Invasão do Congresso

Pastoral da Terra apóia liberação de invasores do Congresso

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20 de julho de 2006, 18h05

A Comissão Pastoral da Terra divulgou carta nesta quinta-feira (20/7) de apoio à decisão da Justiça Federal que mandou libertar 42 sem terra presos depois da invasão do Congresso Nacional. Na Carta, assinada pelo presidente da entidade, Xavier Gilles, a CPT repudia a posição do Ministério Público Federal que em nota questionou a decisão da Justiça Federal. A CPT é uma entidade da igreja católica que atua no meio rural.

Em sua nota o Ministério Público afirma “que passa a ter grande preocupação quanto à efetividade e à tramitação do processo, pois a maior parte dos denunciados não comprovou possuir residência fixa nem ocupação lícita, e prevê grandes dificuldades para citá-los e intimá-los”.

Segundo o advogado dos sem terra, Patrick Mariano Gomes, a preocupação do MPF quanto à residência dos denunciados não procede: “Instruímos o pedido de liberdade provisória com cópias de contas de água e energia, carteiras de trabalho, bem como de declarações de autoridades das mais diversas localidades onde os trabalhadores residem”.

Afirma ainda que “todos os indiciados são primários, possuem advogados constituídos, são trabalhadores e trabalhadoras rurais que querem responder, caso venha a ser recebida, a denúncia ofertada pelos Procuradores para demonstrar, com o devido processo legal, suas inocências”.

Em sua nota a CPT diz que o fato de residirem em acampamentos e assentamentos não significa que os sem terra não tenham endereço certo. Sem entrar no mérito da ação dos integrantes do MLST que invadiram e depredaram instalações do Congresso a CPT sustenta sua na suposta situação de penúria dos manifestantes: “Por que os sem terra, os assentados, os pequenos agricultores, os pobres não podem responder em liberdade aos processos em que são denunciados? Um acampamento, um assentamento, uma área rural não é endereço certo? A condição de sem-terra, em busca do direito ao trabalho e à terra não é atividade lícita?”

Compara também os prejuizos causados pela ação dos sem terra – de R$ 106 mil segundo a carta — com os desfalques proporcionados por mensaleiros, sanguessugas e outros personagens de escândalos políticos: “Valor irrisório se for comparado com os valores envolvidos no escândalo das ambulâncias superfaturadas, tornado público pela “operação sanguessuga”. sem perspectiva de qualquer punição e de outros escândalos já conhecidos, sem falar dos que não são divulgados”.

Leia a carta da CPT aos procuradores do MPF

Ex.ma Senhora Lívia Nascimento Tinoco

Ex.mo Senhor Gustavo Pessanha Velloso

Ex.mo Senhor José Robalinho Cavalcanti

Ex.mo Senhor Vinicius Fernando Alves Fermino

Ex.mo Senhor Valtan T. Martins Mendes Furtado

DD. Procuradores da República

Excelentíssimos senhores e senhora Procuradores da República

Neste País em que a credibilidade das instituições públicas é tão pequena e, em certos casos quase nula, o Ministério Público sobressai por ser uma instituição em que ainda se pode confiar e que tem atuado muitas e muitas vezes na defesa dos direitos dos cidadãos, como é sua obrigação. Nós também apreciamos muito a atuação do Ministério Público e sentimos que é a porta de entrada para que o direito, sobretudo dos mais humildes, ainda possa ser garantido.

Por causa disto estranhamos muito, ao abrir os jornais de ontem, 18, a nota divulgada por V. Excias. contra a decisão da justiça de conceder liberdade provisória aos denunciados no caso da invasão do MLST à Câmara dos Deputados.

Por que os sem terra, os assentados, os pequenos agricultores, os pobres não podem responder em liberdade aos processos em que são denunciados? Um acampamento, um assentamento, uma área rural não é endereço certo? A condição de sem-terra, em busca do direito ao trabalho e à terra não é atividade lícita?

Com sua nota, senhores procuradores e senhora procuradora, o Ministério Público corrobora o que é por todos sobejamente sabido: a justiça funciona para os ricos. A estes, todos os benefícios da lei são concedidos. Estes podem ficar em liberdade mesmo que já tenham sido condenados e representem sério perigo para a sociedade e as instituições. Por que o Coronel Pantoja e o Major Oliveira, já condenados pelo massacre de Eldorado de Carajás, podem aguardar em liberdade? Por que o empresário Regivaldo Pereira Galvão, denunciado por fazer parte do consórcio que decidiu pela morte de Irmã Dorothy Stang, pode estar em liberdade? Por que Norberto Mânica, acusado de ser o mandante do assassinato dos fiscais do Ministério do Trabalho podia estar em liberdade? Realmente, como se diz popularmente com muita verdade, cadeia ficou para os pobres, os desempregados, os sem-terra.

O Ministério Público, no caso dos militantes do MLST, atua em defesa do patrimônio público, que é uma de suas atribuições. Mas quantos e quantos empresários e políticos deste País não dilapidam diariamente o patrimônio da nação sem que ninguém os denuncie! Segundo o que foi divulgado a depredação na Câmara dos Deputados representou um prejuízo de R$ 106.500,00 aos cofres públicos. Valor irrisório se for comparado com os valores envolvidos no escândalo das ambulâncias superfaturadas, tornado público pela “operação sanguessuga”. sem perspectiva de qualquer punição e de outros escândalos já conhecidos, sem falar dos que não são divulgados.

Mas o que nos causa mais estranheza, e isso por acreditarmos e confiarmos no Ministério Público, é o fato destes militantes, praticamente todos pobres ou muito pobres, terem sido denunciados como incursos na Lei de Segurança Nacional. É possível que em plena democracia se lance mão dos instrumentos da ditadura? Que outros o fizessem era até compreensível, mas não em se tratando do Ministério Público. Em sã consciência V. Excias. acreditam mesmo que este pequeno grupo de sem-terra pode representar um perigo à Segurança Nacional? E aqui nossa estranheza se transforma em indignação. Perigo à Segurança Nacional mesmo representam membros dos poderes constituídos, políticos, empresários que diariamente agridem a consciência nacional com o desvio de recursos públicos, com o apoio aos grandes conglomerados econômicos que outra coisa não querem em nosso país do que extrair daqui nossas riquezas.

Perdoem-nos, senhores e senhora procuradores, mas não podemos ficar calados diante deste

posicionamento de V. Excias.

Goiânia, 19 de julho de 2006

Dom Xavier Gilles

Presidente da Comissão Pastoral da Terra

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