Processo fatiado

Inquérito do mensalão deve ser desmembrado, decide Supremo

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9 de novembro de 2006, 16h31

Todos os envolvidos no caso do mensalão cujas práticas se relacionam com atividades de detentores de foro privilegiado serão processados e julgados pelo Supremo Tribunal Federal. Não vingou a proposta do relator, ministro Joaquim Barbosa, de remeter à primeira instância todos os denunciados que não detêm prerrogativa de foro. O processo será desmembrado, mas pela forma intermediária proposta por Sepúlveda Pertence.

A decisão foi tomada nesta quinta-feira (9/11). No entanto, o caso volta a Plenário na próxima semana para que seja decidido quem fica no Supremo e quem vai para a primeira. Devem ser julgados pelo Supremo os acusados de comandar o esquema: José Dirceu, Marcos Valério e Delúbio Soares.

A decisão, por 6 votos a 5, favorável ao desmembramento acatou o voto médio do ministro Sepúlveda Pertence, definindo que o desmembramento se dará apenas nas hipóteses em que não haja co-autoria de crime com detentores de prerrogativa de foro privilegiado.

Os onze ministros reunidos decidiram que ficará a cargo do relator do caso, ministro Joaquim Barbosa, que agora funcionará como um “delegado” do Supremo, fazer um proposta de desmembramento de acordo com o sistema sugerido pelo ministro Sepúlveda Pertence. O inquérito reúne 40 pessoas, entre políticos e empresários, denunciados por mais de seis crimes, entre eles, peculato, corrupção, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

O relator do inquérito apresentou voto pelo desmembramento do processo sugerindo a separação de seis dos acusados, que detêm prerrogativa de foro privilegiado, entre eles o deputado eleito José Genoino (PT-SP), e os parlamentares João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e João Magno de Moura (PT-MG).

Para o relator, o número elevado de denunciados faz com que a instrução seja lenta e que em prol da celeridade o processo deveria caminhar desfragmentado. Joaquim Barbosa se apoiou no artigo 80 do Código de Processo Penal que prevê o desmembramento de processo em caso de excessivo número de acusados. “Embora informações importantes possam ser desconectadas, me mantenho fiel à jurisprudência da casa”, disse.

No julgamento, Joaquim Barbosa foi acompanhado pelos ministros Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso e Marco Aurélio e, em parte, pelo ministro Sepúlveda Pertence. O decano da Corte concordou com o desmembramento, mas não da forma que propôs o relator.

O ministro Ricardo Lewandowski, que votou pelo desmembramento foi o primeiro ministro a tocar na questão da prescrição. “Voto com o eminente relator pelo desmembramento do processo para impedir a prescrição e conferir celeridade processual”, disse o ministro. Em seguida foi acompanhado pelos ministros Carlos Ayres Britto e Cezar Peluso que demonstraram as mesmas preocupações.

“O excessivo número de denunciados é motivo suficiente para desmembrar. Me preocupa que o processo se atrase. A desunidade do processo se impõe”, afirmou Britto. Peluso reforçou o argumento dizendo não ver considerável relevância para se manter o processo unido.

O ministro Gilmar Mendes, que votou pelo não desmembramento do processo, reclamou da “perda de tempo” do plenário em discutir a questão de ordem levantada pela relator, que era justamente o desmembramento ou não do processo. “Poderíamos já estar decidindo sobre o recebimento da denúncia”, disse Gilmar inconformado.

Para Gilmar, o número excessivo de réus não pode ser motivo para o desmembramento do processo neste caso. De acordo com o ministro a denúncia da Procuradoria Geral da República mostra uma teia de fatos complexos que não podem ser analisados em separado.

A divergência foi aberta pela ministra Cármen Lúcia. Ela defendeu que a instrução não poderia perder a conectividade. Acompanharam seu voto os ministros Eros Grau, Celso de Mello, Gilmar Mendes, e a presidente da Corte, ministra Ellen Gracie que votou para o desempate.

Terminado o julgamento o ministro Celso de Mello expôs sua opinião à ConJur. De acordo com o ministro, a Constituição de 1988 pluralizou de modo excessivo as hipóteses de prerrogativa de foro, ampliando para quase 20 hipóteses. Disse que o foro privilegiado é uma chance única ao passo que o processamento pela primeira instância deixa a possibilidade de recurso. Ele observou, ainda, que o desmembramento do processo poderia comprometer a apuração dos fatos e gerar decisões contraditórias sobre a mesma denúncia.

Histórico

Em abril, o Ministério Público Federal denunciou 40 pessoas acusadas de envolvimento no esquema do mensalão. Entre os denunciados estão os ex-ministros José Dirceu e Luiz Gushiken, os ex-dirigentes do PT José Genoíno, Delúbio Soares e Sílvio Pereira, o empresário Marcos Valério, e os publicitários Duda Mendonça e sua sócia Zilmar Fernandes.Também são acusados de participar do esquema os parlamentares João Paulo Cunha, José Janene Pedro Henry, José Borba e Professor Luizinho. Eles são acusados de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão ilegal de divisas, corrupção ativa e passiva e peculato. Antonio Fernando enviou a denúncia ao STF no dia 30 de março.

De acordo com a investigação do procurador-geral, o esquema do mensalão era uma organização criminosa dividida em três núcleos: o político-partidário, o publicitário e o financeiro. Para garantir apoio no Congresso, ajudar na eleição de aliados e fazer caixa para novas campanhas, o estado-maior do PT desembolsava altas quantias aparentemente recebidas em troca de favorecimento da máquina pública.

O núcleo político partidário (composto por José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e Silvio Pereira) pretendia garantir a permanência do Partido dos Trabalhadores no poder com a compra de suporte político de outros partidos e com o financiamento irregular de campanhas. Esse núcleo era o responsável por repassar as diretrizes de atuação para os outros dois núcleos.

O segundo núcleo — composto por Marcos Valério, Rogério Tolentino, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Simone Vasconselos e Geiza Dias — era responsável por receber vantagens indevidas de integrantes do governo federal e de contratos com órgãos públicos (como por exemplo os contratos de publicidade da Câmara dos Deputados, do Banco do Brasil e da Visanet).

E o terceiro núcleo — composto por José Augusto Dumont, Kátia Rabelo José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane — teria entrado na organização criminosa em busca de vantagens indevidas e facilitava as operações de lavagem de dinheiro.

A denúncia da Procuradoria-Geral República arrola parlamentares de cinco partidos (PP, PL, PTB, PMDB e PT) como beneficiários do esquema. Eles vão responder por corrupção passiva e peculato.

INQ 2.245

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