Vantagens aos amigos

MP traz nova denúncia contra Di Rissio por tráfico de influência

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1 de novembro de 2006, 16h25

O Ministério Público de São Paulo ofereceu nova denúncia contra o delegado de Polícia André Di Rissio. Desta vez, o MP acusa o delegado, que foi presidente da Associação dos Delegados de Polícia Civil do Estado (Adepol) até setembro passado, de tráfico de influência em benefício de interesses pessoais e de seus amigos.

Segundo a denúncia, Di Rissio passou a usar seu cargo “para corromper seus próprios colegas, fato que determinou sensível prejuízo à administração e credibilidade da Justiça, decorrendo das condutas, sempre reiteradas, os delitos de corrupção passiva e advocacia administrativa”.

A denúncia lista cinco casos nos quais Di Rissio teria exercido influência. Num deles, o delegado interferiu para livrar de fiscalização seu amigo Eduardo Luiz Violini, o dono da casa noturna Bomboa, em Pinheiros, São Paulo. Ainda segundo a denúncia, a casa recebeu a visita de policiais civis do Deic que queriam investigar se o whisky servido na casa era falsificado. Enquanto faziam a inspeção, um advogado ligou para Di Rissio, que conseguiu contornar a situação.

De acordo com o MP, Di Rissio usou de sua influência ao ligar para os policiais do Deic e pedir que resolvessem a situação do amigo. Os policiais não apreenderam as garrafas, mas disseram que abririam um procedimento preliminar, o que não foi feito, segundo a denúncia. Então o advogado ligou para o advogado do Bomboa, chamado Alberto e disse que a operação foi abortada.

A denúncia também aponta que o delegado foi pego corrompendo o inspetor regional de fiscalização de Londrina (PR), Alexandre de Souza, em setembro de 2005. Di Rissio se apresentou como delegado no telefonema ao fiscal e pediu para que ele liberasse um material de informática apreendido, que pertencia ao seu amigo pessoal Joseph Hanna Doumith, vulgo Turco.

A mercadoria foi apreendida sob suspeita de falta de recolhimento de tributos. O delegado disse que o comerciante era seu primo, que era uma pessoa séria, que não devia tributos. Ainda teria prometido ao fiscal “uma vantajosa viagem à capital paulista”, mas o fiscal não quis liberar a mercadoria.

Leia a denúncia

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA 25ª VARA CRIMINAL DO FORO CENTRAL DA CAPITAL

Autos do inquérito policial n.° 050.06.073361-6

O Ministério Público do Estado de São Paulo, por intermédio dos Promotores de Justiça que esta subscrevem, integrantes do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado – GAECO, nos termos do artigo 129, inciso I, da Constituição Federal e artigos 24 e 41 do Código de Processo Penal, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, para oferecer denúncia em face de ANDRÉ LUIZ MARTINS DI RISSIO BARBOSA, RG 10.157.037-5/SSP-SP (fls. 3.435/3.436 e 3.450/3.451 – PAC/MP) e FÁBIO PINHEIRO LOPES, RG 12.594.066-X, ouvido em declarações a fls. 3.391 (PAC/MP), pela prática dos seguintes fatos criminosos:

1.O denunciado ANDRÉ DI RISSIO, Delegado de Polícia Civil do Estado de São Paulo, acabou, no exercício de suas funções, elegendo-se , no início de 2006, presidente da Associação dos Delegados de Polícia Civil do Estado – ADEPOL, cargo que ocupou até o mês de setembro passado. Tal posição permitiu-lhe angariar, além de nomeação para cargo administrativo no Departamento de Administração e Planejamento da Polícia Civil do Estado de São Paulo – sem atribuições de polícia judiciária – a possibilidade de consolidar uma ampla rede de influência junto a outros Delegados de Polícia Estaduais, de diversos setores e localidades, a fim de atender interesses pessoais, de ordem financeira, familiar ou relacionados com problemas particulares de seus amigos, conforme se evidencia na prova anexa, obtida preponderantemente por meio de interceptações telefônicas judicialmente autorizadas e oriundas da Operação 14 Bis, concebida e realizada pelo Ministério Público Federal e pelo Departamento de Polícia Federal.

Segundo se extraí dos autos, ANDRÉ DI RISSIO, no uso do cargo público de Delegado de Polícia Civil do Estado e, após, ocupando também a presidência da Associação dos Delegados de Polícia Civil do Estado, passou a desenvolver gestões para corromper seus próprios colegas, fato que determinou sensível prejuízo à administração e credibilidade da Justiça, decorrendo das condutas, sempre reiteradas, os delitos de corrupção passiva e advocacia administrativa.


Alardeando a importância do cargo público por ele ocupado e a autoridade dele decorrente, nas oportunidades abaixo descritas, o denunciado não só iludia a boa-fé das pessoas a quem prometia vantagens na administração pública, como também, em idêntico comportamento, em razão de sua atuação impositiva, acabava interferindo no ânimo dos próprios agentes a quem dirigia a solicitação de favores.

2. Em 2 de setembro de 2005, ANDRÉ DI RISSIO tomou conhecimento que um Caminhão da Transjori Transportes Ltda, que transportava material de informática pertencente ao seu amigo pessoal, JOSEPH HANNA DOUMITH, vulgo “Turco”, foi lacrado e a mercadoria apreendida por Auditores Fiscais da Receita Federal em Jacarezinho e Londrina – PR.

A lacração da mercadoria transportada e a retenção do Caminhão pela Receita Federal do Paraná foram justificadas pela irregularidade na importação dos equipamentos transportados, bem como pelo fato da empresa-proprietária da carga, Lírios – Comércio Internacional, Importação e Exportação de Comodities Ltda, não existir de fato, sendo apenas fachada para figurar em negócios ilícitos praticados pela quadrilha de JOSEPH, na qual, aliás, ANDRÉ DI RISSIO ocupava importante papel – tudo, repita-se, conforme conclusões obtidas no âmbito de atuação da Justiça Federal. As suspeitas recaiam, sobretudo, na inexistência de recolhimento dos tributos devidos.

Neste contexto, o acusado ANDRÉ DI RISSIO, no dia 2 de setembro de 2005, às 18h06, através de seu telefone celular, telefonou para o Posto Fiscal de Londrina e conversou com o Inspetor Regional de Fiscalização, Alexandre de Souza. Neste diálogo, ANDRÉ DI RISSIO, sem qualquer pudor e invocando seu cargo, solicitou, para seu amigo Joseph, diretamente, vantagem indevida e, para tanto, buscou influir em ato praticado pelo funcionário da Receita Federal, que estava em pleno exercício de sua função.

De fato, ANDRÉ, embora não estivesse no desempenho de sua função de Delegado de Polícia, apresentou-se para o fiscal Alexandre de Souza como tal. Com o objetivo de alardear força moral, demonstrar seu prestígio e procurar influir na liberação do material de informática e, dessa forma, obter vantagem para o dono da carga apreendida, ANDRÉ acentuou estar lotado na Delegacia Geral de Polícia – DGP – e ter sido retirado de uma reunião com o Secretário Estadual de Segurança Pública do Governo do Estado de São Paulo, o que não era verdade, especialmente para tratar do assunto abordado ao telefone. Com essa autoridade e sob o manto desta simulação, portanto, ANDRÉ argumentou que o comerciante autuado era seu primo, um cara muito sério, e que todos os impostos tinham sido recolhidos – “foram pagos todos os tributos de ponta cabeça”. Frisou, ainda, que se algum documento fiscal faltasse, uma viatura policial seria destacada para levá-lo até Londrina.

Assim agindo, implicitamente, por meio de uma solicitação ou pedido de favor, ANDRÉ DI RISSIO, através do seu alegado prestígio, buscou persuadir o Auditor Fiscal e obter, para seu amigo pessoal, Joseph Hanna Doumith, a liberação da carga apreendida pela Receita Federal. Em contrapartida, ANDRÉ assumiu a condição de devedor de uma “fineza pessoal” para o Auditor Alexandre Souza na Capital de São Paulo, conferindo a ele um “vale homicídio”, insinuando ao Fiscal a promessa de uma vantajosa viagem à Capital paulista.

Depois de consumado o delito, ANDRÉ não obteve êxito em sua solicitação, porquanto não conseguiu corromper o funcionário da Receita Federal do Paraná, que manteve a apreensão do material de informática.

3. Em outra empreitada criminosa, em 6 de setembro de 2005, às 12h25, valendo-se da linha móvel, ANDRÉ DI RISSIO, em razão de seu cargo de Delegado de Polícia lotado na Delegacia Geral de Polícia, solicitou, diretamente, para um Investigador de Polícia e um Delegado de Polícia, ambos lotados no Departamento de Combate ao Crime Organizado – DEIC, que estavam no exercício de suas funções, vantagem pessoal para o comerciante conhecido apenas por Fabrício.

Segundo consta dos autos, Fabrício vendia computadores e produtos de informática relacionados com a importação ou contrabando feitos por Joseph Hanna Doumith. No dia acima citado, nesta Capital, Fabrício foi abordado por policiais civis do DEIC em seu local de trabalho vendendo computadores e acessórios de forma irregular. Investigadores de Polícia, assim, conduziram Fabrício à sede do DEIC para as providências cabíveis do âmbito da Polícia Judiciária.


O acusado ANDRÉ DI RISSIO, que se valia de seu cargo e prestígio pessoal para favorecer pessoas do seu relacionamento – relação criminosa, como restou apurado pelo Departamento de Polícia Federal –, tomou conhecimento da ação policial legítima dos Investigadores do DEIC. Através de seu telefone celular, ANDRÉ telefonou para o celular pessoal de Fabrício, apresentando-se para este como amigo pessoal de Joseph e revelou já estar ciente da abordagem policial, tendo pedido para conversar diretamente com o Investigador de Polícia responsável pela diligência.

Ao conversar, então, com o Investigador do DEIC que se identificou com o pré-nome PEDRO, cuja qualificação completa ainda não se obteve, no exato momento em que este transportava o investigado, o denunciado ANDRÉ, depois de demonstrar prestígio, valendo-se de seu cargo e do fato de estar lotado na Delegacia Geral da Polícia Civil, solicitou-lhe, diretamente, vantagem indevida em favor de Fabrício e seu amigo pessoal, Joseph, consistente na não tomada de providências policiais contra o primeiro.

De fato, através do mesmo telefonema, ANDRÉ indagou ao Investigador Pedro, com muita objetividade, se os fatos relacionados com Fabrício eram graves, dando evidência concreta de que pretendia desfazer a investigação em curso. Ao ouvir de Pedro uma resposta negativa – ausência de gravidade –, ANDRÉ, sem qualquer cerimônia, de forma direta e objetiva, pediu para o Investigador “resolver” para ele, ou seja, para que os policiais do DEIC prevaricassem e, descumprindo o dever funcional, liberassem Fabrício e a mercadoria por ele vendida.

Impressionado com o pedido, o Investigador Pedro sucumbiu ao pleito e respondeu: “com certeza doutor, com certeza”. O mesmo policial ainda assegurou que, posteriormente, o Delegado de Polícia FÁBIO ou o Investigador FEITOSA, que estavam no DEIC, retornariam para ANDRÉ a ligação.

Ao receber Fabrício na 4a Delegacia dos Crimes contra o Patrimônio do DEIC e tomar conhecimento da notícia do fato criminoso, o Delegado de Polícia, FÁBIO PINHEIRO LOPES deixou de praticar, indevidamente, ato de ofício, para atender solicitação feita pelo então Presidente da ADEPOL, colega lotado na Delegacia Geral de Polícia, ANDRÉ DI RISSIO, satisfazendo, assim, claro interesse pessoal em detrimento da expressa determinação da lei penal e processual penal. Ao mesmo tempo, FÁBIO cedeu ao pedido e influência exercidos por ANDRÉ.

É que, cerca de quinze minutos depois de ANDRÉ ter conversado com o Investigador Pedro, FÁBIO PINHEIRO LOPES, Delegado de Polícia lotado na 4a Delegacia de Polícia do DEIC, telefonou para ANDRÉ DI RISSIO e noticiou a prática do crime que ele cometeu, nos seguintes termos: “….

Satisfeito com mais um êxito de sua influência, ANDRÉ prometeu para FÁBIO um almoço.

Em face da solução criminosa dada pelo denunciado FÁBIO PINHEIRO LOPES, Fabrício e a loja para a qual trabalhava sequer foram identificadas. Perdeu-se, ao menos até o presente momento, o objeto da investigação.

4. É dos autos também que, no período compreendido entre as 15h30 até 21h25, do dia 14 de setembro de 2005, ANDRÉ DI RISSIO solicitou, para pessoas de seu relacionamento particular, vantagem consistente na ausência de providências policiais, a pretexto, assim, de influir em ato oficial praticado por policiais civis lotados no DEIC.

Na ocasião acima citada, policiais civis da 2ª Delegacia da D.I.G. do DEIC compareceram na casa noturna denominada Bomboa, situada na rua Capote Valente n° 210, nesta Capital, para investigar possível comercialização de bebida alcoólica falsificada (whisky). Enquanto os Investigadores de Polícia procediam ao trabalho policial e reuniam as garrafas suspeitas para apreensão, um Advogado de confiança dos representantes do Bomboa, por volta das 15h28, acionou, por telefone, o acusado ANDRÉ DI RISSIO (confira-se no relatório de interceptação telefônica de fls. 2828, item n° 41, vol. XIII, PAC/MP).

A partir de então, ANDRÉ DI RISSIO, valendo-se de seu cargo público, passou a assumir, pessoal e diretamente, o patrocínio do interesse dos representantes do Bomboa perante os policiais civis do DEIC e, nesta condição e contexto, passou a exercer intenso tráfico de influência visando a obtenção de vantagem indevida aos seus amigos.


Assim, ANDRÉ, através de contato telefônico e rádio, solicitou aos Policiais Civis da base operacional do DEIC que resolvessem para ele a diligência que estava ocorrendo no estabelecimento de seu amigo Eduardo, o Bomboa. Ou seja, influenciou incisivamente para que não levassem adiante a operação policial e as bebidas alcoólicas não fossem apreendidas. Em seu patrocínio aos interesses do Bomboa, o denunciado, valendo-se de meio fraudulento, alertou o Advogado da Casa Noturna, Adalberto, de um fator complicador: juntamente com os policiais do DEIC havia um representante da John Walker, que estaria exigindo providências da polícia quanto à existência de bebidas alcoólicas falsificadas no estabelecimento, o que não era verdade.

Ao final, o delito exauriu-se.

A toda evidência, os Policiais Civis do DEIC sucumbiram à solicitação e influência do acusado ANDRÉ DI RISSIO, pois não apreenderam – como seria exigível – as garrafas para submeter seu conteúdo à perícia e procuraram justificar o abandono da diligência policial no BAMBOA, através da apreensão de cinco notas fiscais – fls. 3349/3353 (PAC/MP) – e da inquirição de um representante da casa noturna, num inusitado procedimento preliminar (fls. 3343 – XV vol., PAC/MP), não contemplado no processo penal, observando-se não ter sido instaurado inquérito policial ou lavrado boletim de ocorrência.

Após a investigação ter sido abandonada, no mesmo dia 14 de setembro de 2006, às 15h38, valendo-se de seu telefone celular, ANDRÉ DI RISSIO comunicou o Advogado do Bomboa, Dr. Adalberto, que havia conversado com um Delegado de Polícia do DEIC e um chefe de investigadores de polícia e a diligência, nas palavras do acusado, havia se encerrado, acabado, tudo ficou zero a zero.

Mesmo diante da não apreensão das garrafas de whisky, ANDRÉ DI RISSIO procurou ampliar ainda as vantagens aos seus amigos do Bomboa. Não satisfeito com a presença de um representante do Bomboa no DEIC, ANDRÉ DI RISSIO exigiu, por mais de uma vez, a presença de Advogados experientes – a “presença de uma cavalaria para falar com os policiais” – e indicou um Advogado criminalista de seu relacionamento pessoal, Dr. José Geraldo, a fim de resolver eventuais medidas adotadas por eles, tudo conforme outro contato telefônico estabelecido entre o acusado e EDUARDO, um dos donos do BAMBOA (CD de fls. 830 e relatório de fls. 2830, item 46.

Terminada a operação policial do DEIC e satisfeito com o êxito de sua influência junto aos seus colegas, mas interessado em futura vantagem financeira indevida, ANDRÉ DI RISSIO afirmou para o Advogado do Bomboa, que o responsável pela casa noturna ficaria devendo um grande favor a ser contabilizado como ele quiser..

5. Dois dias depois, em 16 de setembro de 2005, por volta das 15h30, durante o expediente de Delegado de Polícia e em razão desta função, ANDRÉ DI RISSIO solicitou e recebeu, diretamente para si, vantagem indevida consistente no pagamento de um serviço que foi feito num de seus veículos particulares.

Segundo restou apurado, apenas dois dias depois de ANDRÉ DI RISSIO ter indicado um cliente – o representante da casa noturna Bomboa – para o Advogado JOSÉ GERALDO LOUZÃ PRADO, colega de escritório do Dr. Adalberto, aquele acusado solicitou para este o pagamento dos serviços mecânicos efetuados num de seus veículos, no valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais).

ANDRÉ DI RISSIO, em 16 de setembro de 2005, às 15h25, telefonou para o mecânico HÉLIO e anunciou que faria o pagamento do serviço feito em seu carro. Para tanto, porém, HÉLIO deveria ligar para o escritório do Dr. JOSÉ GERALDO, apresentar-se como seu amigo e fornecer o número de sua conta corrente, pois Edna lhe faria, de pronto, um depósito no valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais).

Logo em seguida, o acusado ANDRÉ DI RISSIO, sendo já conhecido do escritório LOUZÃ PRADO, fez um contato telefônico com a funcionária EDNA e solicitou-lhe o pagamento do valor acima citado na conta corrente de HÉLIO. E, repita-se, na verdade, tal pagamento consistiu no recebimento de vantagem financeira indevida, recebida em razão de seu cargo de Delegado de Polícia e das – criminosas – solicitações feitas em nome desta função.


Três dias depois, em 19 de setembro de 2006, às 12h05, através do telefone celular, ANDRÉ conversou diretamente com o Advogado JOSÉ GERALDO e ouviu deste a confirmação do recebimento da vantagem ilícita indevida, no valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais), correspondente ao valor que era devido pelo acusado ao mecânico HÉLIO. Registre-se apenas que, na mesma oportunidade, JOSÉ GERALDO anunciou que, uma vez mais, precisaria dos serviços de ANDRÉ DI RISSIO junto ao 34º Distrito Policial, no qual ele teria um cliente com problemas e precisando de uma escoradinha. Tal tratativa, entretanto, não foi conversada por telefone, o que impediu, até o momento, o esclarecimento dos fatos.

6. Consta ainda que, no dia 23 de setembro, às 11h14, do interior do prédio da Delegacia Geral de Polícia, situada na rua Brigadeiro Tobias, Centro desta Capital, ANDRÉ DI RISSIO, valendo-se de seu cargo, patrocinou, diretamente, interesse privado de um amigo, perante a 4ª Delegacia Seccional Norte.

Apurou-se que Sérgio Ricardo Miascovsky, amigo pessoal do denunciado ANDRÉ, desde o dia 4 de agosto de 2005, estava sendo investigado pelo Setor de Investigações Gerais da 4ª Delegacia Secional de Polícia desta Capital (Zona Norte) pela prática do crime de estelionato – Inquérito Policial n° 84/2005 (fls. 3232) –, uma vez que teria depositado em conta corrente cheques anteriormente furtados da empresa Citrinus Moda Masculina e Feminina. A autoridade policial que presidia os autos na Seccional Norte tentou, por várias vezes, inquirir Sérgio Ricardo, através de notificações pelo correio e por telefone, sem, contudo, ter êxito.

Extravasando os limites de amizade ou de atuação típica de conselheiro e assumindo verdadeiramente a condição de patrono particular, ANDRÉ DI RISSIO afirmou para Sérgio continuar ignorando as notificações feitas pelo Escrivão de Polícia da 4ª Seccional Norte.

Mais que isso, ANDRÉ ficou desgostoso com o cumprimento dos atos de polícia por parte do Escrivão Marco Antonio Maris, lotado na Seccional Norte, e qualificou-o de petulante, nos seguintes termos:

“….Ao chamar para si a responsabilidade pelo patrocínio do interesse de seu amigo, ANDRÉ pediu para o Escrivão Marcos lhe telefonar. Ao conversar com este por telefone – através da linha móvel (–, em 23/9/2005, às 11h14, ANDRÉ procurou dissuadi-lo da investigação criminal que fazia, tal como o faria um Advogado constituído por Sérgio Ricardo. De fato, na referida conversa telefônica, ANDRÉ, valendo-se de seu cargo de Delegado de Polícia da Delegacia Geral da Polícia, advogou para o Escrivão de Polícia Marcos, que seu amigo Sérgio, na verdade, estava sendo vítima de um delito de falsa comunicação de crime. Inclusive, disse que seria necessário cumprir uma Carta Precatória, expedida pela Delegacia de Polícia de Santo André à 4ª Seccional Norte, para indiciar o autor da notícia do crime contra Sérgio Ricardo Miascovsky pela prática do delito de falsa comunicação de crime, que foi chamado por ANDRÉ de “comerciante sem vergonha”.

De forma clara, ANDRÉ assumiu a coordenação da Defesa de Sérgio Ricardo Miascovsky nos autos do inquérito policial de n° 84/2005 da 4ª Seccional Norte. Além dos fatos já descritos, ANDRÉ idealizou uma reunião com Ronaldo (Advogado de Sérgio), com este e o Delegado de Polícia de Santo André responsável pelo inquérito policial n° 497/2005, Doutor Fábio Dalmas, a fim de estabelecer estratégia para a defesa de Sérgio e – com as palavras de ANDRÉ DI RISSIO – “dar logo um cheque mate” na apuração policial, conforme diálogos travados entre o acusado e Sérgio, no dia 23/9/2005, às 12h54 e 18h47, e o depoimento de Sérgio Ricardo (fls. 3364 – volume XV – PAC/MP).

O cheque mate arquitetado por ANDRÉ DI RISSIO consistiu no pedido de redistribuição do inquérito policial da Seccional Norte (IP n° 84/2005) para ser apensado aos autos do inquérito policial do 1º Distrito Policial de Santo André (IP n° 497/2005), o que foi, de fato, providenciado e, ao final, deferido pela MM. Juíza de Direito do D.I.P.O. (fls. – 4.168 – PAC/MP, vol. XVIII).

Frise-se que a conduta criminosa de ANDRÉ DI RISSIO nem de perto caracterizou um mero conselho ou auxílio a um amigo. Basta verificar que, no mesmo dia 29 de setembro de 2005, às 11h53, ao conversar por telefone com seu amigo Sérgio Ricardo, o denunciado ficou totalmente fora de si ao ser incomodado pelo Advogado Ronaldo, que lhe telefonou momentos antes e quase revelou o interesse de ANDRÉ DI RISSIO na defesa de Sérgio ao Delegado de Polícia da Seccional Norte, Dr. Darci Sassi. É que tal telefonema ocorreu no instante em que ANDRÉ conversava, em outra linha, no viva voz, com o Seccional Norte, que pode ter ouvido o contato feito por Ronaldo.


7. Por fim, em 18 de abril de 2006, por volta das 15h20, o acusado ANDRÉ DI RISSIO, novamente em razão de suas funções, solicitou, indiretamente, para outro Delegado de Polícia do DEIC, desta feita o Doutor José Luiz Ruas de Abreu, que se encontrava no exercício de seu ofício, vantagem indevida para o proprietário de máquinas de caça-níqueis, Romualdo Hatty.

Apurou-se que o Delegado de Polícia RUAS e dois Investigadores de Polícia, todos lotados na Delegacia de Polícia dos Crimes de Estelionatos do DEIC, deslocaram-se até o Bingo São Caetano, situado na rua Eduardo Prado n° 8, em São Caetano do Sul, para acompanhar a perícia que estava sendo feita em máquinas caça-níqueis.

Com a presença dos policiais civis do DEIC, a perícia finalmente iniciou-se, logo após as 14h00, buscando constatar nas máquinas a caracterização do crime de estelionato e/ou a contravenção de jogo de azar.

Contudo, por volta das 15h20, depois ter sido acionado pelo responsável pelas máquinas de caça-níqueis do Bingo São Caetano, o Sr. Romualdo Hatty – pessoa portadora de várias passagens criminais (fls. 4.301/4.310 – PAC/MP) – o acusado ANDRÉ DI RISSIO, através de seu telefone celular, fez um contato telefônico com a linha fixa do estabelecimento – (11) 4226.2477 – e conversou diretamente com seu colega e já conhecido, Doutor RUAS. Enquanto assim agia, e com o propósito evidente de demonstrar sua determinação no encaminhamento da diligência, manteve Romualdo o tempo todo ouvindo a conversa com o Delegado Ruas, tomando o cuidado de não explicitar, no diálogo, o assunto tratado. Na conversa que teve lugar, ANDRÉ DI RISSIO reclamou para RUAS que este estava novamente cruzando seu caminho e advertiu-o que precisava falar com ele naquele instante, pessoalmente, na sede da Associação dos Delegados de Polícia – ADEPOL. Para atrair ainda mais o Delegado de Polícia RUAS, que estava em pleno exercício de suas funções no Bingo São Caetano, ANDRÉ DI RISSIO assegurou a seu colega que ele iria ficar feliz com o encontro.

Logo após ter recebido a confirmação do imediato deslocamento de RUAS à sede da ADEPOL, ANDRÉ DI RISSIO, sempre através de contato telefônico interceptado pela Polícia Federal, determinou ao representante das máquinas de caça-níqueis, Romualdo Hatty, que ouvia a conversa, para que fosse também imediatamente para o mesmo local a fim de conversarem pessoalmente sobre a ação policial no Bingo São Caetano, em demonstração inequívoca de que pretendia reunir o dono do bingo e a autoridade policial que nele diligenciava.

Nos autos do inquérito policial – n° 220/02, 3ª Delegacia de Estelionato, DEIC – instaurado contra os responsáveis pelo Bingo São Caetano, observa-se que o Doutor RUAS teve o cuidado de não registrar sua presença no estabelecimento, conforme as cópias de fls. 3023/3058, volume XIV, PAC/MP. E, por último, os laudos periciais correspondentes às perícias efetuadas nas máquinas de caça-níqueis não foram inicialmente juntados no inquérito policial n° 220/02, o que se verificou apenas em 4 de agosto de 2006, após ter sido divulgada a apuração destes fatos.

Diante do exposto, o Ministério Público do Estado de São Paulo oferece DENÚNCIA em face de ANDRÉ LUIZ MARTINS DI RISSIO BARBOSA, como incurso no artigo 317, parágrafo 1o, por 2 vezes (Casos Fabrício e Bomboa), no artigo 317, caput, (Casos Londrina, Bingo São Caetano e José Geraldo Louzã Prado), e no artigo 321, parágrafo único, na forma estabelecida pelo artigo 69 todos do Código Penal; e também em face de FÁBIO PINHEIRO LOPES como incurso no artigo 319 do mesmo Estatuto.

Requer seja a denúncia recebida e autuada, citando-os e interrogando-os, ouvindo-se as testemunhas e representantes das empresas vítimas a seguir arroladas, processando-se a presente nos termos dos arts. 394 a 405 e 498 a 502 do Código de Processo Penal e prosseguindo-se até final sentença condenatória, impondo-se, então, a perda do cargo público de André Di Rissio, circunstância que deverá ser expressamente consignada no provimento condenatório, na forma do artigo 92, inciso I, “a”, do Código Penal.


Rol:

Caso Londrina

1. Alexandre de Souza (Precatória) fls. 3474 e 4231 (PAC/MP);

2. Silvanilson Oliveira Damascena (motorista Transjori) fls. 4193 (PAC/MP);

Caso Fabrício

1. Neurides F. Ferreira (Investipol) fls. 3446 (PAC/MP);

Caso Seccional Norte

1. Marco Antonio Maris (escripol) fls. 3229 (PAC/MP);

2. Sérgio Ricardo Miascovsky fls. 3364 (PAC/MP);

3. Claudio Jardim Pugliesi fls. 3410 (PAC/MP);

Caso Bamboa:

1. Dr. Carlos Edmundo Heyn fls. 3412 (PAC/MP);

2. Manoel Antonio Rufino fls. 3382 (PAC/MP);

3. Norberto Della Brida (Investipol) fls. 3385 (PAC/MP);

4. Emygdio Machado Neto (DelPol) fls. 3388 (PAC/MP);

5. Paulo Sarmento Lopes (Investipol) fls. 3425 (PAC/MP);

6. Júlio César da Motta (Investipol) fls. 3442 (PAC/MP);

7. Eduardo Luiz Violini fls. 4325(PAC/MP) ;

8. Doutor José Geraldo Louzã Prado fls. 4438(PAC/MP);

Caso Bingo São Caetano:

1. Jonas Éboli Machado (Perito – I.C.) fls. 3466 (PAC/MP);

2. Adriano Issamu Yonamine (Perito – I.C.) fls. 3471 (PAC/MP);

3. Romualdo Hatty fls. 4298 (PAC/MP);

4. Dr. José Luiz Ruas de Abreu (fls.223 –) fls. 3394 (PAC/MP).

São Paulo, 1º de novembro de 2006.

ROBERTO PORTO

Promotor de Justiça

JOSÉ REINALDO GUIMARÃES CARNEIRO

Promotor de Justiça

EDER SEGURA

Promotor de Justiça

ARTHUR PINTO DE LEMOS JÚNIOR

Promotor de Justiça

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