Insubstituível

Acordo não pode substituir Justiça do Trabalho por arbitragem

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3 de março de 2006, 11h25

É nula a cláusula de acordo coletivo que substitui a Justiça do Trabalho por um “tribunal de arbitragem” nos conflitos entre patrões e empregados, pois afronta o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. A regra diz que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

O entendimento é da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Os juízes condenaram o Banespa e a empresa de segurança Estrela Azul a pagar todas as verbas trabalhistas a um ex-empregado, que trabalhava como vigilante. Cabe recurso.

O segurança entrou com processo na 69ª Vara do Trabalho de São Paulo reclamando o pagamento das verbas trabalhistas. A Estrela Azul Serviços de Vigilância, Segurança e Transporte de Valores também entrou no processo, como a contratante do trabalhador para prestar serviços ao Banespa.

Para se defender, as empresas alegaram que a rescisão do contrato de trabalho do ex-empregado foi homologada por uma Comissão de Conciliação Prévia, como previsto na convenção coletiva da categoria profissional.

A primeira instância decidiu que os direitos e valores homologados pela comissão não poderiam mais ser questionados na Justiça do Trabalho. O trabalhador apelou ao TRT-SP e sustentou que o acordo “representa fraude à legislação trabalhista”.

O relator do caso, juiz Ricardo Artur Costa e Trigueiros, entendeu que “a cláusula coletiva que substitui a Justiça do Trabalho por um ‘tribunal de arbitragem’ é nula de pleno direito”.

Para o relator, a exigência cria “óbice inconstitucional ao acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, CF)” e “embaraços à aplicação dos princípios protecionistas da legislação trabalhista”.

“O sistema de solução de conflitos através de arbitragem, nesta Justiça, por força do parágrafo 1º do artigo 114 da Constituição Federal, é limitado às demandas coletivas”, explicou o juiz, acrescentado que “nem Tribunal de Arbitragem e nem Comissão de Conciliação Prévia são instâncias homologatórias para quitação de rescisão contratual”.

RO 02072.2002.069.02.00-1

Leia a íntegra da decisão

4ª. TURMA — PROCESSO TRT/SP NO:02072200206902001(20031044861)

RECURSO: RECURSO ORDINÁRIO

1º) RECORRENTE: JOÃO ROBERTO DE LIMA

2º) RECORRENTE: BANESPA BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S/A.

RECORRIDO: ESTRELA AZUL SERVIÇOS VIG. SEG. VAL. LTDA.

ORIGEM: 69ª VT DE SÃO PAULO

EMENTA: TRIBUNAL DE ARBITRAGEM. CLÁUSULA PARA SOLUÇÃO DE CONFLITOS INDIVIDUAIS. INCONSTITUCIONALIDADE. A cláusula que substitui a Justiça do Trabalho por um “tribunal de arbitragem” é nula de pleno direito: a uma porque cria óbice inconstitucional ao acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, CF); a duas porque cria embaraços à aplicação dos princípios protecionistas da legislação trabalhista; a três porque o sistema de solução de conflitos através de arbitragem, nesta Justiça, por força do § 1º do artigo 114 da Constituição Federal, é limitado às demandas coletivas, já que o referido dispositivo explicitamente dispõe que “frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitro”. Ainda que se pudesse admitir a incidência desse sistema para solução negociada de conflitos individuais, o que se diz por argumentar, in casu, o acordo celebrado com quitação plena não se sustenta. É que atuando o Tribunal de Arbitragem como mero órgão homologador da rescisão contratual, a avença, quando muito configuraria ato jurídico de efeito liberatório restrito, nos mesmos moldes dos atos homologatórios praticados perante a autoridade administrativa do Ministério do Trabalho, não possuindo o alcance da quitação extintiva com eficácia liberatória plena, pretendida pelo empregador e muito menos ostentaria a feição de ato jurídico perfeito ou de coisa julgada.

Contra a respeitável sentença de fls.160/162 recorre ordinariamente o reclamante alegando que o acordo perante a Comissão de Conciliação prévia não merece validade sustentando que este representa fraude a legislação trabalhista. Argumenta que no somatório pago ao reclamante não está inclusa a multa de 40% na quitação sobre o FGTS, tampouco o aviso prévio e 1/12 de sua projeção temporal em 13º salário e férias. O apelo também persegue a multa prevista no § 8º do artigo 477 da CLT, sustentando ser irrelevante o argumento de que os pagamentos foram celebrados perante a Comissão de Conciliação Prévia, visto que o texto legal não tem exceções. Alega que o adicional de risco, diante de sua natureza jurídica, proporciona reflexos no aviso prévio, 13º salário, férias acrescidas de um terço. No que diz respeito à multa do artigo 467 da CLT, destaca a nova redação deste dispositivo. Quanto ao intervalo para refeição e descanso, alega que a natureza das funções desenvolvidas não permite o intervalo em exame.


Contra-razões fls.195/201 e fls.202/209.

A segunda reclamada também recorre propugnando pela extinção do feito com julgamento do mérito pela falta de interesse de agir, diante da transação levada a efeito perante a comissão prévia de conciliação. No mérito o apelo se insurge quanto à responsabilidade subsidiária, invocando o artigo 71 § 1º da Lei 8.666/93.

Contra-razões fls.211/220.

Considerações do Digno representante do Ministério Público do Trabalho, fls.221, quanto à inexistência de interesse público que justificasse sua intervenção.

É o relatório.

V O T O

Conheço porque presentes os pressupostos de admissibilidade.

RECURSO DA SEGUNDA RECLAMADA

Incontroverso que o reclamante compareceu perante um “Tribunal de Arbitragem” no qual deu quitação quanto às verbas rescisórias e extinto contrato de trabalho.

Inicialmente temos a destacar que a cláusula coletiva que substitui a Justiça do Trabalho por um “tribunal de arbitragem” é nula de pleno direito: a uma porque cria óbice inconstitucional ao acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, CF); a duas porque cria embaraços à aplicação dos princípios protecionistas da legislação trabalhista; a três porque o sistema de solução de conflitos através de arbitragem, nesta Justiça, por da Constituição Federal, é limitado às demandas coletivas, já que o referido dispositivo explicitamente dispõe que “frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitro”.

E ainda que pudesse ser superada a questão sob o enfoque acima destacado, o que se admite apenas para raciocinar, menos sorte colhe a segunda reclamada quanto à analise dos parágrafos 1º e 3º da cláusula 3ª do Acordo Coletivo (vide documento 125 do primeiro volume de documentos em apartado da reclamada).

Explico. O acordo coletivo, para evitar caracterização de coação, vinculou a possibilidade de uso do Juízo Arbitral à concordância direta do empregado, a ser feita por escrito, pelo que, sua adesão expressa deveria ser inserida no contrato de trabalho, o que não ocorreu no caso dos autos.

Assim, deixando de se cumprir condição imprescindível inserta na norma coletiva, não há como validar qualquer acordo que não se revestiu da formalidade indispensável para assegurar a não incidência de qualquer tipo de coação.

De outra parte, do exame do documento nº 04 (Vol – I em apartado da serie do reclamante) verifico que o ajuste liberatório é feito sobre direitos decorrentes do contrato de trabalho e rescisão contratual, todavia, os valores da avença dizem respeito apenas às verbas rescisórias.

Logo, ainda que se pudesse admitir a incidência dessa modalidade de solução negociada de conflito individual, atuando o Tribunal de Arbitragem como mero órgão homologador da rescisão contratual, a avença, em verdade, configura ato jurídico de efeito liberatório restrito, nos mesmos moldes dos atos homologatórios praticados perante a autoridade administrativa do Ministério do Trabalho, não possuindo o alcance da quitação com eficácia liberatória plena, leoninamente pretendida pelo empregador.

Outrossim, pouco importa que o acordo extrajudicial tenha sido celebrado em “Tribunal de Arbitragem” ou em “Comissão de Conciliação de Conciliação Prévia” anexa ao aludido “Tribunal”, pois o fato é que em momento algum existiu res dubia com efetiva concessão de parte a parte, tendo o trabalhador recebido apenas parte das verbas rescisórias que lhe eram legalmente asseguradas, não se configurando nesse contexto, transação capaz de liberar o empregador de títulos trabalhistas e muito menos de obstar o livre acesso do trabalhador a esta Justiça especializada.

Nem Tribunal de Arbitragem e nem Comissão de Conciliação Prévia são instâncias homologatórias para quitação de rescisão contratual.

Na situação retratada nos autos, o exame da documentação denuncia que o empregador pretendeu apenas eximir-se das obrigações incontroversas do termo de rescisão do contrato de trabalho (documento nº 122 encartado no volume em apartado da série da reclamada). Com efeito, é transparente da documentação encartada de que a empregadora afrontou o escopo da comissão de conciliação prévia, visto que reputou-a como mera instância homologatória para obter espúria quitação da rescisão contratual, desvirtuando o instituto em exame, vez que o valor acordado na referida comissão não levou em conta sequer a multa de 40% sobre as verbas rescisórias. Tal fato afasta qualquer dúvida de que a conciliação foi mesmo realizada em fraude à legislação trabalhista (art. 9º, CLT).

Dessa forma ajuste celebrado nestas condições não traduz ato jurídico perfeito e tampouco acarreta em coisa julgada no âmbito trabalhista.

Incensurável pois a r.sentença de origem que bem aplicou o direito vigente.


Mantenho.

DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

A decisão de origem, no particular, não comporta reparos.

Insurge-se a segunda reclamada contra a r. sentença, pretendendo sua exclusão como responsável subsidiária da condenação.

Temos como incontroversa a terceirização dos serviços.

A terceirização é um fenômeno mundial e não se pode duvidar que sob certos parâmetros influi na geração de novos empregos e novas empresas, desverticalizando-as para que possam dedicar-se com mais aprimoramento apenas à atividade-fim, delegando a terceiros a execução dos serviços voltados à atividade-meio, ou apenas de apoio e acessórias. Tanto é assim, que surge a partir do momento em que há desemprego na sociedade. Essa terceirização pode envolver tanto a produção de bens como de serviços. Mas de forma alguma pode constituir objeto principal da empresa e nem ser aplicada no âmbito da atividade-fim da empresa tomadora dos serviços, sob pena de desvirtuar-se todo o sistema de relações de trabalho submetendo-o a escusos interesses de mercado. Assim, a terceirização aceitável há de envolver uma contratação em que se agregue a atividade-fim de uma empresa (prestadora de serviços) à atividade-meio de outra (tomadora dos serviços).

O objetivo principal da terceirização – feita dentro dos parâmetros legais – não poderá ser o da redução de custos e tampouco a diminuição de encargos trabalhistas e previdenciários como pretendem muitos empresários, porque essa prática levada ao limite, passa a ter efeito perverso no tocante ao desemprego no setor e precarização dos direitos sociais. O objetivo principal da terceirização é trazer agilidade, flexibilidade e competitividade à empresa, através da transformação dos custos fixos em variáveis, aumentando os lucros, gerando eficiência, economia e eliminando desperdícios, de maneira a poder destinar recursos para pesquisa de tecnologia e criação de novos produtos.

A terceirização não é ilícita nem proibida, estando inclusive permitida e prestigiada em nosso ordenamento jurídico nas hipóteses de trabalho temporário (Lei nº 6.019/74), serviços de vigilância, segurança e transporte de valores para estabelecimentos bancários e de crédito (Lei nº 7.102/83), de conservação e limpeza ou serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador da mão de obra, quando inexistente a pessoalidade e a subordinação direta (Súmula nº 331- TST).

O certo é que a terceirização dos serviços, ainda que lícita não retira a responsabilidade subsidiária da tomadora dos serviços, in casu, a segunda demandada.

O debate de existência ou não de fraude na contratação é irrelevante na resolução do feito, mormente porque para a configuração da responsabilidade subsidiária são necessários, tão-somente, o inadimplemento das obrigações trabalhistas pelo prestador de serviços e bem assim, que o tomador tenha participado da relação processual.

E de mais a mais, é indisfarçável que, para atingir seu objetivo social, o recorrente utilizou-se de empresa prestadora de serviços que se revelou sem qualquer idoneidade, tanto assim que não cumpriu as obrigações emergentes do contrato de trabalho com o reclamante.

O inegável contrato de prestação de serviços firmado entre as reclamadas revela ser a segunda, tomadora dos serviços da primeira, e, no caso dos autos, responsável subsidiária pelas obrigações inadimplidas.

Não resta dúvida, portanto, que a segunda reclamada, vindo a contratar a prestação de serviços do reclamante através da primeira reclamada, tornou-se responsável, de forma subsidiária, pelas obrigações decorrentes do contrato de trabalho mantido entre a última e o autor.

Antes da apreciação propriamente dita da questão levantada, pelo recorrente, de bom alvitre a transcrição da Súmula 331 do C. TST, in verbis:

“Contrato de prestação de serviços. Legalidade – Inciso IV alterado pela Res. 96/2000, DJ 18.09.2000:

I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial ( artigo 71 da Lei nº 8.666 de 21.06.93 ).”


Inaplicáveis ao caso concreto, os incisos II e III da Súmula nº 331 do C. TST, mas sim o inciso IV (todos acima reproduzidos). Tudo isto porque não se discute, no caso vertente, vínculo empregatício do autor diretamente com o tomador de serviços, mas apenas e tão-somente a responsabilidade do segundo, em caráter subsidiário, no tocante à satisfação de obrigações devidas ao primeiro.

Se é certo que a Súmula nº 331 do C. TST é expressa ao afastar a formação do vínculo de emprego com o tomador, nas hipóteses que elenca e desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta, também o é ao estabelecer a responsabilidade do tomador do serviço na hipótese de inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador, em caráter subsidiário, desde que, como ocorre nestes autos, a tomadora tenha participado da relação processual.

Não sendo o cerne da litis a fraude na contratação (que implicaria condenação solidária), a responsabilidade do tomador do serviço é apenas de caráter subsidiário, desde que o empregador não cumpra a condenação. A responsabilidade subsidiária, in casu, é de cunho objetivo, decorrente da própria eleição da modalidade de terceirização de determinado tipo de serviço. Este entendimento se justifica, na medida em que o tomador dos serviços beneficia-se diretamente da força de trabalho do empregado da prestadora.

Afinal, o espírito que norteia o entendimento ora adotado é o fato de alguém, mesmo não sendo o empregador, ter-se beneficiado da força laborativa do obreiro.

Ressalte-se, ainda, que não se trata de simples adoção, de forma incondicionada, do entendimento dominante.

Nem se argumente inexistir preceito legal que ampare a responsabilidade subsidiária, nos termos da Súmula 331 do C.TST, visto que o referido padrão jurisprudencial veicula síntese interpretativa arrimada em princípios protecionistas peculiares ao Direito do Trabalho.

A Súmula nº. 331 do C. TST estabelece a responsabilidade do tomador do serviço na hipótese de inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador, em caráter subsidiário, desde que o tomador tenha participado da relação processual. Frise-se que este verbete sumular suplanta lacuna legislativa, diante da expansão do fenômeno da terceirização, sendo que o escopo dessa inteligência, na verdade, é proteger os créditos trabalhistas que, em face da sua natureza jurídica, deverão ser sempre privilegiados.

Logo, não há que se falar em violação ao princípio da legalidade, já que a condenação subsidiária decorre do enfrentamento da litiscontestatio à luz da prova produzida e do padrão sumular aplicável à espécie.

É curial que as Súmulas não são leis. Embora sem efeito vinculante, constituem, todavia, valiosos referenciais interpretativos que sintetizam e pacificam o entendimento da Corte Superior Trabalhista sobre determinados temas. As Súmulas são baixadas em estrita consonância com a lei e Regimento Interno daquela Corte, e realizam uma das finalidades essenciais do C.TST, qual seja a de uniformizar a interpretação do direito em escala nacional, conferindo harmonia e segurança na aplicação do direito, em benefício dos próprios jurisdicionados e operadores jurídicos.

A segunda reclamada, não pode olvidar-se que o tomador responde pela culpa “in vigilando” e “in eligendo“, já que foi beneficiária do trabalho prestado pelo reclamante.

Ademais, não se pode esquecer, também, que a Súmula 331 do Colendo TST foi firmada levando em conta a teoria da responsabilidade civil prevista pelo artigo 159 do antigo Código Civil de 1916 (artigos 186 e 927 do Código Civil de 2002), alcançando até mesmo pessoas de direito público, vale dizer, quando a tomadora de serviços é empresa ligada à administração pública.

Outrossim, ao se reconhecer a responsabilidade da tomadora, o entendimento cristalizado na jurisprudência do TST está em perfeita harmonia com os princípios protetivos do Direito Laboral que não admitem que o empregado sofra qualquer prejuízo decorrente do inadimplemento das obrigações contratuais por parte do empregador.

Não se pode olvidar que os direitos reconhecidos tiveram origem no curso do contrato de trabalho (em relação ao qual a segunda reclamada é responsável subsidiária por ter-se beneficiado do trabalho do autor), e que cabia à tomadora zelar pela contratação de empresa idônea e cumpridora de suas obrigações (culpa “in eligendo” e “in vigilando“), justificando-se a responsabilização subsidiária da tomadora, quanto às parcelas pleiteadas já que restou evidente a ausência das cautelas necessárias à legalidade da terceirização, devendo, desta maneira, arcar com o risco inerente à tal pactuação, responsabilizando-se subsidiariamente pelos direitos do reclamante.


Assim, considerando-se todo o exposto e que a segunda reclamada usufruiu da força de trabalho do empregado, aliado aos princípios constitucionais sobre os quais fundamenta-se nossa República, notadamente aqueles que velam pela dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal) e os valores sociais do trabalho (artigo 1º, IV, Constituição Federal), deve ser mantida no pólo passivo da demanda, a segunda reclamada como garantia da satisfação do crédito trabalhista atribuído ao obreiro, na possibilidade de por eventual motivo, restar inviabilizada a cobrança contra o empregador.

Ex positis, tenho como irrepreensível, a r. sentença revisanda, cujo teor merece ser prestigiado pelo que torna a recorrente responsável subsidiaria na condenação da primeira reclamada.

Mantenho.

RECURSO DO RECLAMANTE

DA MULTA PREVISTA NO ARTIGO 477 DA CLT

O escopo do legislador ao acrescer os parágrafos 6º e 8º ao artigo 477 da CLT, foi impedir que o empregador retarde ou frustre injustificadamente, em prejuízo do empregado, o pagamento das parcelas rescisórias devidas de forma incontroversa, estabelecendo prazo máximo para o pagamento e não para a homologação.

A quitação rescisória indica que as verbas devidas foram quitadas parceladamente, não tendo o reclamante renunciado à multa estabelecida no parágrafo 8º, do artigo 477, da CLT, já que a avença, em verdade, configura apenas ato homologatório, de validade relativa, assim como aquele comumente praticado perante a autoridade administrativa do Ministério do Trabalho.

Dessa forma, tendo sido pagas em parcelas, as verbas rescisórias, tem-se que a quitação foi realizada com atraso, eis que em absoluta desconformidade com o parágrafo 6º, alínea “b”, do artigo 477 da CLT, respondendo a primeira reclamada pela respectiva multa.

Reformo.

DOS REFLEXOS DO ADICIONAL DE RISCO

No que diz respeito às diferenças decorrentes da incidência do adicional de periculosidade na base de cálculo das horas extras, a pretensão não pode deixar de ser acatada.

A matéria, segundo os elementos dos autos deve ser examinada segundo à natureza jurídica dos títulos para fins reflexos, segundo as disposições do artigo 457 § 1º da CLT “in verbis”:

“Artigo 457 – Compreendem-se na remuneração do empregado para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.

§ 1º Integram o salário, não só a importância fixa estipulada, como também as comissões percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador.”

Ora, se ao determinar a integração de verbas no campo salarial, o legislador não distinguiu quanto à sua origem, não cabe ao intérprete fazê-lo.

Logo, o adicional de risco, diante de sua natureza eminentemente salarial, integra a base de cálculo das horas extras, e, conseqüentemente, os reflexos destas na quantificação de férias acrescidas de um terço, 13º salário e aviso prévio.

Reformo.

DO INTERVALO PARA REFEIÇÃO E DESCANSO

A testemunha do reclamante, segundo o seu depoimento lavrado às fls.156, laborou com o autor numa média de 1 ou 2 vezes por semana. De outra parte, a mesma testemunha informou que de maneira geral todos os trabalhadores somente desfrutavam de intervalo para refeição e descanso de uma hora quando estavam na base, o que girava em torno de um a dois dias por semana.

Nestas condições, a prova oral mostra-se frágil, mormente levando-se em conta que foi registrado pela autoridade judicial de origem que a testemunha não era presencial e nem segura dos fatos.

Acrescente-se que laborando com o reclamante numa média de um a dois dias por semana, não teria como saber quanto ao gozo do intervalo nos demais dias, o que justifica plenamente a insegurança quanto aos fatos informados.

Logo, nenhum reparo merece a decisão de origem ao sopesar a prova produzida.

Mantenho.

EFEITOS DA PROJEÇÃO DO AVISO PRÉVIO

Não obstante a autoridade judicial de origem tenha considerado quitadas as verbas rescisórias, não se pode olvidar que por força do que dispõe o parágrafo 1º, do artigo 487 da Consolidação das Leis do Trabalho, que o lapso do aviso prévio, mesmo quando indenizado, integra-se ao tempo de serviço para todos os efeitos e projeta a extinção jurídica do liame para o trintídio subseqüente.

Logo, remanescem diferenças de 1/12 no 13º salário, férias acrescidas de um terço e depósitos do FGTS acrescido da multa de 40%.

Reformo.

DA INDENIZAÇÃO DE 40% SOBRE AS VERBAS RESCISÓRIAS

Examinando o documento 122 do volume em apartado, da série da reclamada, verifico que não houve pagamento da indenização de 40% sobre os títulos rescisórios.

Logo, também devida esta parcela ainda não quitada.

Reformo.

MULTA DO ARTIGO 467 DA CLT.

O artigo 467 da CLT passou a ter nova redação a partir da vigência da Lei 10.272 de 05 de setembro de 2.001, adotando o caput da referida norma consolidada, o seguinte texto, in verbis:

“Art. 467. Em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de cinqüenta por cento”. (NR)

O exame atento da petição inicial (fls.28) nos dá conta de que o reclamante pleiteou a incidência da multa do artigo 467 da CLT já sob a nova redação, vez que o pedido foi de “…aplicação do artigo 467 da CLT, com a nova redação dada pela Lei 10.272/2001, conforme fundamentação..”

De outra parte, temos que a r.sentença de fls.162, ao decidir a questão, não levou em conta a alteração na norma legal, pois entendeu que não há verba rescisória stricto sensu incontroversa.

Todavia, ainda que a autoridade judicial não tenha levado em conta o novo texto legal, o certo é que o valor das verbas rescisórias era controvertido, diante da alegação de que o acordo extrajudicial abarcaria todos os títulos.

Nesta moldura, ainda que por fundamento diverso, a decisão de origem não comporta reforma.

Mantenho.

Do exposto, conheço de ambos os recursos ordinários interpostos e, no mérito, NEGO PROVIMENTO ao apelo da reclamada e de outra parte DOU PROVIMENTO PARCIAL ao apelo do reclamante para condenar a reclamada na multa prevista no artigo 477 da CLT, e ainda, em diferenças pela projeção do aviso prévio de 1/12 no 13º salário e 1/12 de férias acrescidas de um terço, e depósitos do FGTS acrescido da multa de 40%, além da multa de 40% sobre o valor das verbas rescisórias, e finalmente, nos reflexos do adicional de risco nas férias acrescidas de um terço, 13º salário e aviso prévio, tudo a ser apurado em regular liquidação, na forma da fundamentação que integra e complementa este dispositivo. Rearbitro o valor da condenação em R$14.000,00.

RICARDO ARTUR COSTA E TRIGUEIROS

Juiz Relator

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