editora Três em seu relatório final sobre o caso Kroll – e o documento, pasmem, foi vazado para a revista Veja! Ou seja: existe sigilo na hora de investigar, mas não existe sigilo na hora de se achincalhar a honra de um profissional sério, de uma publicação líder no mercado de economia e negócios e ainda de uma editora de revistas verdadeiramente independente – à revelia da decisão judicial. Por que tanta violência ? Por que tanto arbítrio ? É possível que as reportagens da revista DINHEIRO, citadas pela Polícia Federal em seu pedido de quebra de sigilo, tenham incomodado muita gente. Será esse o motivo da violência oficial ? Eis uma das reportagens: uma simples entrevista ping-pong, pergunta e resposta, com Jules Kroll, o fundador da agência Kroll. Entrevistá-lo on the records, passou a ser, segundo os policiais, indício de crime. Outra reportagem: uma denúncia também on the records, formulada por dois executivos que foram ligados à Previ, o fundo de pensão do Banco do Brasil, apontando que a Brasil Telecom havia sido forçada pelo governo federal e pela Telecom Itália a superfaturar em US$ 250 milhões a compra de outra operadora telefônica – tal reportagem, diga-se, foi finalista de um dos mais importantes prêmios de jornalismo do País. Um terceiro artigo citado pela PF: a revista DINHEIRO revelou, com exclusividade, o diário secreto da Parmalat, em que Stefano Tanzi, filho do fundador da empresa, narra sua angústia com a crise financeira da multinacional do leite. Aqui, há um caso curioso. Os policiais citam, como indício de crime, uma conversa do português Tiago Verdial, suposto espião da Kroll e um sujeito que jamais vi, com sua mãe, dizendo ser "responsável" pela reportagem. A Polícia Federal leva a sério as lorotas de um português, mas sequer me chama para ser ouvido numa investigação a meu respeito. Finalmente, outra reportagem citada pelos policiais: aquela em que a revista DINHEIRO apontou contradições da Polícia Federal na condução do caso Kroll. Meses depois da publicação do artigo, eis o que disse o deputado Paulo Delgado (PT-MG): "A Polícia Federal não está agindo na defesa do Estado; ela interroga, indicia e atormenta a vida do Opportunity, visivelmente favorecendo um dos lados". Estaria Paulo Delgado, um petista histórico, também a serviço de uma quadrilha ? Talvez a Polícia Federal não saiba, talvez alguns membros do governo Lula não saibam e talvez a própria revista Veja não saiba que os jornalistas podem, sim, errar. Muitas vezes, pagam caro por isso. Mas eles estão sujeitos, segundo a Constituição Brasileira, à Lei de Imprensa. O caminho correto para questionar uma reportagem é a via dos tribunais, apresentando argumentos e não aleivosias. No meu caso específico e da revista DINHEIRO, nenhuma das reportagens citadas pela Polícia Federal em seu pedido de quebra de sigilo jamais foi contestada por qualquer parte citada. Portanto, eu, que já estava convicto de que eram verdadeiras, hoje acredito que são irrefutáveis. Mas ainda há tempo. Caso alguém ainda discorde do que escrevi, seja na Polícia Federal, em alguma empresa ou no governo Lula, que me processe. É essa a regra do jogo. Por fim, esclareço ainda que nenhuma publicação informou tão bem seus leitores sobre o caso Brasil Telecom quanto a revista DINHEIRO. Enquanto a imensa maioria da imprensa apontava um desfecho, DINHEIRO antecipava que as ações do grupo Opportunity na operadora poderiam ser vendidas à Telecom Itália, fato que se confirmou. DINHEIRO serve aos interesses de seus leitores, que querem ser bem informados e, por isso, já lhe consideram a publicação de maior credibilidade no mercado de economia e negócios. E a revista Veja ? A que tipos de interesses empresta suas páginas ?


*Leonardo Attuch é editor de economia da revista Istoé DINHEIRO

L –

O que os fatos estão aqui a demonstrar é que a campanha demeritória da revista Veja contra o querelante, não é recente e tem propósitos inconfessáveis …

Fatos em Questão

LI –

O querelante fora o jornalista responsável pela publicação, na revista ISTOÉ DINHEIRO, da bombástica entrevista que lhe fora concedida por Fernanda Karina Sommagio, secretária do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, que revelara as entranhas de um monumental esquema de corrupção que permeara setores vitais do Governo Federal, denúncia que viera a ser objeto de Comissões Parlamentares de Inquérito instaladas no Congresso Nacional, cujas conseqüências são de todos sabidas.

LII –

Desde o princípio, e a todo custo, a revista Veja procurara desqualificar aludida reportagem, quer insinuando que a entrevista teria sido “comprada”[9], quer buscando investigar a vida pessoal do querelante.

LIII –

Desnecessário mencionar que tais perquirições não conduziram a lugar algum, até porque o querelante, tão-logo soubera dessas investidas “policialescas”, fora o primeiro a oferecer seus sigilos bancário, fiscal e telefônico e a convidar os jornalistas da revista Veja para um debate aberto e democrático. Eis o quanto fizera publicar no Portal Imprensa, “in verbis”:

Estou aguardando as respostas neste mesmo espaço do Portal Imprensa. E, mais uma vez, ofereço a qualquer profissional da Editora Abril a possibilidade de analisar todos os meus dados bancários e fiscais, bem como se meu patrimônio é compatível ou não com minha renda. Se eles têm tantas suspeitas sobre minha conduta, que verifiquem livremente meus dados. Abro mão, espontaneamente, do sigilo. Mas, sinceramente, gostaria que os mesmos covardes que me atacam fossem tão transparentes quanto eu. Será que eles topam o desafio ?

LIV –

A resposta, obviamente, não viera

LV –

E, no início de janeiro do ano em curso o querelante publicara o livro “A CPI QUE ABALOU O BRASIL – OS SEGREDOS DO PT E OS BASTIDORES DA IMPRENSA”, pela Editora Futura, no qual relata detalhes do caixa 2 montado pelo PT em 2002 e também revela como fora, e tem sido, o comportamento de alguns órgãos de imprensa na cobertura da crise política que atravessa o Governo Federal.

LVI –

Dentre outros, em seu livro, o querelante citara alguns profissionais da Editora Abril, que publicam a revista Veja. São eles:


· ROBERTO CIVITA – o livro revelara como o dono da Abril tivera encontros secretos com dois tesoureiros do PT, Delúbio Soares e Ivan Guimarães, em 2004, o ano em que se discutia o chamado Pró-Mídia, um programa de socorro a empresas de comunicação. Dera detalhes das histórias e apontara as testemunhas dos fatos;

· MÁRCIO AITH – o livro revelara que o editor-executivo da revista Veja saíra a campo um dia depois da reportagem que fez com a secretária Fernanda Karina Somaggio na revista IstoÉ Dinheiro para "desmontar a maracutaia", procurando algumas figuras importantes em São Paulo, na busca de histórias que pudessem desqualificar o autor da reportagem. Nada lograra apurar;

· ALEXANDRE OLTRAMARI – o livro revelara que o repórter da revista Veja, responsável por um dos furos da crise, aquele que apontara Marcos Valério como avalista do PT, participara de uma negociação com o Banco Rural. E, pretendendo ter acesso aos dados bancários de Valério, como moeda de troca, prometia não publicar um suposto vídeo em que Delúbio Soares estaria achacando José Augusto Dumont, ex-presidente do Banco. Os diretores do Banco Rural se reuniram e decidiram não ceder. Julgaram que se tratava de um blefe, uma chantagem feita a partir de um vídeo inexistente;

· LAURO JARDIM – o titular da coluna "Radar" fora também citado no livro em razão de seu comportamento em 2004. Aponta que ele fora leviano ao usar sua coluna para transmitir os recados da Polícia Federal sobre a chamada Operação Gutenberg, da qual o querelante seria o alvo principal. Tal operação visava apenas constranger os jornalistas que, ao contrário de Lauro Jardim, não estariam dispostos a publicar o que a PF gostaria de ler na cobertura do caso Brasil Telecom. Os jornalistas insubordinados ao patrulhamento oficial estariam "vendendo reportagens".

· POLICARPO JÚNIOR – O livro apontara algumas ironias. Veja tentara colocar o querelante sob suspeita perante o seu meio profissional porque, supostamente, a Kroll poderia ser a fonte de algumas das suas matérias. Meses depois, a CPI deixara claro que as principais fontes dos escândalos da Veja foram os ex-arapongas da Abin. Aliás, fora um deles que alugara a mala usada para filmar o notório diretor dos Correios, Maurício Marinho, recebendo 3 mil reais.

LVII –

O livro, que tivera uma tiragem inicial de 5 mil exemplares, logo se esgotara e entrara para a lista dos mais vendidos das principais revistas semanais do País, inclusive da Veja.

LVIII

Como nem todos se orgulham do que fazem a sorrelfa, a publicação do livro parecera intolerável para quem nele se vira revelado, conclusão que decorrera do fato da revista Veja, mais uma vez, ter voltado sua artilharia contra o querelante pois, afinal, devem pensar: como poderia o livro de um desafeto declarado figurar entre os mais vendidos do País ?

Notícia Mendaz e Ofensiva

LIX

Em 22 de fevereiro de 2006, na edição no 1944, ano 39, no 7 da REVISTA VEJA, previamente ajustados e com unidade de propósito, os querelados fizeram veicular e publicar, com destaque, na seção “Veja RECOMENDA”, a seguinte matéria, sem indicação de seu autor:


O MAIS VENDIDO O MAIS VENDIDO

Investigado pela Polícia Federal por atividades ilícitas, o negociante de notícias Leonardo Attuch está envolvido em uma nova fraude. Há três semanas, um volume de ficção de sua autoria, intitulado A CPI que Abalou o Brasil, apareceu nas listas de mais vendidos classificado equivocadamente como não-ficção. Só isso já seria estranho. Mas, como tudo o que circunda o investigado, as zonas de sombra desse caso são mais densas do que parecem. Na semana passada, desconfiados de que o desonesto volume pudesse estar tendo suas vendas fraudulentamente infladas, repórteres de VEJA foram investigar a correção dos dados enviados pelas livrarias. Bingo ! Descobriu-se que a livraria Siciliano, dona do selo Futura, que publicou o indecoroso panfleto ficcional, fornecera à imprensa dados manipulados, jogando para cima as cifras de venda. Se elas ainda fossem referentes ao autor, vá lá. Mas ao livreco ? Bem, o fato é que a vendagem do panfleto ignominioso (452 exemplares em uma semana) divulgada pela Siciliano – superior à de outras quatro grandes redes somadas ao longo de mais de um mês – era tão falsa quanto a produção do quadrilheiro que deve satisfações à polícia. VEJA pediu explicações à Siciliano. A resposta veio na forma de uma nota oficial: "Constatamos que houve um erro de informação na lista referente ao período de 6/2 a 12/2. Por um erro de cadastro no sistema, foram computadas, além das vendas internas (nas lojas Siciliano), as vendas para redes de livrarias e distribuidores. Isso ocorreu somente com o título A CPI que Abalou o Brasil". Foram dados, portanto, como vendidos livros que estão apanhando poeira em estoques. A nota termina assim: "Favor considerar, como venda total nas livrarias Siciliano, 84 exemplares". Com os dados corretos – ou seja, 368 exemplares a menos -, o volume ficcional não teria sido alçado a nenhuma lista de vendagem. Até que a fraude seja completamente esclarecida e a Siciliano, inocentada de cumplicidade com o novelista investigado que ela publica, VEJA decidiu não computar os dados daquela livraria na elaboração de suas listas. Leonardo Attuch, porém, continua à venda. (documentação anexa – destaques adicionados)

LX –

Na referida matéria, como se vê, o querelante fora acoimado de ´mercador de notícias`, de ´profissional à venda (e o mais vendido)`, de ´quadrilheiro`, que ´deve satisfações à polícia`, de autor de um ´panfleto ignominioso de ficção` e de um ´livreco desonesto`, apontado como um personagem envolvido em ´várias fraudes`.

LXI –

É profundamente lamentável que a mais lida revista semanal do Brasil, que se diz democrática, altiva, ética, isenta, praticante do bom jornalismo, embora nem todos assim pensem (vide comentários anexos), que tanto deveria contribuir para o aperfeiçoamento das instituições democráticas do País[10], desça a nível tão baixo, convolando-se em verdadeiro pasquim e fazendo afirmações mendazes, tudo para atingir um jornalista, que nada mais fez do que narrar fatos verídicos, os quais, diga-se de passagem, jamais foram contestados.

LXII –

Demonstrando a falsidade das levianas afirmações publicadas na seção da revista de responsabilidade dos querelados, a esse propósito, o querelante assim escrevera no website OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, “in verbis”:

Se a revista Veja estiver disposta a debater qualquer uma dessas histórias, estou à disposição. Mas já percebi, em outras oportunidades, que um diálogo franco, aberto e transparente não costuma agradá-los. Tudo bem. Cada um escolhe o seu caminho e que arque com as conseqüências. Mas vejam quanta ironia. Eles é que se reúnem secretamente com o tesoureiro do PT e eu, um mero jornalista, é que estou à venda ! Eles é que usam a chantagem como instrumento de barganha de "furos" e eu é que sou o negociante de notícias. Eles é que passam recados da Polícia Federal e eu é que sou ignominioso. Quem deve satisfações ao país não sou eu – é a revista Veja. Ao que parece, Roberto Civita e seus editores não suportaram a idéia de ver meu livro entre os "mais vendidos" na categoria não-ficção da própria Veja, da revista Época, dos jornais O Globo e Folha de S.Paulo. Por isso, o jornalista Jerônimo Teixeira, que atua na área cultural da revista, decidiu na semana passada procurar a Siciliano, dona do selo Futura, para questionar se meu livro estava mesmo vendendo tanto. Por que será que Veja decidiu auditar as vendas de um único livro ? Nem é preciso responder. Se um livro desagrada a Abril, como pode vender tanto ? Pois bem. A Siciliano respondeu que, na semana de 6 de fevereiro a 12 de fevereiro, a loja informou as vendas para os seus clientes e também para outras redes de livrarias. Isso aconteceu porque, em pouco mais de um mês, o estoque da editora Futura se esgotou. Uma edição de 5 mil exemplares, lançada no início de janeiro, está perto do fim. Se Veja acha que isso é pouco, tentarei fazer melhor da próxima vez.


LXIII –

Diante dos fatos narrados, outra não pode ser a conclusão de qualquer pessoa de inteligência mediana, senão a de que os querelados, responsáveis pela publicação da revista Veja, ou sejam, seu editor-responsável, Roberto Civita, seu diretor de redação, Eurípides Alcântara, e seu redator chefe, Mario Sabino, sentindo-se desnudados pelas verdades contidas no livro de autoria do querelante, para suas satisfações pessoais, resolveram ultrapassar todos os limites do tolerável.

Estes, são os fatos !

5. RESPONSABILIDADE SUCESSIVA

Autoria Delitiva

LXIV –

Pelo que se depreende do exemplar da semanária revista VEJA (anexada integralmente), os querelados são os diretores responsáveis pela edição, publicação e circulação do referido órgão de comunicação e, conseqüentemente, sendo os responsáveis pela edição, publicação e veiculação do texto ofensivo, objeto desta querela.

LXV –

Nesse sentido, preceituara o artigo 28 da Lei Federal no 5.250/67 que:

O escrito publicado em jornais ou periódicos sem indicação de seu autor considera-se redigido: I – pelo redator da seção em que é publicado, se o jornal ou periódico mantém seções distintas sob a responsabilidade de certos e determinados redatores, cujos nomes nelas figuram permanentemente; II – pelo diretor ou redator-chefe, se publicado na parte editorial; III – pelo gerente ou pelo proprietário das oficinas impressoras, se publicado na parte ineditorial.”

LXVI –

Ora, o conceito de parte editorial já fora definido pelo extinto Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, nos seguintes termos, “in verbis”:

“A expressão ´parte editorial`, contida no inc. II do art. 28 da lei especial, tem sentido diverso do significado comum da palavra. Quando se fala em ´editorial`, normalmente se pensa na opinião do órgão sobre determinado assunto. Mas no sentido técnico-jurídico, a expressão tem outro significado. Comentando o mencionado dispositivo, assinala Darcy Arruda Miranda que ´as expressões usadas no art. 28 ´considera-se redigido` e ´é tido` correspondem a uma atribuição de autoria.` Assim é que, se o escrito anônimo for publicado em seções distintas, sob a responsabilidade de determinados redatores, cujos nomes nela figurem permanentemente, o artigo ou notícia considera-se como tendo sido redigido por seu redator; pelo diretor ou redator-chefe, se publicado na parte editorial (noticiário em geral, crônicas, sueltos, etc.); e pelo gerente ou proprietário das oficinas impressoras, se publicado na parte ineditorial (anúncios, editais, comunicações, etc.) (Comentários à Lei de Imprensa, vol. II/596). Assim, a ´parte editorial` refere-se aos artigos, notícias e crônicas, etc., publicados no jornal. A denominada ´parte ineditorial` é destinada à ´seção livre`, aos anúncios, às reproduções, cartas à redação, matéria paga, etc.” (TACrim/SP – JUTACRIM 91/84)

LXVII –

Deveras, mesmo porque, se assim não fosse, não seria razoável que, em casos semelhantes, em que a matéria não vem assinada nem publicada no editorial (aqui compreendido ´stricto sensu`), fossem responsabilizados os gerentes e proprietários de oficinas impressoras em autêntica consagração de responsabilidade objetiva …

LXVIII –

Como, na espécie, a matéria oprobriosa fora publicada na seção “Veja RECOMENDA”, editorial assim como decidido no julgado acima colacionado, a responsabilidade penal pelo seu conteúdo é de ser atribuída ao seu Diretor ou Redator-Chefe, nos precisos termos do quanto preconiza o artigo 28, inciso II, da Lei Federal nº 5.250/67.

LXIX –

Nesse sentido tem se consolidado a jurisprudência dos Tribunais, “in verbis”:

“O art. 28 da atual Lei de Imprensa consagrou o princípio da responsabilidade sucessiva, bem como a repressão ao anonimato.” (STF – RTJ 87/76)

“Injúria – Editorial não assinado – Responsabilidade dos diretores decorrente da regra da sucessividade. Em tema de crime de imprensa, a responsabilidade por matéria não assinada é dos diretores do periódico, no sistema da responsabilidade sucessiva da Lei nº 5.250, de 1967.” (TACrim/SP – JUTACRIM 87/419)

“Nos crimes de imprensa, a responsabilidade por material não assinada é dos diretores do periódico, no sistema da responsabilidade sucessiva da Lei nº 5.250/67 (art. 28).” (TACrim/SP – JUTACRIM 97/388)

“Escrito ofensivo divulgado em revista, sem indicação de seu autor.Se o escrito incriminado for divulgado sem a indicação de seu autor, por força da presunção legal, considera-se redigido, na devida ordem pelos enumerados no art. 28 e seus §§, da Lei de Imprensa.” (TACrim/SP – RT 552/354)

LXX –

Como a legislação não especificara a que diretoria se referira quando dispusera sobre abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e de informação, ajuíza-se esta queixa-crime em face de todos quantos compõem o quadro diretivo da referida publicação e em face de seu redator-chefe, inclusive e principalmente para que não se venha, no futuro, alegar eventual renúncia tácita.

6. APLICAÇÃO DO DIREITO

Calúnia Perpetrada

LXXI –

Ao asseverar que “… a vendagem do panfleto ignominioso […] era tão falsa quanto a produção do quadrilheiro que deve satisfações à polícia …”, depreende-se claramente no sentido DENOTATIVO e CONOTATIVO dessa infâmia, que os querelados imputaram ao querelante a prática de fato definido como crime na legislação pátria.

LXXII –

De fato, quadrilheiro quer significar membro de quadrilha que comete crimes, eis que deve satisfação à polícia, delito previsto no artigo 288 da Lei Penal, “in verbis”:

“Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes: Pena – reclusão, de um a três anos.”

LXXIII –

O mesmo se diga em relação outro excerto da publicação, onde há a seguinte referência igualmente caluniosa, “in verbis”:

Descobriu-se que a livraria Siciliano, dona do selo Futura, que publicou o indecoroso panfleto ficcional, fornecera à imprensa dados manipulados, jogando para cima as cifras de venda. […] Até que a fraude seja completamente esclarecida e a Siciliano, inocentada de cumplicidade com o novelista investigado que ela publica, VEJA decidiu não computar os dados daquela livraria na elaboração de suas listas.

LXXIV –

Com efeito, o artigo 299 do Código Penal tipificara como crime a seguinte conduta, “in verbis”:

Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular.

LXXV –

O mesmo se diga em relação à assertiva segundo a qual “Leonardo Attuch, porém, continua à venda”. Com efeito, o artigo 18 da Lei de Imprensa tipificara como crime a seguinte conduta, “in verbis”:

“Obter ou procurar obter, para si ou para outrem, favor, dinheiro ou outra vantagem, para não fazer ou impedir que se faça publicação, transmissão ou distribuição de notícias: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, de dois a trinta salários mínimos da região.”

LXXVI –

De outro lado, em outro excerto da publicação há a seguinte referência igualmente caluniosa, “in verbis”:

Descobriu-se que a livraria Siciliano, dona do selo Futura, que publicou o indecoroso panfleto ficcional, fornecera à imprensa dados manipulados, jogando para cima as cifras de venda. Se elas ainda fossem referentes ao autor, vá lá.

LXXVII

Aqui, refere a matéria a “cifras de venda referentes ao autor“, como se o querelante estivesse à venda.

LXXVIII –

Bem se vê que os querelados imputaram categoricamente, ao querelante, os crimes de formação de quadrilha, de falsidade ideológica em cumplicidade e também de se vender enquanto profissional do jornalismo (note-se, a propósito, que o título da matéria é “O Mais Vendido O Mais Vendido”, numa clara referência à obra e à pessoa do querelante).

LXXIX –

Assim, os querelados cometeram pois, o delito do artigo 20 da Lei Federal no 5.250/67, assim enunciado, “in verbis”:

“Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime. Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa, de um a vinte salários mínimos, da região.”

LXXX –

A conduta dos querelados se ajusta, com perfeição, ao molde abstrato desenhado na lei, eis que faz determinada e precisa imputação do ilícito penal antes referido. Incontroverso, de outro lado, o “animus caluniandi“ com que obraram, ao agirem de forma livre e consciente. Devem, pois, responder pelo crime de calúnia.

LXXXI

Di-lo, no mesmo sentido, nossa mais recente jurisprudência, “in verbis”:

“O dizer disfarçado da ofensa utilizando certas delicadezas e subterfúgios, atinge da mesma forma a honra da pessoa, pois no crime de calúnia o dolo será sempre presumível, bastando que o agente tenha previsão do resultado lesivo de suas alegações.” (TACrim/SP – RT 757/584 – destaques adicionados)

“Imputar a alguém falsamente fato definido como crime constitui calúnia, crime que já as civilizações da mais alta antigüidade puniam severamente: ´Eu te exorto, em nome dos deuses, a que não te entregues à calúnia, o mais odioso de todos os vícios e uma injustiça que se pratica contra um semelhante` (Heródoto, História, 1950, v. II, p. 138, trad. J. Brito Broca). Pelo mesmo feitio o nosso Matias Aires: ´Honra: esta constitui uma religião, que esse não pode desprezar sem crime` (Reflexões sobre a vaidade dos homens, 1757, p. 101).” (TACrim/SP – RT 765/617 e 618 – Rel. Juiz CARLOS BIASOTTI – destaques adicionados)

Difamação Perpetrada

LXXXII –

Na referida matéria os querelados imputaram ao querelante fato ofensivo à sua reputação, lesando, assim, a sua honra, no plano objetivo. Eis os excertos onde se identificam opróbrios à sua reputação:

O MAIS VENDIDO O MAIS VENDIDO

Investigado pela Polícia Federal por atividades ilícitas, o negociante de notícias Leonardo Attuch está envolvido em uma nova fraude.

Mas, como tudo o que circunda o investigado, as zonas de sombra desse caso são mais densas do que parecem. Na semana passada, desconfiados de que o desonesto volume pudesse estar tendo suas vendas fraudulentamente infladas

Se elas ainda fossem referentes ao autor, vá lá. Mas ao livreco ? Bem, o fato é que a vendagem do panfleto ignominioso (452 exemplares em uma semana) divulgada pela Siciliano – superior à de outras quatro grandes redes somadas ao longo de mais de um mês – era tão falsa quanto a produção do quadrilheiro que deve satisfações à polícia.

Até que a fraude seja completamente esclarecida e a Siciliano, inocentada de cumplicidade com o novelista investigado que ela publica, VEJA decidiu não computar os dados daquela livraria na elaboração de suas listas. Leonardo Attuch, porém, continua à venda.

LXXXIII –

Nestes trechos, os querelados difamam o querelante, ferindo profundamente sua honra no plano objetivo, eis que resta inconcusso que matéria é francamente ofensiva ao querelante e abala, seriamente, sua credibilidade enquanto jornalista, além de ofender-lhe a dignidade e o decoro.

LXXXIV –

Revelara-se manifesto o intuito dos querelados de ultrajar o querelante, apontando-o como mercenário, fraudador, ´investigado por atividades ilícitas` e que ´deve satisfações à polícia`[11], pessoa sinistra, torpe, condenável, portanto, profissional desqualificado, de comportamento anti-ético e imoral.

LXXXV –

Referiram-se os querelados, ainda, ao querelante, como sendo autor de um ´livreco` (livro sem valor, insignificante, segundo os léxicos), de um ´panfleto ignominioso`, um ´novelista` (que ou quem tem por hábito narrar fatos, acontecimentos, quase sempre implausíveis, inacreditáveis),[12] numa clara e irretorquível intenção de diminuí-lo perante todos e infirmar seu conceito perante quantos da matéria tenham tomado ciência. Não há como negar.

LXXVI –

Os querelados atribuíram ao querelante, como se vê, um comportamento e caracteres demeritórios, ignóbeis, desprezíveis, descompromissados com os princípios deontológicos de sua profissão, o que não se coaduna com seu perfil de jornalista sério, competente, íntegro e honrado.

LXXXVII –

Ademais e com gratuita agressividade, os querelados afirmaram que o querelante ´deve satisfações à polícia` e que ´é investigado por atividades ilícitas`, quando sabedores do quanto já decidira o Poder Judiciário a respeito, em caráter definitivo. Basta lembrar da nota “Murchou” acima referida …

LXXXVIII –

Os querelados apodaram o querelante de profissional desqualificado, cujas matérias estariam ligadas a obtenção de vantagens econômicas pessoais, em detrimento do jornalismo imparcial e isento.

LXXXIX –

Sublinhe-se que as imputações levadas a efeito pelos querelados são de fatos precisos e determinados que, por serem estes falsos, atingiram, inquestionavelmente, a honra objetiva do querelante, tisnando sua reputação profissional.

XC –

A conduta dos querelados se ajusta, com perfeição, ao molde abstrato desenhado na lei, eis que faz determinada e precisa imputação do ilícito penal antes referido. Incontroverso, de outro lado, o “animus difamandi“ com que obraram, ao agirem de forma livre e consciente. Devem, pois, responder pelo crime de difamação.

XCI –

Assim, os querelados cometeram pois, o delito do artigo 21 da Lei Federal no 5.250/67, assim enunciado, “in verbis”:

“Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação. Pena – detenção de três (3) a 18 (dezoito) meses, e multa, de dois a dez salários mínimos da região.”

Injúria Perpetrada

XCII –

Agindo nas mesmas condições de modo, tempo, lugar e forma de execução indicados nos itens precedentes, os querelados dirigiram ao querelante as referidas contumélias, alcançando a sua honra no plano subjetivo, injuriando-o com ofensas a dignidade e o decoro.

XCIII –

Referiram-se os querelados, ainda ao querelante, como sendo ´quadrilheiro`, ´investigado por atividades ilícitas`, ´que deve satisfações à polícia`, ´novelista investigado`, ´negociante de notícias`, ´envolvido em fraudes`,´circundado por densas zonas de sombra`, autor de ´desonesto volume`, profissional ´mais vendido`, que ´continua à venda` e, assim, criminosa e profundamente, alcançaram o íntimo sentimento de decoro e dignidade do querelante, injuriando-o, pelo que devem responder, nas formas da lei. Indiscutivelmente atingiram, de modo abissal, o seu decoro e a sua dignidade.

XCIV –

A conduta dos querelados se ajusta, com perfeição, ao molde abstrato desenhado na lei, eis que faz determinada e precisa imputação do ilícito penal antes referido. Incontroverso, de outro lado, o “animus injuriandi“ com que obraram, ao agirem de forma livre e consciente. Devem, pois, responder pelo crime de injúria.

XCV –

Assim, os querelados cometeram pois, o delito do artigo 22 da Lei Federal no 5.250/67, assim enunciado, “in verbis”:

“Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou decoro. Pena – detenção de um (1) mês a 1 (um) ano, ou multa, de um a dez salários mínimos da região.”

7. CONCLUSÃO

Responsabilidade Penal

XCVI –

As ofensas que, previamente ajustados e com unidade de propósitos, os querelados fizeram publicar e veicular no aludido periódico semanal, contra o querelante, configuram os crimes previstos nos artigos 20, 21 e 22 da Lei Federal nº 5.250/67 (Lei de Imprensa), em cujo arquétipo se veste, com perfeita adequação, às suas condutas pois, tais afirmações contumeliosas são desapegadas da ação pessoal do querelante e denigrem, inquestionavelmente, a sua reputação e atingiram abissalmente a sua honra objetiva, seu decoro e sua dignidade.

XCVII –

Ao se analisar os reprováveis termos utilizados, editados, publicados e circulados pelos detratores da honra alheia, constata-se que sequer há a observância das regras de educação, da ética e da boa técnica de jornalismo, deixando até de contatarem o querelante para checarem a veracidade da notícia, extrapolando o tema debatido para ferir de forma inconseqüente a honra do ofendido.

XCVIII –

Os reprováveis termos que foram utilizados pelos querelados, atingiram a honra do querelante, que constitui um bem jurídico de enorme relevância, ínsito na própria idéia de dignidade da pessoa humana, conceito básico do Estado Democrático de Direito e essencial para o exercício da nobre profissão que exerce, gerando efeito nocivo a sua auto-estima, ao sentimento de sua família e amigos, a avaliação e ao relacionamento com seus pares.

Por essas práticas os querelados devem ser responsabilizados !

8. PEDIDO

"EX POSITIS", com fundamento na legislação de incidência, o querelante oferece a presente QUEIXA-CRIME contra os querelados, qualificados no preâmbulo, apontando-os como incurso nas penas dos artigos 20, 21 e 22 da Lei de Informação, requerendo a esse Meritíssimo Juízo que se digne:

a)apreciar a presente, em todos os seus termos, mandando registrá-la e autuá-la, mantendo nos autos o exemplar completo do periódico mencionado nesta queixa;

b)determinar a citação os querelados no endereço constante dos autos para, querendo, apresentarem defesa prévia, sob pena de revelia, "ex vi" do que dispõe o artigo 43, § 1º da Lei Federal nº 5.250/67;

c)decorrido o qüinqüídio legal, com ou sem a apresentação de defesa prévia, conceder vista ao ilustre representante do Ministério Público, "ex vi" do que dispõe o artigo 43, § 4º da Lei Federal nº 5.250/67;

d)após a promoção do Ministério Público, receber e processar esta, fazendo-se instaurar a competente ação penal privada e designar data para a apresentação dos querelados em juízo e designar dia e hora para a realização da audiência de instrução e julgamento, "ex vi" do que dispõe o artigo 45 da Lei Federal nº 5.250/67;

e)com a designação da audiência, mandar intimar as testemunhas infra-arroladas para que prestem seus informes, sob as penas da lei;

f)por derradeiro, acolher a pretensão punitiva para julgar totalmente procedente esta ação penal privada, CONDENANDO os querelados como incurso nas penas cominadas nos preceitos secundários dos dispositivos legais acima indicados (artigos 20, 21 e 22 da Lei Federal nº 5.250/67), com as decorrências de Direito, inclusive a publicação do édito sancionatório, nas custa processuais e nos honorários advocatícios (STF, RTJ 96/825; TACrimSP, RT 560/336);

Termos em que,

Subscrevem o advogado e o querelante.

São Paulo, 15 de maio de 2006.

Leonardo de Rezende Attuch

[1] As investigações, que se realizavam sob segredo de justiça, eram freqüentemente “vazadas” para a imprensa ao sabor sabe-se lá de quais interesses ou estímulos …

2 Sublinhe-se que se obteve cópia do expediente em referência mediante autorização judicial.

3 Apontado pela PF como espião da KROLL.

4 Executivo da Telecom Itália.

5 Sócio do Opportunity.

6 Apud "História dos Estados Unidos, Terceira Época: A Constituição dos Estados Unidos” (1866), tradução de L. Nequete, inserto em ‘O Poder Judiciário e a Constituição’, AJURIS-4, 1977, págs. 13/14 e 19/20 Cf. “A Constituição dos Estados Unidos”.

7 Boletim da comunidade jornalística que circula em todas as edições do Brasil.

8 Impende salientar que nenhuma das reportagens citadas jamais fora questionada por quem quer que seja, muito menos em ambiência judicial.

9 Afinal o querelante compra ou vende reportagens ?

10 Salvo alguns “escorregões”, cujo exemplo mais recente fora o episódio Ibsen Pinheiro, publicado pela Revista Istoé, da Editora Três, ao que parece o fator desencadeador de tudo o quanto aqui se narra.

11 Quando o próprio Poder Judiciário decidira, definitivamente, que: ´em nenhum momento foram levantados indícios de que o alvo da interceptação pleiteada tenha participado, de alguma forma, da obtenção de tais dados, o que afasta sua possível participação em organização formada com a finalidade supra mencionada.`

12 Cf. HOUAISS.

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