Limite da eficiência

Congestionamento e demora na execução comprometem os JECs

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27 de maio de 2006, 7h00

A ampliação da competência e a demora de mais de dois anos para conclusão da execução estão colocando em cheque a eficiência de uma das mais exitosas invenções da Justiça brasileira nos últimos tempos: os Juizados Especiais Cíveis. Está é uma das conclusões do diagnóstico dos Juizados Especiais Cíveis, desenvolvido pelo Cebepej – Centro de Estudos e Pesquisas Judiciais. O estudo foi apresentado na quinta-feira (25/5) pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos e o secretário da Reforma do Judiciário, Pierpaolo Cruz Bottini.

Além do congestionamento devido à ampliação de sua competência e a demora da execução, os juizados padecem com o baixo índice de conciliação, de apenas 34,5%. “Acordos constituem a essência da filosofia que inspirou a criação dos JECs. Deste ponto de vista, é possível dizer que, quanto maior o índice de acordos, mais bem sucedido é um determinado juizado, ou mais próximo ele se encontra de seu paradigma”, afirma a pesquisa.

Segundo o secretário da Reforma do Judiciário, o baixo índice de acordos é preocupante, pois a solução prévia dos conflitos abrevia consideravelmente o fim dos litígios. “É preciso fortalecer a solução prévia de conflitos com, por exemplo, a capacitação dos conciliadores”. Bottini lembra que está no Senado um Projeto de Lei, parte da Reforma do Judiciário, que institui a mediação obrigatória para todos os processos civis que tramitam na Justiça. Sancionado, poderá contribuir muito para alterar o quadro instalado nos juizados.

O estudo sustenta que a presença do advogado interfere significativamente nos acordos. Entre os reclamantes que compareceram com advogados, os percentuais de acordo são sempre baixos.

Congestionamento

Hoje, qualquer pessoa física e microempresa pode procurar os JECs para solucionar questões que envolvam quantias de até 40 salários mínimos nos juizados estaduais e até 60 nos federais. A pesquisa indica que maioria dos reclamantes são pessoas físicas, correspondendo a 93,7% da demanda, contra 6,2% de pessoas jurídicas.

Na opinião do secretário da Reforma do Judiciário, o aumento do valor da causa, e a abertura do leque de entidades que podem acessar os juizados devem cessar caso contrário “estaremos assistindo ao sucateamento dos juizados, trazendo para eles os problemas da Justiça comum”.

O diagnóstico, que tem como objetivo possibilitar o desenvolvimento de estratégias para aperfeiçoar esse canal de acesso à Justiça, apontou ainda que a principal reclamação levada aos juizados, diz respeito à relação de consumo, correspondendo a 37,2% dos processos analisados.

Dentro dessa categoria as questões envolvendo serviços de telecomunicações são as campeãs. Em quase todas as capitais pesquisadas, esta reclamação soma mais do que 10% dos processos, atingindo mais do que 40% em Macapá e em Fortaleza. Logo após as reclamações relativas aos serviços de telecomunicações, aparecem as reclamações envolvendo transações comerciais, com 19%. A pesquisa ressalva que há expressivas variações entre as capitais.

Em segundo lugar na demanda dos juizados estão os acidentes de trânsito, representando 17% das reclamações e, em seguida, as ações de cobrança, 15% da procura. O secretário da Reforma do Judiciário adianta que com esta constatação da pesquisa algumas medidas já podem ser tomadas como estabelecer uma política de acordo com as maiores empresas alvos das reclamações para acordos em massa.

Segundo Bottini, a Lei 11.277/05, que trata do julgamento de ações repetitivas, e entrou em vigor no começo deste mês, também contribuirá para solucionar este tipo de demanda.

Execução

Mais ágeis e desburocratizados, os JECs estão correndo risco de ficar tão lentos quanto a Justiça comum. Hoje um processo nos juizados leva mais de dois anos, em média, para concluir a execução. Segundo Bottini, a esperança para a amenização deste tempo é a Lei 11.232/05 que altera a execução no Código de Processo Civil. A lei une as fases de conhecimento e execução.


A execução de títulos extrajudiciais também não anda bem nos juizados. Como mostra a pesquisa, em apenas 33% dos casos a penhora foi efetivada. “A execução de títulos executivos extrajudiciais está comprometendo desnecessariamente os juizados, pela sobrecarga de serviços e pela indução de burocratização crescente de suas práticas”, afirma a pesquisa.

Advogado presente

A maioria dos reclamantes dos JECs comparece sem a assistência de um advogado. Conforme revela o estudo, 60% dos demandantes. Em todas as capitais este percentual é significativo. No Rio de Janeiro, que apresenta o menor índice, 52% dos reclamantes, compareceu com advogado.

No que diz respeito à presença de advogado junto ao reclamado, as proporções são diferentes. Advogados acompanham o reclamado em 35% dos casos.

Recursos

O estudo, feito em nove capitais do país mostra ainda que em 29% dos casos houve sentença e em 39% houve homologação de acordo. A homologação de acordos registrada em Fortaleza, foi a mais alta: 72%. Os percentuais mais reduzidos estão em Goiânia. O percentual de extinção por desinteresse do autor também é significativo, 24%.

A ocorrência de recurso foi registrada em 31% das sentenças proferidas. O julgamento dos recursos manteve a sentença na maioria dos casos, 66%. A sentença foi totalmente reformada em 12% e parcialmente reformada em 16%.

De um modo geral, os juizados apresentam deficiências de infra-estruturas material e pessoal. Muitos juizados não têm juízes exclusivos, o que compromete sua organização, que depende muito do perfil do juiz encarregado, segundo revela o estudo.

Apesar das inúmeras dificuldades e deficiências que apresentam, os Juizados Especiais Cíveis constituem ainda o canal mais importante de acesso à justiça pelos cidadãos comuns, em especial pelos mais humildes, como afirma Kazuo Watanabe, presidente do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais. Segundo Watanabe, a adequada reforma do Judiciário passa necessariamente pela melhor organização e aprimoramento dos juizados.

Veja os números da pesquisa

Reclamante

%

Pessoa física

93,7

Pessoa Jurídica

6,2

Ambas

0,1

Total

100

Reclamado
Pessoa física

49,5

Pessoa Jurídica

48,9

Ambas

1,6

Total

100

Natureza da reclamação

%

Relação de consumo

37,2

Acidente de trânsito

17,5

Cobrança

14,8

Execução TEJ

9,8

Outros

20,6

Reclamação de telefônicas
JEC

%

Goiânia

9,1

São Paulo

9,2

Belo Horizonte

10,0

Porto Alegre

25,1

Belém

27,5

Salvador

32,4

Rio de Janeiro

33,6

Macapá

41,9

Fortaleza

44,2

Média

22,8

Presença de advogado

Sim(%)

Junto ao reclamante

28,6

Junto ao reclamado

34,7

Acordo

%

Na audiência de conciliação

34,5

Na audiência de julgmaento

20,9

Acordos cumpridos

45,7

Fonte: CEBEPEJ, 2006

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