Opção errada

É engano pensar que Justiça Federal é mais eficiente

Autor

  • Alberto Zacharias Toron

    é advogado defensor de Aldemir Bendine doutor em direito pela USP professor de processo penal da Faap e autor do livro "Habeas Corpus e o Controle do Devido Processo Legal" (Revista dos Tribunais)

16 de novembro de 2006, 16h29

A despeito de critérios estritamente jurídicos para a fixação da competência, está se disseminando entre nós a falsa idéia de que a Justiça Federal é aquela que reúne condições mais eficazes para combater determinados crimes e, por isso, além das hipóteses taxativas definidas na primitiva redação do artigo 109 da Constituição Federal, procura-se atrair para a sua competência também “os crimes contra os interesses da República Federativa do Brasil perante a ordem internacional”1.

Não foi por acaso que a Emenda Constitucional 45 criou a possibilidade de, “nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o procurador-geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, suscitar perante o Superior Tribunal de Justiça, (…), incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal” (CF, art. 109, § 5º).

Uma primeira leitura do novo dispositivo constitucional passa a impressão de que a Justiça Federal estaria, pela magnitude do bem atingido — os direitos humanos —, mais bem aparelhada para desenvolver a atividade persecutória ou, por outra, trataria de assuntos mais relevantes. Sem querer entrar nessa espinhosa discussão, a essa altura inócua porque o legislador já concretizou sua opção, é imperioso ressaltar que, afora a captis diminutio que isso representa para a jurisdição estadual, nada está a indicar que as coisas se passam melhor na Justiça Federal do que no âmbito das Estaduais.

Embora debruçado sobre antigo projeto do Executivo, como bem disse Inocêncio Mártires Coelho, com a autoridade de eminente constitucionalista e ex-procurador-geral da República, tornou-se público que, aos olhos da União, “tanto a Polícia quanto a Justiça estaduais, manipuladas por interesses locais, perderam as condições mínimas para reprimir lesões contra os direitos humanos e, por isso, deveriam ter confiscada essa relevante atribuição constitucional”2.

A verdade é que se está depositando nos ombros da Justiça Federal a esperança de que seja mais eficiente, isenta e rigorosa que, no entanto, não encontra amparo na realidade. É enganosa tal opção! Seja porque tal ramo do Judiciário não é necessariamente mais célere que o outro, seja porque nada indica que não esteja acometido dos mesmos males que a Justiça Estadual. Os recentes fatos envolvendo juízes federais e até os autodenominados desembargadores federais denunciam isto. Como realçou Inocêncio Mártires Coelho, quem imagina que a Justiça Federal ostente maior isenção para apurar os crimes em geral e, em particular, os que atingem os direitos humanos, está incidindo no equívoco de supor “a existência de um homem incondicionado, materializado na figura do juiz federal — um indivíduo impermeável e refratário às influências do meio; um personagem alheio ao que na vida é porosidade e comunicação; enfim, um magistrado acima de qualquer suspeita, a quem se deve atribuir, precisamente em razão de todos esses atributos celestes, a espinhosa missão de julgar os crimes contra os direitos humanos”3.

Agora, o presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Walter Nunes, reclama também a fixação da competência da Justiça Federal em relação a todos “os crimes contra os interesses da República Federativa do Brasil perante a ordem internacional”4, arrolando-se entre estes a repressão penal do assim chamado trabalho escravo que, na sistemática do Código Penal, se situa entre os crimes contra a liberdade individual e vem descrito no artigo 149 sob a rubrica de “redução a condição análoga à condição de escravo”.

A expressão “crimes contra os interesses da República Federativa do Brasil perante a ordem internacional” é tão ampla e vaga quanto à grave violação de direitos humanos e, uma vez adotada, ensejaria o reconhecimento da maior diversidade de crimes a ser doravante julgado pela Justiça Federal. Sim, porque o Brasil se comprometeu internacionalmente a reprimir os crimes contra a dignidade da mulher. Assim, por exemplo, toda a vez que ocorrer um estupro se poderia dizer que isso afeta os interesses da República, pois perante a ordem internacional estamos comprometidos em reprimir tal crime. Idem o tráfico de drogas de qualquer espécie, revele este internacionalidade ou não. O mesmo, a se adotar um critério tão amplo, valeria para os homicídios e toda a sorte de ações previstas no Código Penal, não se esquecendo de crimes como os popularmente chamados de pirataria (contrafação de marca, produtos, etc.).

Ou bem se adota um critério objetivo para se definir a competência da Justiça Federal, ou esqueçamos a Justiça Estadual e com ela a garantia do juiz natural e a própria idéia de federação.


No concerne ao crime de descrito no artigo 149, consistente na redução de alguém “a condição análoga à condição de escravo” a sistemática penal encarta-o, como já dito, entre os que atentam contra a liberdade individual. A doutrina, sem exceção, anota que o bem jurídico tutelado pelo tipo penal é a liberdade individual, isto é, o status libertatis da pessoa5. Não estamos, portanto, situados no campo dos crimes contra a organização do trabalho previstos entre os artigos 197 a 207 do Código Penal. Só por isso já se poderia dizer descabida a pretensão de se deslocar para o campo da Justiça Federal a competência para o processo relativo à violação ao artigo 149 do Código Penal. Bem por isso, os Delmanto, referindo um acórdão do TRF da 2º Região, anotam: “É da competência da Justiça Estadual, por não acarretar detrimento de bens, serviços ou interesse da União, de suas entidades autárquicas ou empresas públicas; tampouco está inserido entre os crimes contra a organização do trabalho, pois o Código Penal classifica-o como crime contra a liberdade pessoal (RT 786/763)”6.

Mas, independentemente do critério classificatório adotado pelo Código Penal, seria possível, numa tentativa de interpretação conforme a Constituição, considerar o crime do artigo 149 como crime contra a organização do trabalho? A resposta é igualmente negativa.

Em caso de acusação de trabalho escravo, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, tendo como relator o juiz Tourinho Neto, firmou a competência é da Justiça Estadual realçando o seguinte: “é da competência da Justiça Federal, Constituição Federal artigo 109, VI, processar e julgar os crimes contra a organização do trabalho, tomada essa organização em si, e não em relação a questões individuais, ou seja, quando o trabalho é atingido em sua feição orgânica. O ataque é contra os direitos dos trabalhadores considerados no seu todo. O crime deve ser praticado contra instituição ou órgãos que integram a organização do trabalho, atingindo, portanto, de uma maneira coletiva, os direitos do trabalhador. Assim não sendo praticado, a competência é da Justiça Estadual (cf. Súmula 115/TFR). Na hipótese, o fato foi praticado em um imóvel rural, atingindo 53 trabalhadores rurais, individualmente”7. Ou, mais enfaticamente: “O tipo do artigo 149 do Código Penal, redução de trabalhador à condição análoga a de escravo, classificado como crime contra a liberdade individual, não é considerado como crime contra a organização do trabalho, coletivamente considerada, não configurando, portanto, a competência da Justiça Federal — artigo 109, VI da CF, Súmula 115 do TRF”8.

Daí o fato de, quanto aos crimes contra a organização de trabalho, Antônio Scarance Fernandes sublinhar: “é pacífico o entendimento de que só são da competência da Justiça Federal aqueles que ofendem a própria organização geral do trabalho ou os direitos dos trabalhadores considerados coletivamente, não quando se tratar de lesão a direito individual do trabalho”9.

De fato, a atual Constituição Federal estipulou, conforme elucida José Afonso da Silva, que os direitos relativos aos trabalhadores são de duas ordens fundamentais: “a) direitos dos trabalhadores em suas relações individuais de trabalho, que são os direitos dos trabalhadores do artigo 7º, e b) direitos coletivos dos trabalhadores (artigos 9º a 11), que são aqueles que os trabalhadores exercem coletivamente ou no interesse de uma coletividade deles, e são: os direitos de associação profissional ou sindical, o direito de greve, o direito de substituição processual, o direito de participação e, por fim, o direito de representação classista”10.

Ocorre que na hipótese da redução análoga à condição de escravo não existe lesão, nem em tese, aos direitos compreendidos nos artigos 9º, 10º e 11 da Constituição Federal, que autorizariam o deslocamento da competência para a esfera Federal. Portanto, é da sistemática constitucional, conjugada com a penal, que também se extrai ser o crime em foco da competência da Justiça Estadual.

No Superior Tribunal de Justiça, ao contrário do que sustentou Walter Nunes, vigora o entendimento de que a competência nos casos de “trabalho escravo” é da Justiça Estadual: “Por certo, não há confundir os interesses do Estado brasileiro (artigos 1º e 18, CRFB), que não se restringe à União (artigos 20 a 24, CRFB), com o interesse jurídico desta.

A questão, que resulta de notícia trazida a conhecimento judicial por trabalhadores e pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Açailândia, além de fiscais do trabalho, trata da manutenção de indivíduos em propriedade rural, submetidos a excessiva jornada, infimamente remunerada, à margem da legislação previdenciária, sujeitos a endividamento crescente, sob ameaça e vigilância ofensivas, de maneira a impedi-los de abandonar o local de trabalho, enquanto não quitassem as dívidas contraídas.


Conduto, não será o conjunto de 86 indivíduos que definirá, em termos de coletividade, o alcance da suposta ofensa, para alçá-la como lesiva à organização geral do trabalho, posto que a conduta tida por delinqüente não abarca nem compromete, no todo, tal bem jurídico.

Para além do inadequado critério aritmético, é necessário notar que o interesse do Estado em proteger o status libertatis individual não é suficiente para, per se, deslocar, para a Justiça Federal, a competência para processar e julgar casos desta espécie, pois, se assim fosse, todas as hipóteses de violência, em especial a urbana, bem como qualquer conduta delituosa capaz de causar dano à liberdade individual ou à dignidade da pessoa haveriam de ser julgados por Juízes federais, raciocínio que, sem dúvida, não reflete a melhor interpretação da lei.

Do mesmo modo, não há porque conferir à Justiça Federal a competência para julgar feito afeto aos tipos contidos na denúncia, porque não se cuida de crimes cometidos contra a organização do trabalho ou de lesão a bens, serviços ou interesse da União.

O juiz natural, tanto quanto o devido processo legal, são garantias constitucionais inarredáveis e imbricadas, que não se excluem sem ofensa à Carta Magna”11.

Também a 3ª Seção do STJ, dirimindo um Conflito de Competência, já se pronunciou sobre o tema: “Depreende-se dos autos que aos acusados são imputadas às práticas dos delitos de aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional e de suas reduções à condição análoga à de escravo. Contudo, tais fatos não podem ser considerados como delitos contra a Organização do Trabalho, de competência federal, porque não houve ofensa ao sistema de órgãos e instituições que preservam coletivamente os direitos e deveres dos trabalhadores. Os delitos foram cometidos contra determinado grupo de trabalhadores refugindo, portanto, a competência federal para o julgamento da lide”12.

Observa-se que tal julgado foi proferido depois que o Brasil subscreveu o Pacto de São José da Costa Rica e o fato não abalou a competência da Justiça Estadual.

No Supremo Tribunal Federal, é antigo o entendimento segundo o qual “A expressão ‘crimes contra a organização do trabalho’, utilizada no referido texto constitucional, não abarca o delito praticado pelo empregador que, fraudulentamente, viola direito trabalhista de determinado empregado. Competência da Justiça Estadual. Em face do artigo 125, inciso VI, da Constituição Federal, são de competência da Justiça Federal apenas os crimes que ofendem o sistema de órgãos e instituições que preservem, coletivamente, os direitos e deveres dos trabalhadores”13.

Na linha do precedente da lavra do ministro Moreira Alves, ergueu-se sólida e justa jurisprudência sobre o tema como se percebe do seguinte julgado relatado pelo ministro Ilmar Galvão: “Em face do mencionado texto, são da competência da Justiça Federal tão-somente os crimes que ofendem o sistema de órgãos e institutos destinados a preservar, coletivamente, os direitos e deveres dos trabalhadores” (RE n.º 156.527-6/PA, DJ 27.05.94). E no corpo do v. aresto, vem destacado:

“… Interpretando o atual dispositivo constitucional, o STF e demais tribunais distinguem entre: a) crimes que ofendem o sistema de órgãos e instituições destinados a preservar coletivamente o trabalho; b) crimes que apenas violam os direitos de determinados trabalhadores. Apenas os primeiros (a) são da competência da Justiça Federal, enquanto que os outros b) competem à Justiça Estadual” (…) Jurisprudência: só competem à Justiça Federal os crimes que ofendam os sistema de órgãos e institutos que preservam coletivamente os direitos do trabalho, e não os crimes que são cometidos contra determinados trabalhadores (STF, Pleno, RE 90.042, TRJ 94/1227, RHC 62.896, RTJ 115/1126…)” (RE n.º 156.527-6/PA, DJ 27.05.94).

E conclui:

“as demais imputações criminosas, referidas no parecer do Ministério Público Federal, quais sejam os arts. 149, 227, 228, 229 e 230, do Código Penal, são, indubitavelmente, da competência da Justiça Estadual. (…) A narrativa dos autos, tal como oferecida, não contém notas caracterizadoras do crime contra a organização do trabalho, na abrangência que lhe dá a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Cuida-se, pois, de condutas individuais de empregador que não ofendem órgãos e instituições que preservam os direitos e deveres dos trabalhadores em coletividade, como força de trabalho” (RE n.º 156.527-6/PA, DJ 27.05.94).

Aliás, o ministro Moreira Alves, no julgamento do Recurso Extraordinário 300.244-9/SC, foi enfático ao afirmar que “o interesse da União para que ocorra a competência da Justiça Federal prevista no artigo 109, IV, da Carta Magna tem de ser direito e específico, e não, como ocorre no caso, interesse genérico da coletividade, embora aí também incluído genericamente o interesse da União” (DJ 19.12.2001). Nesse sentido, a interpretação dada pelo ministro Bilac Pinto em prestigioso julgado no qual afirmava que “a fórmula constitucional referente aos “interesses da União” deve ser interpretada como atinente apenas àqueles interesses diretos e inequívocos da Federação como um todo homogêneo. A interpretação ampla e extensiva do dispositivo levaria, sem dúvida, a extremos indesejáveis, já que, por via oblíqua, nenhum ilícito penal poderia ser inteiramente estranho aos interesses da União Federal” (RHC n.º 50.268, DJ 28.03.1973).


E ainda: “O inciso IV do artigo 109 da Constituição, ao atribuir competência à Justiça Federal para processar e julgar as infrações penais praticadas em detrimento de interesse da União, não tem a extensão pretendida pelos impetrantes, até porque no cenário desta singular amplitude seria muito difícil excluir alguma infração penal que não fosse praticada em detrimento dos interesses diretos ou indiretos da União” (STF, rel. Min. Maurício Correa, HC n.º 75.404-0/DF, DJ 27.04.2001).

Agrega-se a tudo, o acórdão paradigmático do pleno do colegiado do STF, que se aplica com perfeição ao tema objeto de estudo. No voto do ministro Thompson Flores, tratando sobre a limitação da competência da Justiça Federal, define-se bem a matéria da competência da Justiça Federal: “ampliá-la importaria sua denegação pela absoluta falta de meios adequados para seu mais amplo exercício. Assim, a distinção que a maioria está fazendo é, a meu ver, a única forma de justificar o regular exercício da competência da Justiça Federal aos crimes sobre a Organização do Trabalho. Somente quando ele afeta a ordem econômica ou social, originando perturbação que não se compreenda em crimes contra a própria Segurança Nacional, da competência da Justiça Militar, é que cabe na jurisdição da Justiça Federal” (RE n.º 90.042-SP, DJ 30.10.1979).

Não obstante a clareza da matéria, o ministro Joaquim Barbosa, no julgamento do RE 398.041-PA, revendo a jurisprudência da Suprema Corte, propôs em 3 de março de 2005 que se considerasse o delito de redução do trabalhador a condição análoga à de escravo como da competência da Justiça Federal. O argumento central é o de que “quaisquer condutas que violem não só o sistema de órgãos e instituições que preservam, coletivamente, os direitos e deveres dos trabalhadores, mas também o homem trabalhador, atingindo-o nas esferas em que a Constituição lhe confere proteção máxima, se enquadram na categoria dos crimes contra a organização do trabalho, se praticadas no contexto de relações de trabalho. Concluiu que, nesse contexto, o qual sofre influxo do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, informador de todo o sistema jurídico-constitucional, a prática do crime em questão se caracteriza como crime contra a organização do trabalho, de competência da justiça federal (CF, art. 109, VI)”14. É bom dizer que os votos dos ministros Cezar Peluso e Carlos Velloso prestigiam “a jurisprudência do STF no sentido de que apenas compete à Justiça Federal o julgamento de crimes contra a organização do trabalho que afetem diretamente o sistema de órgãos e instituições do trabalho”15.

A tese sufragada pelo voto do ministro Joaquim Barbosa e já acompanhada por três outros ministros merece profunda reflexão. Sim, pois a se entender que a afetação do trabalhador “na esfera de proteção máxima” que a Constituição Federal lhe confere se caracteriza como crime contra a organização do trabalho, de competência da justiça federal (CF, art. 109, VI), teremos hipóteses das mais diversas ensejando o deslocamento da competência da estadual para a federal. É que o conceito do que seja a “esfera de proteção máxima” conferida ao trabalhador pode, segundo as inclinações ideológicas do intérprete, ou suas idiossincrasias, implicar nas mais díspares inclusões ou exclusões. Ademais, a idéia de crime contra a organização do trabalho não pode vir confundida com a vulneração dos interesses fundamentais dos trabalhadores. Do contrário, até mesmo as hipóteses de homicídio decorrente da atividade laboral virão para a órbita da justiça do trabalho. Afinal, com carradas de razões se pode dizer que mais caro que a liberdade individual, é a própria vida.

Afora o mais, no debate que se travou por ocasião do julgamento do RE 398.041-PA, o ministro Sepúlveda Pertence trouxe a questão dos vínculos de dependência das autoridades locais, o que tornaria mais salutar a colocação da repressão aos cuidados da Polícia Federal e a competência da correlata justiça, dotadas da independência necessária. O argumento coloca em pauta uma questão que já foi tormentosa, mas na República Velha tão bem retratada na obra do imortal Victor Nunes Leal 16, quando a Polícia e a Justiça locais estavam debaixo do tacão do coronel.

Há muito tempo que as policiais estaduais, com todos os defeitos que possam ter (e dos quais a federal não está infensa) estão profissionalizadas, seguindo as determinações de juízes estaduais concursados e colocados nas diferentes comarcas por critérios objetivos. De outro lado, a atuação dos promotores de Justiça, no controle externo da polícia e na condução da repressão aos crimes não pode ser diminuída. Enfim, por que se pode dizer que “a força federal”, compreendida aí a polícia e o judiciário, é mais independente? Estaria presente aquele preconceito que parece se erguer contra a jurisdição penal estadual ou um novo modismo de glorificação à jurisdição federal?

Como quer que seja, o fato é que o alargamento da competência da justiça federal, mediante a adoção de critérios vaporosos, gerará todo tipo de insegurança e, quando não, um sem número de ofensas à garantia do juiz natural.

Notas de rodapé

1 – Assim, em expressivo artigo, “Impasse na luta contra o trabalho escravo”, o juiz federal Walter Nunes da Silva Júnior, atual presidente da Ajufe, em artigo publicado na Folha de S. Paulo de 13/11/06, p. A3 e no site Consultor Jurídico.

2 – Revista da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios nº 11, janeiro/junho 1998, Brasília/DF, págs. 83/100.

3 – Idem.

4 – “Impasse na luta contra o trabalho escravo”, cit.

5 – Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de direito penal, São Paulo, ed. Saraiva, 5ª ed., 2006, II/485; Celso Delmanto et alli, Código Penal Comentado, Rio de Janeiro, ed. Renovar, 6ª ed., 2002, p. 320; José Henrique Pierangelli, Manual de direito penal brasileiro: parte especial, São Paulo, ed. Revista dos Tribunais, 2005, p. 257; e, por todos, Hungria, Comentários, Rio de Janeiro, ed. Forense, 5ª ed., 1982, VI/199, n.º 164.

6 – Código Penal Comentado, ob. cit., p. 321. Na mesma linha, mais recentemente, decidiu também o TRF da 1ª Região no Habeas Corpus 2005.01.00.023009-0, rel. juiz Hilton Queiroz, m.v., j. 28/6/05, DJ 22/9/05. Observa-se que o voto vencido apenas propunha o não-conhecimento da impetração por entender que o juiz não era autoridade coatora.

7- HC n.º 2004.01.00.042385-6/MT, DJ 03/12/2004

8 – TRF da 1ª Região, juiz Cândido Moraes, 2ª Turma Suplementar, ACR n.º 1998.01.00.064116-1/PA, DJ 15/08/2002.

9 – Processo Penal Constitucional, São Paulo, ed. Revista dos Tribunais, 1999, p. 154.

10 – Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo, Editora Malheiros, 18º ed., 2000,p. 291.

11 – 6ª T., RHC n.º 15.702, rel. ministro Paulo Medina, DJ 22/11/04.

12 – CC n.º 23.514, DJ 16/11/99, rel. ministro Fernando Gonçalves. Nessa mesma de entendimento confiram-se os seguintes julgados: CC n.º 34424, rel. ministra Laurita Vaz DJ 16/6/03; CC n.º 33505, rel. Min. Paulo Medina, DJ 09/12/03 e CC n.º 29851, rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ 17/9/01).

13 – STF, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, RE n.º 90.042, DJ 05/10/79.

14 – Citação colhida do Informativo do STF n.º 378, de 4/3/05.

15 – Idem.

16 – Coronelismo enxada e voto, São Paulo, ed. Alfa-Omega, 2ª ed., 1975.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!