Na ponta da linha

Gravações revelam tráfico de influência feito por delegado

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25 de julho de 2006, 12h06

O Ministério Público Federal deve denunciar o delegado André Di Rissio, preso há quase um mês sob a acusação de liberação ilegal de cargas no aeroporto de Viracopos, em Campinas, também por tráfico de influência. As informações são do Jornal Nacional.

Reportagem do noticiário da TV Globo revelou diálogos em que o presidente da Associação dos Delegados de São Paulo, por meio de telefonemas, libertava presos, abortava operações policiais e alterava o rumo de processos judiciais. Numa das ligações gravadas, um advogado pede ajuda para um cliente alvo de uma blitz.

Advogado — Diz que tão levando todo o estoque de bebidas deles lá.

André Di Rissio — Estão apreendendo o estoque de bebidas? Peraí…

Segundo as investigações, Di Rissio falou com um delegado do Deic. Minutos depois, veio a resposta:

André Di Rissio — Você quer a má ou a boa notícia?

Advogado — A má primeiro.

André Di Rissio — A diligência tá legalizada. A boa é que eu liguei pro delegado. Acabou, é zero a zero. Tá abortada a operação.

De acordo com o JN, uma semana antes, dentro de um carro da Polícia, um acusado de sonegar imposto recebeu uma ligação.

André Di Rissio — Você está sendo levado pro Deic por quem? Quem tá aí com você?

Preso — É o investigador de polícia.

André Di Rissio — Deixa eu falar com ele. Um momentinho, por favor. Alô, aqui é o Dr. André Di Rissio, da delegacia geral. Tá muito ruim a situação aí?

Investigador — Não, doutor, nada de horrível, não.

André Di Rissio — Tá bom. Você resolve pra mim?

Investigador — Com certeza doutor.

O MPF sustenta que o caso não foi registrado no Deic. O delegado avisou Di Rissio que o acusado estava solto.

Delegado — Deixa eu te falar, aquilo lá eu tô mandando embora tá?

André Di Rissio — Te agradeço. Fico te devendo um almoço.

Influência na Justiça

As investigações do Ministério Público Federal apontam que André de Rissio tinha influência no Judiciário. Filho do desembargador Eduardo Di Rissio Barbosa, do Tribunal de Justiça de São Paulo, o delegado, segundo os procuradores, recorria ao pai para beneficiar amigos que tinham pendência na Justiça.

O advogado Luiz Silvio Moreira Salata é um dos que receberam ajuda, segundo as investigações. A Prefeitura de Olímpia, no interior de São Paulo, teria contratado o advogado sem licitação e isso foi contestado numa ação popular.

“O Salata pediu um negócio e eu falei a ele que a Câmara que tinha caído era de um colega do qual eu não tinha acesso, mas ia tentar através de outro colega. Aí eu conversei com o Laureli. O Laureli conversou lá fazendo aquele meio de campo, foi julgado trancando a ação”, afirmou o desembargador Eduardo Di Rissio Barbosa em telefonema ao filho.

Ainda de acordo com o JN, a decisão judicial tomada pelo desembargador Láercio Laureli no dia 15 de setembro de 2005 confirma a ordem de trancar a ação penal contra Luiz Silvio Moreira Salata. Laureli já se aposentou.

Depois de publicada a decisão, o desembargador Eduardo Di Rissio Barbosa ligou para o filho e pediu para ele anotar um telefone.

Desembargador Eduardo Di Rissio — Esse telefone é do Laércio Laurelli. Eu tinha interesse em que o Salata soubesse que ele fez o meio de campo.

André Di Rissio — Pai, você vive me alertando pra não falar por telefone. Depois de velho eu tenho que ficar preocupado contigo. Você já falou isso. Vai contar de novo a história? Vou pedir pro Salata ligar pra ele pra agradecer, agora pelo amor de Deus fique mais inteligente. Você não vê que a bruxa tá solta aí?

Desembargador Eduardo Di Rissio — Não se preocupe comigo que eu sou vitalício.

André Di Rissio — A única coisa vitalícia que você tem é a sua mulher.

A reportagem do Jornal Nacional afirmou que o advogado do delegado André Di Rissio não quis comentar o caso. Disse que não conhece o teor das investigações. No Tribunal de Justiça, a secretária do desembargador Eduardo Di Rissio Barbosa informou que ele não poderia falar porque tinha um exame médico marcado.

O desembargador aposentado Laércio Laurelli negou ter influenciado na decisão que trancou a ação penal. O advogado Luiz Silvio Moreira Salata afirmou desconhecer interferência de juízes no processo contra ele. O Departamento Estadual de Investigações Criminais, o Deic, nega que o delegado Di Rissio exercesse qualquer influência nas operações.

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