Crédito abalado

Banco não pode suprimir limite de crédito sem avisar o cliente

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8 de junho de 2006, 7h00

Sem aviso prévio, o banco não pode suprimir limite de crédito da conta de cliente. Com esse entendimento, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou o Banco do Brasil a pagar indenização de R$ 3 mil por danos morais a um correntista.

Em junho de 2002, o cliente tinha à sua disposição cheque especial de R$ 800. Uma semana depois, o valor não estava mais disponível e, por isso, o cliente teve um cheque de R$ 260 devolvido. Em sua defesa, o banco alegou que foi ínfimo o período em que o cliente ficou sem seu limite, mas não esclareceu o motivo da supressão.

A relatora, desembargadora Íris Helena Medeiros Nogueira, entendeu que o Banco do Brasil descumpriu o contrato com o correntista ao suprimir limite de crédito, sem prévia comunicação, nem razão plausível para tanto.

“Diante da inesperada modificação nos limites de crédito, a requerente teve um cheque devolvido sem provisão de fundos, o que, por si só, traz abalo de crédito, fato ensejador do dano moral”, ressaltou a desembargadora, reconhecendo a responsabilidade civil do banco.

A relatora reduziu o valor da indenização fixado em primeira instância. Condenou o banco a pagar R$ 3 mil, no lugar de R$ 6 mil, porque embora a cliente tenha sofrido abalo com o ocorrido, não teve seu nome inscrito no cadastro de emitentes de cheques sem fundos do Banco Central.

Processo 700.142.535-53

Leia a íntegra da decisão

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SUPRESSÃO DE LIMITE DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. CHEQUE ESPECIAL. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO PRÉVIA DO CORRENTISTA E DE CAUSA A JUSTIFICAR O CANCELAMENTO. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DEVOLUÇÃO DE CHEQUE POR INSUFICIÊNCIA DE FUNDOS. ABALO DE CRÉDITO. DANO MORAL. QUANTUM.

1. A autora teve seu limite de crédito no cheque especial – R$ 800,00 – suprimido pela requerida sem prévio aviso, razão pela qual teve um cheque devolvido por duas vezes sem provisão de fundos junto ao sacado.

2. Evidenciado o descumprimento contratual por parte da instituição bancária, que suprimiu o limite de crédito da conta da requerente sem prévia comunicação nem razão plausível para tanto. E, diante da inesperada modificação nos limites de crédito, a autora teve um cheque devolvido sem provisão de fundos, o que, por si só, traz abalo de crédito, fato ensejador do dano moral.

3. Trata-se de dano moral in re ipsa, que dispensa a comprovação da extensão dos danos, sendo estes evidenciados pelas circunstâncias do fato.

4. O arbitramento da indenização por danos morais em R$ 3.000,00, in casu, mostra-se suficiente e adequado para a recomposição dos danos e prejuízos, não caracterizando enriquecimento ilícito por parte do autor e encontrando-se em conformidade com o entendimento desta Câmara. Reduzido o quantum arbitrado na sentença.

APELO PARCIALMENTE PROVIDO.

APELAÇÃO CÍVEL

NONA CÂMARA CÍVEL

Nº 70014253553

COMARCA DE GRAVATAÍ

BANCO DO BRASIL S/A

APELANTE

DOLORES THUMS

APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento parcial ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores DES. ODONE SANGUINÉ E DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY.

Porto Alegre, 10 de maio de 2006.

DESA. IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA,

Presidente e Relatora.

RELATÓRIO

DESA. IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (PRESIDENTE E RELATORA)

Cuida-se de apelo interposto por BANCO DO BRASIL S/A na ação de indenização por danos materiais e morais que lhe moveu DOLORES THUMS, contra sentença que julgou procedentes em parte os pedidos.

Narrou a autora, na inicial, que, sendo correntista do banco réu desde 1999, teve um cheque no valor de R$ 260,00 devolvido por insuficiência de fundos, uma vez que a requerida inadvertidamente lhe suprimiu o limite de cheque especial, que era de R$ 800,00. Aduziu que não foi informada da supressão do limite da conta, e, em razão da conduta da ré, teve seu nome inscrito no rol negativo do Banco Central.

Destacou ter sofrido dano moral por abalo de crédito. Pediu a condenação do demandado ao pagamento de indenização no valor de 250 salários mínimos. Juntou procuração (fl. 07) e documentos (fls. 08-13).

Concedido à demandante o benefício da gratuidade da justiça, à fl. 16.

O réu contestou (fls. 22-32). Preliminarmente, apontou impossibilidade jurídica do pedido, uma vez que o nome da autora não foi inscrito junto ao CCF – Cadastro de Cheques sem Fundos nem à SERASA.

Aduziu que, não tendo a autora efetuado o pagamento mínimo da fatura de seu cartão de crédito, era devedora, desde 03.05.2002, de R$ 411,00, o que ensejou o cadastramento.


Quitado o débito, a requerida providenciou, em menos de cinco dias, o cancelamento do registro, bem como restabeleceu o limite do cheque especial. No mérito, asseverou, em suma, que agiu em exercício regular de direito. Disse que a quantificação do dano, no caso de procedência, deve ser feita em fase de liquidação de sentença.

Discorrendo acerca da delimitação dos danos, postulou o acolhimento da preliminar, ou a improcedência do pedido. Procuração às fls. 33-34 e documentos às fls. 35-45.

Houve réplica (fls. 47-52).

Sobreveio sentença (fls. 57-75) que, julgando procedentes em parte os pedidos, condenou o réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 6.000,00, acrescidos de correção monetária pelo IGP-M desde a data da publicação da sentença e juros de mora desde 03.07.2002. Onerada a ré, ainda, com o pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% da condenação.

Inconformado, o réu apelou (fls. 83-97). Suscitou a preliminar de carência de ação por ausência de interesse processual, uma vez que a autora não teria sofrido qualquer dano com a supressão do limite de sua conta corrente, já que não teve seu nome negativado em decorrência do cheque que retornou sem provisão de fundos.

Aduziu, no mérito, a inocorrência dos elementos ensejadores da responsabilidade civil. No tocante ao valor da indenização, disse ser demasiado. Buscou a reforma da sentença, com a inversão dos ônus da sucumbência.

Com as contra-razões (fls. 102-108), subiram os autos a este Tribunal, e vieram a mim conclusos, para julgamento, em 14.02.2006 (fl. 109).

É o relatório.

VOTOS

DESA. IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (PRESIDENTE E RELATORA)

Eminentes Colegas.

A autora pretende ser indenizada pelos danos morais que sofreu em razão de, tendo a ré suprimido unilateralmente o limite de seu cheque especial, ter um cheque devolvido por insuficiência de fundos e, assim, ter seu nome inscrito no CCF – Cadastro de Cheques sem Fundos do Banco Central.

Inicialmente, destaco ser a presente de competência interna deste Órgão Fracionário. Em que pese um dos fundamentos do pedido tenha base em contrato de abertura de crédito em conta corrente – o que ensejaria a competência do 8º Grupo Cível (artigo 11, VIII, i, da Resolução 01/98), que trata de negócios jurídicos bancários -, há discussão, como se verá, também acerca de contrato de uso de cartão de crédito.

Cuida-se, em última análise, de responsabilidade civil decorrente da prestação de serviços, matéria que se insere na competência interna desta Câmara, conforme artigo 11, V, d, da Resolução 01/98 deste Tribunal de Justiça.

No tocante à preliminar de carência de ação por ausência de interesse processual, muito embora tenha o Código de Processo Civil adotado a Teoria Eclética da Ação, este é um dos casos em que a argüição preliminar confunde-se com o mérito. Ora, se a autora foi cadastrada indevidamente em órgãos de inadimplentes por culpa da ré; ou se sofreu – ou não – danos, tudo isso é de ser definido no exame de mérito.

É o que passo, agora, a fazer.

Com efeito, com base nas alegações da requerida, bem como na prova documental acostada aos autos, a demandante efetivamente teve seu limite de crédito no cheque especial – R$ 800,00 – suprimido pela requerida sem prévio aviso, razão pela qual o cheque de n° 850238, no valor de R$ 260,00, foi devolvido por duas vezes sem provisão de fundos junto ao sacado.

O extrato bancário de fl. 12 mostra que, em 29.06.2002, a autora tinha à sua disposição um limite de R$ 800,00 em seu cheque especial. Já em 08.07.2002 (fl. 13) tal limite não mais estava disponível, o que ensejou a devolução do título de n° 850238.

É importante destacar, mesmo que as circunstâncias assim já denunciem, que a requerente não foi previamente comunicada pelo banco do cancelamento do limite, o que implica reconhecer-se o descumprimento contratual por parte deste.

A instituição financeira apenas diz, em contestação, que foi ínfimo o período em que a requerente ficou sem seu limite. Não esclarece suficientemente qual o motivo da supressão do limite de crédito. Discute a ré, na verdade, coisa diversa da causa de pedir; ou seja, refere a legitimidade da inscrição negativa referente ao não pagamento tempestivo da fatura de cartão de crédito, o que não é objeto da lide.

Por outro lado, inocorreu a inscrição do nome da autora nos cadastros de emitentes de cheques sem fundos do BACEN em razão da devolução do cheque n° 850283, o que ameniza as conseqüências danosas da conduta do réu, não as afastando, entretanto.

Nesse diapasão, entendo estar evidenciado o descumprimento contratual por parte da instituição bancária, que suprimiu o limite de crédito – cheque especial – da conta da autora sem prévia comunicação nem razão plausível para tanto. E, diante da inesperada modificação nos limites de crédito, a requerente teve um cheque devolvido sem provisão de fundos, o que, por si só, traz abalo de crédito, fato ensejador do dano moral.


Colaciono, porque traz à baila caso muito semelhante, o voto proferido pelo eminente Dr. Túlio de Oliveira Martins na apelação cível n° 70010762227, julgada em 05.04.2006 pela 11ª Câmara Cível deste Tribunal de Justiça:

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. CANCELAMENTO DO CHEQUE ESPECIAL SEM A PRÉVIA CIENTIFICAÇÃO DO USUÁRIO.

A ausência de comunicação prévia do usuário, sobre o cancelamento de seu cheque especial consubstancia falha na prestação do serviço, implicando abalo ao crédito, na medida em que, inesperadamente, o consumidor se vê impossibilitado de usufruir as vantagens proporcionadas pelo uso do limite de crédito disponibilizado.

Quando mais, tendo em vista que, em contratos dessa espécie, o distrato deve ser comunicado com quinze dias de antecedência. Não observância, pelo réu, do dever de prevenir danos ao consumidor e zelar pela transparência, harmonia e boa-fé na relação com ele estabelecida.

“QUANTUM” INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO. Na fixação da reparação por dano extrapatrimonial, incumbe ao julgador, atentando, sobretudo, para as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado, e aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitrar ‘quantum’ que se preste à suficiente recomposição dos prejuízos, sem importar, contudo, enriquecimento sem causa da vítima. Súmula 54 do STJ. Inversão da sucumbência. Apelo provido.

E, no corpo do acórdão:

“Objetiva o apelante a indenização por danos morais no valor de cem vezes o limite do cheque especial em razão de o apelado ter cancelado o crédito, sem prévia notificação, o fazendo de forma explícita em público o que alega ter causado humilhação e discriminação, gerando o dever de indenizar por danos morais.

À sua vez o apelado alega que o limite do cheque especial foi realmente cancelado. Contudo, salientou que tal fato ocorreu não em razão do ingresso de ação revisional ou mesmo por represália ao ingresso dessa, mas fundamentalmente por inadimplência do contrato formalizado entre as partes. O cancelamento ocorreu automaticamente, conforme cláusula contratual.

Examino, então o apelo.

Conforme se percebe dos autos o apelante mantinha conta com o apelado e possuía cheque especial no valor de R$ 800,00, além de contrato de empréstimo. Os valores depositados mensalmente (fls. 13/17) em conta corrente do apelante provinham de pagamento de salários pela SEST SENAT, conforme comprovam os autos.

Possível ainda vislumbrar que o empréstimo contraído com apelado restou liquidado em 12-12-2002, conforme extrato de operação de (fl. 58).

Importa referir que a presente ação foi interposta em 31-10-2002 assim resta claro que à época do ingresso da mesma o contrato de empréstimo não estava liquidado.

Também não foram juntados aos autos extratos da conta bancária, o que impede se aferir os débitos e créditos realizados na conta do apelante.

De outro turno, em nenhum momento o apelado negou tenha cancelado o cheque especial. Contudo, alegou que o cancelamento do cheque especial se deu devido ao fato de apelante estar inadimplente no contrato firmado entre as partes.

Também a alegação do apelado de que a notificação para o cancelamento do cheque especial foi enviada para o apelante, mas restou devolvida pelo fato de não ter sido encontrado naquele endereço, permaneceu somente nas alegações já que nenhuma prova foi produzida.

É de ser destacado que o cancelamento do contrato em si, consubstancia em tese exercício regular de um direito pelo Banco demandado. Contudo, questiona-se, a forma mediante a qual o ato foi praticado, notadamente, diante do que dispõem as normas consumeristas.

Da análise dos autos, constata-se que, efetivamente, houve falha na prestação do serviço, à medida em que o réu deixou de comunicar previamente, ao autor, o cancelamento de seu limite de crédito, disponibilizado a partir do contrato de abertura de crédito em conta corrente -cheque especial.

A afirmação do apelante de que teve prejuízos de ordem financeira porque dependia do cheque especial para pagamento de pensão de alimentos e ainda outras despesas procede, pois o cheque especial vinha sendo renovado automaticamente por seis anos, o que leva a concluir que o cancelamento inesperado lhe acarretou prejuízos.

Os argumentos expendidos pelo recorrente vão ao encontro da jurisprudência desta Corte, assentada no sentido de que a ausência de comunicação do correntista, quanto ao cancelamento do limite de cheque especial, configura falha na execução do serviço, ensejando o dever de indenizar.

Nesse sentido, colhem-se os seguintes precedentes:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. CANCELAMENTO DO CHEQUE ESPECIAL SEM A PRÉVIA CIENTIFICAÇÃO DO USUÁRIO. SERVIÇO DEFEITUOSO PRESTADO PELA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA.


A ausência de comunicação prévia do usuário, sobre o cancelamento de seu cheque especial, consubstancia falha na prestação do serviço, implicando abalo ao crédito, na medida em que, inesperadamente, o consumidor se vê impossibilitado de usufruir as vantagens proporcionadas pelo uso do limite de crédito disponibilizado.

Não observância, pelo réu, do dever de prevenir danos ao consumidor e zelar pela transparência, harmonia e boa-fé na relação com ele estabelecida. SENTENÇA MANTIDA. POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO”. (Apelação Cível Nº 70013191184, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Angelo Maraninchi Giannakos, Julgado em 23/11/2005).

“APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS. SUPRESSÃO DE LIMITE DE CHEQUE ESPECIAL. AUSÊNCIA DE AVISO AO CORRENTISTA. DEVOLUÇÃO DE CHEQUES QUE RESPEITARAM O LIMITE. DIREITO À INDENIZAÇÃO. MAJORAÇÃO DO VALOR DEFERIDO EM PRIMEIRO GRAU.

Ausente prova bastante que a instituição financeira comunicou ao cliente a supressão de limite de crédito em conta corrente, é procedente o pedido indenizatório por devolução de cheques que respeitam os limites contratuais.

Recrudescimento da indenização para 30 salários mínimos, alcançando assim patamares compatíveis com o caso em concreto. Apelação do banco improvida e provida parcialmente a do autor”. (Apelação Cível Nº 70012570594, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Guinther Spode, Julgado em 25/10/2005).

“DANO MORAL – CHEQUE ESPECIAL – CANCELAMENTO – AVISO – AUSÊNCIA – VALOR – HONORÁRIOS – O cancelamento unilateral do limite concedido ao cheque especial deve ser precedido do respectivo aviso por escrito – conduta do estabelecimento bancário que diz com dano moral puro, pelo injusto do ato praticado – valor da indenização reduzida – impropriedade da fixação em salários mínimos – verba sucumbencial redimensionada – apelo e recurso adesivo providos em parte – unânime”. (Apelação Cível Nº 70004884201, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 05/06/2003).

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REDUÇÃO DO LIMITE DE CRÉDITO DO CONTRATO DE CHEQUE ESPECIAL, SEM COMUNICAÇÃO PRÉVIA AO CORRENTISTA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.

E responsável o Banco que reduz, modo unilateral, sem qualquer notificação ao correntista o limite de crédito, ocasionando a devolução de cheques,por insuficiência de fundos.

Argumento de desrespeito ao limite que não se sustenta ante a constatação de que tal prática era costumeira, Dano moral que se presume, na forma da regra re in ipsa. Apelo provido”. (Apelação Cível Nº 70003315702, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ary Vessini de Lima, Julgado em 10/04/2003).

Diverso não é o entendimento do Colendo STJ, consoante se verifica do seguinte precedente:

“ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE – CIVIL – DANO MORAL – VALOR DA INDENIZAÇÃO.

1. O valor do dano moral tem sido enfrentado no STJ com o escopo de atender a sua dupla função: reparar o dano buscando minimizar a dor da vítima e punir o ofensor, para que não volte a reincidir.

2. Posição jurisprudencial que contorna o óbice da Súmula 7/STJ, pela valoração jurídica da prova.

3. Fixação de valor que não observa regra fixa, oscilando de acordo com os contornos fáticos e circunstanciais.

4. Recurso especial parcialmente provido”. (RESP 604801/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 23.03.2004, DJ 07.03.2005 p. 214)

Ora, é inegável que, a teor do inciso VI do art. 6º do CDC, o réu tinha a obrigação legal de prevenir danos patrimoniais e morais que pudessem atingir a esfera do consumidor.

Ademais, estava obrigado a zelar pela transparência, harmonia e boa-fé na relação estabelecida com o autor.

Considerando que, em contratos dessa espécie, a intenção de distratar ou de não permitir a prorrogação do contrato deverá ser comunicada por escrito, com quinze dias de antecedência, o inesperado cancelamento do limite de crédito lesou o postulante.

Isso sem esquecer que tal prejuízo se consubstancia em dano moral puro, o qual independe de prova. (…)”

Ainda no âmbito desta Corte, têm-se os seguintes arestos jurisprudenciais:

APELAÇÃO CÍVEL. DECISÃO MONOCRÁTICA. ARTIGO 557, CAPUT, DO CPC. RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. Conta corrente. Limite. Cheques devolvidos por insuficiência de fundos. Indenização devida. A ausência de notificação do consumidor acerca do cancelamento do limite do cheque especial e, conseqüentemente, a devolução de cheques sem fundos, acarreta a condenação do banco a indenizar o dano moral pelo mesmo sofrido. Negado seguimento ao recurso. (Apelação Cível n° 70013813266, 19ª Câmara Cível, TJRS, Dês. Mário José Gomes Pereira, em decisão monocrática. j. em 23.03.2006)


APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. CANCELAMENTO DE LIMITE DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO. INSCRIÇÃO INDEVIDA. DANO CONFIGURADO.

1. CANCELAMENTO DO LIMITE DO CHEQUE ESPECIAL. INSCRIÇÃO EM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANO CONFIGURADO. A ausência de comunicação do correntista, quanto ao cancelamento do limite de cheque especial, configura falha na execução do serviço, ensejando o dever de indenizar.

Hipótese em que restou demonstrada nos autos a abusividade do ato praticado pelo banco demandado que, unilateralmente, cancelou o limite de crédito em conta corrente disponibilizado ao autor, procedendo à inclusão do seu nome nos cadastros do SPC e do SERASA. Dano in re ipsa. Dever de indenizar reconhecido. Sentença de improcedência reformada.

2. QUANTUM INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO. Na fixação da reparação por dano extrapatrimonial, incumbe ao julgador, atentando, sobretudo, para as condições do ofensor, do ofendido e do bem jurídico lesado, e aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitrar quantum que se preste à suficiente recomposição dos prejuízos, sem importar, contudo, enriquecimento sem causa da vítima.

A análise de tais critérios, aliada às demais particularidades do caso concreto, bem como aos parâmetros utilizados por esta Câmara, em casos análogos, conduz à fixação do montante indenizatório em R$ 3.000,00, que deverá ser corrigido monetariamente, pelo IGP-M, desde a data desta sessão, até o efetivo pagamento, e acrescido de juros moratórios de 12% ao ano, a contar da data do evento (02.06.2002), nos termos da Súmula 54 do STJ. Inversão da sucumbência. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70012969895, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Lessa Franz, Julgado em 29/12/2005)

NEGÓCIO JURÍDICO BANCÁRIO. INDENIZAÇÃO POR ABALO MORAL. CANCELAMENTO DO LIMITE DO CHEQUE ESPECIAL. A ausência de notificação do consumidor acerca do cancelamento do limite do cheque especial e, conseqüentemente, a devolução de cheques sem fundos, acarreta a condenação do banco a indenizar o dano moral pelo mesmo sofrido.

APELO IMPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70008025314, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Francisco Pellegrini, Julgado em 26/07/2005)

Assim, verificada a conduta ilícita do réu – consistente na supressão unilateral e sem previa cientificação do consumidor de limite de cheque especial -, o dano – abalo de crédito decorrente de devolução de cheque por insuficiência de fundos – e o nexo de causalidade, encontram-se os pressupostos ensejadores da responsabilidade civil.

Presente o dever de indenizar, passo à quantificação da verba indenizatória, e, já adianto, neste ponto assiste razão ao apelante quando busca sua redução.

Vejamos.

Em relação à prova dos danos morais, por tratar-se de dano imaterial, ela não pode ser feita nem exigida a partir dos meios tradicionais, a exemplo dos danos patrimoniais. Exigir tal diligência seria demasia e, em alguns casos, tarefa impossível.

Tradicionalmente, o diploma processual civil brasileiro, divide a carga probatória entre os componentes da demanda, ainda que lhes permita a propositura genérica de provas. Cumpre mencionar que os sistemas específicos que versam sobre a questão do ônus probatório, em diversas hipóteses optam pela inversão do encargo. O exemplo clássico desta hipótese é o Código do Consumidor (art. 6º, VIII do CDC).

A questão do encargo probatório assume relevância nas situações em que nos deparamos com a incerteza e/ou insuficiência de meios e elementos probatórios nos autos do processo. Ou ainda, quando existe certa resistência processual das partes em produzir algum elemento de prova. Constatadas essas dificuldades de ordem prática, a decisão judicial precisará valer-se da questão do encargo probatório, isto é, verificar quem possuía o dever legal de produzir a prova naquela lide específica.

O encargo probatório é uma regra que deve ser sopesada no ato de decidir. No Código de Processo Civil, a regra geral, está prevista no art. 333, incisos I e II, que determina que o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito, e ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo.

A regra não tem caráter absoluto, comportando exceções, tais como a verossimilhança, a presunção, a notoriedade do fato.

Considerando que o dano moral diz respeito à violação dos direitos referentes à dignidade humana, a doutrina especializada e a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça vêm entendendo que a conseqüência do dano encontra-se ínsita na própria ofensa, porquanto deflui da ordem natural das coisas, tomando-se como parâmetro a vida comum das pessoas.


Nessa perspectiva, para a demonstração do dano moral basta a realização da prova do nexo causal entre a conduta (indevida ou ilícita), o resultado danoso e o fato.

Não se trata de uma presunção legal, pois é perfeitamente admissível a produção de contraprova, se demonstrado que não consiste numa presunção natural.

O art. 335 do CPC é a abertura legal do nosso ordenamento jurídico para o reconhecimento desta espécie de prova, ao afirmar que diante da falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum, subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.

No caso dos autos, é preciso levar-se em consideração o fato de que a discussão envolve danos morais puros e, portanto, danos que se esgotam na própria lesão à personalidade, na medida em que estão ínsitos nela. Por isso, a prova destes danos restringir-se-á à existência do ato ilícito, devido à impossibilidade e à dificuldade de realizar-se a prova dos danos incorpóreos.

Trata-se de dano moral in re ipsa, que dispensa a comprovação da extensão dos danos, sendo estes evidenciados pelas circunstâncias do fato.

Nesse sentido, destaca-se a lição de Sérgio Cavalieri Filho, Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:

“Entendemos, todavia, que por se tratar de algo imaterial ou ideal a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível, exigir que a vitima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão de fatores instrumentais.

Neste ponto, a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras de experiência comum.” (Programa de Responsabilidade Civil, 5ª ed., Malheiros, 2004, p. 100/101).

Não é diferente a orientação do Superior Tribunal de Justiça, conforme ementa que segue:

CIVIL. DANO MORAL. REGISTRO INDEVIDO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. A jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que, na concepção moderna do ressarcimento por dano moral, prevalece a responsabilização do agente por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto, ao contrário do que se dá quanto ao dano material. (…) Recurso não conhecido.(RESP 556200 / RS ; Recurso Especial 2003/0099922-5, Quarta Turma do STJ, Relator Min. Cesar Asfor Rocha (1098), Data da Decisão 21/10/2003, DJ Data:19/12/2003 PG:00491).

Dessa forma, evidente a ocorrência de dano moral, passa-se à quantificação da indenização.

Para se fixar o valor indenizatório ajustável à hipótese fática concreta, deve-se sempre ponderar o ideal da reparação integral e da devolução das partes ao status quo ante. Este princípio encontra amparo legal no art. 947 do Código Civil e no art. 6º, inciso VI, do Código de Defesa do Consumidor.

No entanto, não sendo possível a restitutio in integrum em razão da impossibilidade material desta reposição, transforma-se a obrigação de reparar em uma obrigação de compensar, haja vista que a finalidade da indenização consiste, justamente, em ressarcir a parte lesada.

Em relação à quantificação da indenização, é necessário analisar alguns aspectos para se chegar a um valor justo para o caso concreto, atentando-se à extensão do dano, ao comportamento dos envolvidos, às condições econômicas e sociais das partes e à repercussão do fato.

Verifica-se que a autora, correntista do banco réu, teve seu limite de cheque especial cancelado unilateralmente e sem prévia comunicação, do que decorreu a devolução de cheque sem provisão de fundos. Trata-se de falta grave, que ocasionou diversos transtornos e restrições à autora.

A extensão dos danos resta evidenciada pelas circunstâncias do fato, considerando-se que o presente caso envolve abalo de crédito, hipótese de dano moral in re ipsa.

Assim, considerando tais vetores, tenho por reduzir à metade a quantia fixada na sentença em R$ 6.000,00 (seis mil reais). O valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) se presta para a recomposição dos danos, não caracterizando enriquecimento ilícito por parte da requerente.

Essa Câmara assim já decidiu:

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. CADASTRO INDEVIDO EM ÓRGÃOS DE INADIMPLENTES. INCONFORMIDADE COM O VALOR FIXADO PARA A INDENIZAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO QUE, NO CASO CONCRETO, SE MOSTRA ADEQUADO.

1. É ato passível de indenização o cadastro indevido em órgãos de inadimplentes, quando o crédito pretendido não era da responsabilidade da autora.

2. O dano moral puro prescinde de produção probatória, pois considerado in re ipsa.

3. A fixação do quantum indenizatório deve atender uma série de critérios adotados pela jurisprudência de modo a compensar a vítima pelos danos causados, sem significar enriquecimento ilícito desta, às custas de seu ofensor.

4. Configura-se adequada a indenização quando as circunstâncias específicas do caso concreto indicam que a repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor foram observadas no arbitramento. Manutenção do valor fixado pela sentença recorrida. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70007842883, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, julgado em 28/04/2004)

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. (…) Dano moral. Caracterização. A inscrição indevida em órgãos restritivos de crédito, como SPC e SERASA, de pessoa que não é devedora, é fato gerador de indenização por dano moral, devido à falta de justa causa para o apontamento. Danum in re ipsa. Prescindibilidade da prova de prejuízo concreto, sendo suficiente a comprovação da existência do ato ilícito, causador de violação ao patrimônio moral do indivíduo.

Condenação mantida. Quantum Indenizatório. Na fixação do valor indenizatório deve-se levar em consideração as condições econômicas e sociais do ofendido e do ofensor, as circunstâncias do fato e a culpa dos envolvidos, a extensão do dano e seus efeitos, sem esquecer o caráter punitivo e que a indenização deve ser suficiente para reparar o dano, não podendo importar enriquecimento injustificado. (…) APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO IMPROVIDOS. (Apelação Cível Nº 70007874761, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relatora Fabianne Breton Baisch, julgado em 05/05/2004)

Por todo o exposto, dou provimento parcial ao apelo, para reduzir o valor da indenização para R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescidos de correção monetária pelo IGP-M desde a data deste acórdão, e juros de mora de 1% ao mês desde a citação.

É como voto.

DES. ODONE SANGUINÉ (REVISOR) – De acordo.

DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY – De acordo.

DESA. IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA – Presidente – Apelação Cível nº 70014253553, Comarca de Gravataí: “DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO APELO. UNÂNIME.”

Julgador(a) de 1º Grau: REGIS ADRIANO VANZIN

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