Teste heterodoxo

PF tem de admitir policial reprovado em teste de sexualidade

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12 de maio de 2006, 18h30

O delegado da Polícia Civil do Espírito Santo Francisco Badenes Junior, que ficou famoso até na Europa pelo empenho no combate ao crime organizado, está se preparando para assumir o posto de delegado de Polícia Federal.

Badenes tenta há mais de dez anos ocupar o posto de delegado federal que conquistou em concurso público. Decisão do juiz substituto da 1ª Vara Federal de Brasília, Marcelo Rebello Pinheiro, reconheceu agora seu direito.

Aprovado no concurso de ingresso na Polícia Federal em 1993, Badenes foi reprovado na segunda etapa de um teste psicotécnico por não atingir um “determinado grau de heterossexualidade.”

O exame da PF, constante do processo, referia que “a escala de heterossexualidade tende a mensurar a quantidade de energia que o indivíduo desprende para o sexo e a direção dessa canalização energética em termos psíquicos. Esse dado é necessário, pois complementa outros que analisam a energia vital do indivíduo, bem como sua pré-disposição para o trabalho, persistência, produtividade e resistência à fadiga e frustração”. Ainda segundo essa monstruosidade pericial, “o fator heterossexualidade estaria relacionado ao fator persistência”.

Segundo a PF, o teste kafkiano não é mais adotado. A Comissão Nacional de Defesa e Proteção da Pessoa Humana vindicara a nomeação de Badenes. Também deram pareceres a favor de sua integração parlamentares, Ministério Público Federal e a própria Advocacia-Geral da União.

Também o TRF da 1ª Região se manifestou em prol do delegado em recurso julgado no final do ano passado: reconheceu seus direitos, mas jogou para a primeira instância a decisão.

Mesmo assim, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, se recusava a assinar a nomeação de Badenes. Ano passado, o policial foi condecorado e homenageado pela polícia da Irlanda por seu conhecimento e experiência no combate ao crime organizado.

Inimigo do Esquadrão

Badenes e o procurador da República Ronaldo Albo foram os principais inimigos da Scuderie Detetive Le Cocq, o clássico Esquadrão da Morte do Espírito Santo. Seu símbolo é uma caveira, sobreposta a duas tíbias cruzadas e duas letras brancas sobre um fundo negro: EM, de Esquadrão da Morte. Foi fundada em 24 de outubro de 1984, pautada para “aperfeiçoar a moral e servir à coletividade”. Dela são sócios advogados, juízes, políticos e promotores, auto-intitulados “irmãozinhos”

A Le Cocq é acusada de 30 assassinatos políticos cometidos em 18 anos e quase 1.500 homicídios anuais que transformaram o Espírito Santo no segundo Estado mais violento do Brasil. Foi criada no Rio, em 1965, por policiais que decidiram vingar a morte de um detetive, Milton Le Cocq. Cara de Cavalo, o bandido que matou Le Cocq, foi exterminado com mais de cem disparos, e seu corpo, coberto com o cartaz da caveira.

A CPI do Narcotráfico indiciou seis delegados da Polícia Civil capixaba e 24 policiais civis como integrantes do crime organizado. Todos eram filiados à Scuderie Le Cocq e são acusados de crimes que variam da receptação de carros roubados à organização de assaltos a banco, passando por homicídios e tráfico internacional de drogas.

Um dos indiciados é o delegado Cláudio Guerra, assumidamente filiado à Le Cocq. Ele foi preso mais de uma vez pela Polícia Federal. Em uma das ocasiões, foi acusado de trocar carros roubados no Espírito Santo por cocaína na Bolívia, com auxílio de policiais civis de Cáceres (MT). Continua na ativa e sem julgamento.

Outros três delegados foram indiciados, na CPI, por prevaricação. Encarregados de apurar mais de uma dezena de assassinatos cometidos pela Le Cocq, eram filiados à organização e arquivaram todos os inquéritos sem apontar culpados.

Pelos menos 103 páginas das 900 do relatório final da CPI do Narcotráfico que descrevem a situação do narcotráfico em todos os estados brasileiros, foram dedicadas ao Espírito Santo

Em 2000, o Espírito Santo ocupava a segunda colocação no ranking de violência do país, com índice anual de 55 homicídios para cada 100 mil habitantes. O relatório da CPI denunciou a “atuação dos grupos de extermínio, de esquemas de corrupção e espoliação do erário por máfias municipais e os mecanismos de impunidade” no Estado.

Calúnia

Em 2004, o delegado foi condenado por caluniar e difamar o ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Velloso. O delegado acusou o ministro de participar do crime organizado no Espírito Santo e de deferir liminares que impediam quebra de sigilo bancário de denunciados.

Leia o pedido de Badenes à Justiça Federal

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 1ª DA VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL

Ação de Rito Ordinário nº 2000.34.00.005295-0

Autor: FRANCISCO VICENTE BADENES JUNIOR


Ré: UNIÃO FEDERAL

FRANCISCO VICENTE BADENES JUNIOR, já qualificados nos autos do processo em referência, em face do v. acórdão de fls. 737/741, que deu provimento à apelação para cassar a r. sentença que indeferiu a inicial e “determinar o retorno dos autos ao juízo a quo, para o regular processamento do feito”, vem, perante Vossa Excelência, por seu advogado constituído nos autos, requerer o

ADITAMENTO DA INICIAL,

nos termos a seguir aduzidos.

CABIMENTO DO ADITAMENTO

A inicial desta ação foi indeferida antes de ser determinada a citação da ré. Logo, inexiste óbice ao presente aditamento, em face do que dispõe o art. 294 do Código de Processo Civil.

SÍNTESE FÁTICA

O autor ingressou com a presente ação ordinária, cujo objeto é a sua nomeação para o cargo de Delegado da Polícia Federal, com retroação das vantagens pecuniárias a 27.07.1996, data da nomeação dos candidatos aprovados no Curso de Formação. A pretensão deduzida apóia-se nos seguintes fundamentos:

a)prestara concurso para o provimento do cargo de Delegado de Polícia Federal, regido pelo Edital 01/93/ANP; fora aprovado nas provas objetivas, classificando-se no limite das vagas oferecidas; também fora considerado APTO na primeira parte do exame psicotécnico, constituída de testes objetivos e raciocínio lógico, bem como no exame médico e na prova de capacidade física; todavia, na segunda fase do exame psicotécnico, de natureza subjetiva, fora considerado INAPTO;

b)ao amparo de liminar e sentença proferidas em ação mandamental, freqüentara o XIII Curso de Formação Profissional de Delegado de Polícia Federal, concluindo-o exitosamente, tendo obtido média final de 8,177 e classificação em 90º lugar, dentre as 200 vagas oferecidas no edital do certame;

c)cumprira, portanto, todos dos requisitos do edital do concurso, inclusive o de classificação dentro do número de vagas oferecidas, com exceção da aludida segunda fase do exame psicotécnico, cuja invalidade estava discutindo judicialmente.

A inicial desta ação foi indeferida ao fundamento de que havia questão prejudicial ao pedido, qual seja, a reprovação na segunda parte do exame psicotécnico, matéria que estava pendente de julgamento no STJ, fator impeditivo, segundo a r. sentença, de ser apreciado o pedido formulado.

Dessa sentença foi interposta apelação, deduzindo-se, como razões, a diversidade de causa de pedir e de pedido entre esta ação e o mandado de segurança referido, mesmo porque a impetração não continha pedido de nomeação para o cargo em referência nem, muitos menos, de efeitos patrimoniais pretéritos. Essa tese foi acolhida pelo v. acórdão de fls. 737/741, de cuja ementa destaca-se o seguinte tópico:

“1. A extinção do processo, sem julgamento do mérito, por coisa julgada ou litispendência pressupõe a reprodução de ação anteriormente ajuizada (CPC, art. 301,§ 1º), o que não se verifica no presente caso, uma vez que os pedidos formulados neste feito (nomeação e posse, com retroação de efeitos patrimoniais) são diversos dos deduzidos no Mandado de Segurança nº 95.00.07321-8/DF (participação no curso de formação profissional e demais etapas do certame), cujo acórdão transitou em julgado após a prolação da sentença recorrida.” (destaques da transcrição)

FATOS NOVOS

Após o ajuizamento da presente ação, fatos novos vieram ao mundo jurídico, os quais eliminam qualquer dúvida que pudesse existir quanto ao direito deduzido nesta ação, a saber:

I – atos do Ministério da Justiça determinando o apostilamento dos candidatos reprovados no exame psicotécnico mas que tomaram posse “sub judice”; fundamento desses atos: o exercício do cargo teria demonstrado que os candidatos não eram inaptos para o cargo, ou seja, o exame psicotécnico teria sido um instrumento inválido de avaliação;

II – Despacho do Consultor-Geral da União, aprovado pelo Advogado-Geral da União, sugerindo ao Senhor Ministro da Justiça que autorize a nomeação de Francisco Vicente Badenes Junior, nas mesmas condições fixadas para os demais candidatos qualificados como “sub judice”, ao fundamento de que:

a)o Despacho do Senhor Ministro da Justiça “pela sua fundamentação reconheceu que o exame psicotécnico no concurso em questão não foi um teste válido” ;

b)que a situação de Francisco Badenes é “tecnicamente”, sub judice, o que o iguala à dos demais candidatos reprovados, apenas, no exame psicotécnico;

c)“não há como deixar de estender ao ora requerente – mesmo não tendo obtido medida liminar e não havendo o exercício do cargo – o reconhecimento de uma situação ‘sub judice’ que fizesse valer perante a Administração a mesma vantagem, obedecidas as mesmas condições aos demais impostas”, sob pena de se “consagrar a iniqüidade decorrente de uma azar processual, elevando-o à categoria definidora de direito. (docs.3 e 4, anexos)


III – Resolução nº 03, de 30 de março de 2005, publicada no Diário Oficial da União de 4 de abril de 2005, Seção 1, p. 2 , expedida pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, órgão da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, recomendando ao Senhor Ministro de Estado da Justiça que, “com a urgência possível, determine a adoção das medidas cabíveis no sentido de implementar o cumprimento das conclusões do Despacho do Consultor Geral da União nº 613/2004, do Doutor Manoel Lauro Volkmer de Castilho, nos autos do processo nº 00400.001517/2003-4, de interesse de FRANCISCO VICENTE BADENES JÚNIOR, aprovado por Despacho do Advogado Geral da União, Doutor Álvaro Augusto Ribeiro Costa (…)” (doc. 5, anexo).

O primeiro ato do Senhor Ministro da Justiça é o Despacho de nº 95, datado de 9 de julho de 2002 (doc. 1, anexo), proferido pelo então Ministro MIGUEL REALE JÚNIOR. Nele, Sua Excelência reconhece que o exame psicotécnico aplicado no concurso de 1993 não foi um teste válido, haja vista que os candidatos reprovados nesse exame que, por força de decisão judicial, tomaram posse sub judice, revelaram, no exercício da função, ser pessoas devidamente aptas ao exercício do cargo.

Ponderou Sua Excelência que, em face de ter ficado evidenciada a imprestabilidade daquele exame psicotécnico para aferir a capacidade dos candidatos, e, considerando:

a) o interesse público e o princípio da instrumentalidade das formas;

b) o fato de o exame psicotécnico ser apenas um dos instrumentos de avaliação do concurso público;

c)que, em sede de concurso público, “não se deve perder de vista a finalidade para a qual se dirige o procedimento”; determinou a regularização da situação de todos os candidatos sub judice que tivessem sido reprovados apenas no exame psicotécnico.

O segundo ato é o Despacho de nº 312, de 16 de dezembro de 2003, do atual Ministro MÁRCIO THOMAZ BASTOS, o qual define o que se deve entender por candidato sub judice, para fins de executoriedade do despacho anterior. Essa definição, no entanto, foi feita de forma a limitar o alcance do primeiro Despacho, haja vista que definiu como sub judice apenas os candidatos que,“tendo participado do concurso de 1993, encontram-se atualmente em exercício por força de decisões judiciais ainda não transitadas em julgado, tendo concluído o estágio probatório” (doc. 2, anexo).

O autor não se enquadrou nos limites desse novo Despacho porque não tinha obtido decisão liminar que lhe assegurasse a nomeação e posse precária no cargo. Daí a razão do Despacho da Advocacia-Geral da União reconhecendo-lhe igualdade jurídica aos demais candidatos sub judice, haja vista que a sorte ou o azar processual não podem ser considerados fatores válidos de discriminação.

DO DIREITO QUE DECORRE DOS FATOS NOVOS

O resultado inexorável de todos esses atos é que, por meio deles, a Administração reconheceu a invalidade dos exames psicotécnicos que foram aplicados no concurso de 1993 e, também, que o autor é beneficiário dos efeitos decorrentes desses atos.

Com efeito, o Advogado-Geral da União, ao analisar o caso específico do autor, no âmbito administrativo, aprovou o referido Despacho exarado pelo Consultor-Geral da União, sugerindo ao Senhor Ministro da Justiça que autorize a sua nomeação, nas mesmas condições fixadas para os demais candidatos qualificados como “sub judice”. Tal Despacho ancora-se nos seguintes fundamentos:

a)o Despacho do Senhor Ministro da Justiça “pela sua fundamentação reconheceu que o exame psicotécnico no concurso em questão não foi um teste válido”;

b)“se o ato do Sr. Ministro da Justiça reconheceu implicitamente a invalidade do exame psicotécnico” , a situação de Francisco Badenes é “tecnicamente”, sub judice, o que o iguala à dos demais candidatos reprovados, apenas, no exame psicotécnico;

c)“não há como deixar de estender ao ora requerente – mesmo não tendo obtido medida liminar e não havendo o exercício do cargo – o reconhecimento de uma situação ‘sub judice’ que fizesse valer perante a Administração a mesma vantagem, obedecidas as mesmas condições aos demais impostas”, sob pena de se “consagrar a iniqüidade decorrente de uma azar processual, elevando-o à categoria definidora de direito.

No âmbito do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, o eminente relator, Conselheiro PERCÍLIO DE SOUSA LIMA NETO, representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, assim se pronunciou:

“Este relator havia elaborado longo e minucioso parecer examinando tais alegações e a documentação que as instruiu. Todavia, o interessado, através de requerimento datado de 26 de janeiro de 2005, trouxe parecer do Consultor Geral da União, Doutor Lauro Volkmer de Castilho, aprovado pelo Advogado-Geral da União, Doutor Álvaro Augusto Ribeiro Costa que, após examinar a matéria em seus diferentes aspectos, concluiu pelo reconhecimento do direito do interessado em se ver nomeado para o pretendido cargo de Delegado de Polícia Federal, pelas razões que expõe.


Destarte, em face de expressa disposição do art. 4º, inciso X, da Lei Complementar nº 73, de 10/02/1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia Geral da União, cabe-nos tão somente, agora propor aos eminentes Conselheiros do CDDPH que a matéria, já solvida juridicamente seja encaminhada ao Exmo. Senhor Ministro da Justiça, para cumprimento da decisão do Órgão Superior do Serviço Jurídico da União, em forma de recomendação, consoante a legislação pertinente.” (doc. 7, anexo).

Diante desses fatos novos, resta evidente que o alegado óbice à nomeação do autor, se é que existia, desapareceu no momento em que a própria Administração – seja mediante ato do Ministro da Justiça, seja mediante parecer aprovado pelo Advogado-Geral da União -, reconheceu a invalidade do exame psicotécnico aplicado no concurso regido pelo Edital 001/ANP/1993 e o seu direito de ser nomeado para o cargo ao qual concorreu.

Com efeito, quando se reconhece a invalidade de um item de um edital de concurso, essa invalidade alcança todos os candidatos na mesma situação. Quando se anula uma questão de prova, a nulidade aproveita a todos os candidatos do certame. De igual modo, quando se reconhece que determinado exame psicotécnico foi um teste inválido e autoriza a nomeação definitiva daqueles que haviam sido reprovados apenas nesse exame, esse reconhecimento tem de ser estendido aos demais candidatos em idêntica situação no concurso. A situação processual de cada um deles não pode ser tomada como fator de discriminação, para fins de aferição de direitos, porque não integra os requisitos do Edital do concurso.

Sabe-se que o pedido é o que define a lide. A causa de pedir, conquanto constitua o fundamento do pedido, não se altera pela simples qualificação jurídica diversa.

No caso presente, o autor pediu a sua nomeação porque havia cumprido todos os requisitos do edital, exceto o relativo ao exame psicotécnico, cuja invalidade foi também argüida. Como a Administração reconheceu, na via administrativa, a invalidade desse exame, persistem o pedido principal e a causa de pedir, que, agora, apoia-se em fundamentos novos, também.

Por ouro lado, é certo que a Administração renunciou ao direito de continuar discutindo, judicialmente, a validade do exame psicotécnico, na medida em que reconheceu que o mesmo fora um teste inválido e determinou a efetivação dos nomeados sub judice.

Ademais, é o Excelentíssimo Senhor Advogado-Geral da União – a mais alta autoridade da instituição responsável pela defesa judicial da União -, quem está afirmando que a situação do autor é igual à dos demais beneficiados pelo despacho do Senhor Ministro da Justiça.

Diante disso, resta evidente que falece interesse jurídico à União de se opor à nomeação e posse dos candidatos sub judice, como bem asseverou a eminente Desembargadora Federal SELENE MARIA DE ALMEIDA, nos autos da Apelação em Mandado de Segurança nº 2000.34.00.009207-9, verbis:

“2. Considerando que o impetrante comprovou nos autos a conclusão com êxito do curso de formação, é de se concluir que a sua situação encontra-se abrangida pelo Despacho do Ministro da Justiça.

3. Não há mais pretensão resistida, na medida em que a própria União demonstra interesse (e necessidade) em regularizar a situação de policiais federais com ações pendentes de julgamento perante o Judiciário.

4. O ato administrativo praticado pela União é incompatível com o interesse de recorrer da sentença concessiva da segurança”.

(TRF/1ª, Quinta Turma, unânime, DJ de 29.7.2005, p.71).

DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA

O art. 273 do Código de Processo Civil autoriza o juiz antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e,

“I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou

II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.”

A prova inequívoca dos fatos articulados na inicial encontra-se nos documentos que instruem os autos e, também, nos que ora se anexa.

A verossimilhança da alegação, que aliada à prova inequívoca dos fatos consubstancia o que tradicionalmente se denomina de fumus boni iuris, decorre de toda a fundamentação jurídica demonstrada na inicial e no presente aditamento.

Ademais, repita-se, é a própria Advocacia-Geral da União, através dos titulares dos mais altos cargos da sua hierarquia institucional – o Consultor-Geral da União e o Advogado-Geral da União – quem afirma que o direito de nomeação do autor decorre dos atos praticados pelo Ministro da Justiça, atos esses que invalidaram o exame psicotécnico e determinaram a nomeação definitiva dos candidatos sub judice, reprovados apenas nesse exame .


Quanto ao periculum in mora, este decorre, especialmente, dos fatores a seguir mencionados.

O primeiro fator é o tempo transcorrido desde a propositura desta ação, visto que a mesma foi proposta em 3 de março de 2000 mas somente agora o feito inicia o seu regular processamento. Ocorre que, nesse período, vários candidatos obtiveram decisão judicial assegurando-lhes nomeação e posse provisória, o que cria dificuldades, com o passar do tempo, para que a Administração cumpra a decisão judicial que julgar procedente o pedido, lotando o autor em localidade onde realmente haja necessidade e que corresponda à opção que, por direito, lhe assistia à época da finalização do concurso. Mesmo porque, muitos candidatos sub judice – e que agora estão obtendo nomeação definitiva -, não lograram aprovação dentro do número de vagas ofertadas no edital do certame, o que prejudica direito do autor, que obteve classificação no 90º lugar, dentre as 200 vagas oferecidas.

O segundo fator decorre do dever de ofício imposto aos Advogados da União de contestarem a lide e de adotar todos os recursos cabíveis, visto que a autonomia funcional para reconhecerem a procedência do pedido ou deixarem de recorrer é restrita a situações específicas, indicadas em lei, hipótese que não se aplica ao caso presente.

Ademais, apesar das recomendações do Advogado-Geral da União e do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, o Senhor Ministro da Justiça não praticou o ato que lhe competia. Logo a hipótese enquadra-se no disposto no inciso II do art. 273 citado (II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.)

O terceiro fator decorre de o autor ser Delegado de Polícia Civil do Estado do Espírito Santo e, nessa qualidade, ter sido designado pelo Senhor Governador do Estado e pelo Senhor Ministro da Justiça para apurar denúncias de criminalidade organizada e investigar as atividades da entidade denominada “Scuderie Detetive Le Cocq” , entidade esta que contava com a participação de policiais locais (doc. 9, anexo). Por força dessa atuação, tornou-se vítima de perseguições e retaliações engendradas por alguns dos integrantes da corporação à qual pertence, o que motivou a sua inclusão no Programa Federal de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, em modalidade especial, conforme relatado no processo em curso no Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, verbis:

“Assinale-se que o Doutor Badenes, em decorrência de sua atuação profissional, viu-se na contingência de ser incluído no Programa Federal de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, em modalidade especial – e está impossibilitado de retornar ao convívio de seus pares, para o exercício das funções inerentes ao seu cargo, em face do antagonismo e rejeição de que é vítima da parte dos policiais de seu Estado.” (doc. 7).

A modalidade especial de proteção que lhe foi concedida significa a suspensão do seu vínculo funcional com o Estado do Espírito Santo, até que haja condições de voltar a exercer as funções de Delegado de Polícia Civil, o que ainda não se verificou. Por isso, desde que foi incluído no referido Programa, encontra-se na precária situação de prestação de serviços ao Ministério Público Federal, em Brasília, no aguardo, também, da solução da sua situação no concurso em referência (doc. 11).

É certo que, ao tomar posse no Cargo de Delegado de Polícia Federal, o autor poderá ser lotado em qualquer Unidade da Federação, inclusive no Estado do Espírito Santo. Todavia, sendo a Polícia Federal uma instituição diversa da Polícia Civil daquele Estado, não há o risco de sofrer as retaliações e perseguições de que fora vítima no âmbito da Instituição à qual pertence.

De qualquer sorte, a situação de dificuldades que hoje o autor se encontra decorre da atuação do próprio Estado, seja designando-o para uma missão de alto risco – embora de elevado interesse público -, seja reprovando-o, de forma indevida, num concurso público que poderia ter mudado sua vida. O prejuízo que o autor está sofrendo com a demora no reconhecimento do seu direito – fato não experimentado pelos demais reprovados no mesmo exame psicotécnico que tiveram a sorte processual de obter decisão judicial que lhes garantiu a posse “sub judice”, e que constituem a maioria deles -, configura um dano que jamais poderá ser reparado. Não há dinheiro que pague o sofrimento.

E se o direito é manifesto, conforme está expresso nas diversas manifestações referidas, postergar o seu exercício, em caso tal, configura, efetivamente, situação de dano irreparável.

Ademais, conforme estabelece o § 6º do art. 283 do Código de Processo Civil, acrescentado pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002, “a tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso” .


Ora, a referida manifestação da Advocacia-Geral da União, reconhecendo, no âmbito administrativo, o direito deduzido nesta ação, configura típica situação de pedido incontroverso a que se refere dispositivo citado.

A teleologia desse dispositivo foi muito bem exposta pelo eminente Ministro do Superior Tribunal de Justiça, TEORI ALBINO ZAVASCKI, em artigo publicado no Jornal da ANPAF (Associação Nacional dos Procuradores Federais), de fevereiro de 2003, nos seguintes termos:

“A fórmula da antecipação da tutela fundada na evidência do direito postulado, prevista no § 6º, busca, sem dúvida, privilegiar a celeridade da função jurisdicional. O princípio constitucional da efetividade do processo se exterioriza, entre outros modos, também pela resposta do Estado às demandas que lhe são dirigidas. Não se estará atendendo àquele princípio constitucional se a demora na entrega reclamada decorrer de motivo injustificado ou irrazoável.” (negritos da transcrição).

Desse modo, mesmo que não existisse o periculum in mora acima demonstrado, o que se admite apenas para argumentar, ainda assim, data maxima venia, assistiria ao autor o direito à antecipação da tutela, em face da norma que dimana do referido § 6º do art. 273 do CPC.

Questão de interesse público

Registre-se pormenor, de relevante interesse público, que pode decorrer dos efeitos do deferimento da tutela requerida. Trata-se da solução administrativa do pleito. Explica-se: em que pese a Advocacia-Geral da União e o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana terem sugerido e recomendado, respectivamente, a nomeação do autor, o Senhor Ministro da Justiça tem relutado em praticar o ato que é da sua competência. O autor, por seu turno, já afirmou e reafirmou, perante o Senhor Ministro da Justiça, mediante documento escrito, o seu compromisso de, em sendo resolvida a sua postulação, na via administrativa, renunciar a qualquer direito patrimonial antecedente à nomeação (doc. 8).

Por certo que, com o deferimento do pedido de antecipação da tutela, ora formulado, a situação do impetrante passa a corresponder ao que está escrito, ipsis litteris, no Despacho proferido pelo Senhor Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Consequentemente, deixarão de existir os argumentos da área jurídica desse Ministério – argumentos não declinados por escrito -, no sentido de que a situação do autor não se enquadra no figurino do referido Despacho, porque não está no exercício da função, e a solução administrativa certamente será adotada.

Isto ocorrendo, ganhará a União que deixará de arcar com as verbas patrimoniais pretéritas, postuladas nesta ação; ganhará o Poder Judiciário com o encerramento definitivo desta ação, por perda do objeto; ganhará a sociedade porque será menos um caso a demandar a proteção tutelar do Estado (Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana e Programa Federal de Proteção a Vítimas e Testemunhas ameaçadas); ganhará o autor e o sentimento de Justiça, haja vista que não mais será necessário esperar o desfecho final da lide para que o direito, manifestamente evidente, afinal prevaleça; ganhará, também, o serviço público, especialmente o Departamento de Polícia Federal, eis que o autor, como assinalado e demonstrado nos autos, é Delegado de Polícia Civil com experiência e renome consagrados nacional e internacionalmente, conforme comprovam os documentos anexos (docs. 13 a 15), a saber:

DEFENSOR DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL, outorgado pela Anistia Internacional (Inglaterra) e Front Line Defenders (Irlanda) – 2001.

MEDALHA DA INTERNATIONAL POLICE ASSOCIATION, recebida na cidade de Trondheim, Noruega em 13 de maio de 2003.

PROFESSIONAL SERVICE AWARD 2004, Prêmio outorgado pela INTERNATIONAL ASSOCIATION OF LAW ENFORCEMENT INTELLIGENCE ANALYSTS, for outstanding contributions as an intelligence analyst to the achievement of law enforcement objectives, recebido na cidade de Sacramento, Califórnia, Estados Unidos da América , em 28 de abril de 2004.

Por todas essas razões, requer a Vossa Excelência que defira a antecipação da tutela pretendida, para fins de determinar ao Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado da Justiça que adote as medidas necessárias à nomeação e posse do autor, no cargo de Delegado da Polícia Federal, até decisão final nesta ação.

DO PEDIDO DEFINITIVO

Reitera o pedido definitivo formulado na inicial desta ação, ora aditada.

Por fim, requer a Vossa Excelência que determine as providências necessárias para que das publicações dos atos processuais conste, também, o nome do advogado ora signatário.

Pede deferimento.

Brasília (DF), 10 de fevereiro de 2006.

José Leovegildo Oliveira Morais

OAB/DF nº 16.484

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