Troca de arquivo

É legal fazer download musical, afirma juíza da Espanha

Autor

  • Nehemias Gueiros Jr

    é advogado especializado em Direito Autoral Show Business e Internet professor da Fundação Getúlio Vargas-RJ e da Escola Superior de Advocacia — ESA-OAB/RJ consultor de Direito Autoral da ConJur membro da Ordem dos Advogados dos Estados Unidos e da Federação Interamericana dos Advogados – Washington D.C. e do escritório Nelson Schver Advogados no Rio de Janeiro.

10 de novembro de 2006, 15h49

Sempre dissemos que a inexorabilidade da tecnologia, em sua quase totalidade, a torna positiva e boa para a sociedade. Até mesmo o avanço científico da ciência da guerra tem alguns poucos desdobramentos úteis para a sociedade, como o radar e os motores a reação, entre outros.

O mesmo está ocorrendo com o download de conteúdo da internet. Inicialmente rotulado de criminoso e eivado de vício jurídico por ferir as leis de direitos autorais, a tecnologia de “baixar” músicas e textos da web parece que chegou mesmo para ficar. Desde o acirrado embate entre a indústria musical americana e o jovem Shawn Fanning, criador do Napster, nunca mais o mercado fonográfico mundial foi o mesmo. Interditado o Napster por decisão judicial, dezenas de outros surgiram, tornando a atividade de “baixa” de músicas da rede mundial de computadores uma coisa banal e literalmente incontrolável.

As coisas começam a tomar novo rumo. Uma juíza da cidade espanhola de Santander, absolveu esta semana o réu de um processo que estava sendo acusado de crime autoral por compartilhar músicas na internet em regime P2P. Na decisão, a juíza criminal Paz Aldecoa absolveu um homem (J.M.L.H.), que estava sujeito a dois anos de prisão, sob a alegação de que o download de músicas para uso exclusivamente individual não pode ser considerado crime e está amparado pelo direito de cópia privada.

O réu fazia cópias digitais das músicas que baixava da rede e oferecia-as a outros internautas através de chats e blogs na rede, sem, contudo, cobrar nada por isso.

Na sentença, a juíza decide que “considerar delito a baixa de músicas pela Internet sem finalidade lucrativa, implicaria na criminalização de comportamentos socialmente admitidos e que a finalidade dessa atividade não constitui enriquecimento ilícito, mas, apenas, o desejo de obter cópias para uso privado”.

Entre os autores da ação estão o Ministério Público espanhol, a Associação Fonográfica e Videofonográfica Espanhola (AFYVE) e a Associação Espanhola de Distribuidores e Editores de Software de Entretenimento (Adese), que pediam 2 anos de prisão, multa de 7.200 euros e uma indenização de 18.361 euros para a Afyve.

A juíza argumentou ainda que para que se caracterize o delito contra a propriedade intelectual é necessário que ocorra o animus de lucro, o que não ocorria com o acusado. “Ele não mediava preço nem apareciam outras contraprestações além do compartilhamento de músicas com outros usuários em forma gratuita, o que está previsto no artigo 31 da Lei de Propriedade Intelectual espanhola, que permite a cópia privada” finalizou ela.

Trata-se de decisão inédita no mundo, que pode tornar-se um case law paradigmático, nestes tempos em que entidades como a RIAA – Recording Industry Association of America, órgão que congrega todas as gravadoras majors nos EUA está processando intensamente todos os internautas e empresas engajados em download musical gratuito, já tendo ajuizado mais de 3 mil ações.

Boa notícia para os fãs da tecnologia digital e que revela o anacronismo da indústria fonográfica mundial, verdadeiro cartel comercial, que privilegia um modelo-de-negócios ultrapassado, baseado na busca do lucro através de mecanismos artificiais de sucesso que determinam a exploração excessiva dos talentos artísticos dos seus contratados.

A baixa de músicas pela internet criou um novo produto musical e já resultou em substancial queda de preços no mercado, fazendo as vendas de CDs despencarem uma média de 30% ao ano. São as grandes empresas globais da música, as chamadas majors, que deveriam estar liderando esse processo de conversão tecnológica, não apenas pelos grandes recursos financeiros e técnicos de que dispõem, mas principalmente porque a vida na sociedade contemporânea é dinâmica, o Direito precisa acompanhar esse dinamismo para regulamentar essa tendência, pois os modelos comerciais antigos não irão subsistir por muito mais tempo.

Ponto para o Direito Autoral e para os defensores de uma maior flexibilidade das leis autorais, permitindo um maior acesso da sociedade à cultura e o estabelecimento de uma mecânica mais equânime e menos severa de remuneração pela utilização econômica de obras intelectuais.

Autores

  • é advogado especializado em Direito Autoral, Show Business e Internet, professor da Fundação Getúlio Vargas-RJ e da Escola Superior de Advocacia — ESA-OAB/RJ , consultor de Direito Autoral da ConJur, membro da Ordem dos Advogados dos Estados Unidos e da Federação Interamericana dos Advogados – Washington D.C. e do escritório Nelson Schver Advogados no Rio de Janeiro.

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