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Rio recebe conselho para discutir soluções para a violência

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18 de março de 2006, 18h14

O Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana se reúne no dia 31 para discutir questões de segurança no estado do Rio de Janeiro. A data coincide com o aniversário de um ano da chacina que matou 29 pessoas, sete delas com menos de 18 anos, em Queimados e Nova Iguaçu (Baixada Fluminense).

O local escolhido para o encontro foi a sede da Assembléia Legislativa do estado do Rio. Depois da reunião, haverá um ato público na Baixada, em memória dos que perderam a vida em função da violência.

A questão da segurança pública no estado do Rio desperta cada vez mais atenção porque são crescentes os índices de criminalidade. As situações de brutalidade e mortes são seguidas de longos processos na Justiça, acarretando um misto de desesperança, sofrimento e desamparo aos familiares.

Prova disso é que dos 11 policiais militares acusados de participarem da chacina, apenas cinco continuam detidos acusados de formação de quadrilha e homicídio. Outros dois respondem em liberdade a inquéritos por formação de quadrilha e os quatro restantes estão livres por falta de provas.

Dossiê

O Laboratório de Análises da Violência da Uerj, Viva Rio, Justiça Global, Universidade Candido Mendes, SOS Queimados e o professor José Cláudio Alves, vice-reitor da UFRJ acabam de produzir um abalizado estudo sobre a falta de segurança na Baixada Fluminense para ser apresentado aos membros do CNDPH, no Rio. É mais uma tentativa de acabar com a criminalidade e a exclusão social numa área formada por 13 municípios, onde está uma das maiores concentrações urbanas da América Latina.

O trabalho realça a importância de uma maior presença do Poder Público nesse pedaço do território fluminense, onde o direito de cidadão nem sempre é respeitado. As reclamações são muitas. Do Judiciário reclama-se, por exemplo, porque mais de 90% dos casos de homicídios não têm autores identificados.

A crítica ao Executivo é sustentada com o confronto no número de policiais, área por área. Enquanto o município do Rio conta com quase dois policiais para cada 1.000 habitantes, patamar semelhante ao de Niterói, a grande maioria dos habitantes da Baixada encontram-se numa situação bem diferente. Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Mesquita, Belford Roxo e Nilópolis apresentam menos de 1 policial para cada 1.000 habitantes.

“Os quantitativos não tem uma correlação com as taxas de homicídio observadas” salientam os autores do trabalho, observando que a existência de uma única delegacia de homicídios para o conjunto da Baixada, com menos de 40 policiais e pouco mais de 100 inquéritos abertos, não contribui para diminuir os níveis de impunidade que consigam conter a gravidade do problema.

Um dado curioso que salta aos olhos no trabalho. O número de vítimas fatais reconhecidas pela polícia é maior no município do Rio, quando se considera o tamanho da população, porém é maior ou igual na Baixada, quando se compara com o contingente policial. Neste contexto, o elevado número de pessoas mortas em intervenções policiais registradas na Baixada é um fato preocupante dizem os especialistas, apresentando dados que mostram que houve redução de homicídios imediatamente após a prisão dos policiais militares acusados da chacina de 31 de março.

Na parte que lhe cabe no trabalho, os membros da ONG Justiça Global observam que as investigações, os efeitos, e, conseqüentemente, os destinos dos diferentes casos de violência variam na Baixada. “Temos situações em que as instituições de investigação e denúncia funcionam, mas o processo permanece estagnado, devido à ineficácia do Poder Judiciário”.

Leia as propostas do dossiê

A) Para o Ministério da Justiça

1) Criação de um Conselho de Direitos Humanos da Baixada Fluminense com composição paritária que inclua as três esferas governamentais(prefeituras, estado e União) e representantes da sociedade civil;

2) Criação de uma força tarefa composta pela Polícia Federal e pela Polícia Civil para investigar e ‘desmontar’ os Grupos de Extermínio da Baixada Fluminense;

B) Para a Secretaria Nacional de Direitos Humanos

3) Implementação do programa nacional de proteção aos defensores de Direitos Humanos;

C) Para o Congresso Nacional (Câmara e Senado)

4) Imediata aprovação da Lei que cria o Fundo Nacional de Amparo às Vítimas de Violência – FUNAV, cujo Projeto de Lei nº 3.503/04 se encontra para entrar em pauta na Câmara Federal;

5) Efetivação do controle externo da atividade policial pelo Ministério Público;

6) Aprovação da Lei nº 9.299/96 que prevê ampliação da competência da justiça comum na elucidação e no julgamento dos crimes praticados por policiais militares;

D) Para o Governo do estado do Rio de Janeiro

7) Ampliação e investimentos para o programa de proteção às testemunhas e vítimas da violência;

8) Iniciativa de indenização por parte do Estado para as vítimas efamiliares de vítimas de violência policial, assim como ocorreu no caso da Baixada segundo a Lei nº 2749/05;

9) A adoção por parte das autoridades da segurança pública do Estado de um plano semestral de redução de homicídios no estado e particularmente na Baixada Fluminense;

10) Cumprimento da Resolução Nº 73, de 19/11/98, do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, que determina os níveis de transmissão luminosa e de transparência emitidos para as áreas envidraçadas dos veículos, impedindo a camuflagem nos veículos, que dá a falsa sensação de proteção ao cidadão comum, mas que acaba protegendo criminosos;

11) Melhoria na remuneração dos policiais e busca de alternativas como o pagamento de horas-extras para evitar os “bicos” dos policiais;

12) Reformulação dos métodos de treinamento e dos cursos de formação;

13) Reestruturação e aprimoramento dos procedimentos de seleção dos policiais;

14) Reciclagem dos policiais da ativa a começar pelos Batalhões da Baixada Fluminense;

15) Implementação de programa de atendimento psicológico aos policiais e agentes de segurança envolvidos em ocorrências seguidas de morte, bem como aos vitimados por estes e aos seus familiares;

16) Criação de programas que retirem temporariamente das ruas policiais que participem de eventos com resultado de morte;

17) Premiação para Batalhões, delegacias, equipes e policiais que elucidarem situações complexas sem o emprego da força, bem como diminuírem o número de mortes, particularmente na Baixada Fluminense;

18) Fortalecimento e ampliação da Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense;

19) Elaboração de cartilha sobre direitos e deveres de policiais e cidadãos na abordagem policial;

20) Campanha pública na Baixada Fluminense sobre a prática policial correta e ampla divulgação dos canais de denúncia dos abusos praticados por policiais;

21) Garantia de acesso por parte das organizações de Direitos Humanos às perícias realizadas pelos Institutos de Medicina Legal;

22) Modernização da estrutura dos órgãos periciais e desvinculação da Secretaria de Segurança Pública;

23) Aparelhamento adequado, autonomia e independência para as corregedorias dos órgãos de segurança pública, assim como uma gratificação para os funcionários lotados nelas;

24) Plena autonomia e independência das ouvidorias de polícia, além de poder de investigação de denúncias relativas à crimes cometidos por policiais;

25) Afastamento imediato do agente de segurança pública acusada de tortura, homicídio ou corrupção, durante a fase de investigação;

E) Para as Prefeituras Municipais do estado do Rio de Janeiro

26) Criação da Secretaria Municipal ou Coordenadoria de Direitos Humanos com uma ouvidoria independente do tipo disque-denúncia, em conformidade com recomendação dos Planos Nacional e Estadual de Direitos Humanos;

27) Criação ou Reformulação de Guarda Municipal, em sintonia com os Planos Nacional e Estadual de Direitos Humanos;

28) Criação de Comissões Permanentes de Direitos Humanos nas Câmaras de Vereadores;

F) Para a mídia

29) Cobertura da violência na Baixada Fluminense condizente com a importância e gravidade do problema.

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