Sem lucro

Ato de cooperativa feito com cooperado é isento de tributação

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4 de maio de 2006, 11h55

Atos de cooperativas realizados apenas com cooperados são isentos de tributação. O entendimento é da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça e reforça a jurisprudência do tribunal de que a cooperativa tem isenção de tributos em relação aos atos cooperativos.

A questão chegou ao STJ em Recurso Especial ajuizado pela Cooperativa de Consumo dos Funcionários da Companhia Vale do Rio Doce e Entidades Vinculadas Ltda. O objetivo era reverter acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região e manter o entendimento de primeira instância que excluiu a incidência do imposto sobre os atos cooperativos.

A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça acolheu o pedido. Para o relator, ministro Francisco Peçanha Martins, os atos praticados comente com os associados não estão sujeitos à incidência de tributos. “Apesar de a Cooperativa realizar operação de compra e venda de mercadorias, qualquer incidência de tributo deve ser mitigada, haja vista que esta atividade é realizada somente entre a cooperativa e os associados, sem o intuito de lucro e está, diretamente, ligada ao objetivo social da cooperativa”, concluiu.

Resp 479.012

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 479.012 – MG (2002⁄0134640-6)

RELATÓRIO

EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO PEÇANHA MARTINS :

Cuida-se de recurso especial manifestado pela Cooperativa de Consumo dos Funcionários da CVRD e Entidades Vinculadas Ltda e outros com fundamento nas letras “a” e “c” do permissivo constitucional contra acórdão proferido pelo TRF da 1ª Região que, por unanimidade, negou provimento à apelação interposta pela ora recorrente contra sentença denegatória de mandado de segurança fundamentada no sentido de que o art. 69 da Lei n.º 9.532⁄97 não criou obrigação tributária nova, mas apenas estendeu a existente a contribuintes antes protegidos por norma isencional, ou seja, a impetrante está sujeita a todos os tributos federais devidos pelas demais pessoas jurídicas que exerçam atividades similares à desenvolvida pelas cooperativas de consumo.

O Tribunal de origem declarou que não há necessidade de lei complementar para tratar da matéria, pois o artigo 69 da Lei n.º 9.531⁄97, que se afirma inconstitucional, não instituiu obrigação nova, apenas estendeu a existente a cooperativas que desenvolvam atividade de consumo. Declarou, ainda, que a própria Lei que regula as atividades cooperativas prescreve que não caracteriza ato cooperativo a operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria (art. 79, § único, da Lei n.º 5.764).

Opostos embargos de declaração, estes foram rejeitados.

No presente recurso especial, alegam as recorrentes violação aos artigos 458 e 535 do CPC, uma vez que o acórdão recorrido não se manifestou acerca do ato cooperativo não gerar lucro nem originar faturamento, e conseqüentemente, não configurar fato gerador de tributo federal; bem como não haver relação de consumo entre cooperativa e cooperados, posto que a compra e venda realizada entre os mesmos não pode ser entendida como “compra e fornecimento de bens aos consumidores”. Sustentam, ainda, violação ao artigo 97 do CTN, uma vez que o artigo 69 da Lei n.º 9.532⁄97 não pode ser aceito como norma tributária impositiva, visto que não define nem mesmo quais os tributos que incidirão sobre as atividades das cooperativas de consumo. Ao final, alegam violação ao artigo 110 do CTN e divergência jurisprudencial, tendo em vista que lei ordinária tributária não poderia alterar o conceito de lucro ou faturamento, até porque na cooperativa não existe lucro na atividade cooperativa nem faturamento.

Recurso extraordinária interposto simultaneamente.

O recurso foi admitido na Corte de Origem subindo os autos ao STJ, onde vieram a mim conclusos. Dispensei o parecer do Ministério Público Federal, nos termos regimentais.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 479.012 – MG (2002⁄0134640-6)

EMENTA

TRIBUTÁRIO – RECURSO ESPECIAL – COOPERATIVA – ATO COOPERATIVO – Lei n.º 5.764⁄71 – CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO – IMPOSTO DE RENDA – COFINS – ISENÇÃO.

A cooperativa tem isenção de tributos em relação aos atos cooperativos, entendendo-se assim aqueles praticados com o objetivo de atingir suas finalidades estatutárias.

A venda de produtos ou mercadorias pela cooperativa a seus associados que se caracteriza como ato cooperativo está isenta da tributação.

Recurso especial provido.

VOTO

EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO PEÇANHA MARTINS (Relator): Cuidam os autos, originariamente, de mandado de segurança objetivando excluir a incidência do IR, Cofins, PIS, CSSL sobre os atos cooperativos previstos em Estatuto.

Preliminarmente, quanto à alegada violação aos arts. 535, II, e 458, II, do CPC, não a vejo configurada, uma vez que o magistrado não é obrigado a se manifestar sobre todos os argumentos esposados pelas recorrentes, quando já encontrou fundamento suficiente para resolver a lide.

No mérito, assiste razão às recorrentes.

Para dilucidar a controvérsia, imprescindível saber o que são atos cooperativos. Consta a sua definição no artigo 79 da Lei 5764⁄71:

“Denomina-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais”.

Verifica-se que os atos cooperativos são aqueles através dos quais a entidade atinge os seus fins e os atos não-cooperativos são aqueles que extrapolam as finalidades institucionais, devendo gerar tributação.

Impõe-se registrar que a Lei 5.764⁄71, no artigo 79, § único, exclui dos atos cooperativos as operações de mercado e contratos de compra e venda de produtos ou mercadorias.

Na hipótese dos autos, entretanto, apesar de a Cooperativa realizar operação de compra e venda de mercadorias, qualquer incidência de tributo deve ser mitigada, haja vista que esta atividade é realizada somente entre a cooperativa e os associados, sem o intuito de lucro e está, diretamente, ligada ao objetivo social da cooperativa.

Este é o entendimento consagrado pelo Superior Tribunal de Justiça como se pode observar dos precedentes a seguir transcritos:

TRIBUTÁRIO – COOPERATIVA – ATO COOPERATIVO – CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO – ISENÇÃO.

1. A cooperativa, pela Lei 5.764⁄71, tem isenção de tributos quanto aos atos cooperativos, entendendo-se como tais os praticados com vista à sua finalidade.

2. Cooperativa que tem como objetivo a “defesa econômico-social de seus associados por meio de ajuda mútua”, podendo adquirir de produtor ou outras cooperativas gêneros alimentícios, vestuários e outros artigos de uso pessoal para vendê-los por menores preços – ou no máximo pelo valor de mercado – a seus associados.

3. Venda de produtos ou mercadorias pela cooperativa a seus associados que, na hipótese específica, se caracteriza como ato cooperativo, estando isento da cobrança da contribuição social sobre o lucro.

4. Recurso especial provido. (Resp. 591.418⁄MG, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU 20⁄09⁄2005)

AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. COOPERATIVA. NÃO – INCIDÊNCIA.

1. As sociedades cooperativas, quando atuam no desempenho de suas finalidades, praticando ato cooperativo definido no art. 79, da Lei 5.764⁄71, não apuram resultados qualificados como lucros.

2. O ato cooperativo não está sujeito à incidência da Contribuição Social sobre o Lucro, por não configurar fato gerador do tributo.

3. Agravo desprovido.

(AgRg no REsp 211.236⁄RS, Rel. Ministro Paulo Medina, Segunda Turma, julgado em 06⁄09⁄2001, DJ de 10⁄03⁄2003, p. 138)

RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. SOCIEDADE COOPERATIVA. NÃO INCIDÊNCIA. DISSÍDIO INDEMONSTRADO E NEGATIVA DE VIGÊNCIA A DISPOSITIVOS DE LEI FEDERAL NÃO CONFIGURADA.

Descaracterizado o dissídio jurisprudencial, se as razões recursais não apontam precedente em sentido contrário ao acórdão recorrido.

Ao se decidir que as sociedades cooperativas não apuram resultados qualificados como lucros, mas sobras que, em princípio, devem retornar aos associados proporcionalmente às operações realizadas, observada foi a legislação, pois o fato gerador da contribuição consiste justamente na percepção do lucro.

(REsp 171.800⁄RS, Rel. Ministro Hélio Mosimann, Segunda Turma, julgado em 13⁄04⁄1999, DJ de 31⁄05⁄1999, p. 119)

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. COOPERATIVAS. RECEITA RESULTANTE DE ATOS COOPERATIVOS. ISENÇÃO. CABIMENTO.

Os resultados decorrentes da prática de atos com não associados das cooperativas estão sujeitos a tributação.

Os resultados positivos obtidos em decorrência das atividades regulares das cooperativas estão isentos do pagamento de tributos, inclusive da Contribuição Social Sobre o Lucro. Recurso desprovido.

Decisão unânime.

(REsp 170.371⁄RS, Rel. Ministro Demócrito Reinaldo, Primeira Turma, julgado em 06⁄05⁄1999, DJ de 14⁄06⁄1999, p. 113)

Dessa forma, há que se concluir que os atos praticados tão-só com os associados não estão sujeitos à incidência de tributos.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso especial.

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