Caso Toninho do PT

MP pede que acusado de matar Toninho do PT vá a Júri

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29 de novembro de 2006, 18h03

O caso do assassinato do então prefeito de Campinas, Antônio da Costa Santos, o Toninho do PT, ganhou um novo capítulo. O Ministério Público quer que o seqüestrador acusado de ter praticado o crime, Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho, seja submetido a julgamento e condenado pelo Tribunal do Júri. O relatório com o pedido foi entregue pelo Ministério Público de Campinas (São Paulo) ao juiz da Comarca da cidade.

Toninho do PT foi morto a tiros em 2001, enquanto dirigia o seu carro na saída de um shopping em Campinas. A família de Toninho do PT acredita que a morte teve motivação política.

A Polícia Civil chegou à conclusão de que o prefeito foi assassinado porque seu carro atrapalhou a fuga da quadrilha de Andinho. O seqüestrador foi o único do grupo criminoso que sobreviveu. Os outros quatro membros da quadrilha, acusados de envolvimento no crime, foram assassinados pela Polícia Civil em uma ação no município de Caraguatatuba (SP), em 2003.

Segundo o MP, o laudo pericial atesta que houve a intenção de matar, diante da quantidade de disparos contra o carro. Apesar de Andinho não ter sido o autor dos disparos, o MP concluiu que deve ser julgado pelo Tribunal do Júri. Isso porque, entende que foi ele quem instigou os membros de sua quadrilha a disparar contra o ex-prefeito.

“Como dirigente das atividades dos demais agentes, liderou e prestou apoio moral a seus comparsas, fazendo presente no interior do veículo desde o início da empreitada criminosa, inclusive portando, assim como os demais, armas de fogo”, argumenta o Ministério Público.

Leia o relatório

Autos nº 540/2002

Vara do Júri – Comarca de Campinas

Réu: WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA

Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO

Alegações Finais – Artigo 406 do C.P.P.

Meritíssimo Juiz:

O Réu WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA, vulgo “ANDINHO”, está sendo processado como incurso no artigo 121, § 2º, inciso IV, c.c. artigo 29; e no artigo 157, § 3º, segunda parte, c.c. artigo 14, inciso II, por duas vezes, tudo c.c. artigo 62, inciso I, e na forma do artigo 69, todos do Código Penal, tendo em vista que:

a) no dia 10 de setembro de 2001, por volta das 22:15 horas, na Avenida Mackenzie, nas proximidades da concessionária de veículos “Adara”, nesta cidade e comarca de Campinas, Anderson José Bastos, também conhecido pelas alcunhas de “Anso”, “Alemãozinho” e “Puff”, já falecido, agindo com intento homicida, mediante disparo de arma de fogo e usando de recurso que dificultou a defesa da vítima, matou Antônio da Costa Santos, apelidado de “Toninho do PT”, então Prefeito do Município de Campinas, produzindo neste os ferimentos descritos no laudo de exame necroscópico de fls. 800/801, que foram a causa eficiente do óbito;

b-) WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA, vulgo “ANDINHO”, concorreu, de qualquer modo, para o crime acima mencionado, eis que, como dirigente das atividades dos demais agentes, fazendo-se presente desde o início da empreitada criminosa, portando armas de fogo, instigou e aderiu à conduta do autor dos disparos. Igualmente concorreram para o crime em questão Valmir Conti e Valdecir de Souza Moura, vulgo “Fiinho”, ambos já falecidos;

c-) Minutos antes do crime acima citado, por volta das 22:05 horas, na Rua Nova Granada, altura do numeral 330, bairro Chácara da Barra, nesta cidade e comarca de Campinas, WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA, vulgo “ANDINHO”, agindo em concurso e unidade de propósitos com os já falecidos Anderson José Bastos, de vulgos “Anso”, “Alemãozinho” e “Puff”, Valmir Conti e Valdecir de Souza Moura, vulgo “Fiinho”, tentou subtrair, para si, mediante violência e grave ameaça, o veículo da marca General Motors, modelo Vectra, de cor verde, de placas FBI-0180/Campinas, em cujo interior estavam as vítimas Uilson Franco e Celso Alves dos Santos, contra as quais, com intento homicida, foram efetuados disparos de arma de fogo, que atingiram somente o automóvel, não consumando o delito por circunstâncias alheias à sua vontade.

I – Da Denúncia

Apurou-se que o Réu e seus falecidos comparsas, no dia 10 de setembro de 2001, por volta das 22:05 horas, trafegavam pela Rua Nova Granada, quando avistaram o veículo GM Vectra, de cor verde e placas FBI-0180, conduzido por Uilson Franco, que tinha como passageiro Celso Alves dos Santos. Tendo a intenção de subtrair tal automóvel, o Acusado e seus comparsas emparelharam o veículo em que estavam, um GM Vectra, de cor prata, com placas GVF-5346/Uberlândia, produto de crime, com aquele outro e o abalroaram na lateral esquerda. Ato contínuo, utilizando de uma arma de fogo, quebraram o vidro traseiro esquerdo do mesmo carro e gritaram para a vítima Uilson parar e entregar o veículo.

Todavia, Uilson tentou fugir do Réu e de seus comparsas, efetuando inclusive manobras na direção da calçada de pedestres, sendo, mesmo assim, perseguido, o que ocasionou novas pequenas colisões entre os dois carros. Além disso, os perseguidores efetuaram contra as vítimas disparos de arma de fogo, que atingiram o veículo em que estas estavam. A vítima Uilson, na condução do seu automóvel, com as manobras que efetuou, conseguiu afastar-se de seus roubadores, impedindo, assim, a subtração do veículo e garantindo a preservação de sua integridade física e a de seu acompanhante.


Alguns minutos depois do acima ocorrido, por volta de 22:15 horas, o Réu e seus comparsas, ainda no mesmo veículo em que estavam, chegaram na Avenida Mackensie, por onde trafegava o então Prefeito Municipal de Campinas, Antônio da Costa Santos, popularmente conhecido como “Toninho do PT”, conduzindo seu veículo da marca Fiat, modelo Palio, com placas DBJ-2113/Campinas, no sentido do trevo de acesso à Rodovia D. Pedro I.

Em dado momento, quando o veículo em que estavam o Acusado “ANDINHO” e seus comparsas ultrapassava o carro da vítima, o falecido Anderson José Bastos, mais conhecido pela alcunha de “Anso”, passou a efetuar disparos com uma arma de fogo calibre 9 mm. contra vítima.

Antônio da Costa Santos foi atingido por um dos projéteis disparados e perdeu o controle de seu veículo, que acabou trafegando sem direção, até atingir uma placa de propaganda situada em terreno que margeia a já citada avenida e imobilizar-se. “Toninho” faleceu nesse local. Outros dois projéteis atingiram o veículo da vítima.

“Anso” usou de recurso que dificultou a defesa de Antônio da Costa Santos, pois passou a contra este atirar de inopino, sem qualquer aviso, quando o veículo em que estava ultrapassava o carro da vítima, que foi pega de surpresa, quando conduzia seu veículo automotor rumando para o descanso de sua residência e o convívio familiar.

Conforme restou apurado, nos meses anteriores e posteriores aos crimes ora descritos, o Réu WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA, vulgo “ANDINHO”, arregimentou e liderou diversas pessoas, que atuavam sob suas ordens, para a prática de vários delitos. No crime de homicídio já descrito, que vitimou Antônio da Costa Santos, a participação de “ANDINHO” consistiu em instigar e aderir à conduta do autor dos disparos, pois, como dirigente das atividades dos demais agentes, liderou e prestou apoio moral a seus comparsas, fazendo-se presente no interior do veículo desde o início da empreitada criminosa, inclusive portando, assim como os demais, armas de fogo.

II – Do Relatório

A denúncia, aditada a fls. 1664/1672, foi recebida a fls. 1674/1683. Houve correção do teor do despacho de recebimento, a fim de afastar erro material, de redação (fls. 1695).

O Réu foi devidamente citado e posteriormente interrogado por meio de carta-precatória (fls. 1864/1865). Depois, foi novamente interrogado, desta feita na própria Vara do Júri de Campinas (fls. 2006/2016). Outro interrogatório, também por carta precatória, foi realizado (fls. 3320/3322)

Defesa Prévia encontra-se a fls. 2121/2124.

Na fase de instrução, foram ouvidas as vítimas e testemunhas arroladas pelo Ministério Público (fls. 2017/2036, 2046/2074 e 2237/2257), pela Defesa (fls. 3230/3232, 3242/3260, 3391/339 e 4148/4149) e outras a requerimento das “partes” ou ex officio, como testemunhas do Juízo (fls. 2037/2045, 2258/2338, 2794/2813, 3134/3229, 3233/3241, 3323/3324, 3400/3409, 3456/3470, 3521/3524, 3594/3597, 3959, 4299, 4305, 4316/4329, 4333/4409, 4487/4488 e 4493/4517).

III – Da Preliminar

No despacho de fls. 4805, itens 2 a 4, Vossa Excelência indeferiu o requerimento do Ministério Público, que pedia as oitivas de duas testemunhas antes da abertura de prazo para o oferecimento das alegações finais (fls. 4797/4800).

Embora discordemos, acatamos o indeferimento e apresentamos estas alegações. No entanto, aproveitamos a oportunidade para reiterar o pedido de oitivas das duas testemunhas, eis que não há razão alguma para não ouvi-las.

Ao mesmo tempo, aproveitamos para repudiar o argumento por Vossa Excelência utilizado para o indeferimento. É que, conforme consta do item 2 do referido despacho, Vossa Excelência afirmou que indeferia o pedido ministerial “pois a instrução está encerrada, de acordo com o devido processo legal, embasado em princípio constitucional de garantia, que impede que, por vias transversas, seja violado o limite de testemunhas que pode o Ministério Público arrolar para a fundamentação de sua pretensão acusatória…”. No item seguinte, depois de analisar o poder dado ao juiz pelo Código de Processo Penal para ouvir testemunhas não arroladas pelas partes, Vossa Excelência afirmou que “não pode ser essa faculdade do juiz utilizada para violar o princípio do devido processo legal e permitir, por vias transversas, a colheita de provas testemunhais que não indicou o Ministério Público no momento procedimental legalmente previsto”.

Ora, o Ministério Público, neste e em qualquer outro processo, não pretende cometer qualquer violação a direito ou garantia constitucional, seja diretamente seja por “vias transversas”.

Na verdade, quer o Ministério Público buscar a verdade real, quer trazer aos autos todas as informações recebidas depois do oferecimento da denúncia, ou seja, depois que já teve a oportunidade de arrolar testemunhas. Com isso, quer o Ministério Público um processo transparente, com observância do contraditório.


No caso em questão, o Ministério Público ouviu duas testemunhas, que fizeram afirmações a respeito de uma possível motivação do assassinato de Antônio da Costa Santos; trouxe aos autos cópia dos termos de declarações; e, finalmente, requereu fossem as mesmas pessoas ouvidas, sob contraditório, em audiência pública (aliás, Vossa Excelência já afirmou nos autos que depoimento colhido apenas pelo Ministério Público pouco valor possui, pois não é colhido sob o contraditório).

Para nossa surpresa, houve o indeferimento, sob o argumento de que, com tais oitivas, quer o Ministério Público, espertamente, burlar o limite de testemunhas que podia arrolar.

Deixando de lado o fato de não termos o dom da adivinhação – isto é, não podíamos, quando oferecemos a denúncia, saber que, quatro anos depois, surgiriam pessoas fazenda certas afirmações – é certo que o raciocínio utilizado agora por Vossa Excelência não foi usado antes, muito embora diversos depoimentos inúteis tenham sido colhidos, alguns de ofício, sem requerimento das partes. Toda e qualquer pessoa que do nada surgiu, dizendo-se sabedora da motivação do delito, foi ouvida. Estas duas últimas, porém, não serão. Por que ? Não, certamente, pelo argumento utilizado por Vossa Excelência, daí porque apresentamos este necessário repúdio.

IV – Da Pronúncia

A acusação é admissível, havendo provas da existência de um crime de homicídio e de dois latrocínios tentados, bem como de que o acusado WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA foi deles partícipe, requisitos que autorizam o decreto de pronúncia, nos termos do artigo 408 do Código de Processo Penal.

Ensina o eminente JOSÉ FREDERICO MARQUES:

“Para a pronúncia, tem de ser certa a existência do crime e provável a autoria imputada ao réu. (…) Quem, de qualquer modo, concorre para o crime, incide nas penas a este cominadas – dispõe o artigo 25 do Código Penal (atual artigo 29 – esclarecimento nosso). Sendo assim, aquele que de qualquer modo concorreu para a prática do crime que a denúncia descreve pode ser acusado em plenário, passível que é de sofrer as sanções previstas na lei penal para a infração em que esteve envolvido”.

Neste mesmo sentido, lembra, ainda, GUILHERME DE SOUZA NUCCI:

“Finalmente, havendo prova da existência do delito e indícios suficientes de autoria, deve o juiz enviar o caso ao júri (art. 408 do CPP). Nessa situação, havendo dúvida, esta resolve-se em favor da sociedade e não do réu. Embora o princípio do in dubio pro reo seja uma pedra basilar no direito processual penal, não é hipótese de aplicá-lo na decisão de pronúncia, meramente interlocutória, que não põe fim ao processo e não analisa o mérito da acusação”.

Assim, havendo prova da existência de um crime doloso contra a vida e indícios suficientes de que o acusado foi o seu autor ou teve nele participação, não pode o juiz deixar de pronunciá-lo, eis que, do contrário, estaria burlando a regra constitucional que garante que tais casos sejam julgados tão-somente pelo Tribunal do Júri. É este, portanto, o órgão do Poder Judiciário incumbido do julgamento dos crimes dolosos contra a vida, por expressa disposição constitucional.

O presente processo não deve ser exceção, pois há nos autos, como veremos, provas de que ocorreu um crime doloso contra a vida – além de dois delitos a este conexos –, bem como de que o Acusado WANDERSON é deles partícipe.

Vejamos.

O laudo de exame necroscópico de fls. 800/801 demonstra que a vítima Antônio da Costa Santos foi atingido por um projétil de arma de fogo e, em razão dos ferimentos causados, acabou por falecer.

Por outro lado, o laudo pericial de fls. 183/206 mostra que o veículo Vectra, de cor verde, placas FBI-0180, foi atingido por disparos de arma de fogo, de calibre 45. Ademais, dada a quantidade de disparos e a região do carro visada pelo atirador, pode-se seguramente afirmar que o objetivo era o de atingir, com intento homicida, as duas pessoas que estavam em seu interior.

Indubitável, portanto, a existência do crime de homicídio e dos crimes de latrocínio tentados.

Quanto à participação do Réu WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA, há provas suficientes para a pronúncia e posterior condenação.

A vítima do latrocínio tentado, o senhor Uilson Franco, em Juízo, afirmou que, na noite dos fatos, estava na companhia de um pedreiro e na condução de seu veículo Vectra, placas FBI-0180, quando ingressou na Rua Nova Granada, no sentido da Rua Oriente. Em dado momento, um outro veículo se aproximou e emparelhou-se com o carro da vítima. Então, com a lateral direita, tal veículo abalroou a lateral esquerda do auto do senhor Uilson. De imediato, um indivíduo quebrou o vidro do carro da vítima e gritou para que ela parasse e entregasse o veículo. A vítima não obedeceu e procurou fugir, razão pela qual os carros foram “se enroscando” e chocando-se, até que surgiu um ônibus que subia a mesma via pública, o que impossibilitou que o veículo dos agressores continuasse trafegando por ali. Por isso, o senhor Uilson logrou consumar a fuga e dirigiu-se para sua residência, quando constatou que tais indivíduos haviam efetuado disparos, que atingiram o veículo (fls. 2069/2071).


A segunda vítima, Celso Alves dos Santos, o pedreiro acima mencionado, confirmou o relato do senhor Uilson (fls. 2072/2074).

O laudo pericial de fls. 183/206 mostra os danos causados pelos disparos efetuados contra o Vectra de cor verde, placas FBI-0180, pertencente ao senhor Uilson. O mesmo laudo também mostra que os projéteis que atingiram o carro eram do calibre 45 e que, no local dos fatos, na Rua Nova Granada, foram encontrados fragmentos das colisões entre os veículos e estojos de calibre 45, ejetados pela arma quando dos disparos.

Alguns minutos depois, o então Prefeito Municipal de Campinas, a vítima Antônio da Costa Santos saía do Shopping Center Iguatemi, ingressava em seu veículo Fiat, modelo Palio, e passava a trafegar pela Avenida Mackensie.

Em uma via pública anterior à Avenida Mackensie trafegava uma van, dirigida pela testemunha Odilon Aparecido Gomes Leal (fls. 2305/2308), que estava na companhia de Cássia Aparecida Ferracini (fls. 2309/2311). Ambos contaram que um carro aproximou-se por trás, dando sinal de farol. Odilon derivou a van para um lado e o carro fez o mesmo; derivou para o lado oposto e o outro carro fez a mesma manobra. Então, tal carro – um Vectra, de cor prata ou cinza – acabou por bater na guia da calçada do lado esquerdo e quase capotou. O Vectra, então, seguiu caminho e ingressou na Avenida Mackensie. Logo em seguida, as testemunhas ouviram alguns estampidos.

Prestes a ingressar na mesma avenida, estava um veículo da marca Subaru, tendo em seu interior pessoas de uma mesma família, a saber, as testemunhas Luciane Cristina Particelli (fls. 2062/2064), Élcio Particelli (fls. 2065/2068) e Joana Fagundes Particelli (fls. 2312/2314).

Em resumo, Luciane e Élcio relataram que o veículo Subaru em que estavam aproximava-se da entrada da Avenida Mackensie quando foram “cortados” por um automóvel GM Vectra, que trafegava em alta velocidade e fazendo tal tipo de manobra. Tal carro ingressou na Avenida Mackensie. Logo em seguida, ouviram três estampidos e, então, viram um veículo Fiat Palio desgovernar-se, até chocar-se contra um outdoor. Joana, por sua vez, disse que não chegou a ver o carro, mas ouviu os disparos.

Naquela mesma hora, na Avenida Mackensie, um veículo Fiat Uno era dirigido pela testemunha Antônio Araújo Azevedo Sobrinho (fls. 2237/2240), tendo como passageiros sua esposa Márcia Cristina Teixeira de Assumpção (fls. 2241/2245), dois de seus filhos e uma amiga. O trânsito estava lento. Em dado momento, a testemunha ouviu três estampidos que pareciam vir de um ponto da avenida que ele já havia deixado para trás. Logo em seguida, um veículo GM Vectra de cor prata, em alta velocidade, ultrapassou-o, acabando por “fechar” o carro da testemunha, que quase saiu da pista. E depois a testemunha viu, mais atrás, os faróis de um carro que parecia desgovernar-se. Tal relato foi confirmado por Márcia.

Como visto, estas sete testemunhas acabaram por revelar, passo a passo, a dinâmica do homicídio do então Prefeito Antônio da Costa Santos, ocorrido na Avenida Mackensie. E trouxeram algo muito importante: os disparos ocorreram depois da passagem de um apressado Vectra de cor prata.

Na avenida local dos fatos, o Policial Militar João Carlos de Oliveira (fls. 3193/3196) localizou, naquela mesma noite, logo depois de chegar ao local – que, portanto, ainda estava preservado – os estojos de calibre 9 mm. ejetados por uma arma. Tais cápsulas foram apreendidas, conforme consta do Auto de Exibição e Apreensão de fls. 14. No interior do veículo Fiat Palio do Prefeito foram encontrados projéteis do mesmo calibre, conforme se verifica no laudo pericial de fls. 721/779.

Poucos dias depois, em 14 de setembro de 2001, no bairro Nova Campinas, a criança Eduardo Ribeiro Ragazzi foi seqüestrada, quando na companhia de sua mãe, Marina Ribeiro Ragazzi (fls. 1305/1307 e 2295/2298). No momento do arrebatamento, os autores do delito efetuaram disparos de armas de fogo.

Instantes depois, no local do seqüestro, conforme consta do respectivo Inquérito Policial (fls. 1426/1448), bem como do relato das testemunhas Adriano de Almeida Souza (fls. 2315/2318) e PM Gutemberg Felipe Martins da Silva (fls. 3197/3199), foram encontrados estojos de calibre 9 mm., ejetados quando dos disparos efetuados pelos seqüestradores. Alguns dias depois, conforme relato das testemunhas Armando Ricci (fls. 2276/2278) e Pedro Ademir Bordon (fls. 3200/3202), também foi encontrado cartucho de calibre 45.

Tais estojos de calibre 9 mm. foram comparados com os estojos encontrados na cena do crime que vitimou Antônio da Costa Santos. O laudo de comparação dos “picotes” – verdadeiras “impressões digitais” deixadas por uma arma de fogo – revelou que todos os estojos haviam sido disparados por uma mesma e única arma de calibre 9 mm. (fls. 871/880).

Ou seja, a arma que ejetou os estojos encontrados no local do homicídio de ex-Prefeito foi a mesma utilizada no seqüestro da criança alguns dias depois.


E havia a questão dos estojos de calibre 45. Como visto acima, foram encontrados em dois momentos: no da abordagem do veículo do senhor Uilson Franco, momentos antes da morte do Prefeito; e no momento do mesmo seqüestro da criança.

Pois bem. O laudo pericial de fls. 1344/1348 comprovou que tais estojos foram disparados por uma mesma arma de calibre 45.

Assim, tem-se nos autos prova de que no dia 10 de setembro de 2001 o veículo do senhor Uilson Franco foi alvejado por disparos de uma pistola calibre 45, que foi utilizada no dia 14 do mesmo mês para seqüestrar uma criança. Igualmente está provado nos autos que no mesmo dia 10 de setembro de 2001 o então Prefeito de Campinas, Antônio da Costa Santos, foi assassinado e, para tanto, foi utilizada uma pistola de calibre 9 mm.; esta mesma arma foi também utilizada no dia 14 de mesmo mês para seqüestrar aquela referida criança.

Quem efetuou o seqüestro ? Segundo o próprio Réu WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA tal crime – em que foram utilizadas a pistola que matou o Prefeito e aquela utilizada na dupla tentativa de latrocínio – foi cometido por ele e por seus comparsas “Fiinho”, “Valmir”, “Puff” e “Cristiano”, ou seja, todos aqueles mencionados na denúncia e mais Cristiano Nascimento de Faria (fls. 2006/2016).

Cristiano, ouvido nestes autos como testemunha, já durante as investigações havia sido ouvido pelo Delegado de Polícia do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa, Dr. Luiz Fernando Lopes Teixeira. Conforme consta do termo de fls. 1455/1458, Cristiano foi ouvido no DHPP no dia 23 de abril de 2002, na presença dos Promotores de Justiça Drs. Carlos Eduardo Ayres de Farias e Fernando Pereira Vianna Neto, e do Advogado, então representante da família do ex-Prefeito, Dr. Ralph Tortima Stettinger.

Naquela oportunidade, Cristiano, entre outras coisas, relatou acerca de uma conversa que teve com Anderson José Bastos, vulgo “Anso” ou “Puff”, na cidade de Caraguatatuba, dias antes deste ser morto, juntamente com Valmir Conti, por policiais civis de Campinas.

Pedimos vênia para transcrever o trecho em questão: “…recorda-se que três dias antes de VALMIR e ANZO serem mortos em confronto com policiais de Campinas/SP, fato este ocorrido na Cidade de Caraguatatuba/SP, o depoente esteve nessa Cidade, sendo certo que em determinado momento manteve um diálogo com ANZO, lhe comentando que Campinas/SP estava ‘sujo’ após a morte do Prefeito, instante em que ANZO lhe disse que a morte do Prefeito de Campinas havia sido ‘uma cagada’, que ele estava ‘na hora erra e no lugar errado’. ANZO lhe disse ainda que naquela data ANZO, VALMIR, ANDINHO e FIINHO estavam num veículo, sendo certo que tentaram ‘guentar um veio de um Vectra Verde’, todavia este conseguiu fugir, momento em que VALMIR efetuou disparos contra aquele Vectra Verde; ANZO comentou também que durante a fuga desse crime frustrado, ‘pegaram a avenida e se encontraram com um Palio que os atrapalhou’, instante em que, segundo ANZO, este, ANZO, disse ao depoente ter efetuado disparos contra aquele veículo, comentando que inicialmente efetuou um disparo com a intenção de ‘assustar’ aquele motorista do Palio, e logo após disparou mais duas vezes contra o Palio; que não disse, conforme consta em seu depoimento anterior, que VALMIR teria também atirado contra o Palio, sendo certo que ANZO comentou com o depoente que VALMIR teria atirado somente contra o Vectra verde; o depoente não se recorda se ANZO lhe disse que havia descido do carro que ocupava logo após ter atirado ou em um momento posterior, todavia recorda-se claramente de ANZO ter lhe comentado que diante daquela situação, VALMIR tratou imediatamente de abandonar o veículo que ocupavam, pois havia ‘sujado’; ANZO lhe disse ainda que após ter ocorrido este fato, souberam através de noticiário de televisão que o ocupante daquele Palio tratava-se do Prefeito de Campinas, iniciando-se então uma discussão entre FIINHO e ANZO, pois FIINHO dizia que ANZO havia feito ‘uma cagada’”.

Como já afirmado, o relato acima foi presenciado pelo Advogado Dr. Ralph Tortima Stettinger, que, ouvido em Juízo, narrou em detalhes este passo importante das investigações (fls. 2258/2268).

Em Juízo, como sói acontecer, Cristiano procurou livrar seu amigo e camarada de crimes, o Réu WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA, de qualquer participação nestes fatos. Neste sentido, mentiu e mais adiante teceremos outras considerações e pediremos providências a respeito.

Apesar disso, Cristiano, mesmo em Juízo, não conseguiu ocultar parte da verdade, vindo a confirmar que teve de fato aquela conversa – mas por telefone – com Anderson José Bastos e confirmou o seu teor – exceção feita, repita-se, ao fato de estar o Acusado no interior do veículo (fls. 2017/2036).

Na mesma noite em que Antônio da Costa Santos era vítima de homicídio, a testemunha Sandra Antônia Fanuchi passava por momentos do mais absoluto desespero, conforme ela descreveu em seu pungente depoimento de fls. 2051/2061. A razão era simples: junto com sua filha adolescente, ela havia sido seqüestrada pela quadrilha de WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA. Naquela noite, a testemunha ouviu quando um rapaz que tomava conta do cativeiro recebeu uma ligação. Eis as frases que o ouviu proferir depois: “como mataram o ‘Toninho’ prefeito”, “’puta’ cara que besteira; que estupidez; que loucura; que burrice; não era para matar; precisava”; “só podia ser amador, deixa de ser burro, como pôde fazer isso”.


Cópia das peças do Inquérito Policial a respeito dos crimes de extorsão mediante seqüestro de Sandra e de sua filha encontram-se a fls. 3604/3641.

Quanto ao Vectra de cor prata, é certo que foi ele abandonado, conforme havia afirmado Cristiano Nascimento de Faria. Tal veículo foi encontrado com danos produzidos por abalroamento lateral, conforme mostram os laudos periciais de fls. 183/206 e 721/779. Tal tipo de dano também foi encontrado no Vectra do senhor Uilson Franco (cf. também fls. 183/206).

Não trazem surpresa alguma, diante de tal quadro probatório, as conclusões do laudo pericial de fls. 1533/1588. Este concluiu que o Vectra prata utilizado pela quadrilha de WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA foi o mesmo que abalroou lateralmente o veículo do senhor Uilson Franco na noite dos fatos.

Lembremos, ainda, que um Vectra prata foi visto, logo em seguida, passar pela Avenida Mckensie, passagem esta que coincidiu com o disparo que matou o então Prefeito.

O mesmo laudo pericial, então, analisou as gravações da fita de vídeo, com imagens captadas por uma câmera instalada em um supermercado, que filmava um pequeno trecho da Avenida Mackensie. A câmera captou a passagem de um carro, cujas dimensões eram compatíveis com o carro do ex-Prefeito. Mas a mesma câmara captou a passagem, logo em seguida, de um carro compatível com um GM Vectra, de cor clara, e com visíveis diferenças na regulagem dos faróis. E a perícia concluiu: a diferença dos faróis coincidia com aquelas encontradas no Vectra prata da quadrilha do Réu, e era resultado da colisão com o veículo de Uilson Franco. Ou seja, aquele Vectra prata – não outro qualquer – foi o veículo visto pelas testemunhas acima referidas.

Não bastasse, temos o interessante depoimento do também criminoso José Maria Nogueira Sá, vulgo Jotaquest, prestado à Delegacia Anti-Seqüestro de Campinas (DEAS), a fls. 4062/4065. Aquela pessoa confirmou que o veículo em questão foi trazido de Uberlândia e entregue a um dos membros da quadrilha do Réu WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA.

E, por fim, mas não menos importante, para acabar com qualquer alegação de que o Réu não estava na companhia de seus comparsas na noite do crime, o depoimento da testemunha ouvida em Juízo a fls. 4493/4505: ela relatou que, naquela mesma noite, antes de todos os fatos já expostos, sua casa foi invadida pelo bando liderado por WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA, por ela reconhecido. E mais: o bando chegou em um veículo Vectra, de cor prata, com placas de Uberlândia.

É o que basta. Impossível, pois, outra solução que não a pronúncia pelas acusações contidas na denúncia.

Neste sentido, vêm orientando-se nossos Tribunais:

“Desde que existam no processo provas que indigitem o acusado como autor do homicídio, não pode o juiz subtrair à apreciação do Tribunal Popular o julgamento, cuja atribuição ao mesmo decorre de cânone constitucional”.

“Admitida a certeza do homicídio, ante o exame de corpo de delito, no que respeita à autoria, contenta-se a lei tão-só com a ocorrência de indícios para a decretação da pronúncia. Dela não se exige o mesmo rigor, o mesmo peso de provas que, de ordinário, se tem como imprescindível para um juízo condenatório”.

“A pronúncia se impõe quando há indícios bem estruturados e com algumas expressões de razoabilidade no respeitante à autoria, especialmente para não se subtrair o ensejo de o agente ser julgado por seu juiz natural, o Tribunal do Júri”.

Por fim, a qualificadora apontada na denúncia deve ser mantida, eis que as provas colhidas em Juízo confirmaram sua ocorrência. Assim sendo, impossível o afastamento nesta fase processual. É o que vem repetidamente observando a jurisprudência pátria:

“A orientação jurisprudencial desaconselha a exclusão na pronúncia, das qualificadoras, salvo quando de manifesta improcedência. A Júri, em sua soberania, é que compete aprecia-las, com melhores dados, em face da amplitude da acusação e da defesa”.

“O afastamento de qualquer das qualificadoras apontadas pela acusação na denúncia só deve ter lugar quando houver prova plena de sua não existência ou absoluta ausência de sua ocorrência”.

Os delitos conexos, igualmente demonstrados, devem ser submetidos à apreciação do Conselho de Sentença.

Enfim, Excelência, a pronúncia do Réu é o caminho mais de acordo com as disposições constitucionais e legais a respeito do Tribunal do Júri. Qualquer dúvida porventura existente – que, em nós, inexiste – não autoriza a impronúncia, mas, ao contrário, recomenda o julgamento pelo Tribunal Popular. Do mesmo modo, toda e qualquer questão que demande aprofundada análise dos autos deve ser também submetida ao Conselho de Sentença.

V – Dos Crimes de Falso Testemunho

Requeremos a extração de cópia da denúncia, bem como das peças de fls. 1925/1930, 1967/1969, 2228, 2766/2767 e 3340/3375 e das presentes alegações finais, remetendo-as à Secretaria das Promotorias de Justiça Criminais de Campinas, para as providências cabíveis em face da prática de delito de falso testemunho, cometido pela testemunha alcunhada “Jack”.


Tal medida é necessária em vista das freqüentes contradições encontradas em todos os relatos prestados por tal testemunha. Parece-nos que tal pessoa altera seus depoimentos ao sabor das notícias veiculadas na grande imprensa, a respeito da situação política do País. Assim é que ora menciona políticos do PT como integrantes de uma suposta reunião em que se decidiu a morte do então Prefeito, ora coloca nesta mesma reunião político de outro partido. Além disso, todos aqueles que em algum momento procuram ouvi-lo, a partir do instante em que percebem as mentiras e se afastam, são depois alvos de acusações vis e levianas por parte da testemunha.

Vale lembrar que “Jack” chegou mesmo a figurar como testemunha de uma Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado e já de há muito o Tesouro vem gastando dinheiro para mantê-lo em sistema de proteção. Tais fatos são, para nós, inaceitáveis.

Recentemente, a testemunha chegou a ser presa em flagrante, na cidade de Amparo, justamente pela prática de crime de falso testemunho, conforme amplamente noticiado pelos veículos de comunicação de nossa cidade.

Requeremos, ainda, a extração de cópia da denúncia, bem como das peças de fls. 1358/1362, 1455/1458 e 2017/2036 e das presentes alegações finais, remetendo-as à Secretaria das Promotorias de Justiça Criminais de Campinas, para as providências cabíveis em face da prática de delito de falso testemunho, cometido pela testemunha Cristiano Nascimento de Faria.

Como já vista acima, Cristiano, a fim de favorecer seu comparsa, o Réu deste processo, mentiu em Juízo, ao negar que, em conversa mantida com Anderson José Bastos, este lhe dissera que WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA estava presente no Vectra prata quando do assassinato do ex-Prefeito.

Cristiano chegou a provocar risos nos presentes à audiência judicial quando passou a sistematicamente mentir, deixando de efetuar o reconhecimento fotográfico de seus comparsas e, inclusive, de si próprio.

Requeremos a extração de cópia da denúncia, bem como das peças de fls. 4506/4513 e 4514/4517 e das presentes alegações finais, remetendo-as à Secretaria das Promotorias de Justiça Criminais de Campinas, para as providências cabíveis em face da prática de delito de falso testemunho, cometido pela testemunha Geraldo Rodrigues de Lima.

Esta testemunha protagonizou uma das tentativas mais patéticas de favorecimento ao Réu WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA. Anunciado na grande imprensa como uma testemunha que mudaria os rumos deste caso, logo diante da primeira pergunta feita pelo Ministério Público viu-se que montanha pariu um rato. A testemunha, na verdade, tinha estreitas ligações como pessoas da quadrilha do Acusado e tentava fazer crer que uma pessoa cujo nome não sabia, ex-namorado de uma prostituta, cujos nome e paradeiro desconhece, teria sido o autor do delito. Chegou mesmo a indicar o possível paradeiro da arma de calibre 9 mm. utilizada no homicídio.

No entanto, conforme se depreende das peças de fls. 4595/4747, tal arma já havia sido periciada neste caso e mostrou-se incompatível com os estojos e projéteis utilizados na morte do Prefeito. Geraldo, aliás, já aparecia no inquérito cuja cópia está nas peças supra-indicadas, pois havia se prestado ao papel de figurante em auto de reconhecimento de pessoa (fls. 4615).

Outrossim, foi Geraldo desmentido pela testemunha Margarete Guimarães de Freitas (fls. 4514/1517).

VI – Do Pedido

Pelo exposto, aguarda-se seja o Réu WANDERSON NILTON DE PAULA LIMA pronunciado como incurso no artigo 121, § 2º, inciso IV, c.c. artigo 29; e no artigo 157, § 3º, segunda parte, c.c. artigo 14, inciso II, por duas vezes, tudo c.c. artigo 62, inciso I, e na forma do artigo 69, todos do Código Penal, para que seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri e, ao final, condenado.

Campinas, 29 de novembro de 2006.

ALEXANDRE MONTGOMERY WILD

Promotor de Justiça

CARLOS EDUARDO AYRES DE FARIAS

Promotor de Justiça

FERNANDO PEREIRA VIANNA NETO

Promotor de Justiça

RICARDO JOSÉ GASQUES DE ALMEIDA SILVARES

Promotor de Justiça

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