Hora de decidir

STF manda governo apressar decisão sobre guerrilheiro das Farc

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12 de junho de 2006, 21h05

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, mandou o governo decidir, da maneira mais breve possível, se concede refúgio para o guerrilheiro colombiano Francisco Antônio Cadena Colazzos, o padre Medina. Mendes mandou oficiar Ministério da Justiça e o Conare — Comitê Nacional para os Refugiados para que a decisão seja tomada.

O STF depende da manifestação administrativa para decidir sobre a extradição do padre. Segundo o artigo 34 da Lei 9.474/97, “a solicitação de refúgio suspenderá, até decisão definitiva, qualquer processo de extradição pendente, em fase administrativa ou judicial, baseado nos fatos que fundamentaram a concessão do refúgio”.

Segundo o ministro, deve ser respeitado o princípio da celeridade, estabelecido pela Constituição Federal, “o qual, por decorrência do fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana, aplica-se não somente aos processos judiciais, mas também a todos (brasileiros e estrangeiros) cuja situação jurídica esteja, de alguma forma, submetida ao âmbito administrativo”.

Medina atuava no Brasil como um porta-voz das Farc, o grupo guerrilheiro Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Acusado de homicídio em seu país, foi preso e aguarda na prisão o julgamento do pedido de extradição feito pelo governo colombiano em setembro de 2005.

Assim que foi detido e recolhido à carceragem da Polícia Federal em Brasília, o padre entrou com pedido de prisão domiciliar. Ao mesmo tempo e coincidentemente, a Polícia Federal informou ao Supremo que não tinha condições para alojar o padre em seu xadrez. Diante da situação, o STF solicitou que o padre fosse alojado no Centro de Internamento e Reeducação do Distrito Federal.

As coisas estavam assim arranjadas, quando o procurador Luiz Francisco de Souza, que nada tinha a ver com o caso, entrou em ação e pediu à Justiça do Distrito Federal que o colombiano fosse devolvido à Polícia Federal. Sem dar ciência ao Supremo, o pedido foi encampado pelas autoridades interessadas do Distrito Federal — Ministério Público, Polícia Civil e pelo juiz da Vara de Execuções Criminais, Nelson Ferreira Junior.

No dia 5 de maio, o ministro Gilmar Mendes determinou que o colombiano fosse retirado da carceragem da PF em Brasília e reconduzido ao Presídio da Papuda, no Distrito Federal.

Ajuda para campanha

No ano passado, reportagem da revista Veja apontou ligações entre militantes petistas e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Um grupo de militantes solidário com as Farc teria feito uma reunião numa chácara nos arredores de Brasília em abril de 2002, com a presença do padre Medina.

Na reunião, o padre teria anunciado que a organização guerrilheira doaria US$ 5 milhões para a campanha eleitoral de candidatos petistas. O PT nega que tenha recebido qualquer quantia das Farc e repudiou a reportagem de Veja na ocasião.

Leia a decisão de Gilmar Mendes

EXTRADIÇÃO 1.008-5 REPÚBLICA DA COLÔMBIA

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES

REQUERENTE(S): GOVERNO DA COLÔMBIA

EXTRADITANDO(A/S): FRANCISCO ANTONIO CADENA COLLAZOS OU OLIVERIO MEDINA OU CAMILO LOPEZ OU CURA CAMILO

ADVOGADO(A/S): HÉLIO SILVA BARROS

DESPACHO: Trata-se de pedido de extradição, formulado pelo Governo da República da Colômbia, em face do nacional colombiano FRANCISCO ANTONIO CADENA COLAZZOS, também conhecido como OLIVERIO MEDINA, CAMILO LOPEZ e CURA CAMILO, a quem é imputado o crime de homicídio (Legislação Penal da República da Colômbia, arts. 1º e 2º do Decreto 180 de 1988; e art. 2º “B”, do Decreto nº 181, de 1988), cuja pena máxima aplicável é de 25 (vinte e cinco) anos prisão.

No pedido, aduz-se o envolvimento do extraditando em funções de direção das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), em atuação de cunho alegadamente “terrorista”, como se depreende do seguinte trecho (fl. 08):

“É bem sabido que Francisco Antonio Cadena Collazos, no comando de várias frentes conformadas por membros das FARC-EP, atacou a base do exército nacional localizada no morro ‘Los Girasoles’, do município de Mesetas, departamento de Meta, Colômbia, em oito de janeiro de 1991, onde foram mortos um oficial e um suboficial das forças militares da Colômbia, e dezessete militares foram seqüestrados.

Sabe-se que Francisco Antonio Cadena Collazos, conhecido como ‘El cura Camilo’, ‘El cura Camilo López’, ‘Pacho’ e ‘Oliverio Medina’, pertence à direção da mencionada organização criminosa.” (fl. 08)

Em despacho de fl. 96, datado de 24.10.2005, determinei o seguinte:

“… com base nas informações prestadas pelo Ministro da Justiça, no sentido de que o extraditando formulou pedido de refúgio perante o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), fato também informado pelo ora extraditando na Petição nº 123.100/2005, determino o sobrestamento do presente processo de extradição, nos termos do art. 34 da Lei no 9.474/1997 (‘A solicitação de refúgio suspenderá, até decisão definitiva, qualquer processo de extradição pendente, em fase administrativa ou judicial, baseado nos fatos que fundamentaram a concessão do refúgio’).” (fl. 96)

Na Petição nº 23.279/2006 (fls. 185-193), o extraditando requereu a possibilidade de concessão de prisão domiciliar em razão do transcurso do prazo para apreciação do pedido de refúgio ao Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE).

Em decisão de 20.04.2006, fls. 204-210 (DJ de 28.04.2006), indeferi o pedido formulado por entender que, na linha da jurisprudência do Tribunal, não seria possível a revogação da prisão preventiva, nem tampouco o deferimento de prisão domiciliar.

Em seguida, por meio da Petição nº 52.571/2006, tomei conhecimento de que o Juízo da Vara de Execuções Criminais do Distrito Federal, atendendo a pedido formulado pelo Dr. Luiz Francisco F. de Souza, Procurador Regional da República, determinou a transferência do extraditando da Ala Federal do Presídio da Papuda/DF para a Carceragem da Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal.

Tendo em vista que essa medida foi determinada em flagrante violação à competência constitucional desta Corte para o processo de extradição (CF, art. 102, I, “g”), proferi decisão em 05.05.2006 (fls. 262-269; DJ de 11.05.2006) para que o extraditando fosse reconduzido para o Presídio da Papuda/DF, o que foi efetivamente realizado conforme noticia a Superintendência Regional da Polícia Federal no DF por meio das Petições nº 58.509/2006 (fax, fls. 393-395) e 68.525/2006 (original, fls. 398-400).

Levando-se em conta, porém, o considerável tempo transcorrido desde a suspensão deste processo de extradição, oficie-se ao Ministério da Justiça e ao Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), para que o pedido de refúgio do extraditando seja apreciado com a maior brevidade possível, em consonância com o princípio da celeridade (CF, art. 5º, LXXVIII) – o qual, frise-se, por decorrência do fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana, aplica-se não somente aos processos judiciais, mas também a todos (brasileiros e estrangeiros) cuja situação jurídica esteja, de alguma forma, submetida ao âmbito administrativo.

Publique-se.

Brasília, 12 de junho de 2006.

Ministro Gilmar Mendes

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