Mundo Novo

A abertura do mercado da Propriedade Intelectual

Autor

  • Nehemias Gueiros Jr

    é advogado especializado em Direito Autoral Show Business e Internet professor da Fundação Getúlio Vargas-RJ e da Escola Superior de Advocacia — ESA-OAB/RJ consultor de Direito Autoral da ConJur membro da Ordem dos Advogados dos Estados Unidos e da Federação Interamericana dos Advogados – Washington D.C. e do escritório Nelson Schver Advogados no Rio de Janeiro.

2 de maio de 2006, 15h22

Estamos vivendo tempos realmente extraordinários. A sociedade virtual, representada pelas comunidades que desfrutam de conexão à Grande Rede mundial de computadores conhecida como Internet gerou a era de maior criatividade e inovação da história da humanidade, ao longo da qual até bem pouco tempo coisas, engenhos e objetos sempre foram inventados por uma elite reclusa e nebulosa que bem poderia ser denominada de “as pessoas que se encontravam no lugar certo na hora certa” ou “as pessoas de dentro”, já que a maioria das invenções foi produto de persistentes e árduas tentativas que muitas vezes consumiram vidas inteiras de estudos e experimentos.

Os inventores de antanho eram efetivamente pessoas sobremaneira inteligentes e versáteis e representavam uma verdadeira confraria de poucos. A vertiginosa evolução da tecnologia das comunicações no final do século XX modificou radicalmente esta paisagem. As invenções do mundo contemporâneo têm origem numa gama muito mais ampla de pessoas que beneficiaram-se de todas as vertentes tecnológicas disponibilizadas pela comunicação virtual.

Podemos denominar esse novo grupo de inventores como “todas as demais pessoas com idéias” ou “as pessoas de fora”, que não necessariamente estão relacionadas com a inovação. Elas adquirem e consomem tudo o que é inventado pelo seleto grupo de cientistas/inventores dos grandes laboratórios das multinacionais e empresas governamentais de pesquisa e desenvolvimento e disparam as suas novidades a partir daí. A autoralidade da inovação mudou dos poucos para os muitos.

Tomemos o exemplo do movimento de software livre, iniciado pelo finlandês Linus Torvalds com seu Linux. Enquanto a maioria dos softwares foram inventados ou são produzidos pelas “pessoas de dentro” os programas com código-fonte livres são oferecidos ao mundo inteiro como um projeto de colaboração em que qualquer um pode apresentar sugestões e aperfeiçoar o sistema. Nesse modelo de negócios a inovação se origina de milhares de pessoas e não de apenas um seleto grupo de engenheiros eletrônicos e cientistas.

Apenas para exemplificar, um dos mais bem-sucedidos softwares livres, o navegador da Internet Firefox, já foi baixado mais de 150 milhões de vezes em todo planeta. O site Source.Forge.net, que coordena projetos de código aberto já ultrapassou a marca dos 15 mil projetos compartilhados e a poderosa AOL acaba de abrir seu sistema de mensagens instantâneas.

A idéia de que milhares de pessoas possam estar envolvidas simultânea e conjuntamente em processos criativos é uma forma revolucionária de transformar a sociedade e vai ganhando cada vez mais terreno. Quando a Apple lançou o iTunes e o iPod não tinha a noção de que dominaria o mercado musical de MP3, pois foi necessária a explosão planetária de sucesso desses produtos para apontar o caminho à empresa americana.

Companhias como BMW, Ikea e Lego, entre outras, já entenderam a mensagem e estão no mesmo caminho. Websites como YouTube® e Google Video® permitem a qualquer um, de qualquer ponto do mundo conectado, fazer o upload de seus vídeos de 3min ou videocassetadas e existe até uma parada para selecionar os melhores, muitas delas vindo parar no nosso Domingão do Faustão e em outros programas de TV. Tudo de graça, sem licenças, autorizações ou pagamentos. Estudando esse admirável mundo novo eletrônico chegamos a duas conclusões: a primeira é que nada disso seria possível sem — é claro — a Internet. A outra é que estamos diante de um novo e positivo fenômeno que poderíamos chamar de “altruísmo intelectual”, que demonstra que, tendo a devida oportunidade, as pessoas realmente dedicam seu tempo e seu intelecto para tornar o mundo um lugar melhor para se viver. De graça. Basta olhar o excelente exemplo da Wikipedia®, uma enciclopédia online inteiramente redigida por pessoas anônimas que pronta e graciosamente dividem com o mundo seus conhecimentos e sua cultura.

Ela tem muitos críticos e apresenta inadequações, mas é certamente uma das mais poderosas referências online da atualidade e recentemente publicou seu milionésimo artigo virtual. De se imaginar que as grandes empresas já devem estar de olho nesse processo, buscando uma forma de auferir gordos lucros a partir de um laboratório gratuito de pesquisa e desenvolvimento do tamanho de toda a população conectada da Terra mas isto não está acontecendo, simplesmente porque até hoje o valor da propriedade intelectual sempre foi definido por quão poucas pessoas a detêm.

No futuro, ao contrário, esse valor será determinado pela quantidade de indivíduos que a possuem, fazendo-nos supor um cenário em que as empresas eliminarão completamente seus departamentos de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) e apenas apresentarão questões e indagações técnicas para a fabulosa comunidade criativa mundial online, na busca do aperfeiçoamento e da criação dos seus novos produtos. Seria exatamente como a atividade de pesca. Sentar-se confortavelmente diante do computador e “colher” as informações e idéias brilhantes dos bilhões de mentes em redor do planeta. Quem viver, verá.

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  • é advogado especializado em Direito Autoral, Show Business e Internet, professor da Fundação Getúlio Vargas-RJ e da Escola Superior de Advocacia — ESA-OAB/RJ , consultor de Direito Autoral da ConJur, membro da Ordem dos Advogados dos Estados Unidos e da Federação Interamericana dos Advogados – Washington D.C. e do escritório Nelson Schver Advogados no Rio de Janeiro.

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