Rescaldo eleitoral (2)

TSE age com precipitação, afirma Estadão em editorial

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3 de novembro de 2006, 13h13

Desde a redemocratização do País, que culminou em 1989 com a primeira eleição à Presidência da República pelo voto direto após três décadas, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vem agindo com precipitação, mudando freqüentemente de orientações em plena campanha eleitoral e tomando decisões contraditórias, e alguns magistrados têm-se envolvido indisfarçavelmente nas disputas de poder.

Na eleição de 1989, um dos fatos marcantes foi a indicação do então presidente da corte, ministro Francisco Rezek, para ocupar o Ministério das Relações Exteriores no governo Fernando Collor. O convite foi feito logo depois do término do pleito e levou políticos e magistrados a censurar Rezek, por ter aceito integrar um governo eleito num pleito por ele presidido. Censura de outro tipo, mas ‘aparentada’ a essa, está sendo feita ao atual presidente do TSE, o ministro Marco Aurélio Mello, acusado de, a pretexto de esclarecer dúvidas sobre as regras eleitorais, ter emitido opiniões políticas em discursos e entrevistas.

Mas não é somente o comportamento de seu presidente, que não condiz com a isenção exigida dos integrantes de cortes eleitorais, que justifica críticas à atuação do TSE. A corte também foi acusada de ter disseminado insegurança jurídica, com atabalhoadas decisões. No final do primeiro semestre, por exemplo, decidiu que os partidos deveriam manter nos Estados as mesmas alianças feitas para a disputa presidencial. Quando a decisão foi tomada, muitas alianças já haviam sido firmadas sem levar essa diretriz em conta. E, quando os candidatos começaram a se adaptar à nova orientação, a corte voltou atrás e permitiu as alianças que antes havia proibido.

Essa foi a primeira das confusões do TSE no pleito de 2006. A segunda ocorreu logo depois, quando o governo anunciou um reajuste salarial para 260 mil servidores públicos, no valor de R$ 1,3 bilhão. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio vetou a iniciativa, alegando que o aumento seria um ‘saco de bondades’ e que a Constituição proibia a revisão salarial do funcionalismo seis meses antes de eleições. Pouco tempo depois, contudo, a corte mudou de entendimento e autorizou o reajuste.

No começo do segundo semestre, o TSE voltou a surpreender, desta vez estimulando os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) a recusar o registro a candidatos que tivessem, em seu prontuário, denúncias de corrupção ou que estivessem sendo processados por crime de malversação de verbas públicas. Contudo, quando candidatos com registros negados pelos TREs impetraram recursos no TSE, a corte abandonou o rigor que exibira até então e passou a autorizar os registros. Um dos beneficiados por essa mudança de posição foi o candidato Paulo Maluf.

Sobre a ‘cláusula de barreira’, criada para acabar com as pequenas agremiações e moralizar o sistema partidário, o TSE apresentou três interpretações diferentes. E, quando os partidos que não conseguiram obter 5% da votação nacional e 9% da votação em pelo menos nove Estados começaram a estudar a possibilidade de fusão, para assegurar a sobrevivência, alguns ministros da corte emitiram opiniões contrárias a essa iniciativa. Em seguida, recuaram e passaram a aceitá-la. Além disso, ao julgar pedidos de aprovação de mais gastos encaminhados pelos candidatos, no 2º turno, um dos ministros do TSE deferiu a reivindicação de Lula e negou a de Alckmin. No dia seguinte, voltou atrás e aprovou a solicitação do candidato do PSDB.

Em sua defesa, os ministros do TSE alegam que as incertezas com relação às regras eleitorais decorrem da má qualidade da legislação eleitoral. De fato, como já ocorreu em outros pleitos, o Congresso aprovou regras novas em cima da hora. Os critérios para a formação de alianças, por exemplo, só foram votados no começo do ano.

É inadmissível que as decisões do TSE sejam marcadas por freqüentes reviravoltas. Na realidade, as idas e vindas do TSE, causadas pelas lacunas da legislação eleitoral, mostram que, apesar da eficiência exemplar do sistema de votação e apuração de votos, ainda há muito a ser feito para aperfeiçoar a Justiça Eleitoral.

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