Crise das leis

Sem segurança jurídica não há Direito, diz Arnoldo Wald

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21 de maio de 2006, 7h00

O Brasil está em centésimo lugar em segurança jurídica. Pode até ser uma classificação injusta, visto que estamos entre os quinze países em potência na economia mundial, mas a posição só reflete na prática o grau de segurança que o investidor desfruta no país.

A constatação do advogado Arnoldo Wald, foi feita em palestra no congresso A Constituição de 1988 e o Custo Brasil, promovido em São Paulo pela Academia Internacional de Direito e Economia, nos dias 8 e 9 maio. Wald falou sobre A Constituição e a Crise da Legalidade e da Segurança Jurídica. O objetivo foi discutir a insegurança jurídica que teria sido provocada pelo modelo que o Brasil adotou com a Constituição Federal de 1988.

Wald apontou que hoje há três grandes riscos que impedem novos investimentos porque trazem insegurança jurídica: o Legislativo, o das Agências Reguladoras e o do Judiciário.

No Legislativo, segundo o advogado, o que se vê é uma “inflação legislativa” e uma “desordem completa”. “Já não sabemos mais quais são as leis que estão em vigor. Várias vezes, o advogado emite um parecer e precisa dizer ‘parece que’, ‘geralmente’, ‘pode-se presumir’, porque absoluta certeza ele não tem. Leis que eram importantes de repente não se sabe mais se estão em vigor”, afirma Arnoldo Wald.

De acordo com o advogado, durante muito tempo o Banco Central não entendia como crime uma determinada atitude. Mas o Ministério Público entendia de outra maneira. Daí veio o Supremo Tribunal Federal dizendo que se o Bacen considera uma atitude como lícita, a pessoa que o pratica não pode ser incriminada. “Foi preciso um acórdão do STF para que se pudesse chegar ao fim do imbróglio”, diz.

Já nas Agências Reguladoras, segundo o advogado, o risco é generalizado. “Depois das privatizações, tivemos conflitos constantes. Conflitos entre agências e ministérios, conflitos entre Ministério Público e Poder executivo, conflitos de interpretações. Tudo isso fez com que não se saiba mais como é que se aplica o Direito da Regulação, que tem uma grande importância para permitir o bom funcionamento de toda a infra-estrutura”.

“Talvez tenhamos sido o único país do mundo em que na campanha eleitoral o presidente da República disse que ia cumprir os contratos. Assim, parece que até há a intenção de cumprir os contratos, mas não necessariamente as provas dos contratos”, afirma o advogado, além da interferência dos órgãos no Direito Administrativo. “É a Ação Civil Pública que não permite cobrar pedágio, é decisão de ministro que pretende modificar os índices de correção monetária. Tudo isso cria uma área realmente caótica em que não é fácil pedir que haja novos investimentos.”

Arnoldo Wald explica que o mesmo ocorre no Judiciário. “Grandes questões demoram 15, 20 anos para serem resolvidas. Planos econômicos têm levado o mesmo tempo para que se saiba a função definitiva. Quando o Supremo vai julgar a questão, talvez as partes nem tenham mais como executar a determinação. Algumas vezes tenho a impressão de que os juízes se perguntam: ‘por que devemos decidir hoje o que podemos decidir amanhã? Por que devemos decidir de uma vez só, se podemos decidir aos poucos? Por que é que temos de tomar uma decisão impopular, se alguém amanhã pode tomá-la em nosso lugar?’ Não há mais idéia de prestação de serviço”.

“Não sei se a segurança jurídica pode ser decidida por decreto ou por lei. É também uma mudança cultural. Os economistas dizem que o mundo moderno andou muito rápido em virtude da construção criativa. Tenho a impressão que em matéria de Direito também temos de pensar um pouco de forma criativa. Acabar com as leis obsoletas, acabar com aquela infração legislativa e ver quais são as leis vigentes, encontrar formular para que os tribunais julguem com eficiência. Sem segurança Jurídica não há Direito, nem Direito bom, nem Direito mal, nem direito nenhum”, finalizou.

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