Cidade escura

Justiça autoriza corte de energia de município inadimplente

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22 de maio de 2006, 17h34

A 2ª Vara Cível de Penápolis (SP) desobrigou a concessionária CPFL de fornecer energia elétrica às unidades de serviços não essenciais do município de Avanhandava, no interior paulista. A concessionária, contudo, deve manter a energia em creches, hospitais, postos de saúde, iluminação pública das ruas e outros locais com serviços de primeira necessidade.

A Ação Declaratória proposta pela CPFL pedia a suspensão do fornecimento de energia frente ao débito de R$ 286,6 mil do município. A defesa da concessionária, feita pelo advogado Alexandre Pedroso, do escritório Emerenciano, Baggio e Associados — Advogados, alegou que o município é devedor contumaz, o que prejudica os demais consumidores e provoca desequilíbrio no sistema de energia elétrica.

O juiz Marcelo de Freitas Brito decidiu ser legítima a interrupção do fornecimento já que “a relação jurídica entre o usuário e a empresa fornecedora de energia elétrica é de natureza privada, regida por contrato sinalagmático, onde um não pode exigir do outro sem cumprir o que se obrigou”.

A decisão se baseou no artigo 17 da Lei 9.427/96, instituída pela Aneel — Agência Nacional de Energia Elétrica, que prevê a possibilidade de corte no fornecimento de energia por falta de pagamento.

Para o advogado Alexandre Pedroso, este tipo de decisão demonstra que o Poder Judiciário não mais admite o comportamento irresponsável dos administradores públicos. “Muitos privilegiam a execução de projetos de interesse duvidoso para a comunidade e prejudicam o cumprimento de obrigações relativas as despesas essenciais e obrigatórias, como é o caso do fornecimento de energia elétrica.”

Processo 1.817/04

Leia a íntegra da decisão

Processo nº 1817/04 — 2ª Vara da Comarca de Penápolis

Vistos.

A COMPANHIA PAULISTA DE FORÇA E LUZ – CPFL ajuizou a presente ação declaratória com pedido de antecipação da tutela em face do MUNICÍPIO DE AVANHANDAVA alegando, em síntese que o requerido é devedor contumaz no pagamento das contas de energia elétrica dos prédios públicos e iluminação pública, possuindo um débito atual de R$ 286.635,11, fato esse que prejudica os demais consumidores de energia elétrica e provoca desequilibro no sistema de energia elétrica, dizendo ainda que é legal a interrupção do fornecimento de energia elétrica em relação aos serviços não essenciais. Assim, requereu a antecipação da tutela e a precedência do pedido inicial para que seja declarada que não está obrigada a fornecer energia elétrica às unidades não essenciais do requerido em razão do inadimplemento deste (fls. 02/37). Junto documentos (fls. 38/60).

Deferida a antecipação da tutela (fl. 61), o requerido foi citado (fl. 68) e não apresentou contestação (fl. 69).

É o relatório

Fundamento e decido.

Com efeito, legítima é a interrupção do fornecimento de energia elétrica para o mesmo, isto porque a “relação jurídica entre o usuário e a empresa fornecedora de energia elétrica é de natureza privada, regida por contrato sinalagmático, onde um não pode exigir do outro sem cumprir o que se obrigou” (1º TACivSP – Agin nº 784.396-5 – Leme – 9ª Câm. – Rel. Juiz João Carlos Garcia – J. 03.03.98 – v.u). RT 757/211

É por essa razão que o artigo 17 da Lei nº 9.427/96, que institui a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, prevê a possibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica por falta de pagamento, razão pela qual não se pode aplicar ao caso o artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor.

Não há que se falar que o artigo 22 do Código acima citado impede a suspensão do fornecimento de energia elétrica para consumidores inadimplentes, pois como bem lembra o Juiz Morato de Andrade, citando Zelmo Denari e Antonio Hermen de Vasconcellos e Benjamin:

“Quando estiverem em causa interesse individuais, de determinado usuário, a oferta de serviço pode sofrer solução de continuidade, se não forem observadas as normas administrativas que regem a espécie. Tratando-se, por exemplo, de serviços prestados sob o regime de remuneração tarifária ou tributária, o inadimplemento pode determinar o corte do fornecimento do produto ou serviço. A gratuidade não se presume e o Poder Público não pode ser compelido a prestar serviços públicos ininterruptos se o usuário, em contrapartida, deixa de satisfazer suas obrigações relativas ao pagamento.”

“Continuidade, aqui, …, quer dizer que, se o serviço essencial está sendo prestado pela Administração Pública, não pode ser interrompido”. Exemplificando, diz que a Administração não pode, “de uma hora para outra, decidir que não mais prestará serviços de telefonia, sob o pretexto de que o próprio mercado deles se encarregará. Uma vez que a iniciativa privada não esteja habilitada a atender, com eficiência, às necessidades dos consumidores, o Poder Público acha-se, então, obrigado a dar continuidade ao serviço que prestava anteriormente.” (1ª TACivSP – Ap. nº 725.643-5 – São Paulo – 2ª Câm. – Rel. Juiz Morato de Andrade – J. 18.11.98 – m.v).

O fato do referido serviço ser obrigatório também não se constitui em óbice para a suspensão do fornecimento de energia elétrica, pois “Não obstante considere a Administração essencial o fornecimento de energia elétrica, pois “Não obstante considere a Administração essencial o fornecimento de água, é fato notório que milhões de pessoas, em nosso país, não a têm corrente em suas residências, o mesmo se dizendo dos serviços de esgoto e energia elétrica. Deve-se entender a obrigatoriedade no sentido de que não pode ser negada, em princípio, a qualquer um, desde que haja condições técnicas de que esses serviços alcancem o local onde situada a residência. Isso não significa que seja gratuita – há de ser paga.” – RJTJESP 126/39.

Ante o exposto, nos temos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para declarar que a autora não está obrigada a fornecer energia elétrica às unidades não essenciais do requerido em razão do inadimplemento deste.

Condeno o requerido ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitro em 20% sobre o valor da causa, atualizado desde o ajuizamento da ação.

P.R.I.C.

Penápolis, 07 de abril de 2006.

Marcelo de Freitas Brito

Juiz de Direito

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