Aniversário discreto

Maior conquista do CNJ até agora foi a sua legitimação

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15 de junho de 2006, 7h00

O Conselho Nacional de Justiça, criado sob rufar de tambores e muita polêmica, completou seu primeiro ano de existência nesta quarta-feira (14/6). Para quem esperava atuação que fizesse jus ao apelido de “controle externo do Judiciário”, os primeiros doze meses do órgão foram decepcionantes. Mas o fato é que, entre o mundo real e o da fantasia, mesmo os mais tímidos passos do CNJ tentaram ser bloqueados pela feroz resistência da face atrasada do Judiciário.

Na coluna de realizações, o CNJ contabiliza a luta contra o nepotismo, a escolha de membros do Órgão Especial dos Tribunais de Justiça por eleição direta, a fixação do teto salarial do Judiciário e as regras para promoção de juízes.

Na coluna de desafetos alinhou os Tribunais de Justiça dos mais influentes estados da federação. É o caso de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, que contestaram no Supremo Tribunal Federal a atuação do Conselho. Em Minas Gerais, os desembargadores chegaram a fazer greve de protesto contra o órgão. O CNJ tentou fazer uma intervenção no caótico Judiciário baiano, mas não obteve resultados. Mais ainda: bateu de frente com a maior parte da magistratura ao regulamentar o teto salarial do Poder Judiciário.

Para grande parte dos juízes, a atitude incisiva do CNJ não foi uma prova de coragem, mas sim de interferência indevida no Judiciário. O Conselho, que já nasceu visto com maus olhos, completa um ano sem ter conseguido mudar muito essa visão.

O grande mérito do CNJ, contudo, foi o de ter sido absorvido pela estrutura judiciária. A conquista talvez explique a prudência e a cautela do primeiro ano. Afinal de contas, de nada adiantaria uma arrancada cheia de bravatas se o Conselho fosse rejeitado. E o CNJ acabou tendo o apoio da Associação dos Magistrados Brasileiros e o amparo do Supremo Tribunal Federal. A Resolução 7 do Conselho, publicada em outubro, foi referendada pelos ministros do STF, que consideraram a medida constitucional. Mais do que isso, a Corte reconheceu, na ocasião, o poder normativo do Conselho.

Mesmo assim, o CNJ continua lutando para impedir a contratação de parentes de até terceiro grau de juízes no Poder Judiciário. No Rio de Janeiro, 23 servidores que haviam sido exonerados com base na resolução foram readmitidos e o Conselho determinou a imediata suspensão da nomeação dos exonerados na sua última reunião. A determinação ainda não foi atendida.

Para o presidente do TJ do Rio de Janeiro, desembargador Sérgio Cavalieri Filho, não há nada de irregular na nova nomeação dos servidores. “Não há nenhuma vedação, quer legal, quer na resolução, que impeça que servidor de carreira exerça cargo de confiança desde que não seja com parente e que seja no gabinete de outro desembargador que não tenha parente no Judiciário”.

Há, também, outras ações individuais e coletivas de parentes de juízes que pretendem se manter no cargo. Para muitos, o CNJ legislou ao agir assim, o que fugiria de suas atribuições.

Fronteira

O Conselho foi criado pela Emenda Constitucional 45, conhecida como Reforma do Judiciário — mas que tratou apenas das diretrizes constitucionais das mudanças planejadas. Pela lei, a função dos 15 conselheiros é zelar pela boa administração da Justiça. No entanto, o limite entre zelar e interferir é tênue e subjetivo.

Em São Paulo, alguns membros do Tribunal de Justiça consideraram que esse limite foi ultrapassado com a edição da Resolução 16, de maio deste ano. A medida determinou que as eleições para a metade do Órgão Especial dos tribunais estaduais com mais de 25 desembargadores (conforme determina a EC 45) devem ocorrer quando houver vacância, e não imediatamente.

A questão já tinha provocado um racha nos tribunais logo que foi inserida pela Reforma do Judiciário. A decisão do CNJ acentuou mais ainda a cisão. De um lado, os mais conservadores que gostaram da decisão do Conselho. Já que tem de ser feita a eleição, que seja gradual. De outro, aqueles que queriam que a metade mais jovem do Órgão fosse imediatamente substituída pelos escolhidos.

Sem dúvida, o motivo principal que fez do CNJ inimigo ferrenho do Judiciário foi a regulamentação do teto salarial. O Conselho determinou que o salário mais os adicionais dos juízes não podem ultrapassar o teto do Supremo, que é de R$ 24,5 mil. Para os juízes, a medida viola o direito adquirido deles — adicionais conseguidos pelo tempo de serviço, em geral.

Mão amiga

Em maio, o CNJ foi recebido na Bahia como a grande esperança para resolver o caos no Judiciário baiano. A proposta era de que o conselho mediasse a reestruturação da Justiça estadual. A visita, no entanto, não prosperou. Os conselheiros foram com o intuito de que os três poderes locais assinassem um convênio para reestruturar o TJ. Até agora, não obtiveram sucesso.

O conselho esteve à frente de decisões menos polêmicas, como a regulamentação dos concursos para a magistratura e a promoção de juízes. O órgão determinou que a experiência de três anos para prestar concurso, exigida pela EC 45, tem de ser comprovada no ato da inscrição. Os três anos só contam depois que o estudante se tornar bacharel. Quanto aos promoções por mérito, estabeleceu que o voto tem de ser aberto e fundamentado.

Recebeu glórias da magistratura quando entendeu que as funções no Judiciário e na Justiça Desportiva são incompatíveis e determinou que o então presidente do Superior Tribunal de Justiça Desportiva e desembargador Luiz Zveiter escolhesse em qual cargo pretendia ficar. Neste ano, o CNJ também recebeu críticas e aplausos ao deixar a critério de cada tribunal decidir sobre o recesso forense do dia 20 de dezembro a 6 de novembro.

Para o próximo ano de vida, o Conselho Nacional de Justiça já tem grandes desafios, por enquanto aclamados pela comunidade jurídica. O órgão pretende implantar o processo virtual e cadastrar num banco de dados a população carcerária do Brasil. Pelo menos, nestas medidas, ainda é apoiado.

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