Defesa dos pobres

Justiça gratuita fora da defensoria é ilegal, diz Anadep

Autor

24 de junho de 2006, 7h00

Apenas 42% das comarcas brasileiras têm a presença da Defensoria Pública. São cerca de quatro mil defensores federais e estaduais para atender aos 92 milhões de carentes de todo país. O número de defensores é claramente insuficiente para cumprir o que determina a Constituição: todo cidadão tem direito a assistência jurídica, integral e gratuita.

Na ausência do Estado em implementar definitivamente e dar condições para que as Defensorias Públicas funcionem de forma adequada, foram criados mecanismos para suprir essa necessidade, como os convênios firmados com a OAB.

Segundo o presidente da Anadep — Associação Nacional dos Defensores Públicos, Leopoldo Portela Júnior, qualquer prestação de serviço jurídico a pessoas carentes que não seja feita pela Defensoria Pública é ilegal e inconstitucional. “Esses convênios também prejudicam a efetivação da Defensoria Pública nos estados”, afirmou em entrevista à revista Consultor Jurídico.

Ao defender posições como esta, o dirigente classista pode estar pensando na letra fria da lei, nos interesses da classe que representa, mas não está conectado nas necessidades do cidadão que depende do estado para exercer adequadamente o seu direito de defesa.

Portela Junior informa que somente no estado de São Paulo há mais de 30 mil conveniados vivendo desses convênios com a OAB. “Gasta-se dinheiro, não se obtém qualidade no serviço e não há um controle do que está feito, quem está sendo atendido e como. Quem deve atender o carente é a Defensoria com profissionais qualificados”, afirma. A Defensoria Pública de São Paulo foi criada há menos de um ano e se não fosse o convênio da OAB, os pobres do estado teriam simplesmente nenhuma assistência judiciária.

Portela Junior explica que depois da Emenda Constitucional 45 (Reforma do Judiciário), que conferiu independência funcional, orçamentária, administrativa e financeira à Defensoria Pública dos Estados e da União, cabe ao governo de cada unidade da federação adequar as suas Constituições ao que determinou a Constituição Federal: a implantação definitiva e imediata da Defensoria.

“O que é preciso agora, é que os estados modifiquem as suas constituições e leis complementares para se adequar às previsões da Constituição Federal quanto a instalações e novas atribuições da Defensoria Pública. É preciso dar autonomia às defensorias para que o chefe de cada uma delas possa, munido de independência financeira, implementá-la pra que ela funcione melhor e melhor atenda ao carente”.

Leia a entrevista

Conjur — A clientela da Defensoria Pública na esfera estadual é de 92 milhões de brasileiros. Quantos são os defensores estaduais para cobrir esta demanda? Cumpre-se o mandamento constitucional com esse número de defensores?

Portela Junior — São 4 mil defensores públicos dos estados em todo país. Não se cumpre em absoluto o mandamento constitucional com este número de defensores. Hoje, somente 42% das comarcas do país têm defensores públicos.

Conjur — Quantos defensores seriam necessários?

Portela Junior — Para cada 100 mil habitantes temos sete juízes. Então a quantidade mínima de defensores que deveríamos ter é a mesma que de juízes, para haver equilíbrio.

Conjur — É correto dizer que está havendo uma disputa por pobres entre os defensores? Tem sentido separar o pobre estadual do pobre federal?

Portela Junior — Do mesmo jeito que existe a separação de competência nos tribunais existe na Defensoria Pública. Não estamos separando pobres federais dos estaduais. São competências diferentes estabelecidas pela Constituição. Não existe disputa, isso é coisa de maluco, existem competências diferentes.

Conjur — Admitindo que os defensores públicos existentes não dão conta do recado, que alternativa supletiva ou complementar existe?

Portela Junior — A Lei Complementar 80/94 que regulamenta o artigo 134 da Carta Magna, criou a Defensoria Pública da União, estados e Distrito Federal. Esta Lei deu prazo de 180 dias para os estados criarem as suas defensorias. Alguns estados fizeram e outros não. Com a Emenda Constitucional 45 (Reforma do Judiciário) a Defensoria Pública ganhou independência funcional, orçamentária, administrativa e financeira. O que precisa agora é que os estados modifiquem as suas constituições e leis complementares para se adequar às previsões da Constituição Federal quanto a instalações e novas atribuições da Defensoria Pública. É preciso dar autonomia às defensorias para que o chefe de cada uma delas possa, munido de independência financeira, implementá-la pra que ela funcione melhor e melhor atenda ao carente.

Conjur — O que se vê de errado em convênios com a OAB como se faz em São Paulo há muitos anos?

Portela Junior — A Defensoria tem competência atribuída pela Constituição para dar assistência jurídica gratuita ao carente. Já que as Defensorias Públicas não foram instaladas criaram-se mecanismos pra suprir essa necessidade. Como a DP é que tem a prerrogativa de defender os carentes, esses convênios são inconstitucionais. Só em São Paulo temos 30 mil conveniados vivendo disso. Gasta-se dinheiro, não se obtém qualidade no serviço e não há um controle do que é feito, quem está sendo atendido e como. Quem deve atender ao carente é a Defensoria com profissionais qualificados. Qualquer prestação de serviço jurídico às pessoas carentes que não seja pela DP é ilegal e inconstitucional. Esses convênios também prejudicam a efetivação da Defensoria Pública nos estados. Depois da Constituição de 88 o poder julgador (Judiciário) e o poder acusador (Ministério Público) receberam atenção do Poder Público e se fortaleceram. A DP, ao contrário, não recebeu atenção.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!