Proibido para menores

MPF pede que SBT cumpra classificação indicativa

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29 de julho de 2006, 7h00

O Ministério Público Federal entrou com Ação Civil Pública para que o SBT cumpra a classificação etária formulada pelo Ministério da Justiça. A ação ainda pede que a emissora seja condenada a pagar R$ 800 milhões como indenização pelos danos morais coletivos.

De acordo com o procurador Regional dos Direitos do Cidadão Sérgio Suiama, a emissora descumpriu o Estatuto da Criança e do Adolescente quando exibiu filmes, novelas e seriados fora do horário determinado pelo Ministério da Justiça.

O Programa do Ratinho, por exemplo, foi mostrado entre 3 e 13 de setembro de 2004 antes das 21h, quando o indicativo era para depois desse horário. Em fevereiro de 2006, o Ministério Público Federal solicitou informações ao departamento de classificação do Ministério da Justiça sobre todos os casos em que essa emissora não cumpriu a classificação indicativa. A resposta foi de que já existem diversos procedimentos administrativos.

Leia a petição

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA VARA CÍVEL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelos Procuradores Regionais dos Direitos do Cidadão infra-assinados, no uso de suas atribuições legais e constitucionais, vem, com fundamento no artigo 129, II, da Constituição brasileira e na Lei n.º 7.347/85, ajuizar a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA

Em face de TVSBT CANAL 04 DE SÃO PAULO S.A., empresa concessionária do serviço público federal de radiodifusão, inscrita no CNPJ/MF sob o número 45.039.237/0001-14, sediada nesta subseção judiciária, na cidade de Osasco, na Avenida das Comunicações, 04, Bairro Vila Jaraguá, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas:

I – INTRODUÇÃO

A presente ação civil pública busca conformar a programação televisiva da concessionária-ré aos dispositivos constitucionais e legais que regulam a comunicação social no Brasil.

Conforme se apurou nas representações instauradas no âmbito deste órgão ministerial, de números 1.34.001.002404/2004-26, 1.34.001.002018/2005-15 e 1.34.001.001648/2004-91, a emissora-ré vem perfunctoriamente apresentando inadequações em sua grade de programação, desrespeitando por completo a classificação indicativa exarada pelo Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação do Ministério da Justiça.

No total foram exibidos mais de 120 programas contendo inadequações, dentre eles o filme South Park: Maior, Melhor e Sem Cortes; os seriados Mulher Gato, Smallville, O Vidente, As Espiãs, Witchblade, Fastlane, Aliás e The OC; a novela Madrasta e o programa comandado pelo apresentador Ratinho.

Depois de apresentada a causa de pedir, serão pleiteadas obrigações de não fazer em face da TVSBT, bem como a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais coletivos causados à imensa massa de telespectadores que teve contato com a programação irregularmente exibida. Tal indenização deverá ser revertida ao Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente, previsto no art. 6º da Lei n.º 8242/91.

II – DOS FATOS

1 – DAS REPRESENTAÇÕES INSTAURADAS NO MPF

A presente exordial tem como suporte as representações de números 1.34.001.002404/2004-26, 1.34.001.002018/2005-15 e 1.34.001.001648/ 2004-91, instauradas nesta Procuradoria da República e que versam sobre a exibição de programas de televisão em horário inadequado pela emissora SBT.

1.1 – DA REPRESENTAÇÃO N.º 1.34.001.002404/2004-26

O procedimento administrativo n.º 1.34.001.002404/2004-26 foi instaurado a partir do ofício PR/ES n.º 01036/2004, oriundo da Procuradoria da República no Estado do Espírito Santo, encaminhando representação feita por Glauder dos Santos Neumeg acerca da exibição, em horário não apropriado, do filme “SOUTH PARK: MAIOR, MELHOR E SEM CORTES” pela emissora SBT (doc. 01).

Autuados os referidos documentos na Procuradoria da República no Estado de São Paulo, expediu-se o ofício n.º 9.316/2004 MPF-PR/SP requisitando à emissora-ré cópia do filme exibido com o respectivo aviso de classificação etária. Após reiteração, o SBT encaminhou fita de vídeo contendo a gravação do filme “SOUTH PARK: MAIOR, MELHOR E SEM CORTES” (doc. 02), informando que o mesmo havia sido exibido em 29/01/2004, por volta das 22h15. Na oportunidade, encaminhou também cópia da Portaria n.º 109, de 24 de novembro de 2003, do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação, segundo a qual referido filme, na modalidade “programa” (veículo televisão/distribuição TVSBT Canal 04 de São Paulo S/A), não era recomendado para menores de 18 (dezoito) anos, sendo, portanto, inadequado para antes das 23h00, nos termos do art. 2º, inciso V, da Portaria MJ n.º 796, de 08 de setembro de 2000 (doc. 02).


Foi juntado aos autos relatório descritivo do conteúdo do filme “SOUTH PARK”, em que se verifica a constante utilização de palavrões e palavras pornográficas pelos personagens infantis e adultos (doc. 03).

Este órgão ministerial oficiou novamente o SBT (ofício n.º 17.014/2004 MPF-PR/SP), solicitando que informasse se o filme South Park fora colocado ao ar em rede nacional e o dia e horário em que havia sido exibido pela emissora (se em 29/01/2004 ou 30/01/2004, como havia declarado o representante). Em resposta, informaram que o filme fora exibido dia 30/01/2004 (retificando informação anterior de que havia sido exibido dia 29/01/2004), em rede nacional, iniciando sua exibição às 22h15 (doc. 04).

O Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e

Qualificação da Secretaria Nacional de Justiça – Ministério da Justiça, foi questionado, por meio do ofício n.º 17.015/2004 MPF-PR/SP, sobre o motivo pelo qual o filme em comento recebera a classificação indicativa “não recomendado para menores de 18 anos”, enquanto que nas modalidades cinema e DVD/vídeo, a classificação atribuída foi “inadequado para menores de 14 anos”. Em resposta, aquele departamento informou que a possibilidade de uma mesma obra receber diferentes classificações de acordo com o meio de veiculação sempre esteve ligada à percepção de que o acesso de crianças e adolescentes ao cinema e ao vídeo doméstico (VHS ou DVD) seria mais difícil do que à televisão, em especial aos canais abertos de radiodifusão televisiva. Encaminhou cópia das publicações no Diário Oficial da União referentes à classificação indicativa do filme ora colocado em discussão (doc. 05).

Tendo em vista, portanto, que o filme fora exibido em horário não apropriado, expediu-se ofício ao Sistema Brasileiro de Televisão requisitando esclarecimentos acerca de sua transmissão antes do horário permitido, bem como se naquela ocasião houvera advertência ao público quanto à classificação indicativa atribuída: programa não recomendado para menores de 18 anos, nos termos do art. 10, parágrafo único, da Portaria MJ n.º 796, de 08/09/2000 (doc. 06).

Em resposta, aquela concessionária informou que é praxe na grade de programação da TVSBT a advertência dirigida ao telespectador no que tange ao tipo de atração transmitida. Tal advertência é feita por meio de diversas cores empregadas na “marca d’água” da emissora, logotipo situado no canto inferior direito do monitor. Assim, afirma a ré que durante a transmissão do filme em questão, a marca d’água fixada na tela tinha a cor vermelha, indicando que a atração era desaconselhável para menores. Contudo, o horário de transmissão era inadequado (doc. 06).

Em 02 de fevereiro de 2006, este órgão ministerial expediu ofício ao Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação – Ministério da Justiça, solicitando informações sobre todos os casos pretéritos em que houve o descumprimento da classificação indicativa pela emissora SBT (doc. 07). Em resposta (doc. 07), informaram que há diversos procedimentos administrativos abertos naquele órgão, registrando (até aquela data) um TOTAL DE 119 PROGRAMAS EXIBIDOS EM HORÁRIO INADEQUADO.

O Ministério Público Federal encaminhou cópia das principais peças do procedimento administrativo em epígrafe à Presidência do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional (ofício n.º 514/2005 MPF-PR/SP) e à Promotoria de Justiça de Defesa dos Interesses Difusos e Coletivos da Infância e Juventude da Capital (ofício n.º 516/2005 MPF-PR/SP), a fim de que tomassem as providências pertinentes.

1.1.1 – DO CONTEÚDO DO FILME SOUTH PARK: MAIOR, MELHOR E SEM CORTES

Da análise da fita VHS encaminhada pela concessionária-ré (doc. 02), correspondente ao filme South Park: Maior, Melhor e sem Cortes, verificou-se a existência de inúmeras imagens contendo violência, bem como de palavras obscenas e chulas, com as quais o público infanto-juvenil jamais poderia ter contato. Dentre elas, podemos citar:

• após ouvir os palavrões na sala de aula, um professor indaga o aluno: “O que você acha de ir falar com o diretor?”. A criança devolve ao professor a seguinte pergunta: “O que você acha de chupar meu saco?”;

• os personagens (crianças) apostam que um deles não conseguiria acender a própria flatulência. Ao tentar, o garoto se incendeia e é levado ao hospital, onde é submetido a uma violenta cirurgia e não resiste;

• seu espírito vai para o inferno, onde Satã o apresenta a seu parceiro do mal: Saddam Husseim, que fala palavrões e palavras pornográficas enquanto tortura Kenny. Satã e Sadam Husseim têm um caso amoroso;

• aparecem cenas em que Saddam e Satã, conversando a respeito da relação amorosa, utilizam muitos vocábulos pornográficos como “trepar”, “comer o rabo” etc. Eles brincam com alguns pênis de brinquedo;


• enquanto um dos personagens está na cadeira elétrica, exala o seguinte comentário: “Isso é pior do que aquele dia que você colocou seu pau na minha boca e tirou uma foto”;

• constatou-se, também, o uso das seguintes expressões, além de várias outras: “FODE-PORCO”, “FODE-CAVALO”, “VIADINHO DE MERDA”, “COMEDOR DE JUMENTO”, “COME MEU CU E ME CHAMA DE VACA”, “VOCÊ COMERIA SEU TIO?”, “CHUPE MEU SACO”, “CARA DE CU”, “FILHO DA PUTA”, “MAS QUE PORRA É ESSA”, “BABACA CHUPA-PAU”, “CASSETE”, “CARALHO”, “VAI SE FODER”, “ONDE FICA O CLITÓRIS?” etc;

• os personagens Satã e Saddam, principalmente este último, usam muitas palavras pornográficas em suas falas, tais como: “TREPAR”, “MASSAGEAR OS MAMILOS”, “COMER O RABO”, “ESTOU MALVADINHA”, “SUA PUTA”, “VAMOS DAR UMAZINHA” etc.

Percebe-se, assim, que a utilização de palavrões e palavras pornográficas pelas crianças e adolescentes atores é muito freqüente. Esses últimos, além dos palavrões, soltam gases na cara das pessoas.

É de fundamental importância ressaltar aqui que não houve qualquer impugnação administrativa do SBT à classificação feita pelo Ministério da Justiça em relação ao filme em questão, o que demosntra, por si só, que a emissora concordou com ela, no que diz respeito à inadequação das cenas e conteúdo do mesmo. Sendo assim, estava ciente de que ao exibir o fime estava lesando diretamente o público infanto-juvenil, pois reconheceu, ainda que indiretamente, que seu conteúdo era inapropriado.

1.2 – DA REPRESENTAÇÃO N.º 1.34.001.001648/2004-91

Por meio de notícia encaminhada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, foi instaurada, no âmbito desta Procuradoria da República em São Paulo, a representação de nº 1.34.001.001648/2004-91, com o objetivo de apurar a exibição de cenas impróprias pelo “Programa do Ratinho”, em desacordo com a classificação indicativa estabelecida pelo Ministério da Justiça na Portaria de nº 11, de 09/11/1998 (doc. 08).

O Ministério da Justiça realizou o monitoramento do programa no período de 3 (três) a 13 (treze) de setembro de 2004, com o fim de verificar indequações em seu conteúdo com a classificação exarada pelo MJ como “inapropriado para antes das 21h00”. Dentre as irregularidades verificadas durante o monitoramento, podemos citar abordagens homofóbicas; vídeos pornográficos com genitais à mostra; consumo de substâncias ilícitas; exploração sexual de mulheres; vídeo com cenas de uma “tailandesa” que usava uma zarabatana na vagina; vídeo com cenas de um homem que enrolava seu pênis em uma bengala (doc.08); cenas de uma câmera de segurança que mostra a retirada de um caixa eletrônico de uma pequena loja, com o comentário subseqüente do apresentador “nestes casos o crime compensa”; mulher escrevendo com uma caneta colocada na vagina etc (doc.09).

Salienta-se que, de acordo com a Portaria n.º 796/2000 – MJ (art. 2º, parágrafo único), a exibição de cenas pornográficas com genitais à mostra só é permitida depois da meia-noite, fato este ignorado pela Requerida. Houve, portanto, total inadequação do conteúdo dos programas exibidos ao seu horário de classificação, qual seja, 21h00.

No decorrer da referida representação, foi constatado ainda que, não obstante o Programa do Ratinho tenha sido catalogado pelo Ministério da Justiça como “programa não recomendado para menores de 14 anos, inadequado para antes das 21 horas”, vinha sendo veiculado em horário LIVRE, consoante atestam os ofícios expedidos pelo Diretor do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação do Ministério da Justiça (doc. 10).

Infelizmente, o desrespeito às normas legais, mormente às prescrições da Lei nº 8.069/90, bem assim aos atos emanados dos órgãos do Poder Executivo, é uma conduta constante da emissora ré, haja vista que tal fato ensejou também a instauração de outro procedimento administrativo no âmbito deste Ministério Público Federal, o de nº 1.34.001.002018/2005-15.

1.3 – DA REPRESENTAÇÃO N.º 1.34.001.002018/2005-15

Esta representação, encetada em virtude de ofícios remetidos pelo Diretor do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação do Ministério da Justiça, tem por objetivo apurar a exibição de seriados, por parte da concessionária-ré, em horário incompatível com o que lhe fora determinado pelo Ministério da Justiça. Vejamos:

• seriado “Mulher Gato”: classificado como inadequado para menores de 12 anos e para exibição antes das 20h00. A emissora admite, entretanto, ter optado por exibi-lo em horário livre (doc. 11).

• seriado “The OC – Um estranho no paraíso”: classificado como inadequado para menores de 14 anos e para exibição antes das 21h00. A emissora admite ter optado por exibi-lo em horário livre (doc. 12).


• seriado “Witchblade”: classificado como inadequado para menores de 14 anos e para exibição antes das 21h00. A emissora admite ter optado por exibi-lo em horário livre (doc. 13).

• seriado “Fastlane”: classificado como inadequado para menores de 16 anos e para exibição antes das 22h00, contudo é exibido aos domingos, às 9h00 (horário livre). A emissora não quis se manifestar à respeito (doc. 14).

• seriado “Alias”: classificado como inadequado para menores de 12 anos e para exibição antes das 20h00. A emissora admite, entretanto, ter optado por exibi-lo em horário livre (doc. 15).

Cumpre sublinhar que, atualmente, a emissora ré vem exibindo em sua grade de programação apenas os seriados “O Vidente”, “The OC” e Smallville”, embora ainda persista em contrariar o horário estabelecido pelo Ministério da Justiça, consoante evidenciam os documentos acostados a esta exordial (doc. 16).

2 – DO CABIMENTO DA PRESENTE AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Percebe-se, assim, da simples leitura que se faça dos expedientes acima transcritos, que a emissora exibiu o filme, as séries e o programa em comento em total desconformidade com a classificação formulada pelo Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação, órgão do Ministério da Justiça com atribuição para informar sobre a natureza das diversões e espetáculos públicos, as faixas etárias a que não se recomendem, bem como locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada para crianças e adolescentes.

Resta claro e notório, desta feita, que a concessionária ré desrespeitou não só as normas preventivas da Lei 8.069/90, como também os atos emanados do Ministério da Justiça, o que implica em agressão ao telespectador, em especial, crianças e adolescentes que assistiram ao programa, dando ensejo, por conseguinte, à propositura da presente Ação Civil Pública.

3 – DA CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA DOS PROGRAMAS – INADEQUAÇÃO NO HORÁRIO DE TRANSMISSÃO

Como podemos extrair do artigo 21, inciso XVI, da CF, o constituinte atribuiu à União a competência para exercer a classificação indicativa da programação de rádio e televisão:

“Art. 21.Compete à União:

(…)

XVI – exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programação de rádio e televisão;”

O Ministério da Justiça, órgão da Administração Pública Direta, por meio do Decreto 4.720/2003 (doc.17), recebeu a delegação de exercer a classificação sobre a qual dispõe o artigo constitucional, fazendo-o por meio do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação, que, para dar cumprimento a esta tarefa, emite Portarias.

Tendo isso em vista, quando da entrada em vigor do Estatuto da Criança e do Adolescente, aquele órgão editou a Portaria n.º 796/00 (doc. 17), na qual traçou os critérios para classificar por horário e idade a programação de rádio e televisão:

“Art. 2º. Os programas para emissão de televisão, inclusive “traillers”, têm a seguinte classificação, sendo-lhes terminantemente vedada a exibição em horário diverso do permitido:

I – veiculação em qualquer horário: livre;

II – programa não recomendado para menores de doze anos: inadequado para antes das vinte horas;

III – programa não recomendado para menores de quatorze anos: inadequado para antes das vintes e duas horas;

V – programa não recomendado para menores de dezoito anos: inadequado para antes das vintes e três horas.

Parágrafo único. Os programas de indução de sexo, tais como “tele-sexo” e outros afins, somente poderão ser veiculados entre zero hora e cinco horas.”

(grifamos)

Com vistas a dar cumprimento ao dispositivo legal supra-citado, aos artigos 21, XVI e 220, § 3º, I, ambos da Constituição Federal, e ao artigo 74 da n.º Lei 8.069/90 (ECA), o Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação do Ministério da Justiça classificou o filme “South Park”, os seriados “Mulher Gato”, “The OC”, “Witchblade”, “Fastlane” e “Alias”, bem como o progrma “Ratinho” da seguinte forma:

SOUTH PARK

Portaria n.º 109 de 24/11/2003 (doc.17)

Filme: SOUTH PARK: MAIOR, MELHOR E SEM CORTES (SOUTH PARK: BIGGER, LONGER AND UNCUT, Estados Unidos da América – 1995).

Distribuidor (es): TVSBT Canal 04 de São Paulo S/A

Gênero: Desenho Animado

Veículo: Televisão

Tipo de Análise: Fita VHS

Classificação: Programa não recomendado para menores de 18 anos: Inadequado para antes das vinte e três horas

Impropriedade (s): Temática Adulta, Conflitos Psicológicos e Desvirtuamento de Valores.

Contudo, no dia 30 de janeiro de 2003, a emissora – ré, a despeito do que determina a Portaria n.º 109/03, exibiu o filme em questão às 22h15.


PROGRAMA RATINHO

Portaria n.º 11, de 09 de novembro de 1998, de publicada no Diário Oficial da União no dia 12 de novembro de 1998: classificado como programa não recomendado para menores de 14 anos – inadequado para exibição antes das 21h00 (doc.17).

Contudo, o programa foi exibido por diversas vezes em horário desapropriado, como por exemplo, às 16h30, 17h00, 17h30 e 18h50 (livre).

SERIADO MULHER GATO

Classificação Publicada no Diário Oficial da União no dia 06 de janeiro de 2004 – Portaria n.º 05/01/2004: programa não recomendado para menores de 12 anos – inadequado para exibição antes das 20h00 (doc.17).

A emissora admite, entretanto, ter exibido a série em horário livre.

SERIADO “THE OC – UM ESTRANHO NO PARAÍSO”

Portaria n.º 154 de 16/08/2004, publicada no Diário Oficial da União no dia 17 de agosto de 2004: classificado como inadequado para menores de 14 anos e para exibição antes das 21h00 (doc.17).

A emissora admite ter exibido a série em horário livre.

SERIADO WITCHBLADE

Classificação Publicada no Diário Oficial da União no dia 30 de outubro de 2003 – Portaria n.º 93 de 29/10/2003: programa não recomendado para menores de 14 anos – inadequado para exibição antes das 21h00 (Portaria n.° 93 de 29/10/2003 – doc.17).

A emissora admite ter exibido a série em horário livre.

SERIADO FASTLANE

Classificação Publicada no Diário Oficial da União no dia 01 de agosto de 2003 – Portaria n.º 54 de 31/07/2003: programa não recomendado para menores de 16 anos – inadequado para exibição antes das 22h00 (doc.17).

Contudo, a série era exibida aos domingos, às 9h00 (horário livre). A emissora não quis se manifestar a respeito.

SERIADO ALIAS

Classificação Publicada no Diário Oficial da União no dia 06 de janeiro de 2004: programa não recomendado para menores de 12 anos – inadequado para exibição antes das 20h00 (Portaria n.° 04 de 05/01/2004 – doc. 17).

A emissora admite ter exibido a série em horário livre.

Diante disso, é de fácil e notória conclusão que a Requerida desrespeitou a classificação exarada pelo Ministério da Justiça, infringindo, destarte, dispositivos insertos na Magna Carta, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Portaria n.º 796 do próprio Ministério da Justiça, o que implica em agressão ao telespectador, em especial, crianças e adolescentes que assistiram e continuam a assitir a programas completamente impróprios e inadequados para suas faixas etárias.

Impende ressaltar que a vedação da exibição de determinados conteúdos em horários de televisão normalmente assistidos por crianças e adolescentes não configura nenhuma forma de censura, já que a emissora não está impedida de veiculá-los em horário apropriado, segundo os critérios objetivos fixados pelo órgão federal competente.

III – DO DIREITO

1 – DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O Ministério Público é o órgão ao qual a Constituição Federal incumbiu a guarda dos interesses individuais e coletivos que sejam indisponíveis. Assim, suas funções institucionais estão determinadas naquela Carta Fundamental:

“Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

(…)

II-zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;

III-promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;”

No mesmo sentido dispõem os artigos 1º e 2º da Lei Complementar n.º 75 de 1993:

“Art. 1º O Ministério Público da União, organizado por esta Lei Complementar, é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais e dos interesses individuais indisponíveis”.

“Art. 2º Incumbem ao Ministério Público as medidas necessárias para garantir o respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados pela Constituição Federal”.

Tais normas já demonstram de forma inabalável a legitimação do Parquet para atuar no feito em causa. No entanto, vale acostar ainda dispositivos outros consignados na referida Lei Complementar, in verbis:

“Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público da União:

III – a defesa dos seguintes bens e interesses:

e)os direitos e interesses coletivos, especialmente das comunidades indígenas, da família, da criança, do adolescente e do idoso;

V – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos serviços de relevância pública quanto:


a)aos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às ações e aos serviços de saúde e à educação;”

“Art. 6º Compete ao Ministério Público da União:

VII – promover o inquérito civil e a ação civil pública para:

a) a proteção dos direitos constitucionais;

c) a proteção dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos, relativos às comunidades indígenas, à família, à criança, ao adolescente, ao idoso, às minorias étnicas e ao consumidor;”

Saliente-se, outrossim, que a própria Lei de Ação Civil Pública (nº 7.347/95), em seu artigo 5º, também proclama a legitimidade do Ministério Público para a proteção dos direitos difusos relativos aos cidadãos em geral, a saber:

“Art. 5º. A ação principal e a cautelar poderão ser propostas pelo Ministério Público, pela União, pelos Estados e Municípios. Poderão também ser propostas por autarquia, empresa pública, fundação, sociedade de economia mista ou associação”.

Sem excluir a possibilidade de outros legitimados promoverem a defesa das crianças e adolescentes, estabelece o ECA meios de defesa em complementaridade ao disposto no artigo 220, §3º da CF/88, assim dispondo em seu artigo 201:

“Art. 201. Compete ao Ministério Público:

(…)

V – Promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no artigo 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal;”

De fato, estamos diante de legítimo INTERESSE DIFUSO, como já apontou Barbosa Moreira, em artigo sobre o tema:

“O INTERESSE EM DEFENDER-SE ‘DE PROGRAMAS OU PROGRAMAÇÕES DE RÁDIO E TELEVISÃO QUE CONTRARIEM O DISPOSTO NO ART. 221’ ENQUADRA-SE COM JUSTEZA NO CONCEITO DE INTERESSE DIFUSO. (…) Com efeito: em primeiro lugar, ele se caracteriza, à evidência, como ‘TRANSINDIVIDUAL’, já que não pertence de modo singularizado, a qualquer dos membros da comunidade, senão a um conjunto indeterminado – e, ao menos para fins práticos, indeterminável – de seres humanos. Tais seres ligam-se uns aos outros pela mera circunstância de fato de possuírem aparelhos de televisão ou, na respectiva falta, costumarem valer-se do aparelho do amigo, do vizinho, do namorado, do clube, do bar da esquina ou do salão de barbeiro. E ninguém hesitará em qualificar de INDIVISÍVEL o objeto de semelhante interesse, no sentido de que cada canal, num dado momento, transmite a todos a mesma e única imagem, nem se concebe modificação que se dirija só ao leitor destas linhas ou ao rabiscador delas” .

Isto posto, resta patente a legitimatio ad causam do Órgão Ministerial para a propositura desta ação.

2 – DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

Pensamos que já está esclarecido o motivo da demanda ter sido proposta perante a Justiça Federal: a empresa ré é CONCESSIONÁRIA DE UM SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL, nos termos do art. 21, inciso XII, “a”, c.c. o art. 223 da Constituição.

A propósito, o art. 5º, inciso IV, da Lei Orgânica do Ministério Público da União (Lei Complementar Federal n.º 75/93), confere ao Ministério Público Federal atribuição expressa para “zelar pelo efetivo respeito dos meios de comunicação social aos princípios, garantias, condições, direitos, deveres e vedações previstos na Constituição Federal e na lei, relativos à comunicação social”.

Como o Ministério Público Federal é órgão integrante da União, a ação que propõe em defesa dos usuários do serviço federal concedido deve, necessariamente, ser endereçada à Justiça Federal, consoante dispõe o art. 109, inciso I, da Constituição.

Citamos, em corroboração, os seguintes julgados:

“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. DIRIGENTE DE CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL. PRECEDENTES. 1.Consoante assentado pela eg. 1ª. Seção deste Tribunal, a Justiça Federal É competente para processar e julgar mandado de segurança contra ato de dirigente de concessionária de serviço público federal. 2. Conflito conhecido para declarar competente o juízo federal da 2a. Vara de Niterói-RJ, suscitante.”

“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DE DIRIGENTE DE CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO. FUNÇÃO FEDERAL DELEGADA. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO FEDERAL DA 2ª VARA DE NOVO HAMBURGO-SJ/RS, O SUSCITADO.”

“PROCESSUAL – MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL – PARTE – COMPETÊNCIA – JUSTIÇA FEDERAL.

Se o Ministério Público Federal é parte, a Justiça Federal é competente para conhecer do processo.”

“EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PUBLICA. 1. O Ministério Público é instituição nacional, subordinada aos princípios de unidade, indivisibilidade e independência funcional (CF. art. 127), e compreende o Ministério Público da União e o dos Estados (CF, art. 128). 2. A atuação dos agentes do Ministério Público se dá em forma estruturalmente organizada e mediante repartição de atribuições. 3. É incompatível com os princípios de regência da instituição e do sistema de repartição de atribuições a atuação do Ministério Público Estadual, fora do seu Estado ou fora da jurisdição estadual. 4. Compete ao Ministério Público da União, e não ao do Estado, exercer as funções institucionais do órgão relativas a promoção de ações civis públicas de competência da Justiça Federal.”


Em virtude dos fundamentos ora assinalados, não pairam dúvidas que a lide em testilha deve ser processada e julgada pela Justiça Federal.

3 – DO MÉRITO PROPRIAMENTE DITO

A Constituição da República, ao mesmo tempo em que garantiu a liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (art. 5º, IX), estabeleceu limites ao exercício dessa liberdade, sobretudo quando a expressão é veiculada por intermédio dos meios de comunicação de massa. Tais limites estão indicados nos arts. 220 e 221 da Carta de 1988.

Além disso, o art. 227 da Lei Maior determina ser dever do Estado colocar crianças e adolescentes a salvo de toda forma de violência, sendo certo que a mera exposição de jovens e crianças a cenas de violência excessiva já é, por si só, um ato de violência.

No âmbito infraconstitucional, o Estatuto da Criança e Adolescente (Lei Federal n.º 8.069/90) determina, em seu art. 71, que a criança e o adolescente têm direito a diversões e espetáculos que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

Mais especificamente, no tocante ao objeto desta ação, o mesmo diploma legal estabelece, em seu art. 75, que toda criança ou adolescente terá acesso às diversões classificadas como adequadas à sua faixa etária, bem como, em seu art. 76, que as emissoras de televisão somente exibirão, no horário recomendado para o público infanto-juvenil, programas com finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas.

No mesmo sentido, o art. 74 do Estatuto da Criança e do Adolescente atribui ao Poder Público regular as diversões e espetáculos públicos, informando a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada. Tal regulamentação, por força da Portaria nº 796/2000, editada pelo Ministro da Justiça, compete, consoante já assinalado, ao Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação.

Vejamos:

Art. 74. O poder público, através do órgão competente, regulará as diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostra inadequada.

Parágrafo único. Os responsáveis pelas diversões e espetáculos públicos deverão afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do local de exibição, informação destacada sobre a natureza do espetáculo e a faixa etária especificada no certificado de classificação.

Art. 75. Toda criança ou adolescente terá acesso às diversões e espetáculos públicos classificados como adequados à sua faixa etária.

Parágrafo único. As crianças menores de dez anos somente poderão ingressar e permanecer nos locais de apresentação ou exibição quando acompanhadas dos pais ou responsável.

Art. 76. As emissoras de rádio e televisão somente exibirão, no horário recomendado para o público infanto-juvenil, programas com finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas.

Parágrafo único. Nenhum espetáculo será apresentado ou anunciado sem aviso de sua classificação, antes de sua transmissão, apresentação ou exibição.

Como se sabe, as emissoras de rádio e televisão recebem, obrigatoriamente, certificado de classificação de seus programas, definindo horários de apresentação. Essa informação deve ser repassada ao ouvinte ou telespectador antes da apresentação do programa, já que esses veículos de comunicação entram na casa das pessoas, sem que aos pais seja muitas vezes possível triar aquilo que pode ser assistido ou ouvido por seus filhos.

Se os horários de classificação fossem respeitados, poderiam os responsáveis pelas crianças e adolescentes selecionar a programação, evitando que assistam espetáculos absolutamente desaconselháveis para suas idades.

Cumpre aqui ressaltar que o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 254, penaliza a conduta adotada pela concessionária que não respeitar a classificação indicativa imposta pelo Ministério da Justiça:

Art.254. Transmitir, através de rádio ou televisão, espetáculo em horário diverso do autorizado ou sem aviso de sua classificação:

Pena – multa de vinte a cem salários de referência; duplicada em caso de reincidência a autoridade judiciária poderá determinar a suspensão da programação da emissora por até dois dias.

Ao comentar mencionado artigo, José Luiz Mônaco da Silva assim disserta:

“Segue-se, pois, que a ilicitude da conduta repousa na transmissão, através do rádio ou televisão, de espetáculo: a) em horário diverso do autorizado no certificado de classificação; b) sem aviso de sua classificação. Na primeira hipótese, a emissora transmite espetáculo em desacordo com o certificado de classificação emitido; tal programação, veiculada naquele horário, é completamente inadequada ao público infantil ou juvenil. Já na segunda hipótese, o espetáculo, ainda que adequado a esse público, ressente-se de prévio anúncio atinente à sua classificação.”


De acordo com o dispositivo legal acima citado, criado com o objetivo de evitar a exibição dos programas não recomendáveis ao público infanto-juvenil em horários acessíveis a estes, é PROIBIDA a transmissão, por intermédio de televisão, de espetáculos em horários diversos do autorizado e sem aviso de sua classificação.

A dicção do artigo 76 do ECA é clara: “as emissoras de rádio e televisão somente exibirão, no horário recomendado para o público infanto-juvenil, programas com finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas”

É, portanto, terminantemente vedada a exibição em horário diverso do permitido, fato este não observado pela Requerida quando da exibição dos programas em comento.

Ademais, todo o arcabouço legal em defesa do consumidor, em particular o Código de Defesa do Consumidor, subsume-se inteiramente ao presente caso, visto que os telespectadores caracterizam-se, indubitavelmente, como consumidores dos serviços prestados pelas emissoras de televisão.

Saliente-se, assim, que o diploma legal acima citado estabelece, em seu art. 6º, inciso I, que são direitos do consumidor a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos.

Feitas estas ponderações, resta claro que, ao transmitir programas em horário diverso do estabelecido pela autoridade administrativa, a empresa-ré descumpriu com as obrigações que lhe haviam sido outorgadas pelos diversos dispositivos legais outrora anotados, colocando em risco o desenvolvimento de seus telespectadores infanto-juvenil, pelo que urge a intervenção do Judiciário para fins de coibir tal prática abusiva.

Em relação à influência exercida no desenvolvimento infanto-juvenil por meio da televisão, a própria “Convenção Sobre os Direitos da Criança”, cujo objeto é a proteção moral da infância e da adolescência, prevê expressamente a importância dos meio de comunicação de massa para a formação da personalidade da criança. Ademais, uma pesquisa realizada na Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, diz que a exposição das crianças ao sexo e à violância nos meios de comunicação aumenta a prosmicuidade, bem como intensifica o comportamento agressivo das crianças (doc. 18).

Os experts na área de psicologia infantil, em tom uníssono, apontam para o fato de que o excesso de cenas de violência e de sexo na televisão atuam como fator decisivo nos desvios e abusos sexuais praticados pelos adultos.

Esse público não poderia, portanto, ficar sujeito a programações que não se identificassem com os princípios constitucionais e legais vigentes, quando é sabido que crianças e adolescentes são pessoas em estágio de desenvolvimento sensorial, mental e físico, plenamente capazes de sofrer influências de toda a ordem.

Doutra banda, há que se ter em mente que o cumprimento das obrigações consignadas nos dispositivos ora colacionados não representam qualquer embaraço à liberdade da empresa-ré, visto que a medida reclamada não importa em exclusão dos programas retromencionados da grade de programação da mesma, os quais poderão continuar a ser veiculados, mas no horário adequado.

Nesse sentido, colacionamos o entendimento de Anderson de Oliveira Alarcon e Humberto Quirino:

“Não seria nem razoável nem inteligente pregar a censura ou qualquer medida que tenha essa conotação. As famílias e a sociedade têm, no entanto, o direito de exigir sistemas de controle que evitem distorções de conteúdo e inadequações nos horários de transmissão. Têm também o direito de esperar que as fantásticas potencialidades da televisão não se convertam em elementos de desintegração social. Instalada nos recessos das casas, mostrando instintivamente heróis e vilões – muitas vezes sem promover a diferença entre ambos – exibindo sexo e violência com intensidade e freqüência, a televisão de transformou em algo que já não pode ser ignorado. É um veículo muito importante para que seu conteúdo fique apenas sob a responsabilidade das empresas que a exploram, seja do poder que a coordena, seja do arbítrio dos milhões de crianças, que são suas usuárias”. (grifamos)

Abrindo um parênteses, impende, a essa altura, transcrever valiosos trechos do artigo “Ação Civil Pública e Programação da TV”, do brilhante Professor JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA, o qual serve de fundamento à presente causa, no que diz respeito à extensão do pedido em questão e à impossibilidade de se argumentar no sentido de que eventual atuação jurisdicional aqui caracterizaria censura aos meios de comunicação:

“Se é certo, como se mostrou acima, que encontra lugar entre os interesses difusos o dirigido à observância, pelas emissoras de televisão, dos preceitos constantes do art. 221 da Lei Maior, segue-se, em lógica elementar, que a ação civil pública, disciplinada na Lei 7.347, é instrumento adequado à vindicação de semelhante interesse em juízo. Ela constitui, sem discussão possível, um dos “meios legais” que, de acordo com o art. 220, § 3o, n. III, devem garantir “à pessoa e à família que contrariem o disposto no art. 221”; isto é: que não dêem a indispensável preeminência a “finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas”, ou que não respeitem os “valores éticos e sociais da pessoa e da família” – para só nos referirmos aos princípios (que aqui mais nos instruem) dos incs. I e IV.


(…)

A Lei 7.347, em seu art. 3o, aduz que: “A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”. Significa isso que, procedente o pedido, tem o órgão judicial a possibilidade de proibir a exibição do programa incompatível com a Constituição, e bem assim, em termos gerais, a de impor à emissora que adapte sua programação às diretrizes do art. 221. Atente-se, ao propósito, no art. 11 da Lei 7.347: “Na ação que tenha por objeto o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor” (cf. o art. 213 e seu § 2o do Estatuto da Criança e do Adolescente).

(…)

Ademais, por força da remissão do art. 21 do Titulo III do Código de Defesa do Consumidor, incidem as disposições do respectivo art. 84, de resto incorporadas recentemente ao Código de Processo Civil: pode o juiz, por exemplo, aplicar multa à emissora, ou determinar medidas como busca e apreensão ou impedimento da atividade nociva, inclusive mediante requisição de força policial (Lei 8.078, art. 84, §§ 4o e 5o).

(…)

No assunto de que se trata, porém, a questão está resolvida a priori pela Constituição mesma, que, bem ou mal, optou, e cuja opção é vinculativa para a comunidade nacional. À vista do art. 221, há um tipo de interesse difuso julgado merecedor de tutela jurídica, à qual não pode aspirar, de seu lado, o interesse que se lhe contrapõe. Quem quiser dar pasto ao sadismo, ao voyeurismo ou à pura e simples “grossura” dispõe naturalmente da possibilidade de recorrer, dentro de certos limites,.a outros meios, que não é este o lugar próprio para relacionar; não tem como exigir, todavia, que o satisfaçam por intermédio da telinha. Seria absurdo que o ordenamento jurídico viesse a proteger, de alguma forma, pretensão avessa aos seus próprios ditames.

(…)

A outra objeção previsível usará como ponto de apoio a disposição constitucional que veda “toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística” (art. 220, § 2o). Daí certamente quererá alguém tirar que não é lícito à autoridade alguma interferir na programação da TV, seja para proibir tal ou qual exibição, seja – de maneira mais geral – para forçá-la a obedecer a tais ou quais parâmetros, como os fixados no art. 221. Demonstra-se com facilidade a incorreção desse entendimento.

Conforme oportunamente ressaltado (supra n. 2), o § 2o do art. 220 integra amplo conjunto de disposições atinentes, de modo direto ou indireto, à atividade dos meios de comunicação social. Para bem avaliar-lhe o significado e o alcance, é mister levar em conta todos os outros textos correlatos. Há séculos se sabe que “incivile est, nisi tota lege perspecta uma particula eius posita, iudicare vel respondere”. Não é por acaso que o art. 220, caput, contém a expressa ressalva “observado o disposto nesta Constituição”. Já se indicaram acima ilações óbvias dessa cláusula final. A liberdade de criação artística e de difusão de idéias e conhecimentos não é absoluta; obrigatoriamente há de respeitar outras liberdades e direitos também consagrados na Lei Maior. Aliás, nenhuma liberdade é, nem pode ser, absoluta: o ordenamento jurídico constitui, tem de constituir sempre, a expressão de um compromisso entre solicitações divergentes de proteção a valores suscetíveis de contrapor-se uns aos outros. A interpretação de qualquer lei, e com relevo particular a da Constituição, há de atender a essa contingência básica.

Ora, uma vez que outras liberdades e direitos devem ser preservados, é forçoso admitir alguma sorte de controle sobre as transmissões eventualmente capazes de lesá-los. Se os órgãos administrativos têm limitado seu âmbito de ação, no particular, pela proibição da censura, cumpre assegurar aos titulares daquelas liberdades e direitos (e a outros legitimados por força de norma constitucional ou legal) a utilização de meios aptos à respectiva (e eficaz) defesa, toda vez que alguma liberdade ou direito protegido seja objeto de violação, atual ou iminente, imputável a qualquer transmissão pela TV. Semelhante possibilidade tem de conviver – e na verdade convive -, no sistema constitucional brasileiro, com a vedação da censura, sem que a ninguém aproveite invocar esta vedação para contestar aquela possibilidade. Acrescente-se que isso se aplica indiferente aos direitos individuais e aos direitos coletivos, a que a Carta de 1988 deu, em boa hora, tão grande realce.”

Lamentável, portanto, que a concessionária de serviço público SBT não esteja cumprindo suas funções sociais. Como está sujeita às normas estipuladas pelo artigo 221 da Carta Magna, deveria dar preferência a programações que promovam a educação e a cultura, além de respeitar e primar pelos valores éticos e sociais da pessoa e da família, a serem observados por meio dos direitos fundamentais.


4 – DO DANO MORAL COLETIVO CAUSADO AOS TELESPECTADORES

Observadas as irregularidades praticadas pela concessionária-ré, resta clara sua responsabilização por danos morais causados à sociedade, em especial às crianças e adolescentes que tiveram contato com os programas exibidos em horários não recomendados pelo Ministério da Justiça.

Ora, com efeito os fatos objeto desta ação revestem-se de gravidade, coonestando com as mais abjetas condutas de que pode ser vítima uma sociedade. Como já exaustivamente demonstrado, a exibição de filmes ou programas em horário diverso daquele estabelecido pelo Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação pode causar imensos prejuízos à saúde mental e psíquica do público infanto-juvenil, refletindo em suas condutas futuras, de modo a atingir a sociedade como um todo. Tal violação corresponde a dano moral coletivo que exige reparação.

É de se notar que a exibição de programação indevida por canal de televisão atinge indiscutivelmente o interesse difuso. Barbosa Moreira, com sua peculiar clareza, lembra que

“ao interesse em que se observem os mandamentos do art. 221 da Lei Maior ajusta-se como luva a qualificação de difuso. Com efeito: em primeiro lugar, ele se caracteriza, à evidência, como ‘transindividual’, já que não pertence, de modo singularizado, a qualquer dos membros da comunidade, senão a um conjunto indeterminado – e, ao menos para fins práticos, indeterminável – de seres humanos. Tais seres ligam-se uns aos outros pela mera circunstância de fato de possuírem aparelhos de televisão ou, na respectiva falta, costumarem valer-se do aparelho do amigo, do vizinho, do namorado, do clube, do bar da esquina ou do salão do barbeiro. E ninguém exitara em qualificar de indivisível o objeto de semelhante interesse, no sentido de que cada canal, num dado momento, transmite a todos a mesma e única imagem.”

E, em sentido difuso, o dano causado pela exibição de programação em horário indevido por emissora de televisão sujeita-se à reparação por meio da Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/95, art. 1º, IV).

Estando, pois, caracterizada na espécie o conteúdo irregular (ou melhor, inconstitucional) da programação exibida pela emissora – ré, não há como deixar de reconhecer que os telespectadores foram lesionados, havendo, sem dúvida, um dano moral consumado a ser reparado.

Ressalte-se que, para efeitos de indenização por danos morais, basta a demonstração do fato que deu origem ao dano, o que a presente ação já logrará, por si própria, realizar.

Nesse diapasão, colacionamos as seguintes jurisprudências:

“EMENTA: “Indenização de direito comum. Dano moral. Prova. Juros moratórios. Súmula n.º 54 desta Corte.

1 – Não há que falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. Provado assim o fato, impõe-se a condenação, sob pena de violação ao art. 334 do Código de Processo Civil.

2 – Na forma da Súmula n.º 54 da Corte, os juros moratórios nestes casos contam-se da data do evento.

3 – Recurso especial conhecido e provido, em parte. (STJ, RESP n.º 86.271 – SP, Terceira Turma, Rel. em. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 09/12/97)

A doutrina também respalda a tese aqui defendida. Serve como exemplo o entendimento do estudioso Carlos Alberto Bittar Filho:

“(…) chega-se a conclusão de que o dano moral coletivo é a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância , que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial.”

Vale destacar, ainda, o ensinamento do Procurador da República André de Carvalho Ramos, que, em análise ao dano moral coletivo, disserta:

“Assim, é preciso sempre enfatizar o imenso dano moral coletivo causado pelas agressões aos interesses transindividuais. Afeta-se a boa-imagem da proteção legal a estes direitos e afeta-se a tranqüilidade do cidadão, que se vê em verdadeira selva, onde a lei do mais forte impera.”

Continua o citado autor, dizendo:

“Tal intranqüilidade e sentimento de desapreço gerado pelos danos coletivos, justamente por serem indivisíveis, acarretam lesão moral que também deve ser reparada coletivamente. Ou será que alguém duvida que o cidadão brasileiro, a cada notícia de lesão a seus direitos não se vê desprestigiado e ofendido no seu sentimento de pertencer a uma comunidade séria, onde as leis são cumpridas? A expressão popular ‘o Brasil é assim mesmo’ deveria sensibilizar todos os operadores do Direito sobre a urgência na reparação do dano moral coletivo.”


Não há que se afastar a responsabilidade da Ré face ao suficientemente demonstrado menosprezo com que tratam o cidadão, visto que, em lugar de preservarem direitos e garantias fundamentais conferidos pela Constituição, findam por cooperar, ainda que involuntariamente, com o aumento da criminalidade em nosso país.

Urge por todo o aduzido, assim, a responsabilização da Ré por atentar contra a moral coletiva, sendo arbitrada indenização como medida reparatória pela ilicitude atacada por esta ação.

Essa prática se caracteriza como dano moral difuso, expressamente defeso pela Lei 7.347/85, como bem se lê em seu art. 1º:

“Art. 1º – Regem-se pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

I – ao meio ambiente;

II – ao consumidor;

III – aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;(…)” (grifamos)

O instrumento adequado para a proteção desses direitos metaindividuais é, portanto, sem nenhuma dúvida, a ação civil pública, regulada pelas Leis n.º 7.347/85, 8.069/90 e 8.078/90.

Por essas razões, entende o Ministério Público Federal que é mais do que razoável a FIXAÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COLETIVOS NO VALOR DE 8.000.000,00 (oito milhões de reais), O EQUIVALENTE A 1% DO FATURAMENTO BRUTO DA EMPRESA PARA O ANO DE 2006.

5. DA NECESSÁRIA EXTENSÃO DO PEDIDO A TODO TERRITÓRIO NACIONAL

A presente causa tem por alicerce todo um arcabouço legal, como salientado, que pressupõe atuação administrativa por parte do Ministério da Justiça, o que vem sendo realizado de forma exemplar. Ocorre que, o órgão administrativo referido exara a classificação mencionada com validade em todo o território nacional.

Por isso que, os efeitos da decisão de concessão do presente pedido devem alcançar todos os Estados em que ocorra a veiculação dos programas em comento, sob pena de se criar uma situação insustentável, qual seja, a declaração de que tal transmissão é inadequada para o Estado de São Paulo, e, ao mesmo tempo, adequada para os demais entes federados.

Além do que, em situações análogas, mais especificamente em casos de produtos que se revelem nocivos, nosso ordenamento jurídico (art. 102 do Código de Defesa do Consumidor), prevê a possibilidade de ajuizamento de ações que visem compelir o Poder Público competente a proibir, em todo o território nacional, a produção, divulgação, a distribuição ou venda deste produto, razão mais que suficiente para, por analogia, aplicar a extensão pretendida. In litteris:

“Art. 102. Os legitimados a agir na forma deste Código poderão propor ação visando compelir o Poder Público competente a proibir, em todo o território nacional, a produção, divulgação, distribuição ou venda, ou a determinar alteração na composição, estrutura, fórmula ou acondicionamento de produto, cujo uso ou consumo se revele nocivo ou perigoso à saúde pública e à incolumidade pessoal.”

Poder-se-ia argumentar no sentido de que o art. 16, da Lei 7.347/85 (LACP), com a redação que lhe foi dada pela Lei 9494, não permitiria tal entendimento.

No intuito de demonstrar a fragilidade de tal argumentação, transcrevemos trechos de excelente artigo, no qual a Professora Ada Pellegrini Grinover, comentando a alteração em tela na LACP, demonstra a inaplicabilidade da mesma ao caso:

“Limitar a abrangência da coisa nas ações civis públicas significa multiplicar demandas, o que, de um lado contraria toda a filosofia dos processos coletivos, destinados justamente a resolver molecularmente os conflitos de interesses, ao invés de atomizá-los e pulverizá-los; e de outro lado, contribui para a multiplicação de processos , a sobrecarregarem os tribunais, exigindo múltiplas respostas jurisdicionais quando uma só poderia ser suficiente. No momento em que o sistema brasileiro busca saídas até nos precedentes vinculantes, o menos que se pode dizer do esforço redutivo do Executivo é que vai na contramão da história.

Em segundo lugar, pecou pela incompetência. Desconhecendo a interação entre a Lei da Ação Civil Pública e o Código de Defesa do Consumidor, assim como muitos dos dispositivos deste, acreditou que seria suficiente modificar o art. 16 da Lei nº 7.347/85 para resolver o problema. No que se enganou redondamente. Na verdade, o acréscimo introduzido ao art. 16 da LACP é ineficaz.

DA TUTELA ANTECIPADA

A tutela antecipada, necessidade do pleno exercício do direito de ação, em prol da defesa de toda e qualquer ameaça ou lesão a direito, está estatuída no artigo 273 do Código de Processo Civil e no artigo 84, § 3º, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor.


Seus requisitos são a verossimilhança das alegações constantes na inicial, a partir de prova inequívoca, e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Visa a tutela antecipada a garantir o resultado efetivo do provimento jurisdicional.

A antecipação dos efeitos da tutela é de particular necessidade nas ações relativas à defesa do cidadão, as quais exigem celeridade e efetividade processuais como condições para o resguardo de seus direitos.

A presente ação possui como objeto obrigações de não fazer, sendo de tal forma aplicável, por analogia, o artigo 84 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, assim como seus respectivos parágrafos:

“Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento.

(…)

§ 3º- Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.”

À evidência, estão plenamente configuradas na ação em cotejo os requisitos para a concessão da tutela antecipada. De fato, questiona a mesma três pontos essenciais: a) a veiculação de filme, programas e seriados pela emissora de televisão SBT em horários totalmente inadequados; b) a exposição dos telespectadores, em sua maioria, crianças e adolescentes, ao nefasto material exibido; c) a classificação exarada pelo órgão governamental encarregado de promover a fiscalização dos mencionados produtos não tem sido obedecida.

Resta inexorável, desta feita, que a ausência da tutela antecipada seria causa da realização de danos em uma amplitude indeterminada, lesando toda uma massa de cidadãos telespectadores. A fim de resguardar a proteção destes, constitucionalmente determinada, há que se obstar, desde já, a produção de tais danos, compelindo-se a empresa-ré a transmitir toda a sua grade de programação apenas no horário de classificação determinado pelo Ministério da Justiça.

Em face da fundamentação acima expendida, diante da relevância do fundamento da demanda e considerando os sérios prejuízos impostos às crianças e adolescentes em decorrência da exibição irregular de alguns programas como os ora citados nesta exordial, sendo totalmente temerário o aguardo de decisão final para o cumprimento da obrigação que resulta cristalina das normas já explicitadas, requer o Ministério Público Federal seja concedida, inaudita altera pars, a antecipação dos efeitos da tutela, compelindo-se a concessionária-ré à obrigação de não-fazer, consistente na obrigação de não mais transmitir (imediatamente após a notificação do teor da decisão antecipatória) os programas, seriados e filmes de sua programação em desacordo com a classificação exarada pelo Ministério da Justiça, sob pena de ser imposta multa cominatória, no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), para cada exibição contrária ao horário estabelecido por aquele órgão, a qual se reverterá ao Fundo de que trata a Lei n.º 8.242, de 12 de outubro de 1991, em seu art. 6º – Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente.

DO PEDIDO

Em face de todo o exposto, o Ministério Público Federal requer:

seja deferida tutela antecipada inaudita altera pars, para fins de coibir a Ré de veicular qualquer programa constante de sua grade em desacordo com o horário estabelecido pelo Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação do Ministério da Justiça, sob pena de multa cominatória no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por cada veiculação irregular, a ser revertida ao Fundo de que trata a Lei n.º 8.242, de 12 de outubro de 1991, em seu art. 6º – Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente;

a citação pessoal da Requerida para responder aos termos da presente ação, assim como para, querendo, contestá-la, no prazo legal, sob pena de revelia (artigos 285, 297 e 319 do Código de Processo Civil).

a intimação da União, para querendo, habilitar-se como litisconsorte ativo. Em caso de recusa, fica requerida, desde já, sua citação para compor o pólo passivo desta demanda;

no caso de descumprimento da decisão, seja determinada a suspensão, por dois dias, da programação da emissora-ré que der causa à infringência, nos termos estatuídos no art. 254 da Lei 8.069/90, uma vez que sobejamente comprovada a reincidência referida naquele artigo;

seja condenada a Ré TVSBT a indenizar os danos morais causados ao interesse difuso, decorrentes da exibição inadequada da programação, em desacordo com o horário estabelecido pelo Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação do Ministério da Justiça, mediante recolhimento, ao fundo previsto no art. 6º da lei n.º 8242/91, da importância equivalente ao valor de R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais).

Requer, também, seja o Ministério Público Federal intimado pessoalmente dos atos processuais no seguinte endereço: rua Peixoto Gomide nº 768, Cerqueira César, Capital. Protesta, ainda, se assim for necessário, provar o alegado pela produção de todas provas admitidas em Direito, sem exceção.

Atribui-se à presente Ação Civil Pública o valor de R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais).

Termos em que,

Pede deferimento

ADRIANA DA SILVA FERNANDES

Procuradora da República

SERGIO GARDENGHI SUIAMA

Procurador da República

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