Falsidade ideológica

Desembargador federal continua afastado do cargo no TRF-2

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21 de maio de 2006, 7h00

Francisco José Pires e Albuquerque Pizzolante, desembargador do Tribunal Regional da 2ª Região, deve continuar afastado do cargo. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça reunida na quarta-feira (19/5) decidiu, por maioria de votos, declarar extinta a punibilidade do juiz no que diz respeito a prevaricação, mas manteve a acusação por falsidade ideológica e, por conseqüência, seu afastamento do cargo.

A Corte julgava Embargos de Declaração proposto pela defesa de Pizzolante, os advogados Gustavo Filgueiras e Dea Rita Matozinhos, do Rio de Janeiro. Os advogados questionavam a prescrição da prevaricação. De acordo com Filgueiras, o suposto crime de prevaricação estaria prescrito e, assim sendo, Pizzolante deveria ser reconduzido ao cargo.

Os 19 ministros presentes na ocasião do julgamento entenderam que a punibilidade quanto à prevaricação estava prescrita, mas 11 dos ministros, acompanhando voto da relatora, ministra Eliana Calmon, mantiveram a acusação de falsidade ideológica e, portanto, mantiveram o afastamento do cargo de desembargador.

O advogado de Pizzolante alega que segundo o artigo 29 da Lei Orgânica da Magistratura, o afastamento de um magistrado deve se dar com dois terços dos votos dos ministros presentes em julgamento, no caso, 14 ministros. Como no último julgamento apenas 11 ministros entenderam pela manutenção do afastamento, Filgueiras afirma que o escritório já estuda medidas para contestar essa decisão.

Em setembro de 2004, o STJ acatou denúncia Procuradoria-geral da República contra o desembargador por prevaricação e falsidade ideológica. Pizzolante foi acusado de conceder decisão favorável ao Clube de Regatas Botafogo, do Rio de Janeiro, tendo em vista sua condição de ex-membro do conselho deliberativo. Também foram alvos da denúncia do MPF, o presidente do clube, Mauro Nei Palmeiro e o presidente do Conselho Deliberativo do Botafogo, Carlos Augusto Montenegro. Quando a Palmeiro, a denúncia no STJ foi rejeitada por unanimidade.

Outro processo

Em junho de 2004, o STJ acatou Ação Penal (APN 258) proposta pela Subprocuradoria-Geral da União e interposta pelo Ministério Público Federal contra Pizzolante. Foi esta decisão da Corte que o afastou do cargo. De acordo com a ação do MPF, o edesembargador teria distribuído um Habeas Corpus para sua própria apreciação.

A acusação estava relacionada com a empresa Anjos do Asfalto, que presta serviços de socorro em rodovias. De acordo com o MPF, a empresa teria emitido notas fiscais falsas, e seus integrantes foram acusados de formação de quadrilha e de oferecimento de propina.

Em relação a Anjos do Asfalto, a primeira acusação contra Pizzolante tratava de distribuição de um Habeas Corpus para ser por ele mesmo apreciado, se colocando em condições de analisar o pedido de concessão de liminar.

O segundo fato, também ligado à empresa, mais uma vez diz respeito à distribuição de HC. Segundo a Subprocuradoria-Geral da União, Pizzolante concedeu liminar em favor de Júlio César de Figueiredo, Jan Guilherme de Aguiar, Roberto Medina e Waldemar Sebastião Raposo para suspender o interrogatório na ação penal. Informou o MPF que o processo que daria o suposto direito ao juiz de atuar no caso estava arquivado.

O MPF argumentou, ainda, que “a primeira página do habeas-corpus fora trocada para que nela fosse inserida, às pressas, a menção ao processo anteriormente arquivado”. Ao final, tanto o HC quanto o recurso ficaram parados por quase um ano, sendo julgados somente depois de interposto mandado de segurança.

Em terceiro lugar, está o despacho em que Pizzolante aduz ter direito de julgar recurso movido por Juan Carlos Ramirez Villanueva em que se discutia a expatriação de U$ 459.572.391,00. O juiz, que conseguiu restabelecer liminar em favor do réu, não apontou o número do processo que argumentaria sua prevenção. Esclareceu o MPF que o recurso impetrado por Villanueva foi apreciado sem a devida distribuição “e sob a assertiva de que cuidava de medida de urgência”.

Explicou, também, que o desembargador concedeu de ofício “ordem de habeas-corpus em favor dos administradores do Banco Prosper para preveni-los de imputação contra crime de desobediência, caso não cumprisse a determinação do juízo de Foz do Iguaçu, o qual determinou o seqüestro dos bens de Villanueva”. Mais uma vez o STJ suspendeu os efeitos da ordem.

Por último, cita o Ministério Público situação em que Empresas Reunidas Paulistas de Transportes Ltda. apresentou documentos falsos para conseguir concessão de linhas. Foram distribuídas apelações civis a Pizzolante contra o Departamento Nacional de Estradas e Rodagens. No decorrer do processo, “em grau de apelação a sentença foi reformada e extinto o incidente de falsidade”.

Um Habeas Corpus impetrado no Supremo Tribunal Federal (HC 84.491) apreciado pela 1ª Turma da casa trancou a ação penal contra Pizzolante. Na ocasião os ministros entenderam inépcia da denúncia.

Leia o voto da relatora no Embargos de Declaração

EDcl na AÇÃO PENAL Nº 227 – RJ (2002/0167212-5)

Embargante

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Em setembro de 2005, a Corte Especial recebeu a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra FRANCISCO JOSÉ PERES E ALBUQUERQUE PIZZOLANTE e OUTROS, ficando o acórdão assim ementado:

PROCESSO PENAL – AÇÃO PENAL – PROCESSO DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA – PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL (LC 75/93) – FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS E FALSIDADE IDEOLÓGICA.

1. Não ofende o princípio do promotor natural a designação de Subprocurador, para atuar em determinada ação penal, feita pelo Procurador Geral da República, nos termos permitidos pelo artigo 48, II, da Lei Complementar 75/93.

2. O dispositivo mencionado encontra-se em apreciação pelo STF, o que não afasta a sua presunção de legalidade e constitucionalidade.

3. Rejeita-se a denúncia que imputa autoria de falsidade ideológica a quem não forneceu informação alguma, limitando-se a remeter os documentos solicitados pelo MPF.

4. Havendo dúvida quanto à participação de denunciado que assinou documento enviado ao MPF, de conteúdo diverso do documento original, aceita-se a proposta de ação, para aprofundamento da prova no curso da instrução.

5. Falsidade ideológica em documento particular, para acobertar ato de prevaricação de magistrado federal.

6. Afastamento do magistrado das funções, diante do cometimento de crime no exercício da função.

7. Denúncia recebida em parte.

Opõe o réu Francisco José Peres e Albuquerque Pizzolante embargos de declaração, alegando contradições e omissões a serem sanadas, a saber:

1º) omissão quanto ao exame da prescrição da pretensão punitiva do delito previsto no art. 319 do CP, ignorando-se os fatos seguintes:

a) os três agravos de instrumento, de interesse do Botafogo, apontandos na denúncia como despachados pelo embargante, foram julgados respectivamente em 28/04, 03/05 e 29/06, no ano de 2000;

b) a denúncia foi ofertada em 12/02 e recebida em 15/09/04, ou seja, mais de 4 (quatro) anos após a última conduta;

c) o tipo do art. 319 contempla pena máxima de 1 (um) ano de detenção, com prescrição em 4 (quatro) anos conforme art. 109, V, do CP.

2º) a publicação do acórdão embargado se dá em contexto processual diverso do que o embargante esteve envolvido, pois, no momento da prolação do acórdão embargado, estava o recorrente a responder por outra ação penal (APN 258/RJ), demanda que veio a ser trancada no STF, pelo HC 84.492/RJ, que determinou expressamente a cassação da decisão que afastou o embargante/paciente das suas funções.

Se proclamada a prescrição pelo crime de prevaricação, a denúncia só subsistirá pelo crime de falsidade ideológico em documento particular, delito inteiramente estranho ao exercício das funções de magistério, o que não mais justifica o afastamento.

Pede o recebimento dos embargos para, aclarados os pontos omissos e contraditórios, seja rejeitada a denúncia pelo art. 319 do CP, por força de prescrição, reconhecendo-se, a seguir, a insubsistência do afastamento.

Ouvi adrede o Ministério Público Federal, o qual exarou sua manifestação em favor da declaração de prescrição da pretensão punitiva do delito de prevaricação, mas desfavoravelmente ao pedido de reintegração ao cargo. Relatei.

EDcl na AÇÃO PENAL Nº 227 – RJ (2002/0167212-5)

Relatora

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (RELATORA): – Dois crimes são imputados ao réu FRANCISCO JOSÉ PIRES E ALBUQUERQUE PIZZOLANTE: o de prevaricação (art. 319 do CP) e o de falsidade ideológica (art. 299 do CP).

Em relação ao delito do art. 319 da lei substantiva penal, a pena cominada é de 1 (um) ano de detenção e multa.

Como não houve nenhum outro ato ou fato ensejador da quebra do lapso prescricional, senão o recebimento da denúncia, conta-se o prazo da data do fato delituoso até a data do recebimento da denúncia.

Os fatos passaram-se no primeiro semestre de 2000 e a denúncia só foi recebida em 15/09/04, o que enseja a prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato pelo crime de prevaricação.

Assim sendo, reconheço a incidência da prescrição, motivo pelo qual acolho parcialmente os embargos de declaração, para julgar extinta a punibilidade do crime de prevaricação.

De referência ao pedido de reintegração no cargo de magistrado, entendo que, estando o embargante a responder pelo crime de falsidade ideológica, melhor será manter-se eqüidistante da judicatura até o desfecho da presente demanda.

Com essas considerações, acolho parcialmente os embargos de declaração, para declarar extinta a punibilidade pelo crime de prevaricação, prosseguindo-se com a demanda pelo delito do art. 299 do CP – falsidade ideológica. É o voto.

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