Novos tempos

Aplicação do Mandado de Injunção muda relação entre poderes

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7 de junho de 2006, 18h47

O Supremo Tribunal Federal sinalizou, nesta quarta-feira (7/6), que se o Congresso não cumprir seu papel de legislar, o tribunal o fará, quando direito previsto na Constituição não puder ser exercido por omissão dos parlamentares. A corte deu um passo importante para a efetiva aplicação do Mandado de Injunção, um dispositivo previsto na Constituição de 1988 mas desprezado até então. Com o Mandado de Injunção, o Judiciário determina que o Legislativo legisle sobre dispositivos da Constituição que não podem ser aplicados por falta de regulamentação. Até agora, o dispositivo tinha efeito declaratório apenas. Com a nova posição, assume caráter mandamental.

O novo entendimento se manifestou com o voto do ministro Gilmar Mendes. Para o ministro, se o Legislativo não cumpre seu papel de regulamentar a lei, cabe ao Supremo interferir e fazer o direito do cidadão valer mesmo assim. No caso em questão, o que se discute é o direito de greve dos servidores públicos. Para Mendes, se não há lei que regulamente esse direito, devem valer as mesmas regras que se aplicam para os trabalhadores do setor privado.

O passo dado pelo ministro acompanha o entendimento revolucionário do ministro Celso de Mello em matéria similar. Ao julgar quebras de sigilos determinadas por CPIs, o ministro disse sim à interferência do Judiciário no Legislativo sempre que este comete abusos. Pode-se dizer que está sendo colocado um freio na até então intocável independência dos três Poderes.

“Este tribunal não pode se abster de reconhecer que, assim como se estabelece o controle judicial sobre a atividade do Legislativo, é possível atuar também nos casos de inatividade ou omissão do Poder”, disse Gilmar Mendes.

O posicionamento de Mendes contrariou o voto do relator, ministro Maurício Corrêa, já aposentado. Para ele, o Judiciário não pode substituir o legislador. O entendimento de Corrêa, se baseia na posição ministro Moreira Alves, também aposentado, considerado a porta-voz do conservadorismo no STF durante a transição para a democracia.

Desde que o Mandado de Injunção foi instituído, Moreira Alves sempre lutou para adiar e evitar sua aplicação, defendendo que o Judiciário não podia assumir o papel do Legislativo. O que foi concebido — pelo menos no nome — para ser um mandado foi, durante quase 20 anos, apenas uma solicitação. “Comungo das preocupações quanto a não assunção pelo tribunal de um protagonismo legislativo. Entretanto, parece-me que a não atuação no presente momento já se configuraria quase como uma espécie de ‘omissão judicial'”, ponderou o ministro Gilmar Mendes.

Agora, a corrente deve mudar. O julgamento no Plenário do Supremo foi suspenso por pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowski, adiando uma decisão final sobre a matéria. Mas, a aceitação e o reconhecimento ostensivo da tese sustentada por Gilmar Mendes indicam que uma nova era está nascendo nas relações entre os três poderes.

O tribunal julga três Mandados de Injunção sobre o direito de greve dos servidores. O primeiro foi ajuizado pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Espírito Santo. O relator é o ministro Maurício Corrêa. A decisão havia sido supensa por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes. Os outros dois Mandados têm como relator o ministro Eros Grau que, nesta quarta-feira (7/6), teve o mesmo posicionamento de Gilmar. Um deles foi ajuizado pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado da Paraíba e o outro, pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado do Pará.

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