E se fosse Osama?

Brasil tem de monitorar russo procurado pela Interpol

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16 de maio de 2006, 13h58

O Brasil tem uma das legislações penais mais avançadas do mundo sobre lavagem de dinheiro. Porque aderimos à Convenção de Viena, aqui, desde 1998, o fato é tido como criminoso e os agentes envolvidos, direta ou indiretamente na atividade, sujeitos à pena de até dez anos de reclusão. A lavagem de dinheiro é reconhecida por todos os países modernos como uma forte e negativa influência do submundo mafioso nas economias nacionais. Ninguém ganha com a infração penal exceto, é óbvio, as organizações criminosas internacionais.

Com as manobras correspondentes à consumação destes crimes, as máfias conseguem fazer circular na economia mundial o dinheiro obtido dissimulando a origem dos recursos. E a origem é a pior possível. Vai desde atos de terrorismo ou o financiamento puro e simples do terrorismo até o tráfico internacional de substâncias entorpecentes, passando pelo comércio de armas, munições e material destinado à sua produção.

A adesão brasileira ao combate da lavagem de dinheiro, em que pese bastante comemorada pelo significante avanço legislativo, não foi capaz de solucionar, desde a semana passada, estranho paradoxo. Está circulando em território nacional, com bastante desenvoltura, inclusive assessorado ostensivamente por políticos brasileiros, o magnata russo Boris Berezovsky. Segundo relata a imprensa, em pouco mais de dez dias ele estabeleceu relações amistosas com diretores de companhia área nacional e procurou contato com empresas estatais brasileiras.

Pretendeu mais do que isso. Tentou aproximar-se do governo brasileiro, buscando, sobretudo, fornecer auxílio financeiro à economia nacional onde ela se mostra depauperada. Extrapolou, por assim dizer, seu investimento inicial voltado aos clubes de futebol. Nada haveria de extraordinário na presença do investidor estrangeiro não fosse singela circunstância, até agora não avaliada em sua dimensão real.

O magnata é condenado pela Justiça Russa, justamente pela prática de crime de lavagem de dinheiro, entre outros delitos. Mais do que isso. Está incluído na denominada difusão vermelha da Interpol, com pedido internacional de localização e prisão preventiva com finalidade de extradição ao território russo. Trata-se de fato notório, de todos conhecido, sobre o qual ninguém poderá alegar desconhecimento no futuro.

Isso convida a uma reflexão: qual o significado de, ao mesmo tempo em que se adota a legislação moderna sobre lavagem de capitais, deixar circular no Brasil quem, ao final, é procurado no resto do mundo justamente pela condenação pela prática de tal delito? Que extraordinária vantagem econômica pode trazer ao país e às suas empresas privadas ou públicas pessoa que, segundo relato de inteligência governamental, é investigada justamente por deteriorar os interesses das empresas públicas de seu próprio país de origem?

E se a resposta à reflexão proposta indicar, como se acredita que deva ser, a completa falta de razoabilidade na tal relação amistosa com o magnata procurado pelo mundo, é tempo de fazer cessar suas peripécias em terras brasileiras, fazendo cumprir a lei. Apenas isso. Seja com a homologação, no Supremo Tribunal Federal, de seu mandado de prisão, seja com a intervenção, forte, do departamento de polícia federal para averiguar e monitorar — enquanto não chega o mandado homologado — a situação em que se encontra o russo e sua comitiva, como se daria, aliás, em verificação de rotina fosse um brasileiro contra o qual pesasse suspeita de cometimento de crimes.

Afinal, convenhamos, e se fosse outro o criminoso? E se, procurado na Interpol, viesse criminoso de outras paragens? O Brasil aguardaria, em berço esplêndido, o trâmite burocrático do cumprimento do mandado de prisão preventiva? Enfim, e se fosse, por exemplo, Osama Bin Laden?

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