Prerrogativa profissional

STF reafirma que advogado tem direito a sala de Estado-Maior

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8 de maio de 2006, 15h11

Advogado tem direito a prisão em sala de Estado-Maior ou, na sua falta, prisão domiciliar enquanto sua condenação não for definitiva. Ao acolher esses argumentos, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, concedeu liminar em Habeas Corpus ao advogado Ezio Rahal Melilo. A decisão se baseou no artigo 7º da Lei 8.906/94 — Estatuto da Advocacia.

Melilo foi condenado em primeira instância, por fraude ao INSS, a três anos e quatro meses de reclusão em regime fechado. Em novembro de 2004, sua prisão preventiva foi decretada. Com isso, o advogado foi encaminhado para uma cela separada de presos comuns no presídio de Avaí, interior de São Paulo.

O advogado Otávio Augusto Rossi Vieira, que representa Melilo em nome da seccional paulista da OAB, recorreu ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região com o argumento de que seu cliente passa por constrangimento ilegal. Isso porque o mandado de prisão não obedeceu ao inciso V, do artigo 7º, da Lei 8.906/94, segundo o qual “são direitos do advogado, não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e na sua falta, prisão domiciliar”.

O tribunal rejeitou o pedido e o advogado recorreu ao Superior Tribunal de Justiça. Segundo a defesa, a alteração do artigo 295 do Código de Processo Penal, que lista as autoridades que devem ser recolhidas “a quartéis ou prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeito a prisão antes de condenação definitiva”, não alterou a garantia à sala de Estado Maior para os advogados. O STJ, contudo, manteve a decisão de segunda instância.

Em novo recurso ao Supremo Tribunal Federal, o ministro Celso de Mello concedeu a liminar para determinar a transferência do advogado. Não é a primeira vez que o ministro decide dessa forma.

Em decisão de 1995 (HC 72.465/SP), Celso de Mello entendeu se tratar de “insuprimível direito (do advogado), uma vez efetivada a sua prisão, e até o trânsito em julgado da decisão penal condenatória, de ser recolhido a Sala de Estado Maior (…). Trata-se de prerrogativa de ordem profissional que não pode deixar de ser respeitada”.

O ministro Celso de Mello determinou que o juiz da 2ª Vara Federal de Bauru (SP) providencie a transferência do réu para “dependência que se qualifique como sala de Estado Maior (Lei 8.906/94, art. 7º, v), apurando, para esse efeito, junto às organizações militares sediadas na 8ª subseção judiciária e, também, junto à Polícia Militar e ao Corpo de Bombeiros Militar, a existência de local disponível”.

Celso de Mello determinou ainda que, caso não haja local adequado para a prisão, o juiz deve informar o Supremo, que deverá assegurar a prisão domicilar ao advogado.

Leia a liminar

MED. CAUT. EM HABEAS CORPUS 88.702-3 SÃO PAULO

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

PACIENTE(S): EZIO RAHAL MELILLO

IMPETRANTE(S): ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SECCIONAL DE SÃO PAULO E OUTRO(A/S)

ADVOGADO(A/S): OTÁVIO AUGUSTO ROSSI VIEIRA E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): RELATOR DO HC Nº 47.665 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DECISÃO: O E. Conselho Seccional da OAB/SP e o Dr. Otávio Augusto Rossi Vieira, Conselheiro da Comissão de Prerrogativas da OAB/SP, impetramhabeas corpusem favor de Advogado, o ora paciente, a quem se negou a prerrogativa assegurada pelo art. 7º, inciso V, do Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94), que assim dispõe:

Art. 7º São direitos do advogado:

……………………………………………….

V – não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas (…),e, na sua falta, em prisão domiciliar.” (grifei)

Os elementos de informação constantes da presente ação de “habeas corpus” revelam que o paciente, que é Advogado, sofreu condenação penal ainda não transitada em julgado, havendo sido recolhido a estabelecimento prisional – a Cadeia Pública de Avaí/SP (comarca de Bauru) – que não satisfaz a exigência fixada no preceito legal mencionado (fls. 62/64 e 65/75).

Os fundamentos em que se apóia esta impetração revestem-se de densidade jurídica, eis que a pretensão nela deduzida tem o beneplácito da jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria, quer antes do advento da Lei nº 10.258/2001, quer após a promulgação desse mesmo diploma legislativo:

(…) ADVOGADO – CONDENAÇÃO PENAL RECORRÍVEL – DIREITO À PRISÃO ESPECIAL – PRERROGATIVA DE ORDEM PROFISSIONAL (LEI N. 8.906/94).

– O Advogado tem o insuprimível direito, uma vez efetivada a sua prisão, e até o trânsito em julgado da decisão penal condenatória, de ser recolhido a sala de Estado-Maior, com instalações e comodidades condignas (Lei nº 8.906/94, art. 7., V). Trata-se de prerrogativa de ordem profissional que não pode deixar de ser respeitada, muito embora cesse com o trânsito em julgado da condenação penal. Doutrina e jurisprudência.

O recolhimento do Advogado a prisão especial constitui direito público subjetivo outorgado a esse profissional do Direito pelo ordenamento positivo brasileiro, não cabendo opor-lhe quaisquer embaraços, desde que a decisão penal condenatória ainda não se tenha qualificado pela nota da irrecorribilidade.

A inexistência, na comarca, de estabelecimento adequado ao recolhimento prisional do Advogado, antes de consumado o trânsito em julgado da condenação penal, confere-lhe o direito de beneficiar-se do regime de prisão domiciliar.”

(RTJ 169/271-274, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma)

HABEAS-CORPUS. ADVOGADO. PRISÃO PROVISÓRIA. SALA DE ESTADO-MAIOR. PRERROGATIVA DE CLASSE. RECOLHIMENTO EM DISTRITO POLICIAL. CELA QUE NÃO ATENDE A REQUISITOS LEGAIS. SITUAÇÃO DEMONSTRADA POR DOCUMENTOS E RECONHECIDA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM OUTRO PROCESSO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. DESNECESSIDADE. PRISÃO DOMICILIAR DEFERIDA.

……………………………………………….

2. Bacharel em direito, regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil. Lei 8906/94, artigo 7º, inciso V. Recolhimento em sala de Estado-Maior, até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Direito público subjetivo, decorrente de prerrogativa profissional, que não admite negativa do Estado, sob pena de deferimento de prisão domiciliar.

3. Incompatibilidade do estabelecimento prisional em que recolhido o paciente, demonstrada documentalmente pela Ordem dos Advogados do Brasil-SP (…).

Ordem deferida para assegurar ao paciente seu recolhimento em prisão domiciliar.

(RTJ 184/640, Rel. p/ o acórdão Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma – grifei)

Concorre, por igual, o requisito concernente ao “periculum in mora”, tal como alegado – e documentalmente comprovado (fls. 62/64 e 65/75) – pelos ora impetrantes.

Sendo assim, e em face das razões expostas, defiro o pedido de medida cautelar, em ordem a assegurar a transferência do paciente para dependência que se qualifique como “sala de Estado-Maior” (Lei nº 8.906/94, art. 7º, V), devendo, o Senhor Juiz Federal da 2ª Vara Federal de Bauru/SP, adotar providências que viabilizem o imediato cumprimento desta determinação, apurando, para esse efeito, junto às Organizações Militares sediadas na 8ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo e, também, junto à Polícia Militar e ao Corpo de Bombeiros Militar dessa mesma unidade da Federação, a existência, ou não, de local disponível.

Caso tal não se mostre viável, por inexistência de local adequado que atenda a exigência do art. 7º, V, da Lei nº 8.906/94, o magistrado federal em questão deverá informar, com urgência, esta Suprema Corte, da impossibilidade de execução material da presente medida cautelar, caso em que será assegurada, ao paciente, mediante nova deliberação deste Tribunal, a prerrogativa de ordem profissional instituída pelo Estatuto da Advocacia, consistente em recolhimento a prisão domiciliar (art. 7º, V, “in fine”).

Comunique-se, com urgência (fls. 59/60).

Solicite-se, ao E. TRF/3ª Região, informação sobre a fase em que se acha, presentemente, a apelação criminal interposta pelo ora paciente.

Publique-se.

Brasília, 05 de maio de 2006 (23:30h).

Ministro CELSO DE MELLO

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