Atividade de risco

Trabalhar em local com risco de incêndio garante adicional

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12 de junho de 2006, 16h23

Mesmo que a atividade do trabalhador não seja considerada perigosa pelas normas trabalhistas, empregador não está livre de pagar adicional de periculosidade. O entendimento é da 5ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas, SP). Os juízes condenaram a Volkswagen a pagar o adicional para um ex-empregado. Cabe recurso.

A ação foi ajuizada na 1ª Vara do Trabalho de Taubaté. O ex-empregado alegou que teria direito ao acréscimo do salário porque trabalhava em ambiente perigoso, em contato com produtos inflamáveis. Como a primeira instância negou o pedido, o trabalhador recorreu ao TRT de Campinas.

A 5ª Câmara acolheu o pedido. De acordo com os juízes, laudos periciais comprovaram que apesar de um eficiente sistema de ventilação no ambiente de trabalho, havia grande quantidade de solvente, o que poderia causar um incêndio. A própria empresa reconheceu a possibilidade do acidente, tanto que mantém cartazes de alerta no local.

“A própria empresa reconhece a possibilidade do acidente, tanto que mantém os cartazes de alerta. O ambiente de trabalho continua sendo um local com grandes riscos de incêndio, pois os equipamentos apenas amenizam o perigo, mas não o eliminam”, fundamentou o relator, juiz Alberto da Motta Peixoto Giordani.

Para o relator, embora as atividades do funcionário não sejam consideradas perigosas pelo Ministério do Trabalho, o campo da segurança e medicina do trabalho deve sempre e cada vez mais avançar em busca da proteção da saúde do trabalhador. “Por isso que a Constituição Federal prevê em seu artigo 7º que é direito do trabalhador a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”, esclareceu o relator.

Os juízes deram provimento ao recurso do empregado, condenando a Volks a pagar o adicional de periculosidade, com reflexos no 13º salário, férias, aviso prévio e fundo de garantia, valor estipulado em R$ 25 mil. Além disso, a empresa também foi condenada a pagar a perícia feita no processo. A decisão foi unânime.

00319-2004-009-15-00-2

Leia integra do decisão

PROCESSO 00319-2004-009-15-00-2

RO – RECURSO ORDINÁRIO

RECORRENTE:JOSELITO CORREIA

RECORRIDA:VOLKSWAGEN DO BRASIL LTDA

ORIGEM:1ª VARA DO TRABALHO DE TAUBATÉ

JUIZ:WILSON POCIDONIO DA SILVA

SENTENÇA: F.484/92 (PROCEDENTE EM PARTE)

RECURSO: F.493/7 (RECLAMADA)

EMENTA

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ATIVIDADE NÃO ENQUADRADA COMO SENDO DE PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DO TRABALHO EM CONDIÇÕES DE PERICULOSIDADE MESMO ASSIM. Não será pela simples ausência de enquadramento de determinada atividade, por parte da autoridade responsável, como sendo de periculosidade, que não se poderá reconhecer a existência de trabalho em condições de periculosidade, deferindo-se ao obreiro o respeitante adicional, tendo por fundamento o quanto disposto nos artigos 3O, III e IV, e 7º, XXII, da CF/88. Tal como certos catequistas, que não se separam jamais dos textos sagrados e de seus ensinamentos, deve o aplicador da lei ter sempre em mente –e sob as vistas, e sob as mãos- o texto constitucional.

Vistos

Da r. sentença que julgou procedente em parte a ação recorre o reclamante quanto ao adicional de periculosidade e no tocante aos reflexos sobre DSR’s.

Contra-razões a f.500/12.

Conheço do recurso, por preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade; o documento de f.513/7 será examinado enquanto mero subsídio.

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE

O Sr. Perito, a despeito de constatar e reconhecer a presença da quantidade do solvente “thiner”, 30 litros, ser inferior ao limite de tolerância fixado na Portaria n. 3.214/78 – NR 16, 200 litros, observou que no interior da cabine de pintura ”surface” havia outros elementos propícios à combustão, anotando que a própria tinta utilizada é um líquido inflamável:

“R1 – Este perito não concorda, pois a conclusão pela periculosidade não ocorreu apenas pela existência de 30 (trinta) litros de thiner no interior da cabine surface. Ocorre que conforme já analisado, justificado e descrito nos ítens 3.0 e 6.0 do laudo de periculosidade às fls. 438 dos autos, no interior da cabine de pintura Surface existe grande potencial de risco de incêndio devido as características físico-químicas dos produtos utilizados e do processo de utilização de tintas (aplicação com pistolas pneumáticas) diluídas em solventes orgânicos altamente inflamáveis com o solvesso 100 cujo ponto de fulgor é de 40ºC e a própria tinta primer é um líquido inflamável.”, f.461.

Na resposta ao quesito suplementar n. 06, o Sr. Vistor foi enfático:

“R6 – Excelência, ao entender deste perito, embora o Legislador realmente não tenha citado o termo cabine de pintura Surface para efeitos de periculosidade, existia na atividade do reclamante, exposição em área de risco por inflamáveis líquidos”, f.462.


No corpo do respectivo laudo o Expert já havia descrito:

“Apesar de existir um eficiente sistema de ventilação local exaustora, há grande quantidade de solvente no ar constituindo risco potencial de incêndio, motivo pelo qual a reclamada mantém sistema de segurança para prevenção e combate a incêndios como o dispositivo interno de CO2 e cartazes alertando sobre o risco de incêndio”, f.439.

Ora, a própria empregadora reconhece a possibilidade do acidente tanto que mantinha no ambiente de trabalho aludidos alertas. Importa mesmo, conforme elucidado no laudo, que “apesar de existir esses equipamentos de proteção coletiva contra incêndios, essa cabine continua constituindo um local com riscos potenciais de incêndio, pois os equipamentos apenas amenizam o perigo, mas não eliminam o risco de incêndio que continua presente”.

A exposição do reclamante como Pintor de produção Primer, na cabine de pintura Primer era em caráter habitual intermitente.”, f.439.

Tem-se, pois, que o Sr. Perito apresentou laudo circunstanciado e conclusivo à f.424/48, complementado à f.461/2, no qual indicou os motivos pelos quais identificou as condições de trabalho perigosas bastando, para confirmar o quanto se assevera, examinar os excertos retro, tudo de acordo com o item ‘8.0 CONCLUSÃO’, do aludido laudo, onde o Sr. Expert, com base no art. 193 § 1º da CLT e Portaria n. 3214/78 – NR 16, Anexo 2, inciso I e quadro I apontou a periculosidade, f.439/40.

No que toca à falta de enquadramento das atividades aviadas pelo obreiro como periculosas, pelo Ministério do Trabalho, tenho, como já manifestei alhures, que: “a simples exposição do trabalhador rural às mais variadas condições de tempo e temperatura, justifica a percepção do adicional de insalubridade, quando não observadas as medidas especiais que protejam o trabalhador contra os efeitos agressivos a sua saúde, que essa situação provocar porque, nesse campo, da segurança e medicina do trabalho, deve-se sempre e cada vez mais avançar, em busca da efetiva proteção da saúde do trabalhador, porque isso é um mandamento constitucional, art. 7o, inciso XXII, CF/88, no sentido de que é direito do trabalhador a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”, in “Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 24A. Região”, n. 05, 1998, págs.171/2.

O excerto retro, conquanto se refira ao adicional de insalubridade se aplica, mutatis mutandis, ao feito em foco, o que tira força, deixando dessorado o argumento de que, à míngua de enquadramento legal, não poderia ser deferido o adicional de periculosidade, tendo por fundamento – e que fundamento -, o quanto disposto no artigo 7º, XXII, da CF/88, isso se não se pretender abrir o leque, já que o artigo 3O, III e IV, da Lei Maior, também dá sustentação ao entendimento ora esposado. Enfim, não será pela simples ausência de enquadramento de determinada atividade, por parte da autoridade responsável, como sendo de periculosidade, que não se poderá reconhecer a existência de trabalho em condições de periculosidade, deferindo-se ao obreiro o respeitante adicional, tendo por fundamento o quanto disposto nos artigos 3O, III e IV, e 7º, XXII, da CF/88. Tal como certos catequistas, que não se separam jamais dos textos sagrados e de seus ensinamentos, deve o aplicador da lei ter sempre em mente –e sob as vistas, e sob as mãos- o texto constitucional.

Assim, de reformar o r. “decisum” no particular, pois embora não vincule o julgador um laudo pericial, como se não desconhece, nos presentes autos, não há motivo para que não se acolham o trabalho e as conclusões do Sr. Expert.

Colhe o apelo para declarar a apelada obrigada a responder pelo pedido ‘a’, f.05: adicional de periculosidade e reflexos sobre 13º salário, férias + 1/3, aviso prévio, FGTs + multa de 40%. No tocante às horas extras, a questão está superada diante do entendimento consubstanciado na Súmula 132, item I, do C. TST, cuja atual redação é a seguinte:

“132. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INTEGRAÇÃO.

I – O adicional de periculosidade, pago em caráter permanente, integra o cálculo de indenização e de horas extras.

Não se afigura demais acrescentar neste aspecto, que a condição da prestação dos serviços suplementarmente, não faz desaparecer, como mágica, o agente da periculosidade, aliás – como é previsível – acentua o risco do infortúnio. Portanto, merece provimento o requerimento de cômputo do adicional em questão sobre o salário básico pago por força dos serviços prestados em jornada suplementar, conforme se apurar na fase de acertamentos.

O adicional de periculosidade é calculado sobre o salário mensal do empregado, destarte, a exemplo dos dsr’s os feriados se acham remunerados no percentual de 30%. Não procede o pedido neste item.


Por fim, corolário lógico do decidido, considerada, também, a sucumbência, é a apelada que deverá responder pelos honorários periciais arbitrados no r. decisório, f.492, além de reembolsar o apelante pelas despesas de f.397, ficando evidentemente revogada a ordem de reembolso emitida contra o autor, f.489.

REFLEXOS SOBRE OS DSR’S

Pretende o obreiro a repercussão sobre os dsr’s do adicional noturno e das horas extras, rejeitados pela Origem sob alegação de que a reclamada, “na medida em que a mesma, por força do acordo coletivo de fls. 121/126, cláusula 5, visando à simplificação da administração de pagamentos, incorporou o valor do descanso semanal remunerado ao salário-hora, agregando o percentual de 16,67%, correspondente a 1/6 da jornada semanal de trabalho, ao calcular qualquer parcela com base no salário-hora, como horas extras e o adicional sobre horas noturnas, automaticamente, passou a englobar, também, o valor correspondente ao descanso semanal.

O raciocínio é simples. Se o valor do salário-hora já está agregado do percentual que remunera o descanso semanal, ao utilizar esse valor para calcular as horas extras e o adicional noturno, por exemplo, automaticamente apura-se o valor das horas e do adicional noturno também sobre o descanso semanal. De outra feita não haveria motivo para celebrar o acordo, que visou a facilitar exatamente a administração dos pagamentos.

Nem se argumente que referida incorporação vigorou somente até outubro de 1996, pois a incorporação do percentual que remunera os descansos semanais se deu de forma definitiva e possui esta natureza ao menos com relação aos empregados que tinham contrato de trabalho em vigor na ocasião da celebração do convênio coletivo”, f.490.

De fato, a reclamada incorporou 16,667%, correspondente a 1/6 da jornada semanal, para fins de pagamento do DSR do empregados horistas, caso do reclamante. Tal procedimento não foi feito à revelia dos empregados, devidamente representados pela sua entidade sindical, f.122/7. Assim, cada hora extraordinária paga já contém a correlata repercussão nos DSR’s, o mesmo raciocínio é válido para as repercussões do adicional noturno.

No tocante à validade da norma coletiva, tal questão, no mínimo, restou superada pela inexistência do experimento de prejuízo pelo empregado, que aliás não logrou apontar matematicamente a lesão aventada. Confirma-se.

CONCLUSÃO

POSTO ISTO, decide-se CONHECER e DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso para incluir na condenação o pagamento do adicional de periculosidade e reflexos sobre 13º salário, férias + 1/3, aviso prévio, FGTS + multa de 40%, ainda para compor a base de cálculo das horas extraordinárias, bem como a responsabilidade pelos honorários periciais, na forma da fundamentação.

Rearbitro o valor da condenação para R$25.000,00. Custas pelo reclamado no valor de R$500,00.

FRANCISCO ALBERTO DA MOTTA PEIXOTO GIORDANI

JUIZ RELATOR

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