Conversa com o cliente

OAB Campinas questiona proibição de visita reservada a presos

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29 de maio de 2006, 17h45

A 3ª subseção da OAB-SP entrou com pedido de liminar em Mandado de Segurança na Justiça Federal contra o diretor-geral do Complexo Penitenciário Campinas/Hortolândia, Hugo Berni Neto, para que os advogados possam falar reservadamente com seus clientes.

De acordo com a entidade, o diretor proibiu a visita reservada depois do fim de uma rebelião feita durante os ataques supostamente comandados pela facção criminosa do Primeiro Comando da Capital em diversas regiões do estado de São Paulo.

Segundo a OAB de Campinas, a proibição viola dois direitos fundamentais: o do preso, que tem direito à defesa de um advogado que pode falar com ele reservadamente, e o do advogado, que está impedido de trabalhar livremente por não poder falar reservadamente com seu cliente.

No pedido, a subseção da OAB alega que o preso tem a garantia constitucional de receber reservadamente seu advogado. Também é garantido ao advogado, de acordo com o artigo 7, inciso III, da Lei Federal 8.906/94, “comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis”.

A Ordem também ressalta que para falar com o seu cliente também poderá ingressar nas prisões livremente, mesmo fora do horário de expediente. Segundo a entidade, depois de dez dias após o fim da rebelião é que o diretor do complexo penitenciário admitiu, por meio dos seus subordinados e por escrito, que os advogados estão impedidos de exercer seu trabalho dentro do presídio.

Leia a íntegra do Mandado de Segurança

Exmo. Sr. Dr. Juiz Federal Titular da MM. Vara Federal Cível desta Circunscrição Judiciária Federal de Campinas/SP.

Mandado de Segurança

LIMINAR

A Ordem dos Advogados do Brasil, por sua 3ª. Sub-Secção da Seccional do Estado de São Paulo, vem mui respeitosamente perante Vossa Excelência, por todos os seus Diretores Executivos infra-assinados, Diretor Presidente Advogado Dijalma Lacerda – OAB/SP. 42715, Diretor Vice-Presidente Advogado Edmilson Wagner Gallinari – OAB/SP. 105325, Diretor Tesoureiro Advogado Milton Carlos Cerqueira – OAB/SP. 107992, Diretora Secretária Adjunta Advogada Adelaide Albergaria Pereira Gomes – OAB/SP. 134053, Diretor Secretário Geral Advogado José Augusto Gabriel – OAB/SP. 99949, nos ditames e sob o imperativo que lhe impõem especificamente os Artigos 2º, 7º. Incisos I, III, VI letras “b” e “c”, XI, 44 e seus incisos I e II, 49 e seu parágrafo único, 61 inciso I, II “in fine” e III, todos da Lei Federal No. 8906/94, Artigo 1º. “in fine”, 3º., 10 e seu parágrafo único, 11 incisos I, II e III especificamente, 12, Seção II artigo 40 incisos VII e IX, todos da Lei Federal No. 7210/84, Artigo 1º. da Lei Federal No. 1533 de 31.12.1951, Artigo 5º. Incisos LXIX e LXX e Artigo 133 da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, impetrar

MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR

contra ato teratológico Diretor Geral do Complexo Penitenciário Campinas/Hortolândia e da rede penitenciária correspondente, Dr. Hugo Berni Neto, o que efetivamente ora faz nos seguintes termos de fato e de Direito :

Da legitimação da impetrante

1º. A Ordem dos Advogados do Brasil é, por disposição legal contida no Artigo 44 da Lei Federal 8906/94, “…serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa…” (Sic.)

2º. Tem como finalidade igualmente determinada pelo mesmo codex – Artigo 44 incisos I e II,

“ I. defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;

II. promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.”

3º. Duas coisas se sobressaem, portanto, do contexto legislativo acima exposto, como finalidade da OAB :

“…defender a Constituição, a ordem jurídica ….. , os direitos humanos…….., pugnar pela boa aplicação das leis….”, e “… a representação, a defesa….. dos Advogados em toda a República Federativa do Brasil.” (Conforme o supra acima escrito)

4º. Por outro lado, e agora já como ferramental a sua disposição para o efetivo exercício das medidas necessárias ao cumprimento de sua finalidade, a Lei Federal 8906/94 veio aparelhá-la com o contido no Artigo 49 e seu Parágrafo único:

“Art. 49 Os Presidentes dos Conselhos e das Subseções da OAB têm legitimidade para agir, judicial e extrajudicialmente, contra qualquer pessoa que infringir as disposições ou os fins desta Lei.


Parágrafo único. As autoridades mencionadas no caput deste artigo têm, ainda, legitimidade para intervir, inclusive como assistentes, nos inquéritos e processos em que sejam indiciados, acusados ou ofendidos os inscritos na OAB.” (Sic. – grifo nosso)

5º. Quanto à Subseção, agora especificamente, porém sem prejuízo do disposto no Artigo 49 e seu parágrafo, impôs-lhe o legislador consignatário da mesma norma emanada da Lei Federal 8906/94, que:

“ Art. 61 Compete à Subseção, no âmbito de seu território:

dar cumprimento efetivo às finalidades da OAB;velar pela dignidade, independência e valorização da advocacia, e fazer valer as prerrogativas do advogado;representar a OAB perante os poderes constituídos;

6º. Dúvida inexiste portanto, MM. Juiz, sobre ter legitimidade, a Ordem dos Advogados do Brasil, para representar corporativamente os Advogados, e, para a análise alusiva ao caso sub specie, de impetrar, em nome deles e para o resguardo do direito deles, o chamado mandado de segurança coletivo, ex vi do Inciso LXX letra “b”, do Artigo 5º. da Constituição Federal de 1988, e isto sem prejuízo de sua missão institucional, mercê do que lhe é imposto, como supra dito no pertinente a sua própria finalidade, “ defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis…..” (Conf. Artigo 44 da Lei Federal 8906/94)

Direitos dos Advogados no que interessa especificamente ao presente mandamus :

7º. Indiscutível a legitimação da Ordem dos Advogados do Brasil na representação de seus inscritos, e sendo da competência da Subseção “fazer valer as prerrogativas do advogado” cabe agora, e nos estritos limites da presente postulação, saber quais seriam as aviltadas e que clamam pelo beneplácito do remédio heróico:

8º. Assim, cabe buscar socorro no elenco do Artigo 7º. da Lei Federal 8906/94 :

“ Art. 7º. São direitos do advogado:

I. exercer, com liberdade, a profissão em todo o território nacional;

II comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis;

VI . Ingressar livremente : nas salas e, no caso de delegacias e prisões, mesmo fora da hora de expediente e independentemente da presença de seus titulares;

em qualquer edifício ou recinto em que funcione onde o advogado deva praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e se atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado;

XI. reclamar, verbalmente ou por escrito, perante qualquer juízo, tribunal ou autoridade, CONTRA INOBSERVÂNCIA DE PRECEITO DE LEI, regulamento ou regimento ;

9º. Sob o ponto de vista ontológico, e até mesmo teleológico, a ratio essendi do Artigo 2º. da Lei Federal 8906/94 sintetiza, de forma muito feliz, a essência da atuação do Advogado subtraída do enunciado constitucional do artigo 133 :

“ Art. 2º. O advogado é indispensável à administração da Justiça.

“ III. Dos direitos que buscam o patrocínio dos Advogados e que estão sofrendo impedimento :

10º. A par o Direito dos Advogados e da OAB na conformidade com o supra exposto, cabe aqui oportuna digressão de forma a elucidar, a Vossa Excelência, o suporte jurídico, de forma destacada, demonstrativo do aviltamento não só às prerrogativas da classe, mas, igualmente, a outros dispositivos do ordenamento jurídico pátrio, e de maneira pontual e para os efeitos do presente mandamus, face a ato teratológico da autoridade coatora em tela que está impedindo o exercício da Advocacia Criminal, e cruel aviltamento aos Direitos dos detentos e recrusos da rede penitenciária que compõe o chamado “Complexo Penitenciário Campinas/Hortolândia” ;

11º. Com efeito. Sem atinar para o preceito constitucional petreamente enunciado no artigo 5º. da CF 88, de que “todos são iguais perante a Lei sem distinção de qualquer natureza”, o compromisso de nossa Carta Magna com “ a prevalência dos Direitos Humanos” (Art. 4º. da CF/88) e à “dignidade da pessoa humana” (art. 1º. III da CF/88), e ainda o alerta constitucional de que “ A lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades individuais.” (Art. 5º. Inciso XLI), há de se destacar que a chamada “Carta Cidadã” veio conferir , no elenco dos Direitos e Garantias Fundamentais, de forma direcionada, aos presos , que

“XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral.”

12º. A legislador ordinário vem tratar, de forma mais direcionada, pela Lei Federal 7210/84, a “Execução Penal” ;


13º. Já pelo Artigo 1º. in fine, vê-se que a finalidade da referida Lei é “….proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.”;

14º. Mais adiante, já no artigo 3º, “…serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela Lei.” (Sic.) ;

15º. Pelo Artigo 10 “ a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado orientar o retorno e a convivência em sociedade.” (Sic.)

16º. O Artigo 11, por seus incisos I, II e III, impõe a assistência material, á saúde e a jurídica, e, pelo Artigo 12, “…instalações higiênicas…” (Sic.) ;

17º. Pelo Artigo 41 inciso VI, tem o preso igualmente reconhecido o direito à “…assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa.”, e, pelo inciso IX, “ … entrevista pessoal e reservada com o advogado…” (Sic.)

Conclusão dos itens I, II e III :

18°. Pelo acima exposto, tem-se que o preso possui direitos especificamente disciplinados pela Constituição Federal e pela Lei Ordinária, e, dentre eles, “ ENTREVISTA PESSOAL E RESERVADA COM O ADVOGADO ” ;

19º. Tem-se, agora sob a ótica da Advocacia, que os Advogados têm a prerrogativa, assegurada especificamente pela Lei Federal 8906/94, de “ COMUNICAR-SE COM SEUS CLIENTES, PESSOAL E RESERVADAMENTE, MESMO SEM PROCURAÇÃO, QUANDO ESTES SE ACHAREM PRESOS, DETIDOS OU RECOLHIDOS EM ESTABELECIMENTOS CIVIS OU MILITARES, AINDA QUE CONSIDERADOS INCOMUNICÁVEIS.” (Sic. Art. 7º. Inciso III da Lei Federal 8906/94), podendo, para tal finalidade, ingressar nas prisões livremente, mesmo fora do horário de expediente .

20º. Tem-se, igual e finalmente, que à OAB é imposto, pelo legislador ordinário e pela constituição federal, o compromisso com a Constituição, o Estado Democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social e pugnar pela boa aplicação das leis….” (Sic. Art. 44 da Lei Federal 8906/94), dando cumprimento efetivo as suas finalidades e zelando pela proteção das prerrogativas dos Advogados, AGINDO JUDICIAL E EXTRAJUDICIALMENTE , CONTRA QUALQUER PESSOA QUE INFRINGIR AS DISPOSIÇÕES DESTA LEI.

21º. Verá Vossa Excelência, logo adiante, que o ato teratológico emanado da autoridade coatora em questão, avilta sobremaneira o ordenamento jurídico, e, em especial, os Direitos dos presos cogentemente impostos por Lei Especial, os Direitos dos Advogados, e, por último, da Ordem dos Advogados do Brasil, ensejando portanto, para o pronto restabelecimento do Estado de Direito, a concessão do writ primeiro liminarmente, e, ao final, definitivamente, o que desde já se requer .

Fatos:

22º. São notórios os fatos ocorridos há dez (10) dias, dividindo a sociedade e trazendo capitis diminutio a vários segmentos; todavia, mais acentuadamente, à população carcerária, e, no contexto dela, a do “Complexo Penitenciário Campinas/Hortolândia” conforme se verá ;

23º. É que, terminado o motim e já passados que temos dez (10) dias do encerramento, os presos continuam sujeitos a sérias vicissitudes, e, dentre elas, a maior de todas : ESTÃO IMPEDIDOS DE FALAR COM SEUS ADVOGADOS, JÁ QUE ESTES, POR SUA VEZ, ESTÃO IMPEDIDOS DE FALAR COM SEUS CLIENTES (Confira-se documentos anexos).

24º. Dispiciendo é trazer a Vossa Excelência o enorme rol do continuado aviltamento a que vêm e estão sendo submetidos os profissionais da Advocacia, sem a menor condição, face ao ato teratológico em questão, de exercitar seu munus publicae, sem a menor informação de seus clientes, sem o menor contato, e sem poder, também, propugnar qualquer coisa em prol dos Direitos dos mesmos, já que simplesmente não lhes é permitido com eles falar.

Sintomático da deliberada negativa do direito, MM. Juiz, é o fato de que somente muitos dias após o encerramento do motim, e somente após a reiterada cobrança da OAB, é que a autoridade coatora, através de seus subordinados, admitiu por escrito o impedimento do trabalho dos Advogados.(Docs. Anexos)

25º. Fere, o ato teratológico advindo da autoridade coatora, como já se conclui, não só o ordenamento jurídico pura e simples, mas, muito mais que isso, isto é, fere a própria essência da norma ao negar dois direitos fundamentais, de um lado o do preso em ter defesa através de advogado e com ele reservadamente falar, e, de outro, o do Advogado de livremente trabalhar, exercitando a nobre profissão, ingressando livremente (e sob a proteção do Estado que a ele conferiu tal prerrogativa) em qualquer prisão, mesmo fora do horário normal do expediente, FALANDO COM SEU CLIENTE RESERVADAMENTE.

26º. Não tem qualquer acolhida em nosso ordenamento jurídico, MM. Juiz, o impedimento que está sendo imposto à Advocacia do livre exercício de sua atividade, essencial à democracia, aliás insculpida indelevelmente no Artigo 133 da Constituição Federal como indispensável à administração da Justiça, cabendo ao Estado, inexoravelmente, usar de todo o seu aparato para superar todas as dificuldades, submetendo-se ao mandamento legal, até porque, não custa lembrar, é ele o detentor exclusivo do monopólio punitivo.

VI. LIMINAR “INAUDITA ALTERA PARS”

27º. Estando evidenciado, Honrado Magistrado, o aviltamento a direito líquido e certo dos Advogados, e havendo, inquestionavelmente, sério perigo de que direitos a serem objeto de propugnação de tutela jurisdicional sejam irremediavelmente conspurcados, tratando-se, irretorquivelmente, de direitos cuja proteção exige pronta atenção do Estado-Juiz, presentes portanto os requisitos do fumus boni juris e do periculum in mora, requer-se a concessão de liminar “inaudita altera pars” para :

Determinar à autoridade coatora que, incontinente, viabilize a conversa dos Advogados com seus clientes presos, e de forma reservada conforme determina a Lei, cuidando para que isto aconteça com segurança, como lhe é imposto na condição de detentor do monopólio do jus puniendi pelo Estado.

Que seja observado o preceito legal de que o Advogado não precisa marcar hora para falar com seu cliente, constituindo sua prerrogativa legal contatar-se mesmo fora do horário de expediente.

CONCLUSÃO :

Após o cumprimento da Liminar, requer seja oficiada a autoridade coatora para, no prazo legal, oferecer as suas informações para afinal ser a presente impetração julgada totalmente procedente com a concessão do writ nos termos acima expostos e subsistente a liminar concedida, o que se requer, por ser de Direito e de Justiça.

Apenas para efeitos meramente fiscais, dá-se à presente o valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais).

Respeitosamente,

P. Deferimento.

Campinas/SP, 23 de maio de 2006.

Dijalma Lacerda – Presidente

Edmilson W. Gallinari – Vice-Pres.

Milton Carlos Cerqueira – Tesoureiro

José Augusto Gabriel – Sec. Geral

Adelaide Albergaria Pereira Gomes – Sec. Adj.

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