Um pedido de vista do ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu, pela terceira vez, o julgamento do inquérito instaurado contra o ex-deputado federal Armando Abílio (PSDB-PB). Ele é acusado de fraudar o vestibular da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Paraíba para que a sua filha fosse aprovada. Armando Abílio foi denunciado por estelionato e falsidade ideológica. A jovem, no entanto, não foi aprovada no exame.
Nesta quinta-feira (16/11), o ministro Carlos Ayres Britto abriu divergência ao apresentar seu voto-vista pelo recebimento da denúncia referente aos dois delitos: o estelionato e a falsidade ideológica.
Para o ministro Carlos Ayres Britto, é indiferente o fato de a denúncia ofertada pela Procuradoria Regional da República da 5ª Região ter classificado a conduta como estelionato e, posteriormente, a Procuradoria Geral da República ter redefinido-a na perspectiva da falsidade ideológica.
“As coisas se imbricam, de modo a atrair para a cola eletrônica a incidência de todos os elementos conceituais do crime de estelionato”, diz. Britto afirma ter como defensável também o enquadramento da cola eletrônica na tipificação de crime de falsidade ideológica. “É que a operação de compra e venda de antecipação das respostas corretas em exame de vestibular significa fazer inserir em documento particular declaração diversa da que devia ser escrita.”
Para o ministro, em qualquer das tipologias, a denúncia parece “robusta o suficiente para instaurar a ação penal a que se destina, visto que para o juiz processante é dado conferir nova qualificação penal aos fatos que lhe sejam submetidos, quando da prolação de sua definitiva peça decisória”.
Veja o voto
16/11/2006 TRIBUNAL PLENO
INQUÉRITO 1.145-2 PARAÍBA
V O T O - V I S T A
O SENHOR MINISTRO CARLOS AYRES BRITTO
Cuida-se de apreciar denúncia, noticiando a prática daquilo que a doutrina e a jurisprudência vêm designando como “cola eletrônica”. Traduzida esta, já se vê, no sub-reptício ato de transmitir, por meio eletrônico, respostas do tipo objetivo a pessoa(s) participante(s) de concurso público, ou, então, de vestibular em universidade federal de ensino.
2. Deveras, o que se tem nos presentes autos é a formulação de denúncia contra o deputado federal Armando Abílio Vieira e mais 5 (cinco) pessoas, todas enquadradas pelo Ministério Público Federal no crime de estelionato contra entidade de direito público (§ 3º do art. 171 do Código Penal Brasileiro). No caso, estelionato contra a Universidade Federal da Paraíba, praticado durante as provas do vestibular de medicina do ano de 1993, momento em que a filha do denunciado foi flagrada com “fones de ouvido” e aparelho receptor. Motivo pelo qual foi ela administrativamente afastada da competição.
3. À época, o denunciado Armando Abílio Vieira era Deputado Estadual, razão por que o Tribunal Regional da 5ª Região decidiu, em questão de ordem, solicitar autorização à Assembléia Legislativa da Paraíba para instaurar processo penal contra ele, denunciado. Isso ocorreu em 3 de novembro de 1993 (fls. 522), tal como exigido pela redação originária do § 3º do art. 53 da Constituição de 1988.
4. Prossigo no relato do feito para informar que o pedido de licença não ensejou nenhuma deliberação por parte da Assembléia Legislativa da Paraíba. Mais: o denunciado deixou de ser deputado estadual para se tornar deputado federal. Circunstância que forçou a remessa dos autos a esta Suprema Corte, que, de igual modo, oficiou à Câmara dos Deputados para obtenção da mencionada licença. Pedido, esse, que veio a ser expressamente indeferido, conforme documenta o ofício de fls. 619, subscrito pelo Deputado Michel Temer, então Presidente daquela Casa Legislativa da União.
5. Ante o indeferimento do pedido de licença, o ministro Maurício Corrêa determinou o desmembramento do feito para que a ação penal prosseguisse quanto aos demais acusados, permanecendo na esfera desta nossa Corte o sobrestado exame de denúncia contra o único Parlamentar Federal envolvido na trama das ações tidas por delituosas.
6. Foi quando surgiu a Emenda Constitucional nº 35/2001 (de 21/12/20001), que tornou desnecessária a autorização legislativa para o fim de deflagração de processo penal contra qualquer Parlamentar. O que motivou a retomada do curso do inquérito (na linha do que assentado no Inq 1.566, Rel. Min. Sepúlveda Pertence), com a intimação do Deputado Armando Abílio Vieira para apresentação de sua defesa.
Defesa que se traduziu na alegação de atipicidade da conduta imputada a ele, denunciado (que teria “comprado” para sua própria filha as respostas do vestibular), além de enfatizar que a denúncia padecia da falta de ratificação pelo Procurador-Geral da República; o que desrespeitaria a jurisprudência deste STF.
Comentários de leitores
6 comentários
Nanda (Estudante de Direito - Ambiental)
E as fraudes do Cespe? Nunca mais falaram nada.
Paulo Monteiro (Advogado Autônomo - Civil)
Parabéns ao ministro por ter a coragem de afirmar claramente: o rei está nu.
www.professormanuel.blogspot.com (Bacharel)
É mesmo um absurdo! Querer punir alguém só por tentar fraudar o vestibular? Como os filhinhos de papai vão conseguir cursar universidade gratuita? E daí que um aluno que realmente estudou poderia ter ficado de fora por causa disto? Este país e os comentaristas deste site vão de mal a pior...
Comentários encerrados em 27/11/2006.
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