Advogados do bem

OAB regulamenta exercício voluntário da advocacia

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11 de março de 2006, 7h00

A reunião do Conselho Federal Pleno da OAB deste domingo (12/3) e segunda (13) discutirá a resolução nacional de regulamentação da advocacia pro bono. A idéia dos advogados de grandes escritórios prestarem serviços advocatícios para quem precisa ainda é recente no Brasil e só é regulamentada pela OAB São Paulo.

A resolução nacional pretende inserir alguns aspectos que não eram admitidos pela resolução da OAB paulista de 2001. A atividade pro bono não estaria mais restrita a consultoria, como no caso paulista, mas a todas as atividades próprias da advocacia. O atendimento também poderá ser prestado a pessoas físicas, o que na versão paulista é limitado as entidades de terceiro setor.

De acordo Sérgio Ferraz, advogado e membro do Conselho Federal da OAB, não será fácil aprovar a resolução, já que o Pleno é composto por 81 membros e cerca de 60 devem discutir a questão, que gera polêmica. “Já conseguimos começar a mudar a mentalidade de advogados que consideravam o trabalho voluntário da advocacia um desvio ético, caso de concorrência desleal ou captação de clientela. Mas reverter essa idéia ainda não é um trabalho concluído,” afirmou Ferraz no Debate Público sobre a Advocacia Pro Bono no Brasil que ocorreu na Fundação Getúlio Vargas na quinta-feira (9/3).

“A advocacia pro bono não é ajuda para amigos, mas um voluntariado desinteressado”, diz o advogado e membro do conselho Instituto Pro Bono Roberto Quiroga Mosquera. Para ele a distinção é importante para que as questões éticas que envolvem a atividade fiquem que bem resolvidas. Isso não quer dizer que a entidade tenha que ser carente para receber assistência gratuita, a organização pode até ter uma boa estrutura, mas não pode ter como pagar a sua defesa.

Segundo Quiroga, um dos bloqueios para o crescimento da advocacia pro bono é o medo que os advogados têm da OAB. “Muitos advogados paulistas não acreditam que aquela resolução é verdadeira. Mas isso pode melhorar se a resolução nacional for aprovada.”

Outro problema da advocacia pro bono levantado por Quiroga é que como toda atividade, há a possibilidade de riscos para o escritório. “Pode ser arriscado pegar uma causa muito popular para um escritório de advocacia empresarial. Isso pode acarretar em risco de imagem. Há um medo de advogar para pobre porque isso talvez prejudique os clientes ricos.”

Para Miguel Reale Junior, presidente do conselho do Instituto Pro Bono, a advocacia pro bono não serve para eximir o advogado da sua culpa de ser bem sucedido. “Se essa fosse a intenção seria melhor fazer uma mera prestação pecuniária.” Para Reale Junior a intenção é fazer da profissão um serviço social. “Transformar o problema do nosso cliente no nosso problema sem que haja interesse econômico. Usar a nossa inteligência e conhecimento como instrumento de justiça social. Mas a solidariedade não faz parte da nossa cultura e isso não é um processo que se impõe de cima para baixo.”

Advogados do bem

A idéia da advocacia pro bono no Brasil começou a ser desenvolvida com a criação da associação sem fins lucrativos Instituto Pro Bono, em 24 de julho de 2001, formada de início por 37 advogados. Hoje o instituto tem aproximadamente 190 advogados cadastrados e 20 dos maiores escritórios de advocacia em seu banco de voluntários.

De acordo com o Instituto, a advocacia voluntária pode ser enquadrada no artigo 170, inciso VII da Constituição Federal, que estabelece que as empresas enquanto agentes da ordem econômica devem seguir o princípio de redução das desigualdades sociais. E por, isso, os escritórios poderiam seguir a mesma lógica por analogia.

A atividade também está de acordo com o artigo 2° do Código de Ética da OAB “O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que exerce.”

Após a criação do Instituto Pro Bono, que faz o acompanhamento dos serviços voluntários prestados, foi criada na OAB-SP uma comissão de estudos pro bono para regulamentar a advocacia voluntária. Dessa comissão,participaram membros da Comissão de Ética e Disciplina da OAB, representantes do Cesa — Centro de Estudos das Sociedades dos Advogados e sócios fundadores do Instituto.

No ano de 2005 até fevereiro de 2006, foram atendidas 72 demandas de entidades da sociedade civil. Algumas delas foram atendidas pela equipe interna do Instituto e outras repassadas a advogados voluntários. Em 2004 foram 68 demandas e em 2003 foram 69 demandas. Se a resolução nacional for aprovada, mais escritórios poderão exercer a atividade voluntária dentro dos limites éticos da OAB.

Leia a Resolução Pro Bono da OAB São Paulo editada em 19/8/2002.

“RESOLUÇÃO PRO BONO”

O Conselho Seccional de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil, em sessão de 19 de agosto de 2002, por votação unânime, resolve regulamentar a atividade denominada “advocacia pro bono” como segue:

Artigo 1º – As atividades pro bono são de assessoria e consultoria jurídicas, permitindo-se excepcionalmente a atividade jurisdicional.

Parágrafo único – Ocorrendo honorários sucumbências, os mesmos serão revertidos à entidade beneficiária dos serviços, por meio de doação celebrada pelo advogado ou sociedade de advogados prestadores da atividade pro bono.

Artigo 2º – Os beneficiários da atividade pro bono devem ser pessoas jurídicas sem fins lucrativos integrantes do Terceiro Setor, reconhecidas e comprovadamente desprovidas de recursos financeiros, para custear as despesas procedimentais, judiciais ou extrajudiciais.

Artigo 3º – Os advogados e as sociedades de advogados que desempenharem atividades pro bono para as entidades beneficiárias definidas no artigo 2º, estão impedidos, pelo prazo de 2 (dois) anos, contados da última prestação de serviço, da prática da advocacia, em qualquer esfera, para empresas ou entidades coligadas às assistidas, impedimento extensivo às pessoas físicas que as compõem, sejam na condição de diretores, membros do conselho deliberativo, sócios ou associados, bem como entidades que estiverem direta ou indiretamente controladas por grupos econômicos privados, ou de economia mista ou fundacional.

Parágrafo único – Os impedimentos constantes do caput deste artigo são extensivos a todos os integrantes das sociedades de advogados prestadores de advogados prestadores da atividade da atividade, incluindo-se os advogados contratados, prestadores de serviço, ainda que não mais estejam vinculados à sociedade de advogados.

Artigo 4º – Os advogados e sociedades de advogados que pretendam exercer atividades pro bono deverão comunicar previamente ao Tribunal de Ética e Disciplina, os objetivos e alcance de suas atividades, devendo, também, encaminhar a esse Tribunal, relatório semestral contendo as seguintes informações: denominação social da entidade beneficiária, tipo de atividade a ser prestada, data de início da atividade.

Parágrafo único – O Tribunal de Ética e Disciplina poderá determinar o arquivamento do relatório em pasta própria, ou requisitar esclarecimentos que deverão ser prestados pelos advogados e sociedades de advogados referidos no caput deste artigo, ainda que fora dos prazos ali estabelecidos.

Artigo 5º – A atividade pro bono implica conhecimento e anuência prévia, por parte da entidade beneficiária, das disposições desta resolução.

Artigo 6º – Aplicam-se à atividade pro bono as regras do Estatuto da Advocacia e da OAB, do Código de Ética e Disciplina e das resoluções da OAB que versem sobre publicidade e propaganda.

Sala das Sessões, 19 de agosto de 2002.

Carlos Miguel C. Aidar

Presidente

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