Faltou trabalho

Agência de intercâmbio é condenada por não cumprir contrato

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28 de março de 2006, 19h56

Agência de intercâmbio que leva estudante para o exterior e não consegue emprego para ele conforme contratado, tem de indenizar por danos morais. A decisão é da 2ª Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Rio Grande do Sul.

A empresa MC Cultural foi condenada pelo colegiado a pagar R$ 4 mil por danos morais, que corresponde à metade do valor pago pelo estudante. Além disso, teve de devolver metade da quantia paga pelo estudante.

O estudante contratou a empresa de intercâmbio para passar uma temporada de trabalho nos Estados Unidos. Pelo contrato, a empresa ficava responsável por obter o visto de entrada, as passagens aéreas, o seguro e a colocação do contratante em emprego temporário junto a uma empresa norte-americana definida antes do embarque. A empresa cumpriu todo o contrato, com exceção da vaga de trabalho.

De acordo com o advogado da MC Cultural, Felipe Esteves Grando, o estudante não ficou sem trabalhar. Ele começou no mesmo dia em que chegou, na mesma empresa e com remuneração conforme prevista no contrato, pois a empresa tinha uma vaga disponível. Segundo ele, teria havido apenas um mal-entendido quanto ao papel de intermediação feito pela agência de intercâmbio.

Afirmou, ainda, que “mais de 600 estudantes foram encaminhados aos Estados Unidos pela MC Cultural para o mesmo programa de trabalho remunerado que o estudante autor da ação usufruiu (…) sem que jamais tenha havido contratempos como o do referido processo, tampouco qualquer outra condenação judicial em virtude de danos sofridos por seus clientes.”

Segundo a juíza Mylene Maria Michel, a devolução da metade das quantias pagas, correspondente a R$ 2.879,50, se deve à má prestação do serviço, mas não em sua integralidade, considerando que a viagem ocorreu e o cliente permaneceu no exterior pelo tempo combinado.

“Embora inexistente a proposta de emprego, havia a agência, anteriormente, gestionado com a empresa americana a almejada contratação. Ao final, o trabalho foi obtido, mais pelo esforço do contratante, mas a documentação e recomendação da empresa contribuíram para tanto”, analisou.

Afirma, ainda, que é “evidente a enorme frustração e a terrível insegurança que se abateu sobre o estudante, ao tomar conhecimento de que não havia oferta de trabalho”. A conduta da ré, acrescentou, foi conscientemente desidiosa para com o estudante, levando-o à angústia de se encontrar no exterior sem perspectiva momentânea.

Processo 71000874974

Leia a íntegra do acórdão

CONSUMIDOR. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE INTERCÂMBIO CULTURAL NO EXTERIOR. DEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO. RESTITUIÇÃO PARCIAL DE VALORES PAGOS E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ.

RECURSO INOMINADO

SEGUNDA TURMA RECURSAL CÍVEL Nº 71000874974

COMARCA DE PORTO ALEGRE

MC CULTURAL LTDA. — RECORRENTE/RECORRIDO

ALEXANDRE PEROZZO — RECORRIDO/RECORRENTE

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Juízes de Direito integrantes da Segunda Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO AUTOR e NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ.

Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores DR. EDUARDO KRAEMER E DR. CLÓVIS MOACYR MATTANA RAMOS.

Porto Alegre, 15 de março de 2006.

DRA. MYLENE MARIA MICHEL,

Presidente e Relatora.

RELATÓRIO

(Oral em Sessão.)

VOTOS

DRA. MYLENE MARIA MICHEL (PRESIDENTE E RELATORA)

O autor contratou com a ré serviço de agenciamento de emprego no exterior. Depreende-se do contrato de fls.27 e seguintes a obrigação da ré em encaminhar a documentação para a obtenção do visto, fornecimento de passagens aéreas, seguro, e a colocação do contratante em emprego temporário junto a uma empresa norte americana definida antes do embarque.

A prova é reveladora no sentido de que a prestação foi deficiente. Com efeito, a par do deslocamento do autor para o exterior com a indicação da empresa supostamente empregadora, todo o resto foi obtido pelo autor, em especial, o próprio emprego.

A declaração da empregadora, exarada na fl.25 e traduzida por tradutor juramentado na fl.23, é contundente no sentido de que, muito embora o encaminhamento da proposta de emprego ou medida similar, o emprego ou a vaga não foi disponibilizada às pessoas indicadas pela ré. Esta, mesmo sem a oferta de trabalho da empresa americana, enviou o autor e outros, procedimento reiterado que os fez decidir não mais trabalhar com a CHI ou quaisquer da suas coligadas !

A sentença, a meu juízo corretamente, condenou a ré a restituir ao autor metade das quantias pagas em face do contrato, ou seja, R$ 2.879,50. Ocorre que o custo englobava passagens, seguro pelo período em que lá se encontrasse o autor, dentre outros itens. Muito embora inexistente a proposta de emprego, havia a ré, anteriormente, gestionado com a empresa americana a almejada contratação. Ao final e ao cabo, o trabalho foi obtido, mais pelo esforço do autor, é certo, mas contribuiu a documentação e recomendação da empresa para tanto. A prestação foi deficiente, mas não em sua integralidade, considerando que a viagem ocorreu e o autor permaneceu no exterior pelo tempo objetivado. Justa, pois, a restituição apenas da metade, tal como determinado na sentença.

Unicamente, tal valor deve ser corrigido da data do último “voucher” de fl.33, ou seja, de 16.08.04, e não do ajuizamento. Os juros são de 1% ao mês, desde a citação.

Restou controvertida e duvidosa a questão relativa ao visto, não se sabendo ao certo se os dados foram incorretamente preenchidos e por quem. Assim, não cabe a pretendida restituição do valor conferido à ré por conta do encaminhamento da documentação.

Mas o dano moral foi contundente, não resta a menor dúvida.

Tratava-se de um estudante, que pagou para ter a segurança do trabalho temporário no exterior, devidamente agenciado pela ré.

Evidente a enorme frustração e, mais do que isto, a terrível insegurança que se abateu sobre o estudante, ao chegar na empresa de destino e tomar conhecimento de que não havia oferta de trabalho e a documentação respectiva, por ele apresentada a mando da ré, continha assinatura desconhecida da empresa !

E não era a primeira vez que a ré assim agiu, ao menos junto à referida empresa !

Ora, a conduta da ré foi conscientemente desidiosa para com o estudante, seu cliente, levando-o à angústia de se encontrar no exterior sem perspectiva momentânea.

Contribuiu para aplacar o dano a pronta intervenção da empresa norte americana, que resolveu, naquele mesmo dia, conferir emprego ao autor.

Tenho que a indenização de R$ 1.500,00 conferida na sentença a título de dano moral não condiz com o infortúnio a que foi submetido em face da conduta da ré. Estou por fixar a indenização correspondente a R$ 4.000,00, por entendê-la justa compensação ao ofendido, prevenindo que a ré persista reiterando na prestação deficiente relativamente ao universo de consumidores.

Conseqüentemente, pelas razões já sucintamente expostas neste voto, não merece provimento o recurso interposto pela ré.

Ante o exposto, VOTO pelo PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO DO AUTOR, para manter a condenação fixada na sentença a título de restituição de quantia paga, mas estabelecendo a incidência de atualização pelo IGP-M sobre a mesma desde 16.08.2004; e para majorar a condenação por dano moral ao principal de R$ 4.000,00, mantidos os consectários legais dispostos na sentença. Os juros incidentes sobre tais quantias a partir da citação são os de 1% ao mês. OUTROSSIM, VOTO por NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ.

Sucumbência pela ré-recorrente, com honorários de 20% sobre o valor integral da condenação.

PROVERAM EM PARTE O RECURSO DO AUTOR E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ. UNÂNIME.

DR. EDUARDO KRAEMER – De acordo.

DR. CLÓVIS MOACYR MATTANA RAMOS – De acordo.

Juízo de Origem: 4.JUIZADO ESPECIAL CIVEL PORTO ALEGRE – Comarca de Porto Alegre

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