Fim de ano feliz

OAB faz proposta de regulamentação de férias para advogados

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30 de maio de 2006, 20h44

O presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Busato, encaminhará esta semana ao Conselho Nacional de Justiça proposta para que regulamente e normatize as férias e o recesso forenses. A sugestão da entidade, aprovada pelo Conselho Pleno, é de que seja fixado o período de 20 de dezembro a 20 de janeiro, tempo no qual ficarão suspensos os prazos processuais, não serão marcadas audiências e feitos julgamentos.

A OAB sustenta que esse período seja fixado sem que haja prejuízo do funcionamento regular do Judiciário quanto à apreciação e julgamento de questões consideradas urgentes, por meio da designação de juízes substitutos e de câmaras de férias.

O Conselho Federal da OAB aprovou a proposta com base no voto da conselheira federal pelo Mato Grosso do Sul, Elenice Carille, relatora da proposição na entidade. Os conselheiros federais levaram em consideração as reclamações de advogados de todos os estados, que ficaram impedidos de se valer das férias forenses para descansar, passando a ter de trabalhar todos os dias do ano, enquanto os juízes, membros do Ministério Público e serventuários da Justiça têm garantido o direito às férias legais. Esse problema tem sido sentido principalmente pelos advogados de pequenos escritórios distribuídos pelo país.

Leia a íntegra do voto da conselheira federal Elenice Carille, aprovado pelo Conselho Federal da OAB:

Proposição 030/2006/COP

Assunto: Extinção das férias forenses – Emenda Constitucional nº 45/2004 – art. 93, inciso XII, da Constituição Federal.

Origem: Comissão: Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro e Conselheiros Federais Edgard Luiz Cavalcante de Albuquerque (PR), Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira (DF) e Roberto Rosas (AC).

Relatora: Conselheira Federal Elenice Pereira Carille (MS).

Relatório

Tratam os presentes autos de processo instaurado em razão de manifestação do Plenário do Conselho Federal para examinar e emitir pronunciamento sobre a extinção das férias forenses, para cujo mister o Presidente deste Conselho, Roberto Antonio Busato, constituiu Comissão Especial composta pelo Membro Honorário e Vitalício Reginaldo Oscar de Castro e Conselheiros Federais Roberto Rosas, Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira e Edgard Luiz Cavalcante de Albuquerque.

A Comissão, composta pelos valorosos Conselheiros nominados e pelo combativo Membro Nato, manifestou-se às f. 025.

Os nobres membros da Comissão Especial fizeram acostar aos presentes autos os pareceres das professoras e doutoras Cármen Lúcia Antunes Rocha e Regina Maria Macedo Nery Ferrari, juristas que dão mais brilho à constelação de estudiosos do Direito e que emitiram seus pareceres, parcialmente transcritos na manifestação dos Conselheiros Federais, e que serão objeto de menção no voto que passo a emitir.

Voto

O pronunciamento da douta Comissão composta pelos luminares deste Conselho, com nomes já mencionados, nasceu, indubitavelmente, da preocupação da classe dos advogados com a interpretação dada à nova redação do art. 93, XI, da Constituição Federal, advinda da Emenda Constitucional n. 45, de 08.12.2004.

É necessário afirmar que a preocupação, a bem da verdade, com essa norma constitucional, não é privilégio da advocacia brasileira, mas sim de todos os operadores do Direito, em especial a própria magistratura, e por que não dizer, do Poder Judiciário, que através de seus representantes têm emitido censura à norma mencionada, principalmente após a Resolução do Conselho Nacional de Justiça, de nº 3, datada de 16.03.2005, que mereceu o seguinte resumo, da Comissão Especial:

“ A Resolução de nº 3CNJ de 16.05.05, acolhendo ‘as justificativas apresentadas pelos Tribunais que mantiveram as férias coletivas marcadas para julho de 2005, uma vez que demonstrada a transitória força maior’, cientificou a todos ‘que sendo inadmissíveis quaisquer justificativas a período futuro, ficando definitivamente extintas as férias coletivas nos termos fixados na Constituição’.”

Os questionamentos surgidos são de ordem teórica e prática.

O primeiro, sobre três nuances: a. a auto-aplicabilidade do art. 93, XI, da Constituição Federal; b. os efeitos da norma constitucional sobre os artigos 173, 174 e 179 do Código de Processo Civil, no tocante a férias; c. a necessidade da modificação da Lei Complementar nº 35, de 14.03.1979, Estatuto da Magistratura, e dos Regimentos Internos dos Tribunais de Justiça dos Estados Membros.

No campo prático, o efeito da Resolução nº 3CNJ causou sérios transtornos ao Poder Judiciário, especialmente quanto ao entendimento de que estariam extintas as férias forenses, tanto que, na maioria dos Estados, os prazos processuais não foram suspensos e nem interrompidos, com sério ônus para a advocacia, sem que com isso houvesse no cômputo geral celeridade na prestação jurisdicional.


O outro transtorno de ordem prática ocorreu na atividade jurisdicional de 2ª Instância, onde as turmas e Câmaras, órgão colegiados, passaram a ter desfalques permanentes em suas composições, vez que a cada sessão um ou outro magistrado estava ausente em razão de férias individuais. Só para exemplificar, no TJMS, as Turmas Criminais funcionam com apenas três membros, e em determinado julgamento, quando presente o Relator e ausente o revisor, ocorreu obrigatoriamente o adiamento; em sessão seguinte, no mesmo feito, presente o revisor e ausente o relator, novamente ocorreu o adiamento; iniciado o julgamento, o vogal pediu vistas e, em nova sessão, presentes relator e revisor, ausente o autor do pedido de vistas, uma vez mais ficou suspenso o julgamento do processo.

Diante destes fatos, a ininterruptabilidade da prestação jurisdicional, objetivo basilar da Reforma do Judiciário e da Emenda Constitucional nº 452004, tornou-se inócua, vez que, mais do que um mês apenas de atraso no julgamento, em virtude das férias forenses, as férias individuais de cada magistrado acarretam atraso ainda maior no julgamento dos processos e na aplicação da justiça.

Nesse sentido, bem propugnaram os Conselheiros Federais em sua manifestação:

“ Ocorre, outrossim, que a vigência do entendimento do término das férias forenses, no âmbito dos Tribunais do país, está gerando graves prejuízos aos jurisdicionados, pois o fato de componentes da Turmas e Câmaras poderem tirar férias em meses distintos tem prejudicado imensamente ditos Tribunais quando desfalcam permanentemente suas Turmas, ou determinam o necessário e inevitável adiamento de julgamentos.

Com o proceder estão a sofrer, também, os advogados, impedidos que ficaram de se valer das férias forenses, para identicamente terem as suas. Deverão trabalhar todos os dias do ano, quando aos Juízes, membros do Ministério Público e Serventuários da Justiça, são garantidas as férias legais.”

Todos estão, pois, de acordo quanto à necessidade de modificações no Poder Judiciário, para que se possa atender melhor os anseios de Justiça da população, passando aí, especialmente, pela questão da morosidade dos processos judiciários e sua ininterruptabilidade.

Analisando, então, os questionamentos que inquietam à classe jurídica, chega-se às seguintes conclusões:

1. a Emenda Constitucional nº 452004 não é auto-aplicável, até por que o próprio texto constitucional determina que lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, deverá dispor sobre o Estatuto da Magistratura, apenas observando os princípios fixados naquele art. 93 da Constituição Federal, dentre os quais o inciso XII prevê a atividade jurisdicional ininterrupta, vedadas férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, donde se deduz que, até que haja a edição de nova norma infra-constitucional alterando o Estatuto da Magistratura, o que só pode ser feito por norma de igual ou superior grau hierárquico, continuam em vigor os dispositivos ali fixados. É o caso do Estatuto da Magistratura, Lei Complementar nº 35, de 14.03.1979, e do próprio Código de Processo Civil, Lei Ordinária, em seus arts. 173, 174 e 179, no que diz respeito a férias forenses e suspensão e interrupção dos prazos nesse período.

A respeito do assunto é oportuno transcrever o parecer da Profª Regina Maria Macedo Nery Ferrari:

“ Portanto, a efetividade da disposição contida no inciso XII do art. 93, da Constituição Federal, depende, primeiramente,de sua inserção, por meio de Lei Complementar, no Estatuto da Magistratura e mais, de seu detalhamento no âmbito de competência do Estado Membro e no Regimento Interno dos Tribunais de Justiça, sob pena de comprometimento da autonomia dessa entidade que compõe a Federação brasileira.” (f.13)

2. As férias forenses não se confundem com as férias coletivas de magistrados, estas estão vedadas, aquelas não. Então não houve derrogação dos arts. 173, 174 e 179 do Código de Processo Civil, a respeito da matéria.

Sobre o tema, o texto da jurista Cármen Lúcia Antunes Rocha tem precioso ensinamento. Senão vejamos:

“ As férias forenses, cuidadas na legislação processual (e, basicamente, na norma do art. 173 do Código de Processo Civil), não parecem ter sido extintas ou proibidas. A jurisdição não se exerce apenas pela prática de atos processuais. Bem diversamente, há denúncias reiteradas do excesso de processos encaminhados aos juízes para decisão interlocutória ou definitiva que se acumulam pela impossibilidade de os julgadores debruçarem-se e manterem-se afeitos a essa atividade, premidos que são pela necessidade de estarem presentes em inúmeras práticas que lhes tomam os horários e a possibilidade de se manterem voltados àqueles exames.

Segue a Douta Professora Cármen Lúcia, no sentido de que sejam mantidas as férias forenses e vedadas as férias coletivas.


Observe-se, a propósito, que o texto constitucional, alterado pela Emenda Constitucional nº 452004, não menciona expressamente as férias forenses, donde se conclui terem permanecido incólumes as mesmas, cabendo a análise da conveniência de sua manutenção sem as férias coletivas dos magistrados, que como acima dito, já se constatou serem prejudiciais aos advogados, especialmente em instância superior.

3. necessidade de regulamentação do texto constitucional para sua aplicabilidade

Não existem meios de se aplicar a artigo 93 da Carta Magna, como pretendeu o CNJ, sem modificação à Lei Orgânica da Magistratura e ao CPC, nos artigos mencionados, referentemente às férias forenses.

Merece registro o conteúdo do trabalho de autoria do Nobre Professor e Juiz de Direito de Campo Grande-MS, Dorival Renato Pavan, encontrável na Intranetartigos, que se lê:

“ Saliento, finalmente, que houve reunião do Colégio de Presidentes dos Tribunais de Justiça do País, em Aracaju, SE, no dia 04.12.04, em que foi deliberado, por maioria de votos (apenas dois votos contra) que as disposições do artigo 93, XII, da Constituição Federal, na redação da Emenda Constitucional 454, não é auto aplicável, dependendo de regulamentação a ser editada pelo Estatuto da Magistratura, razão maior para que o Ministério Público, advogados, Procuradores, Defensores e Tribunais de Justiça e Alçada (enquanto ainda existirem) se unam em torno desse entendimento.”

É nesse sentido a manifestação da Douta Comissão Especial, bem como das Professoras e Juristas autoras dos pareceres acostados aos presentes autos.

Esta Relatora acata como corretas as assertivas contidas nas conclusões da Douta Comissão, recomendando a este Conselho o acatamento, em ordem preferencial, das seguintes propostas:

Pugnar junto ao CNJ o reconhecimento da inaplicabilidade imediata do art. 93, inciso XII da Constituição Federal, com o conseqüente reconhecimento de que até a promulgação da lei complementar indicada no caput desse artigo deva permanecer vigendo as regulamentações dos Estados a respeito da matéria;

Pugnar junto ao CNJ a emissão de outra Resolução para consignar que não há que se confundir férias coletivas, com férias forenses, devendo essas acontecer por trinta dias em cada ano, como vierem a estabelecer Resoluções ou Códigos de Organização Judiciária de cada Estado, período no qual ocorreria a suspensão dos prazos judiciais, recomendando coincidam elas com uma das férias individuais dos magistrados;

Pugnar junto ao CNJ, para que dúvida não paire nos Estados onde já ocorre e para evitar paralisia onde não, que haja plantão de juízes em Primeira instância e Câmara de Férias nos Tribunais, permanecendo vinculados aos feitos os Magistrados a quem fossem distribuídos os mesmos.

Assim, na esteira das conclusões acima, acolho, em síntese, a proposta do Conselheiro Federal Edgard Luiz Cavalcanti de Albuquerque (PR), com o período sugerido pelo Conselheiro Federal Afeife Mohamad Hajj (MS), de unificação da proposta de encaminhamento ao Conselho Nacional de Justiça, que passa a ter a seguinte redação:

Pugnar junto ao CNJ para que regulamente e normatize as férias forenses e o recesso forense, de trinta dias, sugerindo sejam fixados de 20 de dezembro a 20 de janeiro, tempo no qual ficarão suspensos os prazos processuais e não serão designadas audiências e realizados julgamentos, sem prejuízo do funcionamento regular do Poder Judiciário, notadamente na apreciação e no julgamento das questões urgentes, através de juízes substitutos e câmaras de férias, cujos julgadores ficarão vinculados ao feito.

Brasília, 9 de maio de 2006.

Elenice Pereira Carille

Relatora

Proposição 030/2006/COP

Assunto: Extinção das férias forenses – Emenda Constitucional nº 45/2004 – art. 93, inciso XII, da Constituição Federal.

Origem: Comissão: Membro Honorário Vitalício Reginaldo Oscar de Castro e Conselheiros Federais Edgard Luiz Cavalcante de Albuquerque (PR), Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira (DF) e Roberto Rosas (AC).

Relatora: Conselheira Federal Elenice Pereira Carille (MS).

Ementa nº /2006/COP: Férias forenses. Recesso forense. Regulamentação. Normatização. Conselho Nacional de Justiça. Trinta dias, com sugestão do período de 20 de dezembro a 20 de janeiro. Suspensão dos prazos processuais. Audiências. Julgamentos. Funcionamento regular do Poder Judiciário, notadamente na apreciação e no julgamento das questões urgentes. Julgadores vinculados ao feito.

Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos do processo em referência, decidem os membros do Conselho Pleno do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil acolher o voto da Conselheira Relatora, parte integrante deste, unanimemente, no sentido do encaminhamento, ao Conselho Nacional de Justiça, de proposta de regulamentação e normatização das férias forenses e do recesso forense, por trinta dias, nos termos da proposta do Conselheiro Federal Edgard Cavalcanti de Albuquerque (PR), sugerindo, por maioria de votos, a sua fixação no período de 20 de dezembro a 20 de janeiro, nos termos da proposta do Conselheiro Federal Afeife Mohamad Hajj (MS).

Brasília, 9 de maio de 2006.

Roberto Busato

Presidente

Elenice Pereira Carille

Relatora

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