Donos da Ordem

Não vamos dar a OAB a quem vive de pompa e circunstância

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1 de junho de 2006, 20h43

Talvez o leitor ache estranho misturar Camões com as eleições da OAB, que ocorrerão em novembro. Mas o imortal autor de Os Lusíadas já se referia, séculos atrás, na razão pela qual muitas pessoas insistem em se manter em cargos que lhes trazem apenas trabalho e sacrifício, como são aqueles que estarão em disputa entre os advogados. Em Os Lusíadas (Canto IV, 95), o vate lusitano registrava: “Ó glória de mandar, ó vã cobiça/Desta vaidade a quem chamamos fama”.

Não há a menor dúvida de que dirigir a maior corporação profissional da América Latina enriquece a biografia dos eleitos. É natural que os potenciais clientes presumam que o conselheiro da OAB seja um bom advogado, pois não é razoável supor que a categoria, composta em sua totalidade por pessoas de formação superior, venha a escolher seus dirigentes entre os medíocres, inexperientes ou de caráter duvidoso.

A excelência do eleitorado, formada integralmente por pessoas esclarecidas, de bom nível intelectual (haja visa o rigor do Exame de Ordem), qualifica os eleitos como os que mais se destacam profissionalmente. E essa qualificação, com muita justiça e lógica, atrai clientes e orna o conselheiro com presumíveis qualidades que o fazem ter mais prestígio junto a todos os segmentos da sociedade.

Não há, nessa valorização profissional do advogado que participa ativamente da sua entidade de classe, merecendo o voto de expressiva parcela de seus colegas para integrar seu conselho, nada de estranho ou surpreendente.

Mas, embora seja natural o desejo, direito e até dever de qualquer advogado de participar do Conselho da OAB, nada justifica que, em busca disso, coloque o desejo do poder, a “glória de mandar”, acima do bom senso, da lógica, da razão, do sentimento de justiça.

Tais considerações são necessárias ante algumas manifestações de pré-candidatos ao Conselho da OAB que, na ausência de outros argumentos que possam legitimar suas candidaturas, preferem apenas a crítica pela crítica, sem propostas concretas para resolver os problemas apontados.

Uma das críticas que vimos foi contra a alegada omissão da OAB no caso de advogados que são acusados de crime. No desejo de bajular o setor desinformado e deformador da mídia, chegam a exigir que a OAB os “expulse” imediatamente de seus quadros, ignorando por completo o que diz a Lei 8.906, especialmente o seu artigo 70, parágrafo 3º.

A OAB não pode “expulsar” nem suspender nenhum advogado, por mais criminoso que seja, mesmo preventivamente, sem o devido processo legal. Se o fizesse, seria não apenas ignorar o texto expresso da lei, mas responder pelos danos que isso pudesse causar ao “criminoso”, se alguém assim pudesse ser chamado antes da condenação definitiva. Advogados não podem ignorar a lei e menos ainda a Constituição Federal. A crítica da suposta “omissão” é, pois, uma besteira ridícula de quem não sabe o que diz.

Também uma tresloucada pessoa andou dizendo por aí que a OAB nada faz diante da baixa remuneração obtida pelos advogados. Não se leva em conta, na leviana afirmação, que a OAB está fazendo um gigantesco trabalho de aperfeiçoamento profissional dos advogados, por meio da ESA e do Departamento de Cultura e Eventos, jamais visto na história da entidade. Imagina-se que a entidade possa, num passe de mágica, aumentar os rendimentos dos advogados, o que só se torna possível com o esforço de cada um, sua evolução profissional e as condições econômicas do país. Para minorar essas dificuldades, a entidade desenvolve também as atividades da Caasp, subsidiando vários serviços disponibilizados à categoria.

Críticas infundadas também são dirigidas contra uma fantasiosa “perda de prestígio” da profissão, que só existe na imaginação dos que se guiam pelo sensacionalismo da mídia, sem acompanhar de perto as atividades da OAB, pois a entidade está sempre na vanguarda das lutas da cidadania, liderando os principais movimentos pelo Estado Democrático de Direito, pelo combate à corrupção, pelo respeito às normas legais. Tanto os advogados não estão “desprestigiados” que nada de importante ocorre no país sem a presença marcante da OAB, em cumprimento às suas funções institucionais.

Mais triste ainda é sabermos que algumas dessas “papagaiadas” são divulgadas por ex-conselheiros, que conhecem a entidade e que, pelo menos alguns deles, quando nela estavam pouco ou nada fizeram para “consertar” o que dizem que está defeituoso. È fácil criticar quando não se fez nada quando ocupava o poder.

Essas questões todas são as primeiras escaramuças da “guerra pelo poder” que vem se travando de forma ainda silenciosa nos meios da advocacia, onde alguns colegas, ao que parece, não conseguiram vencer suas paixões, nem dominar suas vontades, sempre direcionadas no sentido de se imaginarem “donos” da OAB.

Tornou-se comum dizer que este ou aquele ex-conselheiro, este ou aquele professor, estaria apoiando uma ou outra das “chapas” que estão se formando. Saibam todos que isso não significa mais nada. Principalmente quando tais apoios partem de colegas que sempre quiseram o poder pelo poder, ou apenas para enfeitar suas biografias, ou para qualificá-los para algum cargo público, alguma “honraria” qualquer, dessas que bajuladores profissionais concedem à vaidade sem limites de gente que ainda vive no tempo das colônias, onde havia senhores e vassalos ou nobres e plebeus.

Por isso tudo, precisamos decidir com serenidade, sem subserviência; com tranqüilidade, sem aceitar cabrestos; com amor à advocacia, sem nos iludir com a crítica que nada constrói ou com o discurso que nada propõe. A OAB somos nós, os advogados militantes, que freqüentam o foro, que correm atrás dos honorários ou que ralam o mês inteiro pelo salário bem suado; que lutam com garra e determinação pela sobrevivência. Não vamos entregar nossa entidade a quem vive apenas de pompa e circunstância; a quem pensa que fazer palestra sobre seu próprio ramo de conhecimento resolve alguma coisa; a quem se imagina superior aos seus colegas. Nós todos somos iguais! Nosso voto é igual. A OAB está acima das vaidades ou do desejo de fama. A OAB é a nossa casa e não podemos entregá-la aos que apenas a visitam, mas que preferem viver em seus palácios!

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