Operação sanguessuga

STF autoriza abertura de 42 inquéritos contra sanguessugas

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18 de julho de 2006, 21h51

O presidente em exercício do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, autorizou nesta terça-feira (18/7) a abertura de inquéritos contra 42 parlamentares suspeitos de envolvimento com a máfia das ambulâncias. O ministro deferiu o pedido da Procuradoria-Geral da República para dar prosseguimento à investigação. A Polícia Federal deu início às investigações em maio deste ano na denominada Operação Sanguessuga. Com essa decisão, o número de parlamentares sob suspeita de envolvimento subiu para 57.

O ministro pede a remessa dos autos ao diretor da Polícia Federal, e determina que em 30 dias seja colhido o depoimento de todos os parlamentares envolvidos e das demais pessoas citadas como intermediárias no esquema. Gilmar Mendes ainda requereu a identificação dos assessores dos parlamentares envolvidos com os fatos em apuração e a tomada de depoimento de todos eles.

Por fim, o ministro deferiu o pedido do Ministério Público nos estritos termos em que foi formulado, para se “apurar a ocorrência ou não das supostas práticas criminosas que eventualmente venham a ser imputadas aos investigados”.

Os 42 inquéritos permanecem em segredo de justiça para garantir a eficácia da investigação. Cabe ao Supremo, a partir de agora, analisar as diligências requisitadas pelo Ministério Público Federal que necessitem de autorização judicial.

A Polícia Federal também continua conduzindo as investigações relativas aos outros 15 inquéritos contra parlamentares que tramitam no Supremo. A autorização para a instauração dos 15 inquéritos foi deferida por Gilmar Mendes no dia 5 de junho.

Cópias à CPMI

O ministro Gilmar Mendes também autorizou que a CPMI dos Sanguessugas, que apura a aquisição fraudulenta de insumos estratégicos para a saúde, tenha acesso às cópias dos autos dos inquéritos contra 42 parlamentares.

Gilmar Mendes observa que a análise das cópias dos inquéritos deve ser restrinjida à CPMI, “a qual deverá adotar rígidas providências para que seu conteúdo não seja indevidamente divulgado”.

No dia 30 de junho, o ministro já havia decidido remeter, também para a CPMI dos Sanguessugas, cópia de outros 15 inquéritos contra parlamentares que tramitam na Corte.

Leia a íntegra da decisão:

INQUÉRITO 2.337-0 MATO GROSSO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES

AUTOR(A/S)(ES) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

DECISÃO: Na Petição no 93.291/2006 (Ofício no 089/06), o Presidente da “Comissão Parlamentar Mista de Inquérito das Ambulâncias” (“CPMI das Ambulâncias”), Deputado Federal Antônio Carlos Biscaia, pleiteia, verbis:

“Na qualidade de Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, criada pelo Requerimento n.° 77, de 2006, com a finalidade de apurar as denúncias envolvendo a ‘Operação Sanguessuga’, realizada pela Polícia Federal, para investigar quadrilha que atuava na aquisição fraudulenta de insumos estratégicos para a saúde, e em conformidade com o artigo 58 da Constituição Federal e 148 do Regimento Interno do Senado Federal combinado com o artigo 2° da Lei 1.579/52, solicito a Vossa Excelência, cópia dos 42 (quarenta e dois) inquéritos e dos respectivos pedidos de instauração para investigar parlamentares, com relação à denominada ‘Operação Sanguessuga’.

Por oportuno, informo que haverá manutenção de sigilo sobre os documentos e dados fornecidos.” A partir da interpretação do art. 58, § 3o, da Constituição, a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é pacífica ao admitir, inclusive, a possibilidade de decretação de quebra de sigilo promovida por comissões parlamentares de inquérito. Nesses casos, exige-se, entretanto, que a referida decretação apresente fundamentação idônea, ainda que sucinta, nos termos do art. 93, IX, da CF.

Ademais, é necessário que a fundamentação de eventual quebra de sigilo seja compatível com o objeto que tenha ensejado a instauração da Comissão Parlamentar em questão (Cf., entre outros: MS no 23.669/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 17.04.2000; MS no 24.750/DF, DJ de 02.02.2004, e MS no 24.751/DF, DJ de 02.02.2004, ambos de minha relatoria).

Em princípio, em que pese o caráter sigiloso da tramitação destes autos, observo relação de pertinência entre os motivos que ensejaram a instauração da “CPMI das Ambulâncias” e as investigações policiais na denominada “Operação Sanguessuga”.

Nestes termos, não obstante os Inquéritos nos 2.337/DF a 2.378/DF, tramitarem sob segredo de justiça, autorizo a entrega de cópias dos respectivos autos ao Presidente da “Comissão Parlamentar Mista de Inquérito das Ambulâncias”, o Deputado Federal Antônio Carlos Biscaia.

No entanto, esclareço que, de acordo com jurisprudência firmada nesta Corte Suprema (Cf., nesse sentido, o HC nº 87.827/RJ, Primeira Turma, julgado em 25.04.2006, DJ de 23.06.2006), o acesso aos autos, em circunstâncias similares às condições ora em apreço, deve se restringir tão-somente aos documentos cujas diligências foram concluídas.

Contudo, embora este Tribunal reconheça a possibilidade de acesso a dados e documentos relativos a inquéritos sigilosos nessa estrita hipótese referida, a “CPMI das Ambulâncias” está igualmente adstrita ao dever de sigilo quanto às informações obtidas. Nesse particular, é válido mencionar o seguinte trecho de decisão monocrática, de lavra do Min. Celso de Mello, proferida em sede de medida cautelar no MS no 25.617-DF, DJ de 03.11.2005, verbis:

“Cabe advertir, no entanto, como já proclamou a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sob a égide da vigente Constituição, a propósito do inquérito policial (que também é conduzido de maneira unilateral, tal como ocorre com a investigação parlamentar), que a unilateralidade desse procedimento investigatório não confere ao Estado o poder de agir arbitrariamente em relação ao indiciado e às testemunhas, negando-lhes, abusivamente, determinados direitos e certas garantias – como a prerrogativa contra a auto-incriminação – que derivam do texto constitucional ou de preceitos inscritos em diplomas legais: ‘INQUÉRITO POLICIAL – UNILATERALIDADE – A SITUAÇÃO JURÍDICA DO INDICIADO. – O inquérito policial, que constitui instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado a subsidiar a atuação persecutória do Ministério Público, que é – enquanto dominus litis – o verdadeiro destinatário das diligências executadas pela Polícia Judiciária. A unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações. O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial.’ (RTJ 168/896, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Torna-se evidente, portanto, que a unilateralidade da investigação parlamentar – à semelhança do que ocorre com o próprio inquérito policial – não tem o condão de abolir os direitos, de derrogar as garantias, de suprimir as liberdades ou de conferir, à autoridade pública, poderes absolutos na produção da prova e na pesquisa dos fatos.

É por essa razão que, embora amplos, os poderes das Comissões Parlamentares de Inquérito não são ilimitados nem absolutos, porque essencialmente subordinados, quanto ao seu exercício, à necessária observância das restrições definidas em sede constitucional ou em âmbito legal, consoante proclamam inúmeros precedentes firmados pela jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal.” (Medida Cautelar no MS no 25.617-DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 03.11.2005)

Diante do exposto, com o objetivo de conferir efetividade à função institucional atribuída às Comissões Parlamentares de Inquérito em nosso ordenamento constitucional (CF, art. 58, § 3o), defiro o pedido formulado e determino que o exame das cópias obtidas fique restrito apenas à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, a qual deverá adotar rígidas providências para que seu conteúdo não seja indevidamente divulgado.

Comunique-se, com urgência. Cumpra-se.

Junte-se, oportunamente, a Petição no 93.291/2006 aos autos do Inquérito no 2.337/DF. Ademais, determino a juntada de cópia da referida petição, assim como de cópia desta decisão nos autos dos Inquéritos nos 2.338/DF, 2.339/DF, 2.340/DF, 2.341/DF, 2.342/DF, 2.343/DF, 2.344/DF, 2.345/DF, 2.346/DF, 2.347/DF, 2.348/DF, 2.349/DF, 2.350/DF, 2.351/DF, 2.352/DF, 2.353/DF, 2.354/DF, 2.355/DF, 2.356/DF, 2.357/DF, 2.358/DF, 2.359/DF, 2.360/DF, 2.361/DF, 2.362/DF, 2.363/DF, 2.364/DF, 2.365/DF, 2.366/DF, 2.367/DF, 2.368/DF, 2.369/DF, 2.370/DF, 2.371/DF, 2.372/DF, 2.373/DF, 2.374/DF, 2.375/DF, 2.376/DF, 2.377/DF e 2.378/DF.

Brasília, 18 de julho de 2006.

Ministro GILMAR MENDES

Relator

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