Juízes fazem autocrítica em pesquisa feita pela AMB
15 de novembro de 2006, 19h29
A população tem suas críticas em relação ao Judiciário, mas os juízes também estão insatisfeitos com o sistema judicial do país. Essa é a conclusão do levantamento de opinião feito e divulgado pela Associação dos Magistrados Brasileiros divulgado nesta quarta-feira (15/11), na abertura de seu encontro anual.
A pesquisa mostra o inconformismo dos juízes com os fatores da impunidade do país, como a qualidade das leis, a estrutura penitenciária, a cultura das relações de trabalho e o sistema político-partidário, que se assenta sobre regras que atendem mais o interesse dos políticos que os da população.
Assim, afirmam os juízes, a Justiça Eleitoral não foi eficiente no combate à repressão do poder político e econômico durante as campanhas eleitorais deste ano. Também não se mostrou devidamente atuante ao examinar as contas dos partidos políticos e candidatos. Por outro lado, a magistratura quer poderes normativos e não apenas administrativos para a justiça eleitoral.
A insatisfação da classe, reflete a própria situação eleitoral vivida nas eleições gerais deste ano. Mudanças na legislação de última hora tornaram as campanhas mais limpas e transparentes, mas também criaram insegurança entre candidatos e eleitores. Velhos hábitos, como a prática de caixa 2, explodiram em escândalos que tumultuaram o processo, como o caso do dossiê PT-Sanguessugas. Diante deste quadro é que se deve avaliar o desempenho da Justiça Eleitoral.
De acordo com a pesquisa, a maioria dos 3 mil juízes entrevistados considerou ruim a atuação da Justiça Eleitoral. Apenas 20,4% consideraram que a Justiça Eleitoral teve um desempenho muito bom ou bom para analisar as contas dos candidatos.
Em contrapartida, para os juízes, o controle da propaganda eleitoral foi satisfatório. Dos entrevistados, 50% avaliaram a atuação da Justiça Eleitoral como muito boa ou boa e 30,%, como regular. As urnas eletrônicas tiveram aprovação de quase todos os entrevistados: 83,3% classificaram como muito boa.
Os entrevistados também se mostraram preocupados com a questão da reforma política e da possível reformulação da legislação e atuação da Justiça Eleitoral. A maioria deles (65,7%), por exemplo, não concorda com a afirmação de que a Justiça Eleitoral deveria ser exclusivamente administrativa, portanto sem competência para expedir normas e resoluções para a regulamentação do processo eleitoral.
Debate amplo
A pesquisa deve nortear os rumos dos debates do XIX Congresso Brasileiros de Magistrados — Desenvolvimento: uma questão de Justiça, promovido pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) em Curitiba de 15 a 18 de novembro. Coordenado pela cientista política Maria Tereza Sadek, o levantamento mostra a opinião de três mil juízes sobre temas que pautaram os encontros da comunidade jurídica neste ano: relações trabalhistas, escola da magistratura, político-eleitoral, penal e ambiental.
Nas questões trabalhistas, os juízes se mostram satisfeitos com a legislação. A maioria é a favor da manutenção das leis trabalhistas. “O juiz entende que não houve de fato uma modernização da Justiça do Trabalho, por isso não há porque reformar a lei”, acredita o juiz Roberto Siegmann, vice-presidente da associação.
A maioria, por exemplo, discorda que a legislação provoque impactos negativos no desenvolvimento do país. Apenas para 8,9% a legislação brasileira sobre trabalho impede diretamente a vinda de empresas estrangeiras para o país. Em contrapartida, 21,2% dos juízes considera que as leis bloqueiam o crescimento do trabalho formal.
A pesquisa revela uma grande preocupação dos juízes para que a Justiça se especialize no Direito Ambiental. A maioria deles (50,9%) avalia a atuação do Judiciário como “ruim” na matéria. A culpa talvez não esteja da legislação, aprovada por 44,9% dos juízes que responderam a pesquisa. A solução estaria na criação de varas especializadas, proposta apoiada por mais de 74% dos juízes.
Veja os números da pesquisa:
Qual o seu grau de concordância em relação às afirmações segundo as quais a existência da legislação trabalhista provoca impactos negativos no desenvolvimento do País, impede a vinda de empresas estrangeiras e o crescimento do emprego formal?
|
|||||
|
Concordo |
Discordo |
Sem opinião |
||
|
total |
parcial |
parcial |
total |
|
Impactos negativos no desenvolvimento do país |
10,8 |
35,5 |
12,0 |
35,6 |
6,1 |
Impede a vinda de empresas estrangeiras |
8,9 |
28,6 |
16,0 |
35, 6 |
9,9 |
Impede o crescimento do emprego formal |
21,2 |
34,8 |
11,5 |
26,1 |
6,4 |
Como o(a) Sr.(a) avalia a atuação da Justiça Eleitoral em relação aos seguintes aspectos: |
|||||
Aspectos |
Muito boa |
Boa |
Regular |
Ruim |
Sem opinião |
Controle da possibilidade de determinados indivíduos participarem do processo eleitoral como candidatos |
22,8 |
27,9 |
25,4 |
20,0 |
3,8 |
Controle da propaganda eleitoral |
21,9 |
28,1 |
30,5 |
17,1 |
2,5 |
Repressão ao abuso do poder político ou econômico da campanha |
17,7 |
11,6 |
26,0 |
42,2 |
2,5 |
Efetividade da legislação eleitoral |
17,8 |
27,2 |
36,3 |
15,6 |
3,1 |
Efetividade dos provimentos judiciais |
18,4 |
32,7 |
33,6 |
11,7 |
3,6 |
Exame das contas dos partidos políticos e dos candidatos |
12,7 |
7,7 |
21,4 |
55,0 |
3,2 |
Apuração eletrônica dos votos |
83,3 |
11,8 |
2,0 |
0,7 |
2,2 |
|
|||||
|
Ótimo |
Bom |
Regular |
Ruim |
Sem opinião. |
Leg. ambiental |
19,1 |
44,9 |
23,8 |
7,2 |
5,1 |
Executivo |
0,8 |
7,4 |
36,4 |
50,9 |
4,4 |
Legislativo |
1,1 |
12,1 |
37,8 |
43,3 |
5,7 |
Judiciário |
3,2 |
30,8 |
44,6 |
16,2 |
5,1 |
MP |
9,3 |
35,5 |
35,1 |
16,0 |
4,1 |
Polícia Militar |
2,5 |
16,3 |
39,2 |
35,4 |
6,7 |
Órgãos técnicos |
2,8 |
17,7 |
37,6 |
37,5 |
4,4 |
ONGs |
8,0 |
34,3 |
33,7 |
16,2 |
7,8 |
Prioridade para decidir |
||||
|
Máxima |
Média |
Baixa |
Sem opinião |
Questão ecológica |
70,9 |
22,3 |
1,4 |
5,4 |
Desenvolvimento econômico-social |
30,6 |
54,4 |
9,2 |
5,8 |
Aspectos sociais |
44,3 |
44,1 |
5,8 |
5,7 |
Aspectos culturais |
29,8 |
49,8 |
14,6 |
5,8 |
Legislação |
38,1 |
48,4 |
7,6 |
5,9 |
Qual a sua avaliação das seguintes propostas:
|
||||||
|
Total a favor |
A favor |
Indi- ferente |
Contrário |
Total |
Sem opinião |
Criação de vara especializada |
39,1 |
35,1 |
11,7 |
8,7 |
1,7 |
3,6 |
Definição mais clara de competências entre diversos níveis de governo para atuar em questões ambientais |
48,2
|
43,0
|
3,8
|
0,6
|
0,2
|
4,2
|
Criação de legislação ambiental específica para diferentes setores econômicos |
29,9
|
38,7
|
12,0
|
11,3
|
1,6
|
6,5
|
Limitação do poder normativo dos órgãos ambientais |
18,9 |
37,9 |
12,4 |
20,8 |
1,9 |
8,1 |
Especialização dos juízes em direito ambiental |
49,1 |
36,6 |
7,0 |
3,5 |
0,9 |
2,9 |
Criação de um “manual de prática ambiental judicial” para juízes |
42,3 |
36,9 |
10,5 |
4,7 |
1,8 |
3,9 |
Constituição de assessorias de peritos especializados |
46,5 |
41,0 |
5,6 |
2,3 |
0,9 |
3,6 |
Criação de Tribunal Agrário |
16,8 |
18,2 |
16,4 |
30,7 |
11,4 |
6,6 |
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