Causa da fortuna

TJ de Goiás reduz honorários advocatícios considerados abusivos

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16 de março de 2006, 17h39

Ao invés de R$ 443,3 milhões, uma advogada receberá R$ 100 mil de honorários advocatícios por atuar em uma causa de família. A redução foi determinada pela 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás.

O TJ anulou cláusula contratual firmada entre advogada e cliente que fixava os honorários em 20% do valor dos bens que uma criança recebeu de herança de seu pai e de seu avô, em ação de reconhecimento de paternidade.

A Justiça considerou o valor fixado “abusivo”, além de “causar ao recorrente onerosidade excessiva, bem como por violar princípios basilares do sistema de tutela consumerista”. A decisão do TJ foi unânime e teve como relator o desembargador Felipe Batista Cordeiro.

Segundo os autos, ao final dos trâmites dos processos do reconhecimento da paternidade e do inventário, a criança obteve, como herança, uma propriedade rural de 78,27 alqueires, hoje cotada em R$ 2 milhões. A mãe, que representou a criança, alegou no TJ que, ao procurar a advogada para pagar seus honorários, ela exigiu que fosse feito por meio de terras, ou seja, queria receber 20% da área obtida pelo seu filho.

A mãe do menino afirmou que, em nenhum momento, tentou esquivar-se da obrigação de pagar, mas que seu intuito era adequar o valor do serviço prestado às condições e à legislação pertinente. A defesa da criança alegou que não houve autorização judicial a possibilitar que sua mãe, por meio do referido contrato, comprometesse o seu patrimônio. Por isso, a cláusula contratual seria nula.

O desembargador Cordeiro ponderou que a “entabulação de contrato de honorários advocatícios pela mãe sem autorização judicial, por si só, é perfeitamente válido porque se trata de mera administração dos interesses daquele”. Mas, para o desembargador, isso não significa que uma de suas cláusulas não possa ser anulada, se for verificada sua abusividade.

Para ele, é fácil perceber a vulnerabilidade da mãe que, na persecução dos interesses de seu filho, contratou a advogada, prometendo-lhe o pagamento de uma quantia que não imaginava ser vultosa. Caberia à profissional orientá-la sobre a alta quantia que teria de pagar pelos seus serviços.

O desembargador Felipe observou que o valor pactuado no contrato, ante a sua efetiva significação, mostra-se “assaz desarrazoado, desproporcional, ferindo, inclusive o princípio da harmonia nas relações de consumo, uma vez que impinge ao consumidor ônus excessivo, propiciando um desenvolvimento econômico astronômico à advogada, valor aquele que exorbita a noção do bom senso, do justo”.

Leia a íntegra da ementa

A ementa recebeu a seguinte redação: “Apelação Cível. Contrato Celebrado por Menor Representado por sua Genitora. Necessidade de Autorização Judicial. Simples Administração dos Bens do Menor. Serviços Advocatícios. Aplicação do CDC. Cláusula Abusiva. Onerosidade Excessiva. Ofensa a Princípios Basilares da Tutela de Consumo. Nulidade.

1 _ Contrato de honorários advocatícios firmado pela genitora, em representação de seu filho menor incapaz, visando a defesa dos interesses hereditários deste em juízo não necessita de prévia autorização judicial (art.386, CC/16), porquanto se trata de mera administração dos interesses do menor, mesmo que no contrato esteja estabelecida como pagamento uma quota dos bens que o menor auferir.

2 _ O art.3º, do CDC, é claro ao impor a sua incidência sobre os serviços prestados por profissionais liberais, neste inclusos os serviços advocatícios, razão pela qual se deve aplicar o CDC aos contratos de honorários advocatícios.

3 _ Nos termos do art.51, do CDC, é nula de pleno direito a cláusula contratual que impor obrigação iníqüa, abusiva contrária à boa_fé e à eqüidade (inciso IV), bem como aquela em desarcordo com o sistema de tutela consumerista (inciso XV), e, ainda aquela que ofender princípios fundamentais da relação de consumo (§ 1º, III).

4 _ In casu, a cláusula segunda do referido contrato de honorários advocatícios mostra_se abusiva, viola os princípios da boa_fé, da eqüidade e da harmonia na relação de consumo, impondo ônus excessivamente exorbitante ao consumidor, ofendendo, por conseguinte, o sistema da tutela consumerista, razão pela qual patente é a sua nulidade, nos termos do art.51,IV, XV, e § 1º, I e III do CDC.

5 _ Uma vez que a ação patrocinada pela causídica , prestadora do serviço, não tem cunho condenatório, o valor a ser pago, a titulo de honorários, pelo consumidor do serviço prestado deve ser arbitrado equitativamente com base no § 4º, do art.20, do CPC.

6 _ Ademais, uma vez reformada a sentença, acarretando alteração na sucumbência, imperiosa é a inversão dos ônus sucumbenciais.

7 _ Recurso de apelação conhecido e provido. Apelação Cível nº 86612-3/188 – 200500383329. Publicado no DJ de 6 de março de 2006).

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