Gaveta do Supremo

Presidente do STF demora até oito anos para analisar ações

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3 de março de 2006, 13h19

A saída antecipada do ministro Nelson Jobim do Supremo Tribunal Federal, além de abrir uma nova vaga na Corte, deve fazer com que voltem à pauta de julgamentos importantes processos retidos em seu gabinete. Há pedidos de vista em mais de uma dúzia de ações diretas de inconstitucionalidade — um dos casos já completou oito anos.

Uma dessas importantes questões retidas voltou à pauta do Plenário do Supremo na semana anterior ao Carnaval: a ADI 2.591. Depois de três anos, Jobim trouxe seu voto a julgamento e os ministros puderam discutir a questão da aplicação do Código de Defesa do Consumidor às relações bancárias.

A notícia só não foi melhor para quem esperava a decisão em razão de novo pedido de vista. Dessa vez, do ministro Eros Grau, que ao pedir vistas deu-se ao trabalho de prometer que devolverá o processo no prazo regimental de 10 dias.

O número de pedidos de vista do presidente do Supremo — e o tempo que levou para analisar as ações — fundamentou pedido de interpelação feito contra Jobim. O pedido foi negado pelo ministro Joaquim Barbosa, que, sem entrar no mérito da questão, entendeu que o Supremo não é competente para julgar o caso.

Com base no levantamento feito pelo advogado Ivan Ferreira Nunes, a revista Consultor Jurídico apurou quais são as ADIs que estão nas mãos de Jobim e desde quando ele as detêm. De início, descobriu-se a ADI 2.135, cujo autor é o Partido dos Trabalhadores.

A ação é contra a Emenda Constitucional 19. Antes da vista de Jobim, um pedido da ministra Ellen Gracie já havia adiado o julgamento. No entanto, entre o pedido de vista da ministra e a devolução dos autos, houve um intervalo de 7 meses e 19 dias. O presidente do STF está de posse dos autos há 3 anos, 8 meses e 26 dias. E não se trata de uma exceção.

Atitudes como as de Jobim contribuíram para que, em 2003, o presidente do Supremo Tribunal Federal na época, ministro Maurício Corrêa, editasse uma resolução com o seguinte teor: “O Ministro que pedir vista dos autos deverá devolvê-los no prazo de 10 (dez) dias, contados da data que os receber em seu Gabinete. O julgamento prosseguirá na segunda sessão ordinária que se seguir à devolução, independentemente da publicação em nova pauta”. Levantamento feito à época mostrava o atual presidente do STF como campeão de pedidos de vista.

Contrato de trabalho

Um dos temas mais espinhosos nas mãos do atual presidente do Supremo é o da ADI 1.764. O tema gira em torno do contrato de trabalho por prazo determinado. A matéria foi questionada por partidos como o PCdoB e o PDT, além do PT. Depois do voto do relator, ministro Sydney Sanches, atualmente aposentado, houve o pedido de vista de Jobim que já completou sete anos.

Procurado pela ConJur, o PDT declarou em nota da área jurídica: “A protelação exagerada causa, na maioria das vezes, a depender do teor da lei que se impugna, prejuízos irreparáveis, tornando inócua a ação de partidos como o PDT que, em busca de um bem maior, se antecipam em questionar a constitucionalidade das leis, mas não só em Ações Diretas, como também em Argüições de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF e outras”.

As questões políticas que envolvem certas matérias muitas vezes são determinantes da velocidade com que são julgadas as ações. Cumpre ressaltar que a morosidade excessiva é um problema que afeta o Poder Judiciário como um todo, não só o Supremo Tribunal Federal.

A “doença” que atinge os Tribunais é muito mais profunda e decorre de um sistema legal que ainda impede a agilidade processual, em decorrência da infinidade de recursos, possibilidade de pedidos de vista sem prazo a cumprir, embargos de várias espécies, entre outros.

Não menos espinhoso é o tema da ADI 1.491: a Lei 9.295/96, responsável pelos serviços de telecomunicações e sua organização, que trata da Anatel — abrange a organização dos serviços de telecomunicações, a exploração de serviço móvel celular, de serviço limitado e de serviço de transporte de sinais de telecomunicações por satélite. Apesar da repercussão do tema, Nelson Jobim assegura a suspensão do debate desde julho de 1998.

A mesma impossibilidade de debate ocorre com o julgamento da ADI 1.625. Ajuizada pela Contag — Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, a ação questiona o Decreto 2.100/96, baixado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O decreto trata da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho, que na prática criaria empecilhos para o término da relação de trabalho por iniciativa do empregador. Vão-se anos desde que Jobim decidiu pesar a mão sobre o andamento do tema — outubro de 2003.


“Esse processo foi ajuizado conjuntamente com a CUT em 1997”, afirmou o assessor jurídico da Contag, Ivaneck Perez Alves. “Já se passaram nove anos e não julgam sequer a liminar. Ninguém quer meter a mão na cumbuca. O pedido de vista é uma forma de adiar a decisão. A ADI serve como forma de preservação da Constituição. Ao Supremo foi dado o controle sobre os atos do Legislativo e do Executivo. Então, se o presidente do Tribunal indica para seus pares que se deve adiar uma decisão, a gravidade do fato é maior”, critica.

Em setembro de 2002, o ministro pediu vista de uma ADI impetrada pela Confederação Nacional do Comércio. A entidade ajuizou o pedido com a intenção de derrubar a incidência de ICMS sobre a alienação de carros “salvados” por seguradoras. O que se pede é a declaração de inconstitucionalidade de um inciso da Lei Estadual 6.763/75, de Minas Gerais, que sofreu duas alterações posteriores.

“A CNC não tem uma posição sobre o tema”, disse um representante do corpo jurídico da CNC. Segundo informou, a ação foi iniciativa de um escritório externo à entidade e a CNC apenas ajuizou o pedido para atender demanda de um dos seus diversos representados. A posição da Confederação, em regra, tem sido de se manter no aguardo das ADI ajuizadas. E, se for o caso, apenas peticionar para pedir preferência no julgamento.

Proposta pela Confederação Nacional das Indústrias, a ADI 1.924 questiona artigos da MP 1.715/98, que trata do Programa de Revitalização de Cooperativas de Produção Agropecuária e autoriza a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo. Em fevereiro de 1999, Nelson Jobim impediu o prosseguimento do julgamento da ADI. Questionada, a entidade informou que não se manifesta a respeito de processos em andamento.

A Lei 9.637/98, de reestruturação da Eletrobrás — Centrais Elétricas Brasileiras, resultado da conversão da MP 1.648/98 pelo Congresso Nacional, também não escapou à necessidade de análise mais cuidadosa do presidente do Supremo. O pedido de vista foi feito por Jobim em agosto de 1999.

A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário, Aéreo, na Pesca e nos Portos foi outra prejudicada com a demora nos julgamentos. A entidade ingressou no Supremo contra a Lei 9.719, sobre normas e condições gerais de proteção ao trabalho portuário. Nesse caso, Nelson Jobim atua como relator da ação. Os autos estão conclusos em seu gabinete desde março de 2003.

Leis estaduais

Diversas ADI que tratam de leis estaduais completam a lista de pedidos de vista do presidente do Supremo. A ADI 1.894, ajuizada pelo governo de Santa Catarina, está nas mãos de Jobim desde dezembro de 1998. Questiona a Lei Estadual 10.789/98, que dispõe sobre normas de administração tributária para estimular o cumprimento voluntário de obrigações fiscais.

A ação 423, contesta artigos dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Espírito Santo. Trata do direito de opção do regime jurídico dos servidores do Judiciário do estado. Houve concessão parcial de liminar. O pedido de vista de Nelson Jobim perdura desde dezembro de 1998.

A ADI 494 questiona vários dispositivos da Lei Complementar 7/90 de Mato Grosso, que trata da organização da Defensoria Pública no estado, com sua respectiva autonomia funcional e administrativa. O pedido de vista foi feito em dezembro de 1997.

A mesa diretora da Assembléia Legislativa do Paraná valeu-se da ADI 682 para questionar a Lei Estadual 9.346, mais uma ação sob pedido de vista de Jobim. A Assembléia questiona a normatização dos procedimentos de matrícula para alunos da primeira série do primeiro grau, acompanhados de uma série de laudos, para o ano de 1991. Jobim pediu vista em março de 1998. Os alunos que deveriam ser beneficiados pela ação na época de sua apresentação, terminaram o primeiro grau no ano passado.

A emenda 7 da Constituição da Bahia está sendo questionada pelo Partido dos Trabalhadores local na ADI 2.077. O pedido de vista, nesse caso, ocorreu em outubro de 1999. Como nos outros casos, o julgamento ainda não foi retomado.

A ADI 255 ajuizada pelo procurador-geral da República, ataca dispositivo da Constituição gaúcha que trata classificação entre os bens do estado as terras dos extintos aldeamentos indígenas. Desde junho de 2002 Jobim está com o processo.


No caso da ADI 1.945, que teve como relator o ministro Octavio Gallotti, aposentado desde outubro de 2000,questiona-se legislação estadual sobre ICMS. Desde abril de 1999 se aguarda o retorno do julgamento. Não há, até agora, vencedores ou vencidos das ações, mas todos comemoram a devolução dos atos pelo presidente do STF.

Ações com pedidos de vista do ministro Nelson Jobim

Ação

Data do pedido de vista

ADI 494

30/12/1997

ADI 682

26/3/1998

ADI 1764

7/5/1998

ADI 1491

01/7/1998

ADI 1894

02/12/1998

ADI 423

9/2/1999

ADI 1945

8/6/1999

ADI 1923

10/8/1999

ADI 255

3/7/2002

ADI 2135

8/7/2002

ADI 1648

27/9/2002

ADI 1940

Jobim é o relator. Autos conclusos desde 19/3/2003

ADI 1625

9/10/2003

ADI 1924

10/11/2003

ADI 2077

10/11/2003

ADI 2591

Jobim é o relator. Autos conclusos desde 30/7/2004

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